Últimas indefectivações

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O toque divino de Markovic

"1 - Tem cara de menino bem-comportado e um pacto secreto com a bola, que lhe obedece a todas as ordens; quando se cruzam (ele e o objecto de estimação), o assombro está ao virar da esquina. As primeiras impressões sugerem que o esboço dos quadros corresponde ao desejo infantil de se entregar a exercícios desconectados com a realidade; pouco depois vem a resposta: são sinais agitados e temíveis de um predador insaciável que não está ali para brincadeiras. Quando pega na bola e parte em velocidade de trás para a frente, em sucessivos ziguezagues no meio de engarrafamentos, Markovic transfigura-se: é um felino com soluções contundentes, veloz e genial com bola, capaz de galgar terreno pela arte do engano mas também por espontaneidade, rapidez e súbitas mudanças de trajecto.
2 - A indiferença aparente com que reage às incidências do jogo é a fachada mentirosa de um futebolista que recusa ser devorado pela pressão da luta mas tem os sentidos despertos em permanência – tudo para golpear o adversário com meia dúzia de acções que servem para fazer a diferença em hora e meia. É impressionante a velocidade que emprega nos exercícios solitários que promove. Mas incrível mesmo é a precisão, a harmonia e a articulação motora dos deslocamentos supersónicos com a bola colada aos pés, como se todos os elementos da viagem fizessem parte do mesmo corpo. Salvaguardando todas as distâncias, desde logo a que separa um jovem talento em fase de afirmação de um dos melhores jogadores da história do futebol, há no rasto que deixa por onde passa, no estilo e no atrevimento de Markovic traços do padrão criativo de Leo Messi.
3 - Aos 19 anos tem ainda longo caminho a percorrer até atingir o patamar correspondente às qualidades que possui. É normal que seja rebelde e se considere invencível; que lhe falte sentido de orientação e tome decisões erradas; que se atrase ou adiante na chegada aos lances e se equivoque na avaliação das dificuldades da equipa; que não seja perfeito a definir o posicionamento em campo e lhe falte sentido prático em determinados momentos. É um jogador muito dependente da inspiração: apesar do extraordinário e reconhecido talento, está ainda à mercê de exibições como a de Guimarães, na qual pouco ou nada fez de relevante. Isto sem beliscar a ideia de que é um fenómeno absoluto e estará em Portugal apenas de passagem para cumprir destino maior.
4 - Há estrelas universais que iluminam e governam os jogos em que participam (como Di Stéfano, Cruyff e Maradona); outras cuja dimensão total está dependente da saída que o colectivo oferece à visão e à criatividade de um homem só (como Platini, Rui Costa e Zidane); e há aquelas, como Lazar Markovic, que precisam apenas da bola para, mais cedo ou mais tarde, mostrarem em continuidade o génio que os distingue (estirpe de que Pelé, Eusébio, Ronaldo, Messi e também Maradona são expoentes máximos). Estes são os craques mais raros e por isso mais valiosos; aqueles que servem para dar ao jogo uma dimensão artística nem sempre reconhecida; para deslumbrar plateias, ganhar jogos e, com um pouco de sorte, marcar um tempo ou mesmo a história do futebol.

Fazer do inferno o paraíso ideal
O Rio Ave de Nuno Espírito Santo e o bom futebol estabeleceram relação sólida e duradoura
Os vila-condenses visitaram o reduto leonino com a família verde e branca em estado de graça, unida à volta de uma equipa que é a principal responsável pelo clima de perfeita comunhão de energias, interesses, motivação e confiança no clube. Nuno teve a ousadia de ir a Alvalade discutir o jogo, reclamar a posse de bola e transformar o inferno num paraíso onde a equipa expressou todo o futebol que possui. O jogo entrará na história pelo penálti que Carlos Xistra não assinalou. Mas a ele deve ficar adjacente uma adenda que sirva para recordar a notável exibição do Rio Ave.

Grande equipa à volta de Evandro
As equipas que se aventuram a jogar são aquelas que mais e melhor valorizam os jogadores
Depois de uma temporada de sonho sob o comando de Marco Silva, o Estoril viu-se obrigado a reconstruir uma equipa sem Steven Vitória (Benfica), Jefferson (Sporting), Carlos Eduardo e Licá (FC Porto). Fê-lo sem dramas e ao fim de cinco jornadas já mostrou que, no fim da época, lá estarão os tubarões na Amoreira em busca de reforços. Evandro, por exemplo, está a mostrar, na qualidade de maestro, que é um dos melhores médios da Liga. Pensa bem, executa melhor e só toma decisões corretas; a equipa gira à volta do seu talento, do seu ritmo e da sua inteligência. Um grande jogador.

Todo o direito a uma noite má
O jogo do FC Porto no Estoril foi esquisito e não apenas pelo desacerto do árbitro Rui Silva
Não é habitual uma equipa de fiabilidade quase absoluta estar a vencer por duas vezes e permitir o empate. Mas também é raro (raríssimo desde que pegou de estaca no onze) ver Mangala cometer tanto deslize. Sucederam-se os erros posicionais; de avaliação dos lances, de entrada à bola e até de abordagem aos adversários – tudo a par de inusual leveza em quem faz do físico uma arma prioritária. Já com 2-2 no marcador, permitiu a Luís Leal desembaraçar-se da sua vigilância e rematar a centímetros do poste esquerdo de Helton. Conclusão: também Mangala tem direito a uma noite má. Todos têm."

Sem comentários:

Enviar um comentário

A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!