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domingo, 22 de junho de 2025

E se ela fosse ele?


"AB Hernandez nasceu do sexo masculino, mas identifica-se como género feminino. Nos campeonatos regionais de atletismo na Califórnia fez estalar a polémica e até Donald Trump tem algo a dizer. E o resto do do Mundo está preparado para esta realidade?

Usei este título «E se ela fosse ele?» com uma fotografia do futebolista David Beckham e outra da tenista Anna Kournikova para uma reportagem sobre um tema praticamente tabu em 2002: os atletas transgéneros. Naquela altura, o ponto de partida foi uma polémica numa prova de BTT no Canadá, em que a vencedora da prova feminina ganhou sem oposição e deixou profundamente irritadas as adversárias, uma vez que tinha nascido biologicamente homem. Falei com médicos, advogados, revi outros casos, muito mais do que imaginava existirem. A argumentação era muitas vezes oposta e contraditória. «Se legalmente ela é agora ele tem o direito de competir e ser selecionada para uma equipa», diziam.
«Apesar do processo rigoroso médico que implica a transição, há aspetos que fisiologicamente não se podem alterar», exclamavam outros. Sem consenso, sem unanimidade, os casos foram acontecendo ao longo destes anos e questiono-me se teremos andado muito. O Comité Olímpico Internacional tomou posição, as instituições internacionais que gerem as diferentes modalidades também, umas a favor, outras contra, mas em que ponto estamos quando batemos de frente com esta realidade?
Passaram mais de 20 anos e o tema continua a dar que falar. Nos Estados Unidos, há poucas semanas AB Hernandez, 16 anos, participou nas finais do Campeonato Estadual da Califórnia de atletismo, uma espécie de regionais ou 3.ª divisão. Hernandez nasceu biologicamente do sexo masculino, mas identifica-se como mulher e competiu nas provas femininas. Não ganhou, mas apurou-se para as finais. A sua participação fez com que algumas raparigas cisgénero (biologicamente do sexo feminino) ficassem excluídas das finais, por não se terem classificado e logo muitos clamaram que Hernandez teve vantagem física e que era injusto.
Perante a polémica, a CIF, a Federação do Desporto Escolar da Califórnia criou um projeto piloto para tentar acalmar os ânimos que permite que raparigas cisgénero que não se classificaram para as finais (por terem ficado imediatamente atrás de AB Hernandez) também possam competir. Uma medida de compromisso basicamente em que a ideia é não excluir a atleta trans, mas também não penalizar as atletas cisgénero que, de outra forma, iriam à final.
No Oregon, no início deste mês, duas atletas recusaram subir ao pódio onde estava uma atleta trans que há duas épocas participou em competições masculinas.
«Não era isto que as feministas queriam», exclamou a ex-tenista Martina Navratilova, lésbica e defensora dos direitos LGBTQI+.
A polémica está ao rubro, para já nos Estados Unidos, até porque Donald Trump não se priva a qualquer assunto.
A questão parece ser mais contestada quando se passa do biologicamente masculino para a identificação feminino, mas haverá modalidades em que o contrário pode igualmente levantar dúvidas sobre a justiça competitiva.
Há poucos anos, o treinador de voleibol Bernardinho, que já foi selecionador do Brasil, viu a sua equipa, (Sesc-RJ),perder depois de Tiffanny Abreu (Sesi/Bauru) marcar 28 pontos.
Em 2008/2009, Tiffany jogou no Leixões e chamava-se Rodrigo Pereira de Abreu.
Depois da derrota provocada em grande parte pela exibição da oposto que se tornou a primeira atleta transsexual a atuar na Liga brasileira, o técnico reagiu assim: «Ser homem é ff&##@!»
Afinal, 20 anos depois, continuamos sem saber como responder à pergunta: «E se ela fosse ele?»"

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