Últimas indefectivações

terça-feira, 16 de junho de 2020

Pêpê, o conquistador

"Como médio mais defensivo ou até como interior, Pedro Rodrigues renasceu no Castelo.
O médio defensivo de características marcadamente ofensivas tem uma eficiência invulgar nas suas acções técnicas. Conscientemente ou não, recebe sempre por forma a poder dar seguimento sem perder mais tempo(s) a dominar a bola. É o tipo de jogador que apenas precisa de um toque para ter a bola consigo e é essa eficiência que lhe permite acelerar o jogo para as zonas de criação.

Últimos Jogos de Pedro Rodrigues
A variar corredor ou furando linha adversária em bolas verticais, Pêpê tem a paciência e conforto em posse que lhe permite segurar, temporizar e esperar pelo tempo certo para soltar a bola. Não se livra da “menina”, antes a entrega.


Em 2019/2020 deu finalmente o salto em rendimento que o seu potencial fazia antever desde há muito. Encontrou em Guimarães o espaço ideal para se potenciar – Das características do plantel, à exigência do clube, sem ignorar modelo de jogo, e em breve poderá subir mais patamares."

«O Benfica poderia ter-me valorizado mais»

"O facto de Lisboa estar adiantada cinco horas face a Ontário faz o nosso convidado dizer que “em Portugal vivem no futuro”. Mas a conversa foi sobre um passado dentro dos relvados e um presente que se faz, atualmente, à frente da sua academia de Futebol. A carreira do “Comboio da Luz” até poderia ter sido no Hóquei devido ao seu pai, mas foi a paixão por dar uns pontapés numa bola que falou mais alto. Veio para Portugal aos 11 anos e começou a despontar para o Desporto Rei entre Atlético de São Brás e Damaiense. Do Restelo até Vila Real, a trajectória é sempre a subir até chegar ao Rio Ave, onde se estreia na Primeira Liga. Uma curta experiência de bom nível em Braga permite-lhe chegar à Luz onde venceria a Taça de Portugal. Em Espanha, jogou num super “Submarino Amarelo” e ganhou a Taça do Rei pelo Espanyol, antes de jogar no Leeds United e terminar a carreira no Irão, onde viveu histórias algo caricatas. Agora o tempo é de ajudar os mais novos no Canadá a alcançar o sonho que outrora foi dele. Em mais um exclusivo Bola na Rede, eis então Armando Sá.

– O início do sonho entre Moçambique e Portugal –
Antes de dar os primeiros pontapés na bola, era o Hóquei em Patins que te puxava maior interesse.
É verdade, o Hóquei era realmente o desporto que me atraía mais na altura. O meu pai era guarda-redes no Costa do Sol, o antigo Sport Lourenço Marques e Benfica, e nos jogos, durante os intervalos, ia para o meio do ringue patinar e brincava muito. Como era um guarda-redes de sucesso – era o que ele me contava, não consigo confirmar isso (risos) – , as pessoas adoravam-no, sentia um orgulho enorme e queria ser jogador de Hóquei em Patins.

E o que te fez optar pelo Futebol?
Como disse, o meu pai levava-me para o Hóquei e tinha dois tios que foram jogadores profissionais de Futebol. Eu estava ali meio indeciso sobre qual desporto praticar. Jogava à bola na rua com os meus amigos e todos diziam que tinha um talento especial, mas estava mais virado para o Hóquei. Quando chego a Portugal – saí de Moçambique com os 11 anos -, o desporto rei era o Futebol e todos convidavam-me para ir jogar à bola. Como deves saber, o Hóquei é um desporto um bocado caro e tens de investir para poder jogar e assim, então virei-me para o Futebol e tinha uma enorme paixão pelo Futebol.

Aos 11 anos, veio para Portugal. Quais foram as maiores dificuldades sentidas na chegada ao país?
Senti algumas. A primeira foi o frio (risos). Não estava habituado ao frio, tanto que, quando cheguei, os meus lábios rebentaram todos. Foi uma adaptação complicada. A outra foi na escola, pois recordo-me que o meu pai me teve de registar um ano mais tarde na escola para poder conseguir apanhar o ritmo de todas as matérias, então fui matriculado um ano abaixo. Na parte académica, senti algumas dificuldades ao início, mas felizmente aos poucos fui-me adaptando e passados dois anos já estava habituado à vida em Portugal. Mas, naquele tempo, fazia um frio terrível (risos).

Os primeiros passos foram no Atlético São Brás e SF Damaiense. Que memórias guardas desses tempos?
Guardo grandes memórias. Aquele prazer de jogar no clube do bairro, o clube ali da tua zona, e lembro-me que na altura faziam os torneios de Futsal, Casal de São Brás contra Brandoa, e aquilo era uma rivalidade tremenda, aquilo era demais. Havia vários jogadores dessa zona como o (Ricardo) Ramires, que jogou no Sporting e Benfica, e o Calado, que mais à frente acabei por descobrir que éramos quase todos vizinhos (risos). Comecei a dar os meus passos no São Brás, no futsal, e lembro-me uma vez, por causa da escola, tive umas más notas e o meu pai proibiu-me de jogar. Para mim, o pior castigo que me poderiam dar era não poder jogar.

Um “mau” castigo para todas as crianças que adoram Futebol
(risos) Fiquei de castigo devido às notas que tinha, e íamos jogar uma final. Entretanto, o treinador de equipa, o senhor Ferreira, foi até minha casa e implorou ao meu pai para me deixar jogar pois precisava de mim. Aí, comecei a perceber que era algo especial pois necessitavam de mim e até pensei: “Afinal se calhar tenho mesmo talento, sou importante na equipa” (risos). O meu pai ficou convencido, deixou-me ir jogar e conseguimos ganhar. Depois o São Brás passou a ter futebol de 11 e foi aí a minha primeira experiência com o futebol de 11, onde fiquei um ano. A seguir, fui fazer umas captações ao Estrela da Amadora, mas estava com uns problemas de crescimento no joelho e acabei por não ser escolhido. Não ficando no Estrela da Amadora, a minha opção era o Damaiense que também estava em captações, onde acabei por ficar e conheci gente espectacular e jogadores que acabaram por chegar a um bom nível, como o Paulo Sérgio que jogou no Sporting. Foi no Damaiense que comecei a levar o Futebol mais a sério.

Segue-se depois o CF “Os Belenenses”. Como vais parar ao clube do Restelo?
Lembro-me que estava na escola e tinha um professor de Educação Física, o João Couto – que neste momento está na formação do Sporting -, e um dia perguntou-me: “Porque não vais ao Belenenses treinar?”. Perguntei quando eram os treinos, e ele disse para aparecer num dia desses. Então lá fui, fiz o treino, correu bem e acabei por assinar pelo Belém. Às vezes, é como costumo dizer: é estar num momento certo, na hora certa e com as pessoas certas. Tive essa felicidade, mas também com trabalho, de estar nos momentos certos e com as pessoas certas.

É em Belém que fazes a transição dos juniores para os séniores. Que importância teve essa passagem?
Teve uma grande importância. Para já, foi a “escola” mais séria de Futebol que tive. Um clube com outra dimensão, outra estrutura e com treinadores muito capacitados. Lembro-me dos treinadores da formação, sobretudo o falecido José António – que foi capitão do clube -, e, nessa altura, foram importantes pois, para mim, são eles que te criam como homem e jogador e acredito que essa passagem pelo Belenenses foi bastante importante. Entretanto estava nos juniores com 18 anos e tento a transição para os séniores, o José António falou com o Carlos Janela para que eu assinasse contrato profissional, mas o Carlos não me deu muita importância e acabei por não assinar. Se tivesse assinado, teria ficado na equipa principal, pois já treinava com os séniores muitas vezes e estava a ser preparado para conseguir chegar a esse patamar. O Carlos não seguiu o conselho do José António e acabei por sair.

