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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

Formar e ganhar, eis a questão


"É um mantra do futebolisticamente correto, que se reforça quando as crises estalam e o dinheiro não abunda: há que apostar na formação. Ouve-se isso agora no Benfica, depois de mais uma campanha de contratações dispendiosa e desastrada. A intenção é boa, o problema é outro. Para se apostar na formação, em jogadores jovens, há duas premissas cruciais: a mais importante é ter atletas de qualidade, e tal não deriva necessariamente do local onde cresceram, depois é ter quem aposte neles quando é mais difícil, que é antes das provas dadas. Como depois da noiva casada, também depois de carreira lançada não faltam pretendentes. No futebol português, a própria opinião publicada tem muita dificuldade em acreditar nos jovens talentos, sobretudo quando não dotados de “envergadura física”, esse chavão tão carregado de pleonasmo como de inutilidade. O contraste é o do jogador “evoluído tecnicamente”, aquele que parece amputado de futuro por lhe faltar “intensidade”.
Lembro-me de tantos que aplaudiram a venda de Bernardo Silva pelo Benfica ao Mónaco por 15 milhões. O negócio era excelente, o jogador nem era utilizado, treinava a lateral e com aquele físico não ia a lado nenhum. João Cancelo foi idêntico em quase tudo e a transação, naturalmente, também parecia boa. O futuro desmentiu-os totalmente. Saíram em saldo dois dos melhores jogadores portugueses, de hoje e de sempre. A situação repetiu-se, ou quase se repetiu, com Vitinha, hoje médio decisivo no FC Porto e a valorizar-se todos os dias, mesmo se começou a época atrás de Bruno Costa, Sérgio Oliveira e Grujic. Antes disso ainda esteve destinado a compra pelo Wolverhampton, por 20 milhões. Quase todos percecionaram um negócio magnífico para os dragões. Mais uma vez um baixote magrinho e que não era opção (nem seria) ia valer muito dinheiro. Só que não. O melhor negócio, como é agora evidente, foi mesmo os ingleses não terem completado a aquisição e devolvido o jogador ao Olival, onde cresceu. E ninguém me tira da cabeça, mais uma vez, que a questão física foi determinante para as dúvidas só agora superadas. Aliás, na magnífica geração portista que nasceu ali pela viragem de século, Romário Baró foi o primeiro a merecer aposta. Baró tem tudo para uma boa carreira mas está longe do talento de Vitinha, Fábio Vieira ou Francisco Conceição, a quem tem custado mais ver surgir a sua hora.
Não se critique Rúben Amorim por não apostar em jovens, que não me lembro de quem o tenha feito com mais gente e mais vezes nos grandes clubes nacionais. No entanto, acaba de deixar sair Jovane e Tiago Tomás para dar entrada a Marcus Edwards e Slimani. Muito sinceramente não vejo mal nenhum nisso. Os jovens da formação merecem oportunidades, mas também não são mais que os outros e um clube grande existe para ganhar, não apenas para formar. Eduardo Quaresma não é Gonçalo Inácio, como não é fácil que o próximo Nuno Mendes nasça em Alcochete, mesmo se Flávio Nazinho parece de perfil idêntico. Os mesmo diferenciados, como Inácio ou Mendes, quando agarram o lugar não largam mais. E pouco tempo por cá ficam, em regra. Outros precisam de fazer o caminho das pedras, mesmo que consigam regressar por cima, como sucedeu, no caso do Sporting, com João Palhinha ou Ricardo Esgaio. É esse o desafio para Jovane e TT, que entusiasmaram depressa pela explosão e velocidade mas que dificilmente poderiam ser hoje primeiras figuras entre os leões. Sarabia e Pote são de outro nível, Nuno Santos, Marcus Edwards e até Tabata surgem como alternativas mais óbvias e Slimani acrescenta soluções que nenhum deles assegurava. Citei seis nomes, nenhum da formação leonina. Qual é o drama? Nenhum também, desde que isso não faça descrer na importância de investir nos jovens, até pelo potencial de negócio. Um clube grande, dos que buscam sempre ser campeão, nunca pode desistir de formar, mas sobretudo não pode é desistir de ganhar. E só se ganha com os melhores, nasçam eles onde nascerem."

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