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domingo, 6 de abril de 2025

Quando a mulher de 71 passou a fazer parte da mobília


"João Avelino Gomes foi um daqueles treinadores especialistas em filosofia de balneário

Marinho Peres foi um daqueles bons amigos que a morte me levou numa azáfama constante e miserável de ir esvaziando a minha vida até que o momento que me espera chegue também. E foi o Marinho que pela primeira vez me falou de João Avelino Gomes. Ou melhor, do 71. Não tenho nada contra gente que adota ter números em lugar de nomes, nem mesmo anagramas, afinal Cristo foi simplesmente XPTO e o universo não se deixou abalar por isso. Por seu lado já tenho tudo a favor de todos aqueles que me impelem a escrever uma crónica. Dizia o Marinho: «O 71 era um cara de pavio curto. Arranjava sempre confusão. Muitas vezes tive de ser eu a apartá-lo». Pois bem, o folclórico João veio lá de Andradas, Poço das Caldas, Minas Gerais, onde nasceu em 1929. Veio primeiro para oRio de Janeiro, ainda um jovenzinho, depois andou a saltitar de um lugar para o outro como se fosse um gafanhoto e deixando marcas aqui e ali como outro gafanhoto. Estudou no SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e, como acontece a todos nós quando vamos parar com o esqueleto a uma organização seja ela qual for, deram-lhe um número. Escusado dizer que esse número era o 71. Escusado sim, mas mesmo escusado disse já disse. Se estão à espera que vos conte uma história apaixonante sobre um jogador inimitável, vão ter de esperar bastante, e até podem dormir uma sesta. O fulano nunca teve jeito de pés e passou ao lado de uma fraca carreira. Para compensar era esperto e dedicou-se a saber de táticas e de filosofia de balneário, tendo passado pelo banco de nada menos de vinte clubes, assim contas por alto, do América de São Paulo (onde esteve oito vezes em anos diversos) ao Náutico, do Atlético Mineiro ao Uberaba e ao Marília, do Corinthians ao Taquaritinga e do Palmeiras ao Cerro Porteño, do Paraguai, onde pôs fim ao percurso já muito confuso dos neurónios por via da porcaria do Alzheimer.
Pode ser que o 71 não tenha ficado conhecido pelos troféus conquistados, afinal só ganhou um a sério, o de campeão do Paulista com o América, mas muitos ainda se lembram das suas diatribes. A 10 de março do 1974, João Avelino apresentou-se com o seu CEUB (Centro Esportivo Universitário de Brasília) frente ao Corinthians para o jogo de inauguração do Estádio Mané Garrincha. Para azar dele, houve um repórter de pista que se colou ao banco do CEUB e lhe matraqueou a cabeça de minuto a minuto com perguntas idiotas. O diálogo foi mais ou menos assim: «Seu João, como é que o senhor está vendo o jogo?». E 71, paciente: «Com os olhos, meu filho, com os olhos!». E o chato: «Seu João, o que o senhor está achando do gramado?». E 71, ainda mais paciente, arrancando um pouco de relva e levando-a à boca: «Verdinho, macio e azedinho, meu filho!». Depois, já deitando fumo dos ouvidos, desabafou em cima do seu avançado-centro com um grito que deixou o repórter surdo: «Vai cabecear assim na casa da mãe Joana!!!». E, voltando a sentar-se, replicou mais sereno para o desgraçado: «Se o bicho continuar chutando assim vai matar o goleiro mas de raiva». O povão gostava dele e os jogadores também, a despeito das suas zangas frequentes e dos berros que lhe saíam tão de surpresa como o de Joaquim Soares da Cunha, de Jorge Amado, o Quincas Berro d’Água, quando lhe deram um copo de água em vez de um de cachaça. Também era supersticioso de acender velinhas nos corredores e de andar sempre com uma imagem de Nossa Senhora da Aparecida debaixo do braço. Na hora do pessoal se equipar, virava a santa de costas para a parede. «Ela não quer ver homem pelado, não», justificava. Com os guarda-redes era firme: absolutamente proibidos de comerem frango nos dias antes dos jogos. Estava convencido de que entendia muito de anatomia. Então punha os jogadores a subir bancadas com a narina direita tapada para fortalecer o pulmão esquerdo e, em seguida, com a narina esquerda tapada para fortalecer o pulmão direito. Acho que ninguém ficou muito mais saudável por causa disso. A pouco e pouco foi ficando baralhado. O homem dado a confusões passou a achar que a mulher fazia parte da mobília. Morreu sem saber o que era uma bola…"

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