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domingo, 13 de janeiro de 2019

Clássico: organização defensiva de excelência, num jogo rico tacticamente (atenção, este título contém ironia)

"O treinador (...) viu sábado em Alvalade um jogo paupérrimo onde a organização defensiva não se superiorizou; a ofensiva é que teimou em não aparecer

Primeira Parte
Os primeiro minutos do jogo poderiam indiciar um jogo diferente; não por parte do Porto que já nos habituou a não ter um jogo muito pausado e de passe curto, mas porque as duas primeiras acções do Sporting assim o indicavam. Um lance em que o guarda-redes participa e Wendel é parado em falta, e o lance seguinte que acaba com a entrada na área de Diaby e o remate interceptado. Logo de seguida, Renan recebe a bola e manda a equipa fechar, joga a bola na referência Bas Dost para os duelos, acabando numa disputa da segunda, terceira, (…), décima bola, falta cometida pelo Sporting e recomeço do jogo para o Porto. O jogo foi isto. Ninguém quis arriscar sair a jogar curto pressionado, deixando a construção para depois de uma segunda bola já no meio campo ofensivo ou no seguimento de uma reposição de bola.
Marcel Keizer trabalhou do ponto de vista estratégico as suas linhas para estarem posicionadas mais atrás. Bas Dost e Bruno Fernandes à entrada do meio campo, e o resto da equipa a tentar retirar espaço dentro do bloco e em profundidade para condicionar os ataques à profundidade. Não foi por isso estranho que os centrais do Porto e o Danilo tivessem a bola durante algum tempo fora do bloco, até que decidirem procurar o passe longo para Marega que se movimentava entre Mathieu e Jefferson, ou para Soares que se encontrava entre Coates e Bruno Gaspar. O Porto trabalhou da forma habitual, e optou por não pressionar Renan, fechando-lhe as linhas de passe mais próximas, como que o incentivando a escolher outro tipo de opções. Seis homens a fechar o corredor central: Marega, Soares e Herrera numa primeira linha; Corona, Danilo e Brahimi mais atrás, sendo que os dois alas tinham como missão dividir o espaço para conseguirem disputar a bola com os laterais caso Renan optasse por colocar a bola neles.
No meio campo ofensivo as duas equipas tentaram jogar, cada uma a tentar explorar as suas dinâmicas. Um Sporting a procurar ir mais em passe curto, e o Porto a tentar massacrar entre central e lateral e a forçar o passe em profundidade para os dois avançados. Por mais que a bola andasse por Brahimi ou Corona, os lances terminavam invariavelmente na procura das duas referências ofensivas naquele espaço. Também se percebeu que os jogadores do Porto tentaram, na marcação dos livres e nos lançamentos, recomeçar o jogo rápido para tentar aproveitar os momentos de desorganização do Sporting.
Nesta a primeira parte houve um encaixe das duas equipas com um ligeiro ascendente do Sporting. Porque nas situações em que ficou com a bola controlada depois de um duelo (que foram poucas), e sobretudo nas situações em que tentou jogar em passe curto pelo chão, conseguiu chegar junto à área do Porto, onde faltou a qualidade e a paciência para desmontar o que sobrava da organização defensiva do Porto. Sérgio Conceição também tem algum mérito porque a equipa pareceu saber sempre em que situação deveria parar o lance em falta para impedir a criação de uma situação de golo. Tendo Keizer optado por recuar alguns metros, a equipa do Porto entrou ficou desconfortável e esteve longe de conseguir criar situações claras de golo, excepto numa recuperação nos primeiros minutos onde Corona tenta explorar as costas de Mathieu, jogadno em Soares, mas Coates aparece muito bem a cortar o lance. Não se perceberam as fragilidades defensivas do Sporting pela alteração estratégica que criou constrangimentos ao Porto, e por ser um jogo onde os jogadores entram super concentrados nas tarefas defensivas. Sporting não conseguiu expor o Porto pela sua opção na construção, e por não ter qualidade na criação. As transições e outras situações de potencial foram muitas vezes paradas em falta. Não houve, por isso, situações de golo para nenhuma das equipas.
Há um dado interessante onde se percebe a melhor preparação do Porto para um jogo de duelos, e o quão pouco benéfico é para quem ataca optar por esse tipo de lance. Contabilizei durante a primeira parte o número de lances onde os jogadores das duas equipas, em zonas mais recuadas, optaram por jogar a bola pelo ar para uma zona onde se encontravam jogadores das duas equipas. E desses lances, tentei perceber em quantos a equipa que tinha provocado a situação (o duelo) ficava em vantagem (com a bola controlada) depois do lance estar limpo (disputas das segundas, terceiras, (…), décimas bolas). Considerei ainda dentro das vantagens a bola ir para fora e seguir da equipa que provocou o duelo numa zona mais adiantada, ou o adversário fazer falta. O posicionamento mais próximo dos jogadores do Porto, e acção mais agressiva que têm nesse tipo de lances percebeu-se. É este o tipo de jogos que jogam regularmente.
Já o Sporting ter optado por esta estratégia, retirou o erro das zonas mais recuadas, mas não lhe trouxe qualquer benefício do ponto de vista ofensivo. Começamos também com mais estes sinais a perceber que Keizer não é fundamentalista de uma ideia de passe curto, ou talvez ache que a equipa ainda não está preparada para se expor tanto, por haver pouco conforto dos jogadores, neste tipo de jogos. Ainda assim, há a responsabilidade da escolha do onze inicial onde não estavam os mais capazes de colocar a equipa mais confortável em posse.
O Sporting provocou 19 duelos, sendo que ganhou 8. Nestes estão incluídos duas faltas e três lançamentos. O Porto provocou 15 duelos, sendo que ganhou 9. Três foram faltas, e dois lançamentos. Se retirarmos as vantagens das faltas e dos lançamentos, as duas equipas juntas apenas em 7 situações ficaram com a bola controlada em 24 possíveis.

