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quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

As cores natalícias

"Lembro-me de jogadores que, no SCP de Bruno de Carvalho, tiveram de abandonar o vermelho dos seus carros (...)

1. Sábado de manhã, antes do magnífico jogo que pude ver na Luz entre Benfica e Famalicão, fui a uma livraria, com o propósito de comprar livros para uma sobrinha e um outro sobrinho. Ambos benfiquistas ferrenhos e praticantes nas escolinhas do clube. Tinham-me pedido livros sobre o Benfica e a sua história. Escolhi-os e pedi para mos embrulharem como prenda natalícia. Escusado será dizer que a cor dominante nas capas de cada um dos livros era o vermelho. A jovem, que gentilmente me atendeu, olhou-me e disse-me, algo embaraçada, que, naquela altura, só tinha papel de embrulho... verde! «Mas qual é o problema?», perguntei-lhe quase distraidamente. Foi, então, que me contou que já tinham sucedido situações em que quem comprou um livro sobre o Benfica recusou determinante o verde de embrulho e, também, o inverso do Sporting e não ter consentido no invólucro encarnado. Ao mesmo tempo que sorri, disse-lhe que podia, à vontade, envolver em alegre verde as ofertas de um tio benfiquista até ao tutano para duas crianças de corpo e alma benfiquistas.
Já fora da livraria, pus-me a pensar no significado das recusas de junção de cores, que me foram descritas. E no que isso tendencialmente significa de excessivo, senão mesmo de patológico, em vez de uma sã, aguerrida e competitiva rivalidade. E no que isso pode induzir no espírito de crianças e jovens em formação, quando atitudes como as referidas são formuladas por pessoas adultas. E, pior do que isso, quando são tornadas (quase) obrigatórias por instruções de quem dirige clubes. Lembro-me de jogadores que, no SCP de Bruno de Carvalho, tiveram de abandonar o vermelho dos seus carros ou a tão insólita, como patética discussão à volta da figura do Pai Natal transfigurado num barbudo verde-e-branco.
Coincidência foi o facto de, no fim-de-semana, o Real Madrid e o Barcelona terem jogado nos seus encontros com equipamentos alternativo esverdeado quase igual. Ai se isso acontecesse cá...

2. Ultrapassada a fase de algumas vitórias com exibições descoloridas, eis que, de há um mês a esta parte, o Benfica regressa a desempenhos não só sedutores, como eficazes. Bruno Lage terá conseguido o onze ideal no actual conjunto de jogadores disponíveis. Como ele disse, e estando ou no estádio a assistir aos desafios, percebe-se também (e tão bem) a importância de um bom relvado para o padrão do Benfica. Acresce um ponto, qual seja o de todos os jogadores estarem em boa forma. Na minha leitura de leigo, gosto particularmente do par Gabriel - Taarabt, improvável até há pouco tempo. No fundo, num um 6, nem um 8, diria, um 6,5 e um 7,5 em diagonais alternadas. Apreciei, particularmente, a grande ovação dada a Franco Cervi, um jogador que, no início da temporada, terá estado na porta de saída. Trata-se de um atleta híper trabalhador, e que tanto ataca como defende com assertividade e que liga muito bem com Grimaldo e o compensa amiúde. Outro jogador que promete é o lateral-direito Tomás Tavares. Comete erros próprios da sua idade, mas adivinha-se que tem à frente um futuro bastante promissor. Chiquinho -  disse-o aqui ainda na pré-época - é um virtuoso, que joga com inteligência, clareza e profundo sentido associativo. Pizzi é o metrónomo da equipa. Se ele joga bem (e tem-no feito muitas vezes), a equipa segue-o; se tem uma tarde ou noite menos conseguida, o colectivo ressente-se. Vinícius, já aqui o escrevi, só tem olhos para a baliza contrária e mostra valer o que custou. Vlachodimos está um senhor guarda-redes.
Segue-se agora um jogo difícil num troféu sempre apetecível. Jogar contra o Sporting de Braga para a Taça de Portugal, mesmo na Luz, constitui sempre um desafio que exige concentração, capacidade competitiva e discernimento. Em bom rigor, está-se a falar de um encontro que, não fora o sorteio, bem poderia ser nesta época o encontro derradeiro no Estádio Nacional.

