"No Bétis ficou O Mito Supremo. Luis Del Sol era um ciclone sobre o relvado de Villamarín
Em Sevilha, do lado bético, chamam-lhe El Mito Supremo. Claro que falar de bético em Sevilha significa falar do Real Betis Balompié, o clube, já que béticos são todos os andaluzes. E Luis del Sol Cascajares foi um dos grandes andaluzes do futebol apesar de ter nascido na vila de Arcos de Jalón, na província de Soria, Castilla y León, vale do Rio Jalón, afluente do Ebro, nas faldas da Sierra Ministra, entre Saragoça e Guadalajara, e o mais que se possa saber. Filho de um maquinista da antiga Compañía de los Ferrocarriles de Madrid a Zaragoza y a Alicante, aos dois meses já vivia em Sevilha levado ao colo de mãe e pai, entretanto transferido. Eram gente de trabalho, os Cascajares e os Del Sol. Apesar do nome que luzia à maneira dos Homens de Ferro de Cortéz. Mas a sua fidalguia limitava-se à labuta. Nove irmãos e um pai morto e ele ainda criança. Luis tinha catorze anos e dava duro na Industria Subsidiaria de Aviación. E jogava também na equipa de futebol da fábrica. Era bom demais para andar a trocar bolas com operários trapalhões. Tornou-se bom demais para jogar com muitos que que se limitaram a empurrar bolas a seu lado. Só não foi bom demais para jogar com Santamaría e Pachín, com Puskás e Di Stéfano, com Marquitos e Zágarra, com Paco Gento e Hector Real. Mas isso foi depois, em Madrid, noReal das cinco Taças dos Campeões consecutivas, momentos mais vitoriosos da sua vida. Em Portugal, Félix Marques Guerreiro, que passou pelo Benfica e pelo Atlético mas chegou ao auge em Setúbal, no Vitória, o magnífico Guerreiro que nos acompanhava nas peladas e amesendações à beira Sado, fez com que, à conta do seu futebol de luta contínua, os jornalistas o apelidassem de Del Sol.
Em Sevilha, quando assinou finalmente um contrato profissional com o Bétis, passou rapidamente a brilhar a sol ou sombra como se estivesse em La Maestranza. Aos 18 anos exibia o n.º 11 en las espaldas. Um ciclone sobre o relvado de Villamarín. Os antigos recordam-no como se recordassem Cayetano Ordoñez, José Gómez Ortega (El Joselito) ou Dominguín. Não por acaso foi batizado em La Macarena. E aprendeu menino, no bairro de San Jeronimo, no qual vivia ouvindo o chiar de ferro dos comboios, a frase que todos os sevilhanos sabem de cor: «La vida y el fútbol sólo son para los listos».
Luis corria e corria e corria. Era possível vê-lo cortando com o orgulho de um Grande de Espanha um lance na sua grande área e depois partir à desfilada para concluir o golo do outro lado do campo como se fosse a estocada de Pedro Romero que matou o primeiro touro da Plaza de Ronda e, em seguida, matou mais de cinco mil touros no resto da sua vida. Cinco mil touros eram esperados em Itália quando saiu do Real Madrid para aJuventus por vinte e dois milhões de pesetas. Em Turim deram-lhe a alcunha de Settepulmoni e o Comunale rugiu um coro tremendo quando apareceu na boca do túnel. Já não era uma questão de sol nem sombra. Era o frio, a chuva e a neve. Não, Turim e os Alpes ali ao lado não serviam para Del Sol. Foi para Roma, chamado por Helenio Herrera, o falso mago que destruiu o futebol à conta do catenaccio. O sol entrou-lhe outra vez na vida quando não resistiu ao chamado de sereia que vinha de Sevilha. Regressou ao Bétis. A aventura branca de Madrid era um capítulo encerrado. Agora queria jogar para os seus. Era outubro e as temperaturas continuavam a trepar pela corda do mercúrio. 2 de outubro de 1972. Milhares e milhares de pessoas invadiram as ruas, desaguaram na Avenida de la Palmera, tomaram conta do bairro de Heliópolis, Ciudad del Sol, espalharam-se por Casas Baratas, Reina Mercedes e por Los Bermejales. Sevilha, a Sevilha bética, tremia num terramoto de emoções. O Bétis voltava a subir a la cancha com O Mito Supremo: Pesudo; Mellado, Telechía, Frigols e Cobo; López, Genaro, Del Sol e Rogelio; Macario e Aramburu. De entre os onze, todos os olhos se fixaram num só.
Jogou apenas mais um ano a juntar aos dezanove que já levava de carreira. Como mediapunta ou extremo esquerdo, ele que podia estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Dizem em Espanha: «Se retiró a los cuarteles de la memoria». Luís Del Sol tornou-se Don Luis. Havia por ele adoração e respeito. Hurtado Simó, escreveu em La Leyenda de Siete Pulmones: «Ese nombre que fue de generación en generación rememorando hazañas memorables como la de aquel abrazo inmortal antes de su gol en el campo de estreno, aquel incidente con el brasileño al que fue a darle con el palo del banderín de córner, aquel larguero roto una tarde que golearon al Extremadura, aquellos desbordes imposibles, aquellos siete pulmones!». Era o dia 20 de junho de 2021. Todos os sete pulmões de Del Sol deixaram de respirar."
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