Últimas indefectivações

terça-feira, 22 de maio de 2018

As balizas com pronome possessivo!

"Poucos grandes jogadores terão sido tão eclécticos: lançou o peso, o dardo, saltou em altura, jogou basquetebol e foi avançado-centro. Costa Pereira. Um nome para a história. Tinha, na grande área, um estilo único. Uma autoridade imensa.

muitos anos que escrevo neste vosso jornal sobre episódios e figuras do Benfica, umas mais marcantes, outras que foram caindo no limbo do olvido, e poucas vezes tenho referido um personagem enorme chamado Costa Pereira. Uma injustiça!, dirá o meu pacientíssimo leitor. Com toda a razão, com toda a razão. Alberto Costa Pereira, natural de Nacala, Moçambique, infância passada na praia do Limbo, meninice entre casa, escola e areia, futebol de areia também, foi lá que deu os primeiros mergulhos, não apenas no oceano Índico mas também para segurar bolas chutadas pelos amigos.
Depois, o pai foi colocado em Nampula, e Costa Pereira foi ao Ferroviário mostrar os dotes.
E dotes ele tinha. Ainda não era o calmeirão que viria a ser, imponente nas saídas de entre os postes, impressionando a Europa com o atrevimento, sempre disposto a tomar conta de toda a sua grande área, assim mesmo com o pronome possessivo, ele era possessivo em relação ao seu território eram aqueles linhas e aqueles ângulos que nasciam branco em frente às balizas.
Lourenço Marques seria a etapa seguinte, para estudar, na Escola Técnica, chumbou a Físico-Química e a Tecnologia, se não teria o curso completo, mas veio o trabalho nos caminhos ferro, veio o futebol um bocadinho mais a sério no Imperial, encontrou por lá o Juca, que viria mais tarde para o Sporting, passou para a União, que tinha o famoso Costuras, do FC Porto, atenção que não era guarda-redes, isso foi depois, era avançado, tinha jeito de pés, ele próprio confessou, já na Metrópole, que poderia jogar nas calmas em qualquer clube médio da I Divisão.
O futuro era a baliza
Mas as balizam esperavam por ele. Primeiro na equipa de rapazolas do colégio interno que frequentou, depois nos juniores do Sporting de Lourenço Marques, o pai nem soube que ele estava nos leões, era demasiado Ferroviário para aceitar a traiçãozita, de Alberto passou a ser conhecido por Costa Pereira, o nome espalhou-se com a facilidade do fogo num campo de milho seco, seria o Costa Pereira até ao fim da vida.
O pai, quando soube do Sporting, pediu-lhe para trocar. Bem tentou. Fecharam-lhe a porta de saída, ficou um ano sem futebol, mas era um inquieto, tratou de se dedicar ao basquetebol, ao atletismo - salto em altura, lançamento do peso, dardo, velocidade - aí já no Ferroviário, sábado à noite jogava básquete, domingo vinha a bola de couro, as características físicas de Costa Pereira tornaram-se inconfundíveis, aquela forma de saltar e agarrar a bola frente à baliza como se fosse em baixo dos postes com a rede cilíndrica.
Veio para o Benfica, um bocado contra a vontade da família. Aos 21 anos, o Sporting de Lisboa chamou-o, mas o pai nem quis ouvir falar do convite. Nem pensar!
Tinha ganho a fama de ser um especialista nos penalties. Graças a um jogo em que defrontou o St. Mirren, da Escócia, e defendeu a grande penalidade marcada por Bill Steel, um nome forte do futebol britânico de então. Mas não foi só o penalty defendido. Foi a exibição total.
Costa Pereira tornava-se o Costa Pereira. Se tinha sido, até aí, um homem à procura do seu nome, via a sua lenda espalhar-se pelas margens do futebol português. Sete vezes campeão nacional, quatro Taças de Portugal, duas Taças dos Campeões Europeus.
Era ele e o seu Destino.
As balizas esperaram por ele, mas valeu a espera. Tornou-se dono delas..."

