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quarta-feira, 9 de março de 2016

Jorge Jesus e a serradura

"A Liga deu uma cabriola em apenas 48 horas e, nesta altura, já nem parece arriscado considerar que o FC Porto renunciou ao título em Braga e que o Benfica só não será campeão se for absolutamente incompetente, o que poderá sempre acontecer se trocar cedo de mais a épica e a perna dura pelo fraque e o laçarote. Até por isso, importa ser moderado nas conclusões. Mas sem que isso inviabilize, desde já, algumas percepções: caso se confirme que o Sporting somou mais um aos 13 anos que já leva sem abrir o champanhe do título, isso não se deverá tanto (ou apenas) ao que aconteceu no sábado em Alvalade. De facto, o Sporting terá deitado quase tudo a perder uma semana antes, em Guimarães. Porque foi o empate ali somado que tornou ainda mais decisivo o dérbi e também porque a equipa não estava animicamente preparada para a pressão suplementar que significava ter o Benfica nos calcanhares. Ou seja, nesse caso ter-se-á repetido o cenário vivido por Jesus em 2013, quando foi surpreendido pelo Estoril (de Marco Silva, já agora) e depois acabou por ser ultrapassado pelo FC Porto do 'Minuto Kelvin' e do injustiçado Vítor Pereira. E o jogo em Guimarães é também importantíssimo por ajudar a retratar algumas idiossincrasias de Jesus que já tinham estado na base das derrapagens fatais que ele havia experimentado no Benfica. Para melhor se perceber há que recordar, primeiro, que Jesus tem uma capacidade reivindicativa que lhe tem garantido sempre uma autonomia raramente autorizada a um treinador e que, por norma, lhe permite acrescentar mais e mais reforços às equipas que treina. É uma qualidade indubitável, mas que no seu caso acaba muitas das vezes por ter efeitos colaterais, na estabilidade financeira dos clubes e não só. Permanentemente insatisfeito, Jesus acabou por conseguir anular a saída de Mané, que iria garantir o interessante encaixe de 10 milhões de euros e que, curiosamente, a partir dai até passou a ter uma utilização que contrasta com o ostracismo a que antes era votado. Outro exemplo é o de Rúben Semedo, cujo regresso a Alvalade começou por parecer um expediente para mostrar que precisava de mais um central (e conseguiu-o com a chegada de Coates). A verdade é que Semedo entrou logo para o onze titular, onde se manteve quase sempre que esteve disponível. Mas em Guimarães não foi apenas ele a jogar de início: o mesmo aconteceu a mais quatro dos seis reforços de Janeiro (Zeegelaar, Coates, Schelotto e Bruno César, porque Barcos só jogou os minutos finais e continua sem justificar a venda módica de Montero). Importa fazer aqui um parêntesis para recordar que, no último fim de semana, a dupla de centrais do Sporting B foi formada por Paulo Oliveira e Tobias Figueiredo, titulares no tempo de um Marco Silva a quem Bruno de Carvalho dizia, há um ano, para esquecer os reforços e que olhasse era para a formação e para um tal de Ryan Gauld. Os tempos mudaram e hoje Jesus tem à sua disposição seis defesas-centrais...
Ora, independentemente do valor indiscutível de alguns dos reforços, é impossível não presumir que a entrada de supetão de quase todos eles na equipa titular acabou por retirar alguma unidade estratégica à equipa e também a coesão do próprio balneário, sendo que para uma e outra coisa já vinha certamente contribuindo a aposta cega num Gutiérrez que tem encarado esta estada em Portugal como um passatempo. Mas em Guimarães ficou ainda patente que a forma como Jesus geriu o processo Slimani só serviu para o condicionar, o que não é despiciendo sabendo-se que os seus 18 golos têm um peso de 34 por cento. A verdade é que Jesus continua a falar como se tivesse tirado o Sporting de um atoleiro, não respeitando sequer a herança dos seus antecessores. A aposta exclusiva na Liga portuguesa não é nada de novo no seu 'modus operandi'. Mas acaba por ser uma blasfémia à própria história do clube, até porque nada é mais perigosa do que uma ideia quando se tem apenas uma. E há algo que também importa desmistificar: o último relatório e contas mostra que o Sporting, no último semestre, duplicou os gastos com o pessoal. À custa dos 5 milhões de euros que são pagos ao treinador e do forte investimento no reforço da equipa, passou de 12,118 milhões de euros para 23,481 milhões, inflação que deve acentuar-se em função dos últimos reforços. Mais, neste período só gastou menos 3 milhões do que o Benfica. Jorge Jesus tem méritos inquestionáveis e parte do seu trabalho está à altura do que melhor se faz por essa Europa fora, mas tem de parar de nos atirar serradura para os olhos, como ele gosta de dizer."

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