Acabas por ir para o UD Vilafranquense, onde apanhas o Rui Vitória como colega de equipa. Foi um “choque” para ti a nova realidade que estavas agora a viver, atendendo que vinhas do Belenenses que jogava na Primeira Liga e tinha excelentes condições, como disseste antes?
Sim, posso dizer que foi um verdadeiro “choque”. Foi aquela transição em que passo dos juniores habituado a tudo: condições de trabalho, campo de relva natural, equipamento de marca… Condições de trabalho excelentes. Entretanto, quando passo a sénior, decido ir ao Vilafranquense e deparo-me com uma realidade totalmente diferente: o campo era pelado, tinha de se regar para ficar um pouco mais mole para se poder jogar. Mas quando chego ao clube, vejo jogadores com qualidade, alguns que tinham atingido um bom nível e outros que estavam a começar a sua carreira. Estava lá o Torrão que jogou no Sporting, havia alguns jogadores emprestados pelo Sporting e tinha também o Rui Vitória que era o nosso capitão de equipa. Uma vez, lembro-me que – acho até que ele costuma contar este episódio – ainda estava com aquelas “manias” de equipa grande e vinha do Belenenses, e ele deu-me um raspanete: “Isto aqui não é o Belém. Se queres chegar a algum lado, tens de batalhar! Se te adaptares facilmente a esta realidade, vai ser mais fácil para ti”. Sinceramente, para mim, essas palavras foram de “ouro”, pois percebi que tinha de me adaptar à nova realidade, deixar de pensar no passado, virar a página e seguir o meu caminho.

E nesse período, em Vila Franca de Xira, és chamado para prestar o serviço militar durante seis meses. Sentes que esse período em que não estavas tão focado no Futebol te prejudicou?
Esse período foi na época seguinte em que assinei pelo Vilafranquense e acabámos por subir de divisão, em que fazemos um ano fantástico. Foi muito complicado, pois estás num processo de crescimento e evolução, e de repente tens de parar porque tens de ir cumprir o serviço militar. Fui cumpri-lo três meses em Tomar e outros três em Beja, e para mim foi um atraso muito grande na minha carreira. Foi uma pausa que fiz que me prejudicou bastante.

E como mantinhas a carreira futebolística? Acredito que tenha sido complicado.
Como te disse, eu cumpri o serviço militar e aos fins-de-semana, quando podia, vinha aos jogos. Jogava, mas não era a mesma coisa, não estava entrosado com a equipa, pois jogava e ia-me embora. Foi um momento complicado, onde eu muitas vezes ponderei em parar de jogar. Nessa altura, fiquei um bocado confuso, pois estava a batalhar tanto e acabei por ter uma pausa dessas, mas felizmente correu tudo bem.

Após final do serviço militar e da época no Vilafranquense, arriscas ir até ao Norte à procura de um novo clube. Como foi essa aventura?
(Armando esboça um sorriso) Epá, eu podia escrever um grande livro sobre as minhas aventuras! Quando saio da tropa e volto ao clube, o Vilafranquense queria renovar o contrato comigo, mas sempre me tinham dito que no Norte havia mais oportunidades para se poder ser jogador e porquê? Porque há mais clubes, olheiros e o Futebol no Norte é levado de uma maneira totalmente diferente e há muito mais possibilidades. Entretanto lembro-me de estar com um amigo nas férias, e digo-lhe: “Vamos até ao Norte procurar um clube, pois quero ver se consigo alcançar algo melhor. Clube já tenho, pois estou seguro com o Vilafranquense, mas pode ser que surja outra oportunidade”. Ele aceitou e fomos no carro dele – nem sequer tinha carro na altura -, e começámos a contar os tostões que tínhamos (risos).

O início de uma bela viagem.
(risos) Sim, até cheguei a dizer “Isto aqui dá para dois dias de gasolina e tentamos comer qualquer coisa pelo caminho”. Juntámos umas “coroazitas” e lá fomos. Começámos o nosso caminho até ao Norte, e a nossa primeira paragem foi no Salgueiros, mas confesso que não percebi logo que era o Salgueiros. O estádio do Salgueiros da parte de fora não era assim tão bela – sei que é um pouco mau estar a dizer isto (risos) – na minha opinião, e nem parecia um estádio de Primeira Liga. Bato à porta, falo com um director, conto a minha situação e pergunto se podemos treinar com a equipa para ficarmos lá, ao que o homem disse “Tudo bem, dá-me só um minuto”. Veio depois o treinador e, quando olho para ele, reparo que é o Carlos Manuel e penso logo: “Ui, mas eu estou no Salgueiros pá!” (risos).

(Risos).
Eu não me tinha apercebido antes que estava no Salgueiros e fiquei logo a pensar: “Mas o que é que eu estou aqui a fazer? Tenho de trabalhar muito para poder chegar aqui ao Salgueiros e à Primeira Liga” (risos). O Carlos Manuel recebeu-me super bem – o Salgueiros nessa altura tinha uma equipa espetacular – e deixou-me treinar. Equipei-me, mas no treino estava a tremer, pois olhava para aqueles craques que só via na televisão. Tivemos um jogo, as coisas correram super bem, e o Carlos chegou ao pé de mim no final do treino e disse: “Gostei muito do teu treino, mas, na minha opinião, vocês têm de jogar mais. Precisam de tempo de jogo e aqui dificilmente vão jogar”. Ao saber isso, nem fiquei muito chateado, aliás estava feliz da vida por ter treinado no Salgueiros que estava na Primeira Liga (risos). Agradeci os conselhos que me deu, e continuámos a nossa caminhada pelo Norte. Vou ao Maia, vejo o estádio que me parecia ter excelentes condições, e fiquei logo a achar: “Isto aqui deve ser da I.ª Divisão, nem vou entrar – o Maia estava na II.ª Divisão amigo (risos) – e muito menos pedir para treinar”. Olhei o campo da parte de fora, tirei as minhas conclusões e disse ao meu amigo: “Vamos embora, temos de ir à procura de um clube mais ‘humilde’”. Entretanto seguimos caminho e vamos ao Viana do Castelo, peço para treinar e o treinador olha para mim. Como tinha vestida uma t-shirt a dizer Kadoc, ele ficou a pensar: “Este aqui deve ser um boémio, só pode ser uma pessoa da noite” e então não me deixou treinar. Saí desiludido, vieram-me as lágrimas aos olhos, porque não deixarem mostrar o meu valor é triste, fiquei decepcionado. Julgou-me por uma coisa que eu nem sequer fazia. Com estas coisas todas, já íamos em dois dias de viagem em que dormíamos no carro, lavamo-nos nas casas de banho do restaurante, e fomos continuando a nossa marcha.

E como é que aparece o GD Bragança no meio dessa aventura? Até soube que no primeiro treino disseste ao treinador que eras avançado e não lateral (risos).
(Armando solta uma gargalhada) Nessa altura, já estávamos a chegar a Trás-os-Montes e continuamos o nosso caminho porque o meu objectivo já nem era ficar em Portugal, mas sim ir para a Espanha por estar ali ao lado, quase. Nós estávamos a viajar, mas nem sabíamos como é que iríamos voltar, pois não tínhamos dinheiro para a viagem de regresso (risos). Entretanto paramos em Bragança para comer e vejo um anúncio “Captações às 15h. Precisa-se de jogadores”. O meu amigo pensou logo que era uma boa ideia ir lá, mas eu nem tanto, pois estava na II.ª Divisão no Vilafranquense e não estava assim tão interessado em jogar na III.ª Divisão pelo Bragança. Mas incentivei o meu colega a ir, pois podia ser bom para ele. Fomos ao clube, batemos à porta e encontramos o director, ele disse que o treino era às 15h e perguntou a posição ao meu amigo e depois falou comigo: “E tu não jogas?”. E eu meio desinteressado “Eu? Sim… Jogo lá em baixo no Vilafranquense” – não me apetecia nada treinar (risos) -, ao que ele questiona: “Porque não fazes aqui o treino connosco?”. Pus-me logo a pensar: “Há dois dias que não tomamos banho, vou esforçar-me pouco no treino, tomo um banhinho e está feito” (risos). Aceitei o desafio e antes de começar o treino, o mister estava a fazer as equipas e pergunta a minha posição. E eu que estava nem aí para o Bragança respondo “Ponta de lança” (risos). O treinador mete-me a ponta de lança – eu cheguei a ser ponta de lança no São Brás e Damaiense –, as coisas correram perfeitamente bem e gostaram de mim. Quiseram logo ficar comigo ao que aceitei logo e perguntei se o meu amigo ficava. Eles disseram: “Ah não, não podemos ter dois jogadores de Lisboa aqui”.