Afonso de Melo, in O Benfica

Alvorada... do João Paulo

Brindado a ouro

"A história de uma conquista inédita que valeu ao Benfica um presente singular.

A época 1949/50 terminou em glória para o Sport Lisboa e Benfica. Depois de vencer mais um Campeonato Nacional, o Clube findou a temporada com uma conquista inédita: a Taça Latina. Radiantes, os adeptos presentearam-no com ouro.
Se a conquista do título de campeão nacional já era motivo de festejo, a vitória na Taça Latina inflamou troféu internacional oficial ganho por um clube português e esse clube era o Benfica!
Como 'manifestação de júbilo clubista', Rebelo da Silva, director do jornal O Benfica, lançou o repto: 'Vamos oferecer ao Clube a sua primeira Taça de Ouro (...)?'. A proposta consistia em adquirir, por subscrição pública, 'dentro das posses de cada um', uma 'taça especial', fora 'dos moldes vulgares', cujo material correspondesse 'ao valor e à amplitude da vitória', para 'perpetuar (...) o triunfo magnífico que (o Clube) conquistou para si e para o país'.
A ideia despertou enorme entusiasmo e, em poucos dias, começaram a chegar doações à redacção Álvaro da Cunha Gregório, então sócios n.º 397, foi um dos primeiros a contribuir, dando 100$00. Seguiram-se muitas outras, provenientes de todo o mundo. Mas não foram só donativos que chegaram. Houve quem quisesse contribuir com ideias, como Maria da Piedade Vieira, que sugeriu a 'construção de uma estatueta em ouro e pedrarias (...) baseada na deusa da vitória' e que, 'na mão esquerda, ergueria, orgulhosamente o emblema do Benfica'.
No ano seguinte, depois de exibida publicamente nas montras da Loja das Meias, no Rossio, e da Casa Kodak, na Rua Garrett - 'sobre uma placa giratória, o que permite admirá-la em toda a sua magnificência' -, a taça foi entregue ao Clube. A cerimónia teve lugar a 14 de Outubro de 1951, antes do desafio Benfica - Oriental, sob 'uma trovoada de aplausos'.
Executada em ouro e marfim, a taça da autoria de Alcino Cardoso ostenta numa das faces os emblemas dos clubes com que o Benfica disputou o Campeonato Nacional e, na outra, os da Taça Latina. Actualmente, a Taça de Ouro pode ser vista na exposição temporária Jornal O Benfica - 75 Anos de Missão, patente no Museu Benfica - Cosme Damião. Na exposição pode ainda ver a edição de O Benfica onde é lançado o repto para a sua oferta."

Mafalda Esturrenho, in O Benfica

Afinal havia outra

"Numa época em que descobrimos a 'careca' de forma compassada a centenas de pessoas, não podemos deixar de ser impelidos a escrever sobre o que foi hoje (escrevo na terça-feira) publicado por um meio de comunicação social. Na verdade, aí podemos ler que Sporting compra vitória do Benfica.
Não sei qual irá ser o desenvolvimento de toda esta temática, mas o desenrolar da mesma, desde manhã até agora ao início da tarde, só tem confirmado ainda mais os factos que foram anunciados.
A Procuradoria confirma existência de um processo criminal no DIAP do Porto, mas, ao contrário dos processos do Benfica, este começou por ser divulgado na comunicação social antes de existirem buscas. Essa não é a forma correcta de se fazerem as coisas.

Tal só significa que os processos do Benfica foram trancados a sete chaves, o que só enaltece quem os investiga, mas este relacionado com o Sporting virou uma autêntica 'boca de charroco'! Porquê? Não sei!
A existir como parece evidente, corrupção no título de 2016/2017 de andebol do Sporting por viciação de resultados, temos aqui, pela primeira vez a sério, a grande possibilidade de vir a existir uma punição por esse crime a um dos três grandes!