3. Continuando nas competições nacionais - quando escrevo ainda não sei os resultados dos encontros por disputar na última jornada do campeonato - não posso deixar de referir as incidências da anterior jornada. Não falo de alegado pugilato nas catacumbas do Jamor, nem do modo sempre zangado como Sérgio Conceição fala aos microfones. Que diabo, dizem-nos que é só feitio, mas por que razão é tão singelo feitio só se revela em todo o seu esplendor quando perde ou não ganha? Imagine-se, por hipótese académica, que este Sérgio Conceição, treinava o Benfica. Pergunto, se a tolerância e os salamaleques que lhe fazem em certos e obedientes media não se transformariam imediatamente numa chuva ácida de críticas e onde o tal feitio viraria desequilíbrio. Não haja dúvidas, a Bruno Lage,um treinador correcto, discreto, sem mind games e sem hipocrisia reinante, sempre se inventa qualquer coisa fútil para o criticar. Comparado com a boa imprensa de que, em regra, usufrui o técnico do Porto, o treinador encarnado tende a ter uma imprensa mais adversa...
Uma situação curiosa aconteceu, igualmente, nos últimos dias. Tanta tinta sobre o 2.º golo do Benfica ao Boavista, o tal de Cervi, que - reconheço - foi difícil de ajuizar e caso tivesse sido invalidado não criticaria a decisão. A agência portista de escárnio e maldizer, nos minutos imediatos, lá bolsou nas redes sociais com uma fúria avassaladora contra o árbitro que validou este golo. Pois não é que passados poucos dias, o Porto marcou o seu terceiro e, neste caso, decisivo golo contra o Feyenoord numa indiscutível falta de Soares que levou tudo para dentro da baliza, defesa inclusive. A alegada falta de Cervi comparada com a de Soares é o mesmo que comparar uma ligeira brisa com um tornado. Significativo foi o facto de, mais uma vez, os media em regra muito obedientes (ou com medo de represálias) em relação ao FCP terem ignorado olimpicamente tal situação, ou a terem deixado perder na névoa do tempo quase imediatamente. Na transmissão da Sport TV, limito-me a escrever o que mestre Freitas Lobo disse no momento: «Soares vai com tudo, a mostrar os dentes e os pitons. O mérito é todo dele, que vai de carrinho». Tudo num boa, portanto. Balbuciar a palavra falta, qual quê... o respeitinho é muito ajuizado.

4. Excelente jornada europeia, a que apenas o Sporting entendeu não ligar (e não jogar) patavina. No campeonato 2020/2021, teremos ou duas ou três equipas na fase de grupos da Liga dos Campeões. Este ano, a passagem aos oitavos de final desta competição milionária evidenciou a 100% o poderio dos big five. Das dezasseis equipas apuradas, 4 são inglesas, 4 são espanholas, 3 são italianas, 3 são alemãs, 2 são francesas, numa hierarquia perfeita até dentro destes cinco campeonatos. Um verdadeiro oligopólio futebolístico que se vai perpetuando e cavando um fosse quase intransponível para os outros, a começar por Portugal.
Já quanto ao sorteio dos chamados grandes, e em teoria, Benfica (um confronto entre Bruno Lage e Luís Castro) e Porto terão a eliminatória mais difícil. O Sporting, curiosamente o único clube português do pote 2, terá, aparentemente, um adversário mais acessível. Interessantíssimo será o SC Braga - Rangers.

Contraluz
- Ilustrativo: Desde que Bruno Lage treina a equipa principal do Benfica, os números no campeonato nacional falam por si:
a) 33 jogos, 31 vitórias (94%);
b) 107 golos marcados (média de 3,24 golos por jogo);
c) 15 vitórias (a totalidade) nos jogos fora de casa;
d) em 18 das partidas (55% do total) marcou 4 ou mais golos);
e) nesta época, 13 vitórias em 14 jogos, 11 seguidas, 35 golos obtidos e 5 sofridos (em apenas 4 dos 14 já realizados).
- Tecnologias: Apesar dos erros defendo a existência do VAR. No entanto, com uma apreciável diferença: se para um árbitro de campo sou muito mais compreensível diante de um seu erro, custa-me admitir, que o VAR erre no sossego do sofá e com toda a parafernália tecnológica, como já sucedeu inexplicavelmente cá e lá fora. Há um ponto que também me faz confusão: a medida ao centímetro das linhas para avaliar um fora-de-jogo. Ainda há poucos dias, foi anulado um golo ao Sporting por uns míseros 14 centímetros. Sinceramente acho que, mesmo com a singularidade dos frames, calcular 14cm entre o micro-segundo em que a bola é passada e a posição do jogador que a recebe parece-me ser de um grande arbítrio.  Haverá um dia, em que um offside é assinalado por uma diferença de 1cm. Será marcado? Qual o limite para marcar ou não a infracção ou deixar a jogada ir até ao fim?
- Distinção: Rafael Lisboa, basquetebolista do Benfica, foi eleito pela FIBA para o melhor cinco de jovens que jogaram na fase de grupos da Europe Cup. Mais uma distinção no seu ainda curto percurso, seguindo as pisadas de seu pai (e treinador) Carlos Lisboa, o melhor português de sempre na modalidade."

Bagão Félix, in A Bola

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