"Pavlidis está, agora, a gozar os louros dos golos marcados, mas foi sempre o mesmo desde que chegou e não entrou por atalhos para chegar aonde queria
O prazer de ler e ouvir José Pepe Mujica, antigo presidente do Uruguai agora às portas da morte com cancro do esófago, ajudou-me a ultrapassar várias madrugadas sem sono e conduziu-me incontáveis reflexões, profundas ou superficiais.
Há na simplicidade, elegância e beleza das ideias do treinador argentino Marcelo Bielsa muitas semelhanças. São dois pensadores que obrigam qualquer um a parar, olhar para dentro e fora de nós e a pensar. Já vamos tendo pouco tempo para isso. Por isso, tropeçar neles, inesperadamente, numa entrevista ou numa conferência de Imprensa, é sempre uma oportunidade para nos enriquecermos.
Vem isto a propósito — talvez melhor fosse dizer a despropóstito — de Pavlidis, agora a gozar os louros dos golos marcados e a admiração dos benfiquistas.
A história do avançado grego é, como a de muitas de nós, feita de sacrifício e sem o conforto do privilégio. Não mostrou, em criança, grande pinta para ser jogador, ninguém lhe augurou, como reconheceu um dos primeiros treinadores dele numa recente entrevista à publicação reader.gr, um grande futuro nos campos, foi um produto do trabalho e dedicação, não se abateu quando foi viver com os pais para a Alemanha, manteve sempre a confiança de que triunfaria e custou-lhe a acreditar que tinha marcado três golos ao Barcelona na Liga dos Campeões.
Pavlidis também não teve um começo fácil no Benfica, atravessou jejuns forçados sem marcar golos, os maiores e mais desafiantes da carreira, e, no entanto, quem o viu jogar também nele sempre viu o espírito de quem não desiste perante as adversidades. Tem 26 anos e a pele grossa de quem já muito viveu e de quem sabe o que não pode faltar para termos sucesso.
Não há muito tempo lembrei-me de uma conferência de Imprensa de Bielsa, nem me lembro bem que clube treinava, isso importa pouco ao caso. Dizia ele que não nos deveríamos preocupar quando o nosso trabalho não é recompensado como deveria ser, afinal a injustiça é comum. Já deveremos ficar preocupados, defende Bielsa, quando se premeia algo que não é bom, por isso mostrar a todos que um atalho serve para alcançar um objetivo. E isso é prejudical a todos. Conseguimos identificar-nos todos com isto nas nossas vidas, não é sequer preciso fazer um grande esforço.
Na pré-época, Pavlidis desatou a marcar golos. E, por essa altura, muitos, nos quais me incluo, atalharam com preguiça para logo sugerir, sem sequer parar e refletir, que o Benfica poderia ter mesmo acertado na contratação de um avançado. Passados estes meses todos já serão poucos, mesmo correndo o risco de me voltar a atirar para fora de pé, a duvidar que Pavlidis é mesmo avançado para o Benfica e para ter custado €18 milhões.
O que, pelo menos, está à vista de todos é que Pavlidis foi sempre o mesmo desde que chegou e que não entrou em atalhos para chegar aonde queria. Terá mudado, provavelmente, a forma como olhamos para ele. Como poderia dizer Pepe Mujica, derrotados são aqueles que baixam os braços e se entregam. Também poderia dizer Pepe Mujica que não se vive de recordações, que se vive do futuro. Isto servirá tão bem a Pavlidis como a nós.
A glória de um goleador pode ser efémera, ninguém pode viver apenas do que fez. Vinte golos não são coisa pouca e o Benfica precisará sempre de mais golos de Pavlidis para ser campeão."
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