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quarta-feira, 13 de novembro de 2024

O futebol que temos e o futebol que queremos


"Jorge Valdano, cuja voz tantas vezes ecoou nas páginas do jornal espanhol Marca com uma lucidez rara no desporto moderno, tem-se assumido como um guardião de princípios e de valores que, longe de se limitarem ao universo do futebol, tocam a essência do ser humano. O seu pensamento, que transcende a tática e a gestão, é um contributo precioso para o futebol, em particular para o futebol português que sonha em superar-se.
Inspirar-nos na visão de Valdano é, pois, projetar um desporto não apenas orientado para o sucesso, mas capaz de se ancorar numa autenticidade e numa verdade que são, afinal, o seu património mais valioso.
Um dos princípios centrais de Valdano é a valorização do talento como fonte de renovação do jogo. Em Portugal, onde a formação tem dado ao mundo jogadores de primeiríssima linha, o desafio passa por criar condições que não só revelem talentos, mas que os sustentem e preparem para o rigor da alta competição. Não se trata de reter os jogadores a qualquer custo, mas de lhes oferecer um ambiente onde possam crescer. Valdano defenderia a criação de um campeonato em que os jovens talentos portugueses tenham condições para amadurecer antes de se aventurarem no estrangeiro, fortalecendo o futebol português enquanto mercado e espetáculo.
Mas Valdano não ignora que o talento só prospera num ambiente onde a ética e a integridade sejam respeitadas. Portugal deve ser capaz de construir uma estrutura de governança que funcione como exemplo de transparência e rigor, onde os clubes estejam comprometidos com um fair play financeiro autêntico e onde outros interesses não tenham espaço para prosperar. O futebol que queremos, à imagem do que Valdano escreve, deve viver de clareza e responsabilidade, de forma a que cada adepto sinta o seu clube como uma instituição limpa e orientada para o bem comum.
Outro aspeto essencial é a construção de um modelo de gestão que valorize a cultura e a identidade de cada clube. O futebol português é rico em histórias e tradições, mas necessita de um novo ímpeto cultural que una as comunidades aos seus clubes e projetos. Valdano diria que o sucesso desportivo só tem verdadeiro valor quando se reflete em orgulho e pertença nas suas gentes. Em Portugal, uma liga com clubes mais culturalmente enraizados e competitivos reforçará a mística do campeonato, atraindo mais adeptos, mais apoio local e, inevitavelmente, mais receitas.
A modernização tecnológica, outra das bandeiras que Valdano tem erguido, deve ser um compromisso inadiável. A análise científica do jogo e as ferramentas digitais de gestão e promoção dos clubes são, hoje, instrumentos essenciais para que o futebol português se coloque ao nível das ligas mais avançadas. O uso inteligente da tecnologia não só otimiza a performance, como amplia a experiência dos adeptos, que exigem hoje conteúdos e envolvimento digital constante.
Por fim, Valdano lembra-nos sempre que o futebol é uma linguagem universal, capaz de comunicar sem palavras e de tocar o mais fundo dos sentimentos. Num mundo cada vez mais fragmentado, o futebol português deve ser uma plataforma de união, de identidade e de coesão social. Este é, aliás, o legado de Graça Moura e Prado Coelho, que, por várias vezes, pintaram o futebol como uma arte, um espaço de criatividade e emoção que, como tudo o que é verdadeiramente humano, merece ser tratado com dignidade.
O futebol que temos é o nosso ponto de partida. Mas o futebol que podemos ter, inspirado na clareza de Valdano, na integridade de Graça Moura e na profundidade de Prado Coelho, deve ser um ideal a que aspiramos. Que seja esta a nossa ambição: fazer do futebol português um símbolo de ética, cultura e paixão, à altura do que o desporto pode e deve representar para uma sociedade inteira."

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