"Bateram-se palmas por nove vezes no Dragão e no restaurante onde estava. Temeu-se nervosamente nos mesmos locais, separados por dezenas de quilómetros e pela meteorologia (os momentos de chuva nunca coincidiram, curiosamente), quando a Arménia empatou. E, no fim de tudo, onde estamos, o que tirámos daqui, deste jogo?
Talvez nada do que verdadeiramente interessa, não sendo jogo para isso, claro está. A Arménia é frágil, vive nos meandros do ranking da FIFA e resolveu dar-se ao duelo quando viu uma brecha para arriscar uma gracinha. Portugal correspondeu marcando nove golos, a equipa levitada pelas veias raiadas nos olhos de jogadores que, ao mesmo tempo, pareciam miúdos a divertir-se e assassinos em série no relvado do Dragão, tal a vontade de marcar mais e mais golos. Haverá poucas atitudes mais entusiasmantes num jogo de futebol, para mais um que acabou por dar a Portugal mais uma participação consecutiva num Mundial, a sétima, num total de nove.
Porém, a vitória concludente e a festa que se seguiu vai atirar, por exemplo, a cadência de erros no golo arménio para um qualquer canto. Deixará o jogo com a Irlanda no território do “psicológico”, como defendeu Roberto Martínez, e não no campo das evidentes dificuldades técnico-táticas apresentadas em Dublin. Manterá também, ao contrário do que se pensa, irrelevante qualquer discussão sobre lugares marcados à mesa, porque essa reflexão nunca existiu verdadeiramente, pelo menos para quem a deveria fazer. E quando ela existe, entre os adeptos, é sempre feita de polarização e exageros.
Sobre isso, a querela, de todos, adeptos e responsáveis, não deveria ser sobre ausências e presenças, deveria ser sempre sobre papéis e o papel que Cristiano Ronaldo deveria ter na seleção nacional. Deve ser proscrito como alguns defendem? Dificilmente. O seu magnetismo para o golo continua a ser uma característica que não é nada de se deitar fora para um treinador. Mas é cada vez mais incompreensível que o processo de jogo não tenha as suas hipóteses de aparecer com Roberto Martínez. No Mundial, Cristiano Ronaldo será invariavelmente titular, adeque-se ou não o jogo - e em alguns jogos até fará sentido que esteja no onze -, e vai, seguramente, marcar todos os livres e mais alguns, mesmo com outros jogadores com capacidades para o fazer no seio da seleção. João Neves não foi o primeiro a lembrá-lo.
É sim ou sopas, preto ou branco: a discussão não permite nada que viva no meio.
E isso é que é verdadeiramente preocupante: a ausência de hipóteses de discussão, seja sobre futebol ou outro qualquer tema. Olhar para o jogo com a Arménia como a prova que Ronaldo deveria estar fora será redutor e errado - talvez seja mais importante olhar para os dois duelos com a Irlanda -, mesmo que o ataque com a mobilidade de Gonçalo Ramos e o pensamento de Bruno Fernandes tenha dado provas de uma fluidez que Portugal não só necessita como tem a obrigação de mostrar, tal a qualidade individual que tem em boa parte das posições. O problema é que a discussão simplesmente não tem lugar, alguns querem-na surda e muda, por insondáveis razões, pouco próprias para pessoas com responsabilidades na gestão não só de uma equipa de futebol, mas também de homens.
Justificar um cartão vermelho por agressão - e a pobre atitude que se seguiu - com “muita paixão” e “frustração” abre portas à relativização de outro tipo de comportamentos profundamente errados. E não, não me peçam calma porque “isto é só futebol”. Apelidar de “falta de respeito” uma pergunta sobre a não-presença de Cristiano Ronaldo no Dragão, onde poderia festejar com os colegas uma vitória que lhe permitirá bater o recorde individual de presenças no Mundial, passa de novo uma mensagem já gasta: há assuntos em que, aparentemente, não se pode tocar. E tratar o capitão de equipa, seja ele quem for, com o mesmo barómetro de exigência face a outro jogador qualquer, é cuspir no prato da responsabilidade.
De tanto querer evitar “o circo”, como ele próprio lhe chamou naquela conversa de bros com um dos interlocutores de sempre, Cristiano Ronaldo contribui para ele. Mas não é o principal culpado. Perante tamanha força nas pancadinhas nas costas, Bruno Fernandes foi obrigado a ser o adulto na sala, dizendo em poucas palavras, sem melindrar ninguém, o que deveria ter sido logo atestado pelo selecionador nacional. Falou de coisas que “acontecem no futebol” - e é verdade, ninguém está livre de errar - e de uma “reação” que “custou caro” a Ronaldo. “Ele sabe que cometeu um erro, era algo que não queria fazer”, apontou, defendendo o colega sem lhe retirar as responsabilidades na atitude. Não é assim tão difícil e passa um exemplo bem melhor do que choramingar à FIFA panaceias para evitar uma suspensão que, naturalmente, se ficará por aqui - e se não ficar, a postura mais adulta é assumir as responsabilidades e seguir em frente até ao continente americano sem desculpas ou justificações.
O que se passou
A judoca portuguesa Joana Santos conquistou pela terceira vez o ouro nos Jogos Surdolímpicos, que estão a decorrer em Tóquio.
No râguebi, a seleção nacional voltou às vitórias, frente a Hong Kong.
Portugal bateu a Bélgica e está nos oitavos de final do Mundial sub-17: na terça-feira, o adversário é o México."

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