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terça-feira, 15 de agosto de 2023

O Benfica flertou com a Lei de Murphy antes de impor-se a Lei de Bozenik


"Jogo ensandecido no Bessa, com curvas e contra-curvas, voltas e reviravoltas e uma vitória do Boavista por 3-2, para lá das horas extraordinárias, frente a um campeão nacional que pode queixar-se de algum azar, mas também de erros próprios. Chamada de atenção para o Benfica, a começar o campeonato com uma derrota

Quantas histórias se podem contar dentro de um único jogo, dentro de 90 minutos que agora já não são 90’, serão 100, 105 minutos, mais até? Às vezes, nem uma, queixamo-nos, legitimamente, da falta de história, de um campeonato previsível e insosso, jogado tarde e a más horas, bancadas despidas.
Mas talvez não nos possamos queixar tanto assim desta 1.ª jornada, feita de muitos golos, de surpresas, de inesperados e de voltas e reviravoltas e o Boavista - Benfica foi uma espécie de edição Europa-América, um resumo da ronda de abertura mas em esteróides, tal foi o abalo, o espanto e a intensidade e, por fim, a queda do campeão em título num estádio que nunca facilita o trabalho a ninguém.
E que jogo foi este, feito de erros, falhanços incríveis, azares sem nome? É possível que tenha sido um jogo até aos 51’, minuto em que Petar Musa foi de sola à perna de Abascal e acabou expulso, e daí para a frente foram vários jogos. Logo após o croata receber ordem de banho antecipado, Schmidt mudou de tática, apostando numa linha de três centrais e dois alas projetados, para no livre correspondente, já com Morato em campo, o Benfica sofrer o empate, marca do eslovaco Bozenik, num lance em que nem Otamendi nem Jurasek conseguiram afastar o cruzamento tenso de Bruno Onyemaechi.
Aquela sequência foi como um intenso flerte do Benfica com a Lei de Murphy. O que tinha de correr mal, correu mesmo, com uma expulsão e golo sofrido logo a seguir, com um sistema novo para deglutir. Até aí, os encarnados controlavam. O Boavista de Petit, como é de seu apanágio, ao contrário do que certos iluminados pensam, entrou com grande chegada à área do Benfica, com mais bola. Sem ela, ia dificultando, agressivamente - houve três amarelos para jogadores do Boavista nos primeiros 15 minutos -, a construção de caminhos para a sua baliza. Seria num duelo ganho por Rafa, aos 22 minutos, que o encontro se poria de feição para os campeões nacionais, a jogar com Musa e Jurasek, novidades face ao onze da Supertaça: o pequeno avançado ganhou no ar a Abascal a meio-campo, apanhou o Boavista descompensado na defesa e seguiu com a bola por ali fora, sozinho, antes de oferecer o golo a Di María quando se viu com companhia no seu encalço.
A partir do golo houve mais Benfica, o Boavista deixou de conseguir ser uma ameaça e só o voltou a ser no início do 2.º tempo, onde de novo foi farejar as imediações da área encarnada. Viria então o vermelho de Musa, o empate de Bozenik e todo um jogo diferente. A jogar com 10, Schmidt apostou em ataques rápidos, com Jurasek e Bah projetados. Aos 69’, Rafa, sempre ele, quase fazia golo, ao percecionar o erro de Filipe Ferreira antes do próprio Filipe Ferreira, tentando depois enganar João Gonçalves com um chapéu, com a bola a ficar-se pela barra - hello Lei de Murphy. Mas pouco depois, o génio do avançado português deu chuto no azar: é ele que começa a jogada a meio-campo, lançando Jurasek, que cruzou para a área. Como a Lei de Murphy andou sempre por ali a pairar, a bola só entraria à terceira: primeiro há remate de Kokçu, que João Gonçalves defendeu, tal como defenderia para a barra a recarga de João Neves. Teve de ser Rafa de cabeça a fazer dos restos da jogada um grande repasto, colocando o Benfica na frente.
A alteração tática de Roger Schmidt parecia agora na mouche, o jogo parecia, de novo, controlado pelo Benfica, mas não se pode diminuir o poder quase fantasmagórico da Lei de Murphy, fria e implacável: aos 88’, Vlachodimos ficou a meio caminho e Bozenik, perante tamanha oferta, deu para Jeriel de Santis, que já se preparava para encostar para novo empate quando António Silva o abalroou. Pénalti, marcado por Bruno Lourenço, que ainda na época passada havia feito dois golos ao Sporting, também no Bessa.
Sabendo-se possuidor de qualidade para ainda tentar nova vantagem, mesmo perante ataque cerrado da Lei de Murphy, o Benfica subiu no terreno. Com tudo. Aos 90’+9, uma bomba de Neres de pé esquerdo quase mandava a baliza de Gonçalves abaixo - hey Lei de Murphy - e quando já não havia vivalma para defender o que fosse no meio-campo encarnado, quando já não havia cabeça para pensar no não fosse ir à procura da vitória, o Benfica descuidou-se. E o Boavista aproveitou. Num contra-ataque e sem oposição, já o relógio marcava 90’+sei-lá-quantos quando Bozenik foi lançado por Malheiro e bisou, escrevendo mais uma história, mais uma reviravolta, dando ao Boavista três pontos que podem ter vindo embrulhados por alguma sorte - António Silva, no derradeiro lance do jogo, podia ter empatado -, mas que a equipa de Petit também fez por merecer, frente ao campeão nacional e favoritíssimo a ganhar novamente a liga.
Começa, assim, com uma inacreditável queda a defesa desse título para o Benfica. Num jogo cheio de jogos lá dentro e que dirá pouco sobre as fraquezas ou valências desta equipa. Às vezes, só acontecem muitas coisas no futebol, umas mais inexplicáveis do que outras e para tudo há que estar preparado. Este Boavista - Benfica entrará numa qualquer lista de insólitos, com toda a piada que isso traz ao futebol."

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