Isso é que é pior.
Não sei, na altura se calhar havia uma má imagem dos jogadores que vinham de Lisboa (risos). E respondi logo: “Se ele não ficar, eu também não fico”. “Não te preocupes que arranjamos clube para ele que vai jogar noutro lado”. Acabaram por arranjar empresário para o meu amigo para encontrar um clube, e decidi ficar no Bragança. Assinei contrato e venho a casa buscar as minhas coisas. Na viagem de regresso a Lisboa, comecei a aperceber-me que eram 10 horas de viagem de autocarro e fiquei a pensar: “Mas aonde é que vim parar?!” (risos).

É uma viagem longa de facto.
(risos). Fiquei a pensar muito nisso, cheguei a Lisboa e disse ao meu pai: “Assinei pelo Bragança, mas não vou voltar pois é muito longe” (risos). Fiquei as férias todas em casa com os directores do Bragança a ligarem-me muitas vezes e dizia sempre: “Já vou para aí” e não ia. Até que um dia o meu pai chega ao pé de mim e diz: “Sabes uma coisa? Como assinaste pelo Bragança, já não podes jogar por outro clube e vais ficar um ano sem jogar”. Aquilo bateu-me e lá decidi ir pegar nas minhas coisas e ir para Bragança. Outra viagem de autocarro de 10h e cheguei triste (risos). Depois fui-me adaptando, mas todos os fins-de-semana vinha a Lisboa, pois não gostava de ficar lá: os jogos eram ao domingo e como tinha folga à segunda, vinha para ficar umas horas apenas e depois voltava para treinar à terça. Fiz isso durante dois meses, e, entretanto, houve um dia em que nevou e fiquei preso em Bragança (risos).

Tiveste mesmo de ficar lá.
(risos). Sim, e também foi a primeira vez que vi neve (risos). Fiquei lá e a partir daí passei a gostar da cidade, a cultura e as festas tradicionais, adorei tanto aquilo que nunca mais voltei a Lisboa.

Fazes a época no Bragança e depois vais para o SC Vila Real. Aí já estavas a jogar a lateral direito certo?
Sim, fui para o Vila Real, encontro o professor Vítor Maçãs, que foi meu treinador nas camadas jovens, e ele conhecia-me muito bem como lateral. Cheguei ao clube e já não podia enganar mais, não é? (risos).

E é aí que joga contra o Boavista para a Taça de Portugal. Quão importante foi essa partida para si?
Foi esse jogo que me permitiu dar o salto e abriu-me as portas para chegar à Primeira Liga. Lembro-me que fizemos um grande jogo contra o Boavista, e, a partir daí, os olheiros todos começaram a estar mais atentos. Depois desse jogo que fizemos, em que foi bem conseguido da minha parte, apareceram vários clubes da Primeira Liga como a União de Leiria, Vitória de Guimarães, Boavista e Rio Ave à procura de garantir os meus serviços. Foi uma grande oportunidade para mim e o início do meu caminho para a Primeira Liga.

https://www.zerozero.pt/match.php?id=315207

– A caminho da Primeira Liga –
Assinas depois pelo Rio Ave e estreias-te na Primeira Liga. Como foi o salto da II.ª Divisão B para a divisão principal do futebol português? Foi fácil adaptares-te ao ritmo de jogo?
Foi uma boa adaptação, também por que tive um treinador, o Carlos Brito a quem agradeço imenso, por ter apostado em mim e dado as condições todas para que pudesse atingir um bom nível. Quando chego ao Rio Ave, era uma realidade totalmente diferente com jogadores de grande qualidade e um estilo de jogo ao qual não estava habituado. Nessa altura, o Rio Ave tinha, se as pessoas se recordarem, uma equipa trocava bem a bola e jogava muito bem. Tinha jogadores rápidos na frente de ataque como o (Augusto) Gama e era muito perigosa. Então eu cheguei lá e ver aqueles craques todos ao meu lado, lembro-me que ia para o meiinho, eles circulavam a bola tão rapidamente e só me perguntava: “Mas onde é que eu estou?” (risos). Aquilo era tão rápido, foi a primeira impressão que tive e estava quase sempre no meio, pois não conseguia tocar na bola (risos). Mas, como eu costumo dizer, sempre fui uma pessoa que se adapta facilmente a todas as situações, aprendo rapidamente, olhava para aquilo tudo e comecei a perceber que “Aqui o jogo é mais rápido, os jogadores são mais evoluídos tecnicamente e dificilmente falham passes, então tenho que trabalhar se quiser conquistar algo”. Na minha posição, o titular era o Nenad, que chegou a ser considerado o melhor lateral direito a jogar em Portugal, e era um grande concorrente à minha frente. Eu era um miúdo e para tirar o lugar ia ser complicado. Mas eu trabalhava imenso, era atrevido e tinha o apoio do Carlos Brito que sempre me incentivava e via que tinha boa idade para jogar.

O Carlos Brito foi o teu treinador em Vila do Conde durante os três anos. Ele deu algum conselho que te tenha marcado até hoje?
Ele deu-me vários conselhos. Lembro-me que nesse tempo quando estava a jogar, eu ia a todas: salvava o lateral esquerdo, o central… Salvava quase todo o mundo e não dava uma bola por perdida. Era muito rápido e conseguia dobrar quase todos e para quem me conhece dessa altura sabe que isto é verdade (risos). Um dia, o Carlos Brito chegou ao pé de mim e disse assim: “Cuidado que os bombeiros também morrem – é uma linguagem futebolística como é óbvio-, não podes querer apagar todos os fogos” (risos). “Protege primeiro a tua zona antes de ajudar a equipa”. Porque tinha esse à vontade e saía do meu lado para dobrar os meus colegas (risos). Ele disse-me isso e ficou marcado, pois percebi que, na Primeira Liga, os erros pagam-se caro e passei então a proteger mais o meu lado, preocupar-me com a minha zona, fazer a minha parte e depois ajudar a dobrar os meus colegas e dar apoio no ataque e defesa. Ele deu-me esse conselho que levei para o resto da carreira.

No ano de estreia (1998/99), acabas por ser eleito o Jogador Revelação do campeonato. Esperavas alcançar esse prémio, ainda para mais na época de estreia e com a forte concorrência do Nenad no plantel?
Para ser sincero, não estava à espera, mas sabia que, cada vez que era aposta do Carlos (Brito) para entrar nos jogos, eu era um dos jogadores importantes mesmo sendo o meu primeiro ano na Primeira Liga. Entretanto as coisas foram acontecendo naturalmente, comecei a ganhar o meu espaço e fui beneficiado por este prémio de Jogador Revelação do campeonato, que depois me deu praticamente a titularidade, mais prestígio e maior confiança ao Carlos Brito para apostar em mim.

O Sporting de Braga é o clube a seguir no teu currículo, onde te cruzas com Manuel Cajuda. Gostaste de trabalhar com ele?
Sim, gostei bastante. O (Manuel) Cajuda é um treinador que “espreme” tudo de um jogador. Trabalha contigo e tira todo o sumo que tu tens. Em termos de mentalidade, é um treinador que consegue tirar tudo de um jogador e tem uma maneira especial de trabalhar e acredita que nunca corri tanto como corria com ele (risos). Era muito trabalho, mas era top! Lembro-me que antes dos jogos, ele dizia sempre: “Vocês têm 72 horas para descansar”, só que antes disso aquilo era tão intenso, até usava bolas medicinais e era incrível. O trabalho era tão forte, mas para os jogos resultava e acabamos por ter uma boa época com um grande equipa que tinha o Tiago, Ricardo Rocha, Artur Jorge, entre outros que ajudaram a seguir o meu caminho.

E há algum episódio vivenciado nessa época com o Manuel Cajuda?
Lembro-me uma vez no treino antes do jogo contra o Sporting CP, estávamos a jogar e atrasei a bola para o guarda-redes. Ele parou o treino, disse uns palavrões e mandou vir comigo. Fiquei envergonhado no meio do campo por ele ter mandado vir comigo, pois queria que eu jogasse para a frente e não para trás e arriscasse no passe. Entretanto vem o dia do jogo, e pensei: “Depois deste raspanete, nem sei se jogo” (risos). Acabei por ser titular, tive de marcar o João Pinto e acabámos por vencer por 2-1. O Cajuda depois veio para os jornais e elogiou-me imenso. Mas é a forma dele de trabalho, em que tenta tirar tudo do jogador para que ele possa render.