Como se sabe, o Apito Dourado não deu em nenhuma condenação em corrupção por viciação de resultados desportivos e existiam factos suficientes para isso, o Benfica, que se saiba, não está na mira de corrupção por viciação de resultados, mas agora, a coisa ficou muito grave!
Grande parte do universo sportinguista está incrédulo e só se recortam opiniões que dizem 'a ser verdade é muito grave!'.
A Procuradoria-Geral da República devia ir mais longe nos seus esclarecimentos e informar, com base no artigo que o Código de Processo Penal tem, o que afinal se passa. Quanto tempo tem o processo?
Do Benfica sabe-se tudo, do Sporting dizem nada!
O desporto está talvez a atravessar o pior período da sua vida em Portugal e, perante tantas agressões verbais praticadas a todos nós pelo presidente do Sporting, cabe agora perguntar - como é?
A Lei da Corrupção Desportiva pune hoje várias condutas que tipifica como crimes em decalque dos crimes previstos na lei geral penal.

Capítulo II - Crimes
Artigo 8.º
Corrupção passiva
O agente desportivo, por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão destinados a alternar ou falsear o resultado de uma competição desportiva, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

Artigo 9.º
Corrupção activa
1 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a agente desportivo, ou a terceiro com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que lhe não seja devida, com o fim indicado no artigo anterior, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
2 - A tentativa é punível.

Ou seja, a serem verdade os factos descritos na comunicação social, o designado director desportivo do Sporting pode responder por crimes até penas de 8 anos de prisão, enquanto o designado empresário até 5 anos.

Artigo 10.ª
Tráfico de influência
1 - Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para abusar da sua influência, real ou suposta, junto de qualquer agente desportivo, com o fim de obter uma qualquer decisão destinada a alterar ou falsear o resultado com pena de prisão de 1 a 5 anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 - Quem, por si ou interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a outra pessoa vantagem patrimonial ou não patrimonial, para o fim referido no número anterior, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

Este crime distingue-se do anterior pela singela razão de que aqui estamos perante intervenção por um conduta de influência em razão do exercício de um cargo, real, ou suposto e estamos a falar até 5 anos.
Estamos a falar de crimes que admitem medidas de coacção gravosas e nomeadamente a prisão preventiva, pelo que o caminho normal é a detenção fora de flagrante delito e a sua apresentação a um juiz, única entidade que tem a competência para aplicar estas medidas de coacção. No entanto, como se verifica, o caminho seguido não foi este. Já no caso do Benfica, o caminho que foi seguido foi o normal!
A divulgação cirúrgica desta situação, evitando detenções e aplicações de prisões preventivas, vai permitir, a ser verdade, que os envolvidos destruam todas as provas existentes, o que não abona a favor da Justiça.
No entanto, espero que a mesma Justiça em surpreenda e pelo menos uma vez mostre a normalidade do curso das coisas - fazendo detenções! A não ser assim, vai desiludir-me muito!
Até para a semana.

P.S. Na terça-feira passada falei para a Bola Branca sobre o nosso Benfica. Sabem o que obtive de retorno? Um 'cabeçudo' qualquer que ligou para o meu escritório e perguntou se o f.d.p. do Pragal Colaço estava? E desligou!"

Pragal Colaço, in O Benfica

PS: Três notas: primeiro, o Pragal escreveu este artigo na Terça, desde então houve alguns desenvolvimentos; segundo, tem toda a razão em suspeitar da forma como o CM se adiantou à PJ e ao MP, permitindo 'apagar' provas... (aliás, no caso de Alcochete, continuo a achar muito estranho como é que líderes da invasão, continuam cá fora, livremente e não são detidos); terceiro, este deveria ser o tema mais preocupante do Tugão neste momento... a invasão de Alcochete tem a sua gravidade, mas não é caso único, ainda esta época, o mesmo aconteceu em Guimarães... Tem havido, uma clara tentativa de abafar o CashBall...

Benfiquismo (DCCCXXXV)

Trio...

Quem são os cúmplices de Bruno de Carvalho?

