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domingo, 28 de julho de 2024

As vitórias da humildade


"Três momentos mostraram à saciedade as mudanças de paradigma, a aposta no desenvolvimento gradual mas consistente do atleta, na vertente individual e coletiva

No desporto (como na vida, afinal), gostamos de partilhar sucessos e de multiplicar alegrias. Nem sempre o encaramos com fair play, com o distanciamento necessário para percebermos que o adversário é fundamental para legitimar o nosso triunfo ou para nos ajudar a preparar o novo desafio.
Com 39 anos de carreira no jornalismo, venho de um tempo inicial pouco inteiro no que diz respeito ao investimento concertado, planeado e sustentado no talento e na sua maximização. Um tempo em que o alto rendimento se confinava ao futebol e em que os sucessos (esporádicos mas retumbantes) noutras modalidades se diluíam na ditadura do desporto-rei e na criação de um quase unanimismo em relação aos gostos e às preferências de acompanhamento dos portugueses.
E, justamente na semana em que, nas páginas do maior e mais prestigiado título da comunicação social portuguesa na área do desporto, lanço este Livre e Direto, três momentos mostraram à saciedade as mudanças de paradigma, a aposta no desenvolvimento gradual mas consistente do atleta, seja na vertente individual, seja na componente coletiva.
E sempre demonstrando que, por trás do sucesso individual, está uma equipa multidisciplinar, está um olhar global, um estudo atento das oportunidades e da evolução de carreira. Sendo que, à frente de tudo isso, está o Talento, esse conceito para muitos tão estranho, difuso e difícil de reconhecer, mas que, no alto rendimento desportivo, não se pode (pelo menos não se deve…) medir apenas pelo resultado imediato, pela vitória de hoje. Ele, o Talento, é apenas a mais-valia que nos coloca perto do objetivo, que nos faz diferentes, que nos torna verdadeiramente competitivos no momento do desafio e inultrapassáveis na hora da dignidade.
Nuno Borges venceu o ATP de Bastad. E isso bastaria para o catapultar para as chamadas de primeira página. Mas bateu Rafael Nadal no último jogo, e fê-lo com desassombro, com inequívoca demonstração de supremacia. Mas fê-lo, também, com Humildade. A que ficou bem patente no modo como entrou no court e na forma como, consumada uma vitória histórica, fruto de imenso e muito profissional trabalho, dele saiu. Apenas isso já basta para fazer dele um Campeão.
O Ténis português reforça a sua posição internacional e projeta um nome para os cinquenta primeiros do ranking mundial. Mas o jogador maiato, que aos 27 anos conseguira já atingir os oitavos de final do Open da Austrália, vale muito mais do que isso: vale pelo modo como respeitou Nadal, um monstro do outro lado do court, como, sem subserviência mas com imenso savoir faire, aproveitou a oportunidade para ganhar espaço informativo, ainda mais credibilidade no circuito e lastro de confiança para os próximos desafios.
Tal e qual João Almeida. Um predestinado numa das mais complexas modalidades, que acrescenta uma dimensão individual única a uma capacidade coletiva muitas vezes desvalorizada, mas tão importante quanto decisiva.
Almeida, um dos habituais desafiadores do Giro, girou prioridades para o Tour e sempre se afirmou um lugar-tenente de confiança para o seu chefe de fila. Quem integra a equipa de Tadej Pogacar sabe bem o que isso significa, sobretudo na Grande Boucle: trabalhar no cumprimento da estratégia que melhor potencie o putativo candidato à vitória.
Só que o corredor português foi ainda mais longe. Revelou-se o apoio indispensável para que o esloveno conquistasse a sua terceira vitória em cinco anos em França, mas marcou indelevelmente a sua presença com um quarto lugar extraordinário, apenas ao alcance de uma reduzida fina flor. A prova traçada a filigrana, de modo quase desenhado ao detalhe, levou João Almeida a um momento de exaltação como muito poucos no desporto português.
E com o denominador comum a Nuno Borges: a Humildade com que reconheceu, ao longo de 21 dias de prova, a sua principal missão, e com que celebrou o seu próprio sucesso, mesclando-o com o fundamental trabalho de equipa, cujo resultado final deve ser sempre superior à simples soma do esforço de cada um.
E é justamente de trabalho de equipa que se fala quando se olha para a brilhante campanha da Seleção Portuguesa de sub-20 no Europeu de andebol. Uma quase imaculada prova (com seis vitórias, um empate e apenas a derrota da final, frente à Espanha).
Quem segue a extraordinária evolução do andebol em Portugal, nos últimos vinte anos, talvez não estranhe o surgimento de tanto talento. Depois, porém, é necessário dar-lhe horizontes, integrá-lo no coletivo e garantir-lhe capacidade de superação.
Carlos Martingo, a sua equipa técnica e o grupo de jovens jogadores agora vice-campeões europeus são a garantia de duas coisas: de que o trabalho científico, programado, organizado e com objetivos bem definidos compensa sempre; e de que, juntando aos fantásticos momentos da equipa A de Portugal, liderada pela capacidade única de Paulo Pereira, teremos futuro assegurado numa modalidade em que Solidariedade também rima com Humildade.

Cartão branco
A sua equipa dirigiu apenas três encontros na fase final do Europeu de futebol. Como se fosse admissível pedir mais, em função dos apertados critérios da Comissão de Arbitragem da UEFA.
Artur Soares Dias (com Paulo Soares e Pedro Ribeiro) pode estar orgulhoso do percurso em terras e estádios alemães. Quem segue atentamente a arbitragem internacional de futebol sabe o quão complicadas são as estradas para se chegar a este nível e a esta dimensão de qualidade.
Tiago Martins tem também, como VAR, mérito incontestável.
Voltarei ao tema mas, por hoje, fica o agradecimento público de quem reconhece nestes quatro árbitros portugueses competência, dedicação e paixão.
Afinal, tudo o que é necessário para triunfar.

Cartão amarelo
Teimar em manter aberto o mercado de transferências na Europa até ao final de agosto é continuar a inquinar a competição e, sobretudo, a desrespeitar o trabalho de treinadores e jogadores.
As incertezas resultantes de transferências milionárias são limite à concentração e à total disponibilidade para a integração nas respetivas equipas. Os condicionalismos psicológicos que daí resultam fazem com que atletas e técnicos dispersem a sua concentração em momentos em que, no arranque das principais competições, isso já não é admissível."

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