Estiveste apenas seis meses no clube. Apesar de ser um curto período, sentiste durante esse tempo que o Sp. Braga iria ter um crescimento sustentado como se tem visto actualmente, em que termina nos primeiros lugares do campeonato e vai às competições europeias?
O “Braguinha” – chamo-lhe assim pelo carinho que tenho clube (risos) – na altura já mostrava inícios de grandeza. Já se via que as equipas feitas do Sporting de Braga eram de grande valor e com qualidade. O que nesse tempo se calhar faltava era ter melhores condições e apostar nas camadas jovens como têm apostado agora para se chegar a este nível. Mas já dava para perceber que havia ali muito potencial para a equipa crescer, e foi o que fez o actual presidente que agarrou no clube e fez do Braga uma das grandes equipas que temos no nosso campeonato. Devemos estar orgulhosos porque consegue estar a fazer frente aos “Três Grandes”.

– Carreira na Luz –
A meio da época 2001/02, vens para o Benfica juntamente com o Tiago. Como foi a chegada ao balneário? O Drulovic disse há umas semanas que era algo confuso e faltava uma mentalidade vencedora ao Benfica…
Foi uma chegada complicada (risos). O Drulovic, melhor do que ninguém, sabe que o balneário do Benfica não era muito coeso e forte. Lembro-me quando eu e o Tiago chegámos ao balneário, notámos um ambiente pesado e uma certa falta de organização. Fomo-nos equipar e equipávamo-nos de costas uns para os outros.

Faltava um maior espírito de grupo.
Sim, não era um espírito sincero. Faltava sinceridade e havia muita coisa ali que não estava a bater certo e isso aí dificultou um pouco. Mas felizmente até cheguei bem ao Benfica: fisicamente estava top, vinha do Braga com as cargas do Cajuda e faço o resto da época no Benfica muito bem, até me lembro que de ser eleito mais do que uma vez para o melhor 11 da Europa e chamavam-me “O Comboio da Luz” (risos). Recordo-me que a imprensa muitas vezes dizia: “Depois do (António) Veloso, não havia um lateral tão bom e que eu era o substituto dele”. Tive aqueles seis meses do resto da época muito bons.

Como é ganhou essa alcunha de “O Comboio da Luz”?
Acho que foi o Terceiro Anel, nem sei bem (risos). Era engraçado, pois quando eu arrancava no lado direito, as pessoas começavam logo a dizer “Lá vai o Comboio” (risos). Sentia-me orgulhoso por poder ouvir esses elogios. São momentos que não me esqueço e me marcaram, e agradeço muito ao Benfica por esses grandes momentos.

Chegas a um dos Três Grandes. Como é que se lida com a constante pressão da imprensa e dos adeptos para vencer os jogos e jogar sempre a um nível elevado?
Como te disse, no princípio estava bem e as críticas eram boas. Entretanto, eu nunca tinha sido suplente, pois, por onde passei, era sempre aposta do treinador, um jogador importante e que fazia a diferença na equipa e, na época seguinte, começo a perceber a enorme pressão que é jogar numa equipa grande com outra exigência, os interesses são outros e depois acabei por perder a minha titularidade – nem sei muito bem o porquê, tinha ido à selecção e quando voltei já não era titular -, o que me fez ter uma perda de confiança muito grande, pois não estava habituado a essa nova etapa na minha carreira. Tive ali uma quebra com toda a pressão, e até que eu conseguisse lidar com isso tudo foi um mau bocado. Custou-me bastante estar a dar o máximo e ver certas coisas que não batiam certo, mas estava num grande clube e só podia estar orgulhoso de mim por pertencer a um plantel com grandes craques. Só dependia de mim lutar contra esta pressão que havia por detrás.

Estás no plantel quando se dá a mudança do antigo para o novo Estádio da Luz. Enquanto atleta, como é que vivenciaste esse período de transição no Benfica?
Foi uma altura complicada, em que andávamos com a casa às costas, onde treinávamos em Massamá e no Jamor e jogávamos com metade do estádio partido.

Foi uma fase complicada.
É verdade, ver a construção do outro estádio e dos balneários foi um altura complicada. Estive nessa transição onde me orgulho bastante de ter feito parte, mas, em termos desportivos, custou bastante a todos os jogadores e adeptos essa mudança. Entretanto, com a entrada do Camacho, as coisas acabam por mudar por completo, em que ele começa a meter uma certa ordem no balneário e regras que faz muita coisa mudar. O Benfica já estava no novo estádio, a nossa “casa”, e começa a ser um pouco mais fácil. Mas essa transição foi uma fase que complicou a história do Benfica.

Dia 25 de Janeiro de 2004. Foste titular na partida frente ao Vitória SC, onde Miklós Fehér, infelizmente, acabaria por falecer dentro de campo. Tiveste logo a percepção de que era algo de grave?
Na altura, acho que ninguém pensou que fosse tão grave. Foi o momento mais triste que tive no Futebol. Estar em campo e ver o teu colega a sorrir e depois cair à frente de ti… Foi chocante, pois não havia reacção da parte dele. Naquele momento, tínhamos acabado de fazer o golo nos últimos minutos e pensei que ele estivesse a queimar tempo, pois levou o amarelo e era para passar o tempo, já que estávamos perto do fim do jogo. Entretanto quando me apercebo do que se estava a passar e vejo as reacções dos meus colegas, começo a perceber que era uma situação muito grave. Também não se podia usar o desfibrilhador devido à chuva, foi um momento complicado. Mas, sinceramente, até irmos para o hospital, não estava a pensar no pior. Acreditei sempre que ele ia recuperar e acabar tudo bem. Nunca nos passou pela cabeça que fosse acontecer o que aconteceu.

E como é que tu e o restante plantel foram buscar forças para aguentar a época inteira depois desta tragédia que abalou não só o Benfica, mas também o futebol português?
A partir desse dia, eu, pessoalmente, comecei a levar o Futebol de uma forma mais calma e não tão stressada. Passei a relaxar um pouco mais, porque não sabemos o que é que nos pode passar daqui a pouco. Depois do que aconteceu, o espírito dele uniu-nos de tal maneira que nós ficamos muito mais fortes, tanto jogadores como adeptos, que fomos com vontade de vencer a Taça de Portugal.

No final dessa época, o Benfica venceria a Taça de Portugal frente ao FC Porto, que viria a ser campeão europeu dias depois dessa final. Conquistar a Taça era visto como uma forma de homenagear o Miklos?
Sem dúvida. Como te disse, ficámos tão fortes. Estávamos a fazer uma época fantástica, fizemos uma boa segunda volta e chegámos à final em grande forma. Com o espírito do Miki e a nossa vontade de vencer a Taça por ele, fomos para o jogo confiantes. Sabíamos que íamos jogar contra uma grande equipa, o Porto do Mourinho foi campeão europeu e ganhava a todos. Chegámos a esse jogo e, nos primeiros 15 minutos de jogo, poderíamos estar a golear o Porto com as três ou quatro oportunidades de golo em que uma delas foi ao poste, só que não marcámos. Eles marcaram, nós empatamos na segunda parte e, no prolongamento, o Simãozinho marca e dá-nos a vitória. Nessa altura, o Benfica estava há oito anos sem vencer a Taça de Portugal e foi um título especial para mim, pois nunca tinha conquistado nada na carreira e ver a grandeza do Benfica no momento da festa. Quando ganhas, é aí que consegues ver realmente o que é jogar num grande clube.

E qual é a sensação de subir a escadaria do Jamor para levantar a Taça?
É uma sensação única. Nem todos conseguiram ter a oportunidade de subir a escadaria, apertar a mão ao Presidente da República e às pessoas importantes de Lisboa e do país, e erguer aquela Taça é fantástico. É algo que não se esquece e é difícil de explicar, pois é um sentimento único. É o desejo de muitos treinadores e jogadores vencer a Taça de Portugal, e felizmente tive essa oportunidade de conquistá-la.

