"A paixão pelo futebol tem limites, e esses limites encontram barreiras nos distúrbios sociais e mentais de uma sociedade cada vez mais violenta. Como luso-brasileiro, filho de portugueses que construíram a vida no Brasil, sinto-me no direito — e no dever — de abordar este tema sem receio de julgamentos. Conhecendo as nuances de ambas as culturas, entendo que minha perspectiva talvez traga um olhar híbrido, mas crítico e realista.
Em 2024, o Brasil atravessa um dos períodos mais violentos de sua história recente. O roubo de telemóveis tornou-se trivial, a corrupção é vista com resignação, e a violência ligada ao futebol alcança níveis alarmantes. Não se trata apenas de um desporto; tornou-se, infelizmente, um campo de batalha para facções organizadas que confundem paixão com agressão.
Um episódio que não deveria existir
O caso mais recente, que culminou na morte trágica de José Victor Miranda, torcedor do Cruzeiro, é o retrato do que o futebol brasileiro tem se tornado. O ataque, que ocorreu na Rodovia Fernão Dias, em São Paulo, foi perpetrado por torcedores do Palmeiras contra adeptos da torcida organizada Máfia Azul. O embate não foi apenas físico, mas uma manifestação crua da irracionalidade que o fanatismo pode alcançar.
Cerca de 150 pessoas participaram do confronto, marcado pelo uso de pedaços de madeira e fogo. Um dos autocarros foi incendiado, resultando na morte de José Victor e deixando outros 17 feridos. Embora as causas da morte ainda aguardem confirmação oficial, relatos indicam que ele foi carbonizado. A situação, além de devastadora, é um reflexo de uma cultura onde o desporto deveria unir, mas muitas vezes divide de forma fatal.
Palmeiras: da glória ao peso da responsabilidade
O momento desportivo do Palmeiras, sob a liderança do nosso conterrâneo Abel Ferreira, é histórico. Com números que superam os de Jorge Jesus durante sua passagem pelo Flamengo, o clube vive uma das fases mais brilhantes no relvado. Porém, fora dele, o cenário é sombrio.
O clube enfrenta agora o desafio de lidar com a escalada de violência ligada à sua torcida organizada. Isso não é apenas uma questão de adeptos, mas de gestão. Uma diretoria que se mostra negligente na promoção de ética e respeito acaba por permitir que episódios como este se tornem recorrentes. É imperativo que as instituições desportivas assumam responsabilidade não apenas pelas vitórias em campo, mas também pela postura de seus adeptos.
Reflexão sobre a sociedade brasileira
Este episódio é mais um sintoma de uma sociedade marcada pela falta de empatia, polarização e narrativas que fomentam o ódio. O Brasil enfrenta o que pode ser chamado de uma "pandemia social", onde o caos é normalizado e as soluções parecem distantes. Contudo, enquanto houver diálogo, há esperança.
O Brasil, que historicamente foi um alicerce para o crescimento económico de Portugal, é mais do que um parceiro estratégico. É um reflexo cultural e humano do qual não podemos nos distanciar. Zelar pelo futuro do Brasil é também cuidar da conexão profunda que existe entre as duas nações.
Que episódios como o ocorrido em Mairiporã sirvam como catalisadores para mudanças. A violência no futebol, como em qualquer outra esfera da vida, não deve ser encarada como parte da paixão, mas como um desvio que precisa ser corrigido. O desporto, afinal, é um espaço de união, não de divisão."
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