"O mito de um desporto iluminado pela ética das elites greco-romanas (provavelmente uma aldrabice milenar), simbolizada pelo aforismo "mente sã em corpo são", atribuído ao poeta romano Juvenal, morreu quando eu tinha 6 anos.
Nessa época, em 1969, um dos atletas-heróis da minha infância, o ciclista do Sporting Joaquim Agostinho, foi desclassificado da sua primeira vitória na Volta a Portugal em Bicicleta por doping. Ele negou a acusação, garantiu que na etapa final, após a qual lhe fizeram as análises incriminatórias, apenas tinha bebido um Sumol e que alguém o tramara.
Eu, que ainda não conhecia gigantes com pés de barro, acreditava no Agostinho, mas estava perplexo: "Fosse como fosse", percebi na minha mente ainda inocente e depois de pacientes explicações do meu pai, "no desporto pode fazer-se batota... Uau!"
Descobri, aos 22 anos, que o futebol podia matar: no estádio belga de Heysel, antes de uma final para a Taça dos Clubes Campeões Europeus, adeptos da Juventus e do Liverpool atiraram-se, numa fúria tribal, à batalha sangrenta. Trinta e nove pessoas acabaram ali a história das suas vidas. Os compromissos comerciais não permitiram o luto, o choro, o protesto: o jogo, pouco depois da matança, decorreu nos 90 minutos regulamentares, transmitido nas televisões de todo o mundo e comentado pelos locutores habituais, especialistas no 4-4-2.
O lema "O mais importante não é ganhar mas participar", adoptado por Pierre de Coubertin para promover o revivalismo moderno dos Jogos Olímpicos da Antiguidade, passou ao podium das hipocrisias do século XX em 1988, tinha eu 25 anos: nesse ano bissexto o Comité Olímpico Internacional admitiu a falsidade do amadorismo propalado por boa parte dos competidores e começou a aceitar atletas profissionais em algumas provas.
O desporto de competição em geral, o futebol em particular, que tantas emoções me deram na infância, na adolescência, nos meus primeiros anos de adulto, deixaram de me interessar: "Adorar mentes perturbadas em corpos manipulados; celebrar vitórias conquistadas com batota e desprezar a vida humana por um punhado de dinheiro são as verdadeiras regras que dominam o desporto. É, quase sempre, uma fraude. Não quero isto na minha vida", concluí.
Só a profissão de jornalista me obrigou a acompanhar as notícias do desporto e a constatar como, lamentavelmente, quase ninguém se importa em ser, todos os dias, enganado; quase ninguém se importa em ser instrumento e alimento da besta que domina a fraude... Tenho, às vezes, uma recaída em alguns jogos da selecção, mas recupero depressa.
Quando vejo uma multidão de gente a acusar Bruno de Carvalho de ser o autor moral do ataque de adeptos sportinguistas a atletas e treinadores do clube, relacionando a violência física com a escalada da violência verbal usada pelo presidente do Sporting, pergunto-me: estes acusadores todos não estão a colocar-se, involuntariamente, também, no banco dos réus?
Os nossos queridos intelectuais, colunistas, escritores, humoristas, académicos, jornalistas, políticos e economistas, anos e anos a fio, tecem loas, escrevem poesia, papagueiam filosofia acerca do primado da emoção sobre a racionalidade no ludopédio, acerca do direito ao insulto contra a civilidade no estádio, acerca da sociologia de excepção do jogo da bola, acerca do estatuto especial do futebol face, até, à lei. Para estes cérebros, para estes líderes de opinião, a paixão pelo clube permite tudo... sim, tudo! Não são eles, também, à luz dos seus próprios critérios, responsáveis morais pela recente escalada de violência?
Não são eles, que mendigam bilhetes para jogos, que viajam a convite das equipas, que se fotografam ao lado dos presidentes dos clubes, que argumentam imbecilidades em defesa dos brutos da sua cor, que vão à televisão participar em peixeiradas boçais, que escrevem nos jornais colunas sectárias, que convocam homenagens a putativos criminosos, que assinam apoios, que garantem votos, que alimentam a promiscuidade do negócio futebolístico com a vida política, que recusam pôr na ordem jurídica da sociedade a maioria dos crimes do desporto, não são eles, todos, cúmplices de Bruno de Carvalho? E de Luís Filipe Vieira? E de Pinto da Costa? E de muitos outros?
Não são os nossos mais respeitáveis líderes, por acção ou omissão, culpados pelo estado a que chegou o futebol?... Não sejam hipócritas."