– Jogar fora de portas: Espanha e Inglaterra –
E como vais parar ao Villarreal CF?
Nessa época (2003/2004), devido à vinda do Camacho, recuperei a minha confiança e o meu espaço na equipa, jogava a lateral direito ou lateral esquerdo e era uma aposta segura do treinador. Nas competições europeias, tive bons jogos que me marcaram e me deram outra visibilidade para poder jogar noutros clubes. As coisas correram bem, ganhámos a Taça de Portugal que foi um recuperar da minha confiança e estava realmente em alta. Penso que o Benfica me poderia ter valorizado mais, porque nem o próprio Benfica acreditava que havia clubes interessados em mim. Lembro-me que o Saint-Étienne, o Villarreal e outros clubes europeus estavam interessados, e o Benfica não estava à espera de que alguém me contratasse. Entretanto, apareceu realmente o Saint-Étienne e o Villarreal, e eu próprio tive de telefonar ao (Luís Filipe) Vieira a dizer “Presidente, tenho aqui um clube interessado em mim” (risos). Lá depois ele apercebeu-se disso. Isto para dizer que chego ao Benfica com 26 anos, vou para Espanha com 28/29 anos e só posso sentir-me orgulhoso por conseguir dar o salto para a Liga espanhola com essa idade, além de ter conseguido com que o Benfica ficasse a ganhar financeiramente comigo na ida para Espanha. Sinto que retribui o investimento que foi feito. Chego a Espanha ao Villarreal que, para mim, é um dos melhores clubes espanhóis e com grande tradição.

Como foi essa adaptação ao futebol espanhol? Foi fácil?
Chego ao Villarreal e sabia que era um clube grande e que estava a deixar a sua marca no Futebol espanhol. Mas quando chego lá, entro numa cidadezita que faz parte da província de Castellón, e vou para o treino. Estava habituado ao Estádio da Luz, um estádio enorme e lindo, e chego ao treino e vejo os jogadores daquela dimensão como Riquelme, Forlán e Sonny Anderson, a adaptação foi fácil, porque quando tu jogas com jogadores daquele nível tudo se torna mais fácil. Consegui-me adaptar muito bem e, como costumo dizer, a bola chegava “redondinha” (risos). Não tinha de trabalhar muito, a bola chegava em condições aos pés, porque tinha jogadores de grande qualidade.

Nesse ano, vencem a Taça Intertoto e ficam em terceiro na Liga, só com Barcelona e Real Madrid à vossa frente. Qual foi o segredo para essa época tão bem conseguida?
Era o espírito de grupo que nós tínhamos. Apesar de serem jogadores com a sua história, o seu ego e prestígio, estávamos ali todos para o mesmo e gostávamos de vencer, pois tínhamos uma mentalidade vencedora. O Manuel Pellegrini era o treinador e só teve de juntar as peças e implantar um futebol tecnicamente que nós tínhamos. O estilo de jogo dele adaptava-se muito facilmente à qualidade que nós tínhamos. Aquele espírito vencedor, com os jogadores que tinham vindo no início da época – como o Forlán que veio do Manchester United – e que estavam habituados a ganhar alguma coisa e juntá-los ali. O grande segredo foi o espírito de equipa que tínhamos. Entrávamos em campo com uma confiança tão grande para jogar. Jogávamos “taco a taco” com todas as equipas, lembro-me até que ganhámos 3-0 ao Barcelona em casa. A confiança toda veio quando fomos campeões da (Taça) Intertoto que dá acesso à Taça UEFA, onde acabámos por ser eliminados pelo AZ Alkmaar nos Quartos-de-final, mas fomos muito mal eliminados (risos).

Apesar do bom ano, acabas por sair em definitivo para o RCD Espanyol de Barcelona. O que esteve na origem para essa saída?
Estava no Villarreal e lembro-me que comecei a receber uns telefonemas do Camacho a dizer que ia ser treinador do Espanyol. Ele tem uma parte nisto tudo, pois antes falou com o Villarreal na altura em que o (Juliano) Belletti vai para o Barcelona, e eles estavam à procura de um lateral direito. O Camacho diz-lhes para me contratarem, que seria uma boa opção. Entretanto, ele liga-me e diz que vai para o Espanyol, devido às eleições que iam decorrer no clube, e caso o candidato dele ganhasse, ele ia assumir a equipa e queria que fosse para lá. Eu acreditei 100% no Camacho e acabei por forçar um pouco a minha saída do Villarreal, convencido de que ele ia ser o treinador do Espanyol (risos). Saí também porque o Villarreal foi buscar outro lateral direito, estava nesse momento com 30 anos e optei por ir para lá.

E como é jogar no Dérbi da Catalunha, ainda para mais a vigiar de perto um tal de Ronaldinho Gaúcho?
É engraçado isso (risos). Quando chego ao Espanyol, lembro-me que tinha um treinador, o (Miguel Ángel) Lotina, que ficou conhecido por estar durante dois anos sem nunca repetir o mesmo onze inicial – o que acho incrível (risos) -, e torna complicado para um jogador manter o seu ritmo de jogo. Na primeira jornada não jogo, na segunda contra o Real Madrid jogo, em que ganhámos por 1-0, e na terceira jornada não jogo.

Era sempre um “entra e saí”, o que dificulta a vida de um jogador.
Sim, mas não era só comigo, com os outros jogadores também era assim, mas eram as opções dele. Tínhamos o (Pablo) Zabaleta, o Juanfran que eram praticamente os meus suplentes (risos), e depois conseguiram chegar ao Manchester City e Atlético de Madrid, respectivamente. Havia também o Iván de la Peña, o (Raúl) Tamudo… Tínhamos uma grande equipa. Há depois o famoso “Dérbi da Catalunha” em que tive a missão de marcar o Ronaldinho (risos).

Tarefa difícil certo?
(risos). É e por vários motivos: primeiro pela qualidade que tinha e segundo era o meu ídolo. E marcá-lo não é uma tarefa fácil, porque ele era forte fisicamente, rápido e tinha uma visão de jogo de outro mundo, mas tive de “ir para a guerra” e enfrentá-lo (risos). Marquei-o e fui considerado o jogador que melhor marcou o Ronaldinho em Espanha. Para ser sincero, considero-me sortudo, porque se ele estivesse num daqueles dias com a “ficha ligada”, ninguém o para. Nesse jogo, a ficha não estava bem ligada e tive essa felicidade (risos). Mas é uma tarefa complicada, pois não sabes o que ele pensa e antes de receber a bola, ele já viu três ou quatro opções. Por acaso, jogámos bem, mesmo perdendo por 1-2, e recordo-me que era o Ronaldinho num lado, o Messi no outro e também estava o Deco a jogar que era um jogador que admiro muito. Já o tinha apanhado no Salgueiros e no Porto, e foi um dos melhores jogadores que vi jogar.

A tua experiência em Espanha terminou com a conquista da Taça do Rei. Foi importante vencer este troféu emblemático?
Sem dúvida. Foi um fechar de época com “chave de ouro”, ainda mais porque o Espanyol já não ganhava a Taça do Rei há algum tempo. Chegámos à final, e, como português, só o Paulo Futre e o Luís Figo tinham ganho essa Taça até essa altura, e poder jogar no Bernabéu, que é um grande palco, não havia melhor sítio para conquistar a Taça. Subi as bancadas para levantar a Taça e isso fez-me lembrar muito a subida para erguer a Taça de Portugal que venci pelo Benfica. Foi muito especial.

Segue-se depois o Leeds United. Como é que acabas por ir para lá?
Então, estava no Espanyol, chega um novo treinador, o (Ernesto) Valverde, que faz algumas mudanças e não estava muito nos planos dele. Falei com ele, que foi sincero comigo ao dizer que não estava nos seus planos, e se eu pudesse arranjar um clube era o melhor a fazer. Antes de sair ainda venci a Taça da Catalunha frente ao Barcelona, que foi o último jogo que fiz pelo clube, mas não fazia parte dos planos do Valverde. Tive a possibilidade de regressar a Portugal, ir para a Rússia – e nesse tempo os portugueses iam quase todos para lá jogar -, e tinha uma enorme paixão e vontade de jogar em Inglaterra. Queria jogar lá, apareceu o Leeds United e decidi aceitar o desafio. Um clube histórico e um dos mais antigos de Inglaterra, onde passaram craques como o (Éric) Cantona. Cheguei lá e tinham umas condições fantásticas com uns sete campos relvados e era incrível. Tinha como treinador o Dennis Wise e o Gustavo Poyet como adjunto, que me ajudaram a adaptar ao clube. 

