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Há, por aí, quem esteja à espera de saber quem vai conseguir o título nacional para saber se é Rui Vitória ou Jorge Jesus quem tem razão
A pergunta é simples, mas marca uma das grandes questões actuais do futebol português. Tudo porque Jorge Jesus insiste que o futebol português não tem ainda condições para ter equipas capazes de lutarem em todas as frentes e que um treinador responsável terá, assim, obrigação de seleccionar os seus objectivos principais que, no fundo, deverão corresponder aos objectivos principais dos adeptos.
Mas há quem discorde. Sem entrar em confronto directo de ideias e de palavras, Rui Vitória tem, manifestamente, uma opinião diferente. Daí que o Benfica tenha apostado, esta época, em todos os jogos de todas as competições, com a melhor equipa possível.
Isso, na ideia de Jorge Jesus é um erro. Com ele, o Sporting nunca deixou de querer ganhar um jogo, mas a teoria da rotatividade foi imposta tendo como prioridade o campeonato.
Para o treinador do Sporting, trata-se, apenas, de ser pragmático. Os adeptos leoninos querem, acima de tudo, voltar a sentir a alegria de serem campeões. É esse o desejo mais forte, é aí que o treinador tem o dever de apostar as fichas todas.
Quando se coloca o problema de que uma equipa portuguesa só ganha verdadeiramente dimensão se conseguir bons palcos e boas exibições internacionais e que isso é fundamental para valorizar jogadores e favorecer a componente de negócio, Jesus não discorda, mas também não muda de ideias. Para ele, é preciso ter a coragem de escolher. No fundo, escolher os melhores para o campeonato, os outros para o resto, incluindo provas europeias. Abre uma excepção para um figurino intermédio quando se fala da Taça de Portugal.
Rui Vitória tem outra visão sobre os grandes objectivos do Benfica. Implicou enorme esforço dos seus jogadores que estiveram na Liga dos Campeões até aos quartos de final, onde jogaram com elogiadas exibições e grande espírito competitivo com o Bayern. A verdade é que o Benfica está à frente no campeonato, fez-se notar na Europa, conseguiu fazer regressar à Luz o ambiente das grandes noites europeias de outros tempos e ainda está nas meias-finais da Taça da Liga.
Pode dizer-se que no jogo da segunda mão, com o Bayern, Vitória poupou Gaitán e Mitroglou para o campeonato, o que é, no fundo, uma forma de escolher, segundo prioridades.
Não se trata do mesmo critério de Jesus. Muito diferente. O Benfica não jogou com Jonas, porque estava castigado, não jogou com Gaitán, porque estava (e está) preso por arames e correria sério risco de terminar a época se não fosse poupado e não jogou com Mitroglou, antes de tudo, porque Jiménez para este jogo e para a forma como o Benfica pretendia jogar, era a melhor solução.
E mesmo que assim não fosse - e foi - mesmo que Vitória tivesse optado por fazer descansar três jogadores fundamentais na equipa, isso não corresponderia, nunca, à prática de Jesus que, em tais situações, pode mudar mais de cinquenta por cento do onze habitual.
É curioso que muitos analistas, alguns dos quais costumam ter certezas sobre tudo, se resguardem sobre esta questão. Muitos deles esperam, no fundo, por saber quem vai ser campeão nacional para decidirem, depois, se darão razão a Jesus ou a Vitória.
Não penso que o título de campeão seja a prova de que precisamos, porque a análise deve ser mais abrangente e não se limitar, apenas, à realidade do futebol português. A verdade é que a tendência de todos os grandes clubes europeus é a de fazer uma rotatividade seletiva e não uma rotatividade global. Selectiva, em termos de jogadores mais desgastados ou mais vulneráveis, parece-me, claramente, ser essa a melhor opção."
Vítor Serpa, in A Bola