"O Flamengo veio a Lisboa para uma festa diferente. Tão diferente, que terminou com um banquete monumental que reuniu mais de 800 pessoas. O jogo passou para segundo lugar. E o empate (1-1) frente ao Benfica foi discutido, mas a zanga durou pouco.
Na véspera só se falava da festa. Festa de arromba! Airoso estádio com sistema revolucionário de instalação eléctrica. Estádio da Luz inundado de luz.
Com um adversário de truz: o Flamengo. Equipa mais popular do Brasil.
1958: dia 9 de Junho.
No ano anterior, os encarnados tinham feito uma grande digressão pelo Brasil. E jogado contra o Flamengo.
Aliás, dizia-se à boca pequena: é agora! O é agora refira-se à vitória. Porque, até aí, o Benfica ainda não batera o Flamengo nos jogos já realizados.
Infelizmente, não seria ainda agora.
Mas a festa estava acima de tudo. Até do resultado.
O Flamengo vinha da Bélgica, onde realizara uns particulares.
Otto Glória, que escrevia uma crónica semanal do Diário de Lisboa, não escondia a alegria: 'Realiza-se hoje a festa de inauguração da iluminação do Estádio da Luz com a presença, para maior brilhantismo e solenidade, do famoso esquadrão brasileiro do Flamengo!' Por seu lado, o director do clube do Rio de Janeiro, Jaime de Almeida, prometia: 'Acreditem que a nossa equipa está em magnífica forma. Tivemos resultados excelentes nesta nossa volta à Europa, contra equipas fortíssimas como o Racing de Paris, o Bolton ou o Ujpest Dozsa. Jogar contra o Benfica significa o máximo prazer para fecho de uma digressão deste calibre'.
Os nomes podem ter sido embaciados pelo tempo, mas não se esqueçam de que estávamos em 1958, e o Brasil ganharia nesse ano o seu primeiro título mundial. Jadir, Babá, Manuelzinho, Décio, Alfredinho, Copolilo, Ary. Os portugueses ansiavam por vê-los ao vivo.
O banquete!
'Não se esquecerá tão depressa o festival que o Benfica, perante milhares de espectadores, realizou para a inauguração da nova iluminação do seu estádio, recinto que ficou, agora, dotado com um dos mais perfeitos requisitos modernos, tanto no processo técnico como na intensidade luminosa que jorra de 240 projectores orientados para o tapete verde', iniciava uma reportagem de um jornal da época. 'Em tudo foi uma festa à Benfica! Multicolor, alegre, imponente, espectacular e rica de beleza. O clube caprichou em realizar um programa variado, repleto de sugestão desportiva, e que se documentou pela realização da estafeta Chama do Benfica, cujos corredores passaram por campos onde o clube exerceu as suas actividades. Além disso, tivemos demonstrações de ginástica, exposição campista e o jogo de futebol no qual colaborou o Flamengo'.
Girândolas de fogo-de-artifício, danças regionais e a execução do Hino Nacional receberam as duas equipas sobre o relvado. Ambiente de euforia e regozijo.
Talvez por isso o resultado não fosse o mais importante.
Mas foi disputado como se fosse a sério.
Tanto assim, que os brasileiros foram arranjando tranquibérnias consecutivas. Está-lhes no sul-americano sangue.
No Flamengo faltavam os seleccionados Zagallo, Joel e Dido Mayer.
A disputa foi acesa como a luz.
Alegres de início, criativos de técnica requintada, os brasileiros começaram por tomar conta dos acontecimentos. No Benfica, com as ausências de Ângelo e Pegado, cabia a José Maria travar as iniciativas contrárias, algo que fez com suprema classe.
Costa Pereira esteve assoberbado de trabalho.
Em desvantagem desde cedo, os encarnados batalharam pela honra em cada milímetro de terreno. Contra e superior capacidade do adversário, ofereceram o peito às bolas. E chegaram ao empate a dois minutos do fim.
O golo deu a sensação de ter sido obtido em off-side.
O público eufórico, não quis nem saber.
O árbitro encolheu os ombros e validou o lance.
1-1: estava bem para a grande festa da luz na Luz.
A malta regressou a casa contente. Cumprira-se mais um capítulo na histórico do Clube.
'O ambiente foi de regozijo intenso, comunicativo e vincadamente popular, e culminou, altas horas da madrugada, com uma ceia monumental na qual tornam parte 800 pessoas!'
Era do quilé! Todos foram dormir de barriga cheia...
O futebol tinha passado para segundo plano...
Mesmo com um Benfica - Flamengo. Mais popular era impossível."
Afonso de Melo, in O Benfica
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