E que tal o futebol inglês?
É uma loucura, porque eles vivem cada jogada, o som que fazem. Depois os adeptos estão perto do relvado, a adrenalina é outra. Cada disputa de bola é como se fosse a última, é de outra dimensão. Também tive de me habituar a jogar às vezes ao meio-dia (risos), pois só estava habituado a jogar à tarde e/ou à noite, e nem sabia se devia tomar o pequeno-almoço ou almoçar antes do jogo (risos). Gostaria de ter jogado mais tempo em Inglaterra e de ter chegado um pouco mais cedo lá, mas, no geral, gostei muito da experiência.

– Irão e Canadá: Sai Jogador, Entra Treinador –
Em 2007 acabas por rumar ao Irão. Como surgiu o convite para ires para lá?
Estava já na fase terminal da carreira com 31 anos, ia regressar a Espanha para o Málaga CF, mas quis ir jogar para um desses países ali das Arábias para terminar a carreira e tentar fazer um “pé-de-meia”, como se diz (risos). E como é que surgiu o convite? Na altura, o (Augusto) Inácio ia ser treinador do Foolad FC e ligou-me a perguntar: “Como é que é a tua vida?”. Expliquei-lhe que tinha a hipótese de regressar a Espanha, mas apenas por um ano, e deram-me um bom contrato e então decidi ir para o Irão. Foi uma descoberta, um outro filme (risos).

Que tal foi a experiência no Irão?
Foi engraçada a minha experiência no Irão. Lembro-me que quando estava no avião, num daqueles voos comerciais a chegar à cidade do Foolad – tive de fazer primeiro escala de Frankfurt para Teerão, e só depois é que foi para Ahwaz -, e vejo pela janela do avião aqueles poços de petróleo a arder e penso logo: “Mas aonde é que vim parar?!” (risos). O avião aterrou e quando saio, era um calor enorme! Estavam para aí uns 55 graus, era um calor tremendo que só suava por todos os lados. Chego ao clube, vejo imensa gente apaixonada por Futebol e lembrei-me daquela frase do Rui Vitória – “Adapta-te rápido se queres continuar a jogar” – que foi fundamental nos sítios onde fui passando. Chegado ao Irão, acabei por me adaptar bem e fui muito bem recebido por todos. Adoravam Futebol, tanto que só tinha assinado por um ano e acabei por ficar mais tempo. Lembro-me de uma vez que estava tanto calor, e o treinador a dizer: “Vai, vai, ataca!” e eu: “Mas estás a brincar comigo? Com este calor? Assim não” (risos). Tive momentos giros lá.

E aquele trauma com a notícia do canal brasileiro Record já foi ultrapassado?
(risos). Isso foi único e vai ficar comigo para o resto da vida (risos). Foi um dos maiores sustos que tive na vida! Estava em casa na altura do Carnaval a ver o canal Record que tem aquelas notícias sempre muito trágicas com mortes aqui e acolá, e, de repente, o apresentador diz assim: “Daqui a quatro dias, os Estados Unidos vão atacar o Irão”, e fiquei em choque (risos). Peguei logo no telefone e liguei à família para me despedir.

Já te estavas a preparar para o pior.
Ninguém no clube me atendia, porque era de noite, e só sei que não dormi a noite inteira a pensar “Como é que vou sair daqui?”, porque o passaporte não estava comigo e tinha de pedir ao clube para me carimbar para poder sair do país. No dia seguinte, chego ao clube à tarde – por causa do calor, os treinos eram à tarde, liguei de manhã e para tentar explicar por chamada na língua deles (o persa), ninguém me entendia (risos) – e explico o que tinha ouvido nas notícias, ao que eles dizem: “No problem, no problem”, estavam nem aí para isso (risos). Mas ainda tenho uma outra história engraçada no Irão para contar a forma como fui muito bem tratado.

Força.
Estava já no Sepahan e apanhava sempre um táxi para ir para os treinos. Um dia, entro num e o taxista faz uma festa ao ver que era eu: “Armando!”, pois era fanático pelo clube. Entretanto, estamos a ir para o treino, e ele decide mudar a trajectória. Perguntei-lhe: “Amigo, para onde é que vais? O local do treino é ali”, ao que ele responde: “No problem!”. “No problem? Mas o local do treino é ali. Aonde é que vais?”, e até achei que ele estivesse a fugir ao trânsito. De repente, paramos ao pé de uma casa, manda-me sair do carro e eu já estava em pânico, até lhe digo “Amigo, tenho treino (Armando aponta para o pulso), vou chegar atrasado” (risos), ao que ele volta a dizer “No problem, no problem”. Entro nessa casa com ele, e tinha ali um alto banquete com fruta e comida, e ele diz-me para sentar e comer, e eu: “Mas eu tenho treino!” (risos). Não podia faltar ao respeito, então tive de me sentar naqueles tapetes no chão, comi, bebi e fui apresentado à família, e só via a hora do meu treino a passar (risos).

Deves ter levado uma raspanete do teu treinador
(risosDepois, ele acabou por me levar para o treino, e quando chego lá, o treinador pergunta “Onde é que andaste?” e, como não conseguia explicar na língua deles, só dizia “Táxi, Problem” (risos). Mas foi muito giro, fui bem recebido e conheci pessoas muito interessantes.

BnR: A tua carreira terminou em 2010 ao serviço do Sepahan, com o título de campeão. Foi difícil tomar a decisão de pendurar as botas?
Não foi muito, porque quando fui para o Irão, já sentia que a carreira estava a prestes a acabar. Percebi que, mais tarde ou mais cedo, iria terminar a carreira. No Sepahan, fomos campeões e já ajudava nos treinos, era meio jogador meio treinador, dava algumas dicas sobre o treino e ajudava o treinador com a experiência que tinha. Joguei ainda a Liga dos Campeões da Ásia com o Rivaldo e encontrei vários craques nessa fase da minha carreira, mas já estava a sentir que mais dia, menos dia, iria deixar de jogar.

Depois acaba por abraçar a carreira como treinador. Em que momento durante a carreira como futebolista sentiu que poderia ser útil nessa função?
Como te disse, foi no Irão que já tinha um “dedito” na equipa técnica e o pessoal até brincava comigo: “Tu ainda vais ser treinador”, ao que dizia sempre: “Nem pensar, isso é demasiada responsabilidade para mim” (risos). Só que, entretanto, fui apanhando o gosto, tirei os cursos de treinador quando deixei de jogar e comecei a sentir aquele “bichinho” por treinar. Comecei então a treinar as camadas jovens, tive uma escola de futebol em Telheiras (Lisboa) com um sócio, e vi que tinha de aprender bastante para continuar a evoluir nesta função.

E como acaba por surgir a hipótese de ir treinar para o Canadá, para o Kleinburg Nobleton SC?
O convite surgiu através de um amigo meu holandês, o Bob de Klerk, que é agora treinador adjunto do Atlanta United FC. Tive essa oportunidade de abraçar o Kleinburg como treinador e Technical Manager para dar apoio aos treinadores todos. Juntei-me ao clube, comecei a trabalhar com os sub-18 e, ao mesmo tempo, estava a dar apoio nos processos de formação dos treinadores. Foi uma experiência engraçada e estive lá cerca de dois anos.

Depois inauguraste uma academia de futebol no Canadá. Como tem sido esta experiência de ajudar os mais novos a dar os primeiros passos no Desporto Rei, e ainda para mais num país onde o Futebol não tem ainda tanta expressão?
Após sair do Kleinburg, decidi abrir a minha própria academia, a Pro11 Soccer, porque a realidade do Futebol daqui não tem nada a ver com a de Portugal e Europa. Apareceu esta oportunidade de negócio e para trabalhar num projecto meu, e está a ir num bom caminho. Treino os sub-21, sou director técnico e dono da academia. Tem sido um desafio enorme, porque sabemos que aqui no Canadá há muita qualidade e talento, como por exemplo o Alphonso Davies que é considerado um dos melhores do Mundo actualmente e joga no Bayern de Munique. Há muito trabalho a fazer e um caminho a percorrer, até este ano foi criada a Primeira Liga canadiana, a CPL, que tem oito equipas profissionais, por causa do Mundial de 2026 que está a chegar. Por isso tudo, o Futebol está a crescer no Canadá e, como sou uma pessoa que gosta de desafios, estou feliz por estar aqui e tentar dar o meu contributo para que cresça ainda mais, pois, apesar de ser um país muito desenvolvido e com boas condições, falta uma aposta a 100% no Futebol. Neste momento, estou a trabalhar para agarrar uma equipa profissional, vou evoluindo no dia-a-dia e sinto-me preparado para um dia abraçar um projecto com outro tipo de responsabilidade. Estou a trabalhar para que apareça uma oportunidade, sinto-me pronto, porque estes anos todos aqui têm-me permitido evoluir, crescer, aprender e amadurecer bastante para um dia fazer de uma equipa técnica. 

https://www.instagram.com/p/B8jT5KuJIH5/

Ao primeiro toque
Jogador com quem mais gostaste de jogar?
(Armando fica pensativo) Jogador com quem mais gostei de jogar? Ui! (risos). Penso que foi o Forlán.