Segunda Parte
Depois do intervalo a duas primeiras situações perto da área são do Sporting. A primeira num duelo em que conseguem ficar com bola e colocar um jogador de frente para a linha defensiva, a segunda num contra ataque depois de um livre ganho pelo Porto. Em ambas as situações faltou, novamente, qualidade e criatividade para definir o lance. Para tal, Keizer teria que optar por outro tipo de jogadores.
Com a entrada de Oliver, e com o intervalo, Sérgio Conceição mudou a dinâmica do Porto. Oliver começava mais baixo: numa primeira fase perto de Danilo, perto do lado direito, para permitir que Corona desse largura e profundidade. Assim, Marega poderia sair do corredor que passou a defender para pedir, novamente, entre central e lateral e Herrera acompanhava Brahimi na tentativa de explorar os espaços entre linhas. A subida de um médio, por troca com o lateral (Maxi) causou outro tipo de problemas ao Sporting. Quando Oliver subia, era Herrera que ficava mais. Os avançados do Porto apareceram mais vezes entre linhas, alternando os movimentos de profundidade com os médios. Do lado esquerdo Brahimi tinha que conduzir para dentro para encontrar colegas para combinar, uma vez que tinha Soares a fixar o Coates e o Telles quase sempre bem tapado pelo Diaby. O Porto estava, nesta fase, mais móvel e menos previsível. Jogou de forma mais paciente por forma a procurar os espaços que lhe interessavam atacar, juntou mais jogadores perto da bola, e também por isso conseguiu mais vezes recuperar a bola nas zonas onde perdia.
Por ter Oliver num espaço de construção o critério foi diferente nas zonas mais recuadas, e é por ele encontrar Brahimi entre linhas que surge a primeira grande situação de golo do jogo. Herrera temporiza bem, depois um passe um pouco largo de Brahimi, e encontra Corona dentro da área que assiste Soares, e este falha incomodado pelo movimento de Marega.
Ainda assim, e apesar de ter tentado de forma diferente, o Porto não conseguiu fazer tremer vezes suficientes a defesa do Sporting para que se justificasse marcar um golo. E sendo o momento defensivo o pior argumento de Keizer, isso diz muito sobre o momento ofensivo de Sérgio Conceição. É um modelo trabalhado para romper pela força, e quando os adversários respondem com força na mesma medida não consegue arranjar alternativas (dentro do seu modelo) para criar embaraço suficiente.
À maior iniciativa do Porto, o Sporting reagiu partindo o jogo. Tentou sair em contra ataque quase sempre que recuperava a bola, mesmo quando as condições não eram as mais indicadas para tal. Perdeu o controlo do jogo por isso, desgastou-se mais, e expôs mais as suas debilidades defensivas colectivas e más abordagens individuais. Continuou a provocar duelos, e o jogo foi-se deteriorando à cada minuto que passava: cada acção falhada precipitava os jogadores para outra acção falhada, e por isso os espaços que o Porto tanto gosta apareceram bem mais do que na primeira parte.
No último quarto de hora, quando Bas Dost estava um tanto quanto adiantado para atacar aquela bola de forma adequada ao segundo poste, no seguimento do canto, não nos podemos esquecer que foi a pausa de Bruno Fernandes que permitiu o tempo e o espaço à Ristovski para colocar lá a bola. O Bruno estava parado, e a acção dele mostra o caminho para se atacar melhor: o critério e a qualidade de execução.
Poder-se-à dizer que foi preferível para ambas as equipas não correrem riscos lá atrás, exemplificando com o lance em que Corona atrasa para Casillas e Bas Dost esteve perto de interceptar. Mas a situação apenas acontece porque Corona está habituado a jogar num espaço diferente onde não tem que jogar sempre na frente, e como Casillas não está habituado a dar linhas de passe ali, não se disponibilizou para receber a bola e dar seguimento ao lance. Se o tivesse feito, Dost não teria chegado perto do o incomodar e ainda o desgastava por ter feito mais um sprint onde nem ele nem os colegas tinham conseguido recuperar a bola. É tudo uma questão de hábitos, é uma questão de escolhas.
O jogo foi pobre porque nenhuma das equipas quis arriscar, e a riqueza táctica perde-se na falta de controlo dos duelos e na precipitação. Atacou-se mal, e por isso não é possível dizer que se tenha defendido de forma exemplar. Porque quando as intenções ofensivas foram boas as duas organizações defensivas acabaram expostas. O título do texto é uma forma irónica de catalogar um jogo paupérrimo onde a organização defensiva não se superiorizou; a ofensiva é que teimou em não aparecer. E como não estamos habituados a ver equipas com boas ideias de ataque dizemos que em Portugal defende-se muito bem, e que do ponto de vista táctico o jogo é muito rico."

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