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quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

Só Lage tem pressão no dérbi

"O Benfica luta pelo título de campeão nacional, enquanto o Sporting apenas batalha pelo terceiro lugar

Depois do enorme susto que a águia apanhou diante do atrapalhado Desportivo das Aves e do pouco entusiasmo do leão frente ao adoentado Vitória de Setúbal não será de esperar dérbi empolgante na próxima sexta-feita, em Alvalade.
Argumentarão os mais condescendentes que ambos foram traídos por superficial abordagem competitiva perante oponentes que não só não suscitavam preocupações de tirarem o sono como sugeriam o resguardo de energias para outros compromissos de maior envergadura.
Replicarão os mais exigentes que nenhuma razão se vislumbrou para poupar no físico e na mente a seguir a prolongada paragem no campeonato para festejos natalícios. A não ser que demasiado descanso, concedido para baixar o tom dos lamentos de treinadores mais agitados, tenha efeitos perversos no rendimento dos próprios jogadores, como se não bastasse a toada pachorrenta que caracteriza boa parte dos jogos da Liga portuguesa.
O dérbi autêntico é sempre especial, imprevisível, fascinante. É o grande jogo, mas o próximo, ao nível da nota artística, prevê-se mais para o fraco. Intensidade haverá, com toda a certeza, como nos conta a longa e cativante história da rivalidade entre os vizinhos da capital. Neste em particular, porém, a pressão, esse papão assustador, está quase toda no lado de Bruno Lage, porque se sente obrigado a salvaguardar a ténue margem de segurança (quatro pontos) no primeiro lugar, sabendo que há duas semanas o FC Porto venceu em Alvalade, enquanto o objectivo supremo de Jorge Silas se esgota na vitória do jogo, por orgulho e pelo gozo que dará à família leonina, como é tradição. Ou seja, Benfica luta pelo título de campeão nacional, enquanto o Sporting apenas batalha pelo terceiro lugar.

O Sporting dá sinais importantes de mudança, de estar a projectar o futuro, em vez de correr à volta de uma mesa redonda, incapaz de escolher um novo rumo e defini-lo no recato do gabinete. Dois exemplos básicos para uma nova política:
Tomar medidas acertadas nas saídas e nas entradas de maneira a construir uma equipa forte, com esqueleto para quatro-cinco anos, vocacionada para discutir títulos mas sem os prometer para amanhã ou depois.
Dar mais oportunidades a gente nova que promete muito, como Rafael Camacho, Pedro Mendes ou Gonzalo Plata, comprar a tempo e horas, como parece ser o caso de Sporar, e aliviar a carga do que não interessa.
No Bonfim, verificou-se mais do mesmo, um Sporting demasiado dependente do talento do seu capitão, que é imenso, mas igualmente sujeito aos seus estados de alma, especialmente confusos, como se compreende, devido à sucessão de notícias que ora o colocam na Premier League, onde ele gostaria de alinhar, ora dizem que o negócio ficou adiado pela enésima vez. O que não é bom, nem para a imagem do clube, nem para a estabilidade do jogador, o qual, no entanto, tem sabido separar as águas. Com o Vitória sadino, mesmo em velocidade moderada, foi ele quem decidiu, o costume, e no dérbi de sexta-feira o desempenho da equipa leonina vai continuar a depender muito da inspiração de Bruno Fernandes, à semelhança do que se viu nos dois confrontos da Taça de Portugal entre os emblemas da Segunda Circular.

O Benfica atravessa uma fase de menor fulgor, apenas disfarçada pela especial aptidão de alguns dos elementos de referência, sem eliminar, todavia, o problema de fundo e que tem a ver com a míngua que se observa quando à sua capacidade concretizadora. É irrecusável que a equipa marca que se farta cá dentro, mas lá fora é outra conversa. O susto no jogo com o Aves teve o seu quê de inexplicável, admite-se, mas o que importa é averiguar se tantos remates deitados à rua foram obra do além ou consequência da falta de aplicação no trabalho diário: o remate treina-se e aprimora-se, tal como o passe ou a recepção.
A contratação do alemão Weigl prova que Bruno Lage está atento, e preocupado também. Tem as debilidades identificadas e quer eliminá-las, não sendo surpresa, pelo que tem sido divulgado, a celeridade na aquisição do brasileiro Bruno Guimarães: há o título para reconquistar e a UEFA para fazer boa figura.
Decisões necessárias no sentido de reforçar o eixo central da estrutura e fortalecer a coesão do grupo, embora insuficientes, na medida em que o Benfica de hoje revela menor poder argumentativo na frente de ataque devido às saídas de João Félix e Jonas. O investimento em Chiquinho não chega. É jogador que (ainda) não tem golo, como agora se diz, que (ainda) não exprime dimensão se clube grande e que, não conseguindo dar o que pretendem que dê, encurta o jogo e limita o poder de finalização.
Chiquinho não reúne atributos para se comparar a Félix, o que não quer dizer que não seja bom jogador, mas provavelmente não tão bom quanto o Benfica precisa que seja.
Bruno Lage pode ver nele um virtuoso, mas também sabe que tem de voltar a esticar a equipa, sem mais delongas, sob risco de falhar a reconquista do título, comprometer uma participação digna na Liga Europa e sabe-se lá que mais..."

Fernando Guerra, in A Bola

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