Melhor momento da carreira?
Tive vários bons momentos, mas os melhores foram os títulos que acabei por ganhar e que são marcantes.

Maior frustração da carreira?
Foi no ano em que saí do Benfica, em que foram campeões no ano seguinte com o mesmo plantel, e acabei por não conquistar esse campeonato.

Adversário mais difícil de marcar?
Tenho dois: o Ronaldinho e Deco.

Treinador que mais te marcou?
Todos os que tive acabaram por ter uma quota parte no meu percurso, e não posso escolher só um, pois iria ser injusto.

Melhor estádio onde jogaste?
(Armando voltava a ficar pensativo) Penso que foi o Santiago Bernabéu."

Ufa! O jogo que nunca mais acabava...

"Nunca, em Portugal, uma eliminatória foi tão comprida como aquela entre Benfica e Olhanense para o Campeonato de Portugal em 1931: 90 minutos nas Amoreiras + 90 minutos em Olhão + 140 minutos em Setúbal (depois anulados) + 90 minutos em Setúbal, novamente.

1931. Dia 3 de Maio. Os espectadores que se acumulavam no Campo dos Arcos, em Setúbal, não seriam capazes de adivinhar o que estava para acontecer. Nos quartos-de-final do Campeonato de Portugal, Benfica e Olhanense encontravam-se pela terceira vez consecutiva. O primeiro desafio tinha sido nas Amoreiras, em 19 de Abril, com vitória dos encarnados por 5-1, mas a permitirem que os algarvios ganhassem vantagem cedo por Bengala, logo aos 2'. As águias revoltaram-se rapidamente. Ralph Bailão, de penálti (24'), repôs a igualdade. Depois, Manuel de Oliveira (50'), Cardoso (57') e Manuel Oliveira (70' e 75') resolveram um problema que iria tornar-se num dos mais bicudos do futebol em Portugal.
As eliminatórias disputavam-se a duas mãos a partir dos quartos-de-final. Havia agora uma viagem a Olhão onde morava uma equipa aguerrida e com qualidade. O encontro teve lugar no dia 26 de Abril. O Benfica foi uma mera sombra de si próprio. Almas penadas sobre um campo de terra batida. 2-0 para os algarvios, golos de Bengala e Delfim. Ainda não chegara o tempo de os golos servirem para acertar contas. Os dois conjuntos foram obrigados a um desempate. O tal desempate marcado para Setúbal. Onde houve mosquitos por cordas.
'O Olhanense, lutando com energia, aliás, mais com energia do que com saber, conseguiu sair vencedor da contenda desportiva que ontem se realizou', escrevia um jornal vespertino. Era o que se estaria para ver.

Tremenda confusão
Esse Benfica - Olhanense de Setúbal ficou para a história como o jogo mais comprido do futebol português. E; ao mesmo tempo, foi apagado dos arquivos como se nunca tivesse existido. Muito cedo Dâmaso pôs os algarvios na frente do marcador. Os lisboetas pareciam cansados, desanimados, desiludidos. A sua reacção foi pobre. O tempo ia correndo nos ponteiros dos relógios, e muitos bocejavam na tarde calma junto ao Sado. Nem um repente, nem um movimento brusco, nem um golpe de imaginação. Um ramerrão insistente, a favorecer os de Olhão, claro está, aos quais tanto covinha que o resultado se mantivesse até final. Um final absurdamente misterioso para o futebol daqueles tempos.
À beirinha dos 90 minutos, o Benfica chega ao empate através de uma grande penalidade muito discutida. Arma-se confusão. De nada serve. O árbitro do Porto, Manuel Oliveira, é peremptório. A agora decorrerá o habitual prolongamento de 30 minutos.
Mais do mesmo. Futebol amordaçado, luta a meio-campo, choques, empurrões... O Olhanense mostrou-se mais poderoso em termos de envergadura. Criou mais perigo. Mas de nada lhe serviu. Neste momento, tudo somado, tinhamos os 90 minutos das Amoreiras mais os 90 de Olhão mais os 120 de Setúbal.Ricardo Ornellas, o grande mestre da crónica desportiva, chamou-lhe 'a partida mais longa. Parecia título de um filme. Mas um filme rodado ao vivo com personagens autênticas.
O final do prolongamento com o resultado em 1-1 pôs capitães de equipa e árbitro às avessas. O do Benfica exigia que se realizasse um quarto jogo. Defendia que era o que os regulamentos impunham. O do Olhanense, por seu lado, invocava que se deveria jogar mais meia hora, talvez convicto de que a sua superioridade física iria dar-lhes o triunfo.
O árbitro do Porto tomou uma decisão inédita:iria jogar-se até que uma das equipas marcasse um golo. Aí ficaria declarado o vencedor.
Perante esta imposição, os teams voltaram à refrega. A fadiga acumulada era grande. A qualidade dos lances ia por aí abaixo até que Bengala fez o 2-1. Os algarvios dedicaram-se à festa; os lisboetas ainda não se davam por derrotados. Os espectadores do Campo dos Arcos tinham estado duas horas e vinte minutos a assistir a um desafio infinito. Que ainda não chegara ao fim.
Alavancando-se nos regulamentos, o Benfica obteve da parte do Comité Executivo da Organização do Campeonato de Portugal a anulação dos Arcos. O regulamento não previa qualquer prolongamento na sequência do primeiro, pelo que haveria lugar à repetição do desempate logo no domingo seguinte. Recorreu o Olhanense, e haveria que organizar um Congresso Extraordinário para dirimir a contenda. Dia 22 de Maio, saiu desse congresso a decisão definitiva. Outro jogo se disputaria no Campo dos Arcos, anulando-se o anterior.
Desta vez o Benfica foi mais forte: venceu por 2-0, golos de Aníbal José e Salvador. Montenegro, avançado do Olhanense, é que entrou em campo com maus fígados e arranjou problema com toda a gente. Finalmente, descarregou no árbitro: deu-lhe dois pares de bofetadas que o deixaram a sangrar do nariz. Foi expulso no último dos minutos desta incrível maratona. Já de nada lhe serviu..."

Afonso de Melo, in O Benfica

Sob o calor em terras africanas


"A Superliga Luso-Angolana foi uma prova exigente a todos os níveis, o que só tornou a vitória ainda mais feliz

Após seis horas de voo, a equipa de basquetebol do Benfica chegou a Angola. Em terras lusitanas estava a liderar a fase regular do Campeonato Nacional 2009/10, mas fez uma pausa na prova, para competir na primeira edição da Supertaça Compal Luso-Angolana, organizada pelas federações portuguesa e angolana.
Esta competição internacional reuniu os participantes das Supertaças de Portugal e Angola - Benfica, Ovarense, 1.º de Agosto e Petro de  Luanda -, no Pavilhão da Cidadela, em Luanda, 'a mítica casa dos principais clubes de Angola e da melhor selecção africana da modalidade'.
Na jornada inaugural, a 2 de Abril, os 'encarnados' e os vareiros abriram as hostilidades, em condições atmosféricas muito diferentes das que estavam habituados, com 'cerca de 30 graus centígrados que abafavam a suave brisa que soprava pelas laterais do Pavilhão (...) e uma humidade relativa elevadíssima, próprio de uma sauna'. Apoiado pelos muitos adeptos presentes nas bancadas, o Benfica foi o que se adaptou melhor e venceu o detentor da Taça de Portugal, por 69-55. O 1.º de Agosto juntou-se ao Benfica no primeiro lugar da classificação, ao vencer o seu grande rival, o Petro de Luanda.
No dia seguinte, a 2.ª jornada voltou a ter os mesmos vencedores. Os benfiquistas tiveram um desempenho notável, 'a roçar a perfeição', frente ao Petro de Luanda, dominando a partida até ao final, e obtiveram o resultado de 87-52. O troféu seria, portanto, discutido entre os campeões nacionais de cada país, Benfica e 1.ª de Agosto, clube que além de campeão angolano, era campeão africano de clubes e a base da selecção de Angola.
No terceiro jogo em três dias, em exigentes condições climatéricas que obrigaram a uma grande rotatividade dos jogadores e em que o cansaço atingiu 'níveis altissimos', os pupilos de Henrique Vieira mostraram um elevado nível exibicional, obtendo um triunfo emocionante por 64-57. No final, Sérgio Ramos, um dos jogadores que estiveram mais em evidência do conjunto benfiquista, concluiu que 'Foram três jogos muito difíceis, em que até o controlo da bola foi complicado pela transpiração das mãos, mas (...) que a parte mental acabou por bloquear os obstáculos'.
Uma página de ouro na história da modalidade, para o clube e para o país. Esta vitória veio 'dar ainda mais moral' à equipa, que se sagrou, no final da época, bicampeã nacional. Saiba mais sobre esta conquista internacional na área 2 - Joias do Ecletismo do Museu Benfica - Cosme Damião."

Lídia Jorge, in O Benfica

Regresso das modalidades

"O dia de hoje é marcado pelo regresso à actividade nos nossos pavilhões, tendo-se obrigatoriamente de respeitar uma série de condições definidas pela Direcção-Geral da Saúde.
Numa primeira fase, o plano de retorno à actividade desportiva previu a realização de treinos individuais e agora abre-se a possibilidade de treinos conjuntos, porém limitados a pequenos grupos cuja dimensão varia de modalidade para modalidade consoante as especificidades de cada uma delas. 
Além da utilização condicionada dos recintos desportivos, é também permitida a utilização dos espaços contíguos, nomeadamente os ginásios. Estes estarão à disposição dos atletas das modalidades de pavilhão, assim como da nossa equipa de futebol feminino e de todos os que pertencem aos desportos do universo do Benfica Olímpico.
Depois de realizados os testes à COVID-19 (PCR e serologia), os nossos atletas têm agora melhores condições de treino à sua disposição. Para usufruírem destas, foram tomadas as seguintes medidas:
- Utilização de máscaras obrigatória (exceptuam-se os atletas durante as sessões de treinos) e reforço dos pontos de higienização frequente das mãos;
- Calendarização de treinos de forma a limitar o número de atletas e staff em simultâneo, observando-se as normas em vigor de lotação e distanciamento social, bem como intervalos adequados para permitir a higienização profunda dos espaços entre equipas;
- Tipo de treino por modalidade para garantir a distância entre atletas e a não partilha de equipamentos de treino;
- Limitação do uso de balneários e circuitos pensados para evitar cruzamentos e aglomeração de pessoas.
A retoma gradual da actividade das nossas equipas depende do sucesso da implementação destas medidas, sabendo-se que existe a expectativa de que as competições regressem em Setembro. 
Relembramos que as nossas equipas de pavilhão vinham fazendo, no seu conjunto, uma boa temporada. Nos masculinos, liderávamos o Campeonato de hóquei em patins e a fase regular no voleibol, além de, no basquetebol e futsal, estarmos na luta pelo primeiro lugar na fase regular. Nos femininos, liderávamos no futsal e hóquei em patins e, nas restantes modalidades, a época prosseguia de acordo com as expectativas.
Não obstante os necessários ajustamentos, devido à pandemia, que terão de ser feitos, há o compromisso assumido pela Direcção do Clube da manutenção da competitividade das nossas equipas na próxima temporada. Com rigor na gestão e sem hipotecar a viabilidade financeira do Clube, será com a mesma ambição e exigência que abordaremos 2020/21.
#PeloBenfica"

Antevisão...

Modo Padre!!!

"É tão certo como o Sol nascer amanhã. Mais uma conferência, mais uma vez a falar de arbitragens. 
Não falha. Desta vez, o “boneco” adoptou o “modo padre"."

Benfica FM #117 - Portimão...

O dia em que o futebol português perdeu a sua essência

"Com o advento da 1ª Grande Guerra, muitos desportistas foram para a chacina das trincheiras, enquanto em Portugal, o futebol tornava-se irremediavelmente uma modalidade em que o importante era ganhar.
Perante esta avidez em vencer a qualquer custo a imprensa desportiva, nomeadamente o quase hegemónico O Sport de Lisboa escandalizava-se, por entender que o futebol deveria ser uma forma de educação e não somente física e uma escola de virtudes. Aliás, o próprio celebre capitão encarnado, Cosme Damião e outros seus contemporâneos, viam no futebol uma escola de trabalho, porque conservava a saúde, o vigor do espírito e ensinava o método, a precisão, a ordem e mais que tudo confirmava a premissa que são os pequenos esforços conjugados que realizam as grandes obras. No entanto, este olhar puro do futebol que não era em função do resultado, era cada vez mais uma utopia. Ainda não era uma realidade o profissionalismo, demoraria ainda mais cinco décadas, mas os valores do desportivismo e fair-play dos primórdios da modalidade perderam-se pelo caminho em detrimento de um novo futebol, mais emotivo e sedento por vitórias. Em 1916, o Benfica e Sporting já dominavam o futebol lisboeta, que no fundo simbolizava que dominavam o futebol em Portugal. No que diz respeito ao Sporting nestes anos revelava até mais que o Benfica, uma conduta no futebol mais “resultadista”. Cobiçava os melhores jogadores das equipas do campeonato regional lisboeta (incluindo do seu rival) que era fácil, verdade seja dita, em virtude de não haver vínculos contratuais. Deste modo tanto o Sporting, como o Benfica, mas principalmente o primeiro, conseguiam facilmente atrair os melhores jogadores da época devido às suas condições materiais superiores, pela sua capacidade de lutar por títulos e até mesmo com um aliciante extra, isto é, as remunerações encapotadas.
Entretanto, numa final da Taça de Honra que contou com a presença do Presidente da República e outras figuras ilustres, enfrentaram-se os rivais do costume: Sporting e Benfica. Esta partida, no entender dos especialistas da época deveria ser um exemplo excepcional das melhores equipas lisboetas ao Estado Português, que se fez representar, no entanto não se veio a verificar. Pelo contrário, o jogo foi apelidado de escândalo desportivo pelo fraco nível apresentado por ambas as equipas. De facto, a tarde ventosa de Junho de 1917 não era convidativa para um futebol fluido e esteticamente bonito. Todavia, esta final foi muito mais que um jogo mal jogado. Foi o jogo que hiperbolicamente simboliza o dia em que o futebol português perdeu a sua essência. Após o Sporting colocar-se em vantagem, os seus jogadores começaram a submeter o seu confesso amadorismo numa gaveta e adoptaram alguns estratagemas dos profissionais, entre os quais uns bem conhecidos do século XXI, isto é, o antijogo e o perder tempo. Na segunda parte os jogadores do Sporting começaram a atirar a bola para fora tantas vezes, que o próprio vento deixou de ser o bode expiatório de um jogo mal jogado. Aliás, Jorge Vieira, célebre e mítico capitão leonino, chegou a correr atrás da bola, quando esta estava fora do campo e chutou-a ainda para mais longe. Perante estas práticas o público apupou estes jogadores, pois achariam, com razão, que o preço pago pelo bilhete merecia outro respeito e espectáculo dos amadores futebolistas portugueses. Mas, foi tanta a vontade de ganhar do Sporting, que nos primeiros 29 minutos da segunda parte colocaram a bola fora 49 vezes, o que provocou a ira do público, que invadiu o campo e incentivou a equipa do Benfica a abandonar a partida. Contudo, somente o capitão encarnado Henrique cedeu a essa pressão e abandonou a partida. No final da partida o Sporting acabou por ganhar a taça, mas o futebol perdeu tudo o resto."

Benfiquismo (MDLVII)

Família...