PS: Esta necessidade de meter tudo no mesmo saco é exasperante...!!!

As lideranças e a ética

"O comportamento do líder e a forma como se relaciona com a sua equipa e com os "stakeholders" será seguramente replicado por todos e melhorará a imagem de marca de toda e qualquer organização.

Na direcção dos negócios, o papel das lideranças é essencial para a criação e consolidação dum ambiente societário onde impere a ética(1).
Como sabemos, há vários instrumentos legais e institucionais que visam prever e estatuir as relações laborais nas organizações empresariais.
Naturalmente, a existência do diálogo social através da existência do instrumento de negociação colectiva, conforme o previsto no artigo 2.º do Código do Trabalho(2), potencia o trabalho digno e boas condições de trabalho. Tal é, igualmente, promovido pelo regulamento interno de empresa(3), conforme o previsto no artigo 99.º do Código acima referido. Mais recentemente com a publicação da Lei n.º 73/2017, de 16 de Agosto(4), em que o legislador pretendeu reforçar o ordenamento jurídico no que à prevenção da prática de assédio diz respeito, a defesa intransigente dos direitos humanos ficou novamente plasmada na lei laboral.
No entanto, sabemos que independentemente da existência de normas jurídicas e de regras institucionais, a prevaricação e a proliferação no meio laboral de condutas impróprias advém por vezes da ausência de referências éticas e deontológicas por parte das lideranças.
Assim, numa empresa, o líder deverá ser, numa linha contínua no tempo e no espaço, um referente no que diz respeito ao respeito pelos direitos de personalidade e pelos princípios e valores que norteiam a vida da organização.
Mas, de um líder espera-se mais e essa expectativa germina em primeira instância nas características que imprime à respectiva conduta e na forma como gere, quer interna quer externamente, a aplicação das normas e dos costumes que fazem parte da identidade da organização que lidera.
O comportamento do líder e a forma como se relaciona com a sua equipa e com os "stakeholders" será seguramente replicado por todos e melhorará a imagem de marca de toda e qualquer organização.
Aquilo que se pede ao líder é que seja leal, justo, equitativo, urbano, use e abuse da probidade e seja ambicioso ao querer que a sua organização se torne aquela de que todos quererão fazer parte! 

(1)é·ti·ca. (latim ethica, -ae, do grego ethikê, feminino de ethikós, -ê, -ón, do grego éthos, -ous, costume, hábito) substantivo feminino. 1. [Filosofia] Parte da Filosofia que estuda os fundamentos da moral.
2. Conjunto de regras de conduta de um indivíduo ou de um grupo. "ética", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa
https://www.priberam.pt/dlpo/%C3%A9tica
(2)Artigo 2.º - Instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho:
1. Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho podem ser negociais ou não negociais.
2. Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho negociais são a convenção coletiva, o acordo de adesão e a decisão arbitral em processo de arbitragem voluntária.
(3)Artigo 99.º - Regulamento interno de empresa:
1. O empregador pode elaborar regulamento interno de empresa sobreorganização e disciplina do trabalho.
(4)https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/108001409/details"

Teresa Damásio, in Jornal de Negócios

“Conheci Sócrates no camarote do BES no Estádio da Luz”

"Os governantes e as televisões contribuíram para o fanatismo dos adeptos e para fazer das presidências dos maiores clubes portugueses cargos apetecíveis para todo o tipo de oportunistas sem escrúpulos

1. Vamos então falar sobre futebol. E podemos fazê-lo através de alguns episódios.
Episódio 1. A selecção de Portugal tinha acabado de ganhar o campeonato da Europa, em Julho de 2016, e centenas de milhares de portugueses esperavam pela equipa no aeroporto e nas ruas de Lisboa. Mas um dos “momentos altos” do dia seria a ida da equipa ao Palácio de Belém para uma celebração com o Presidente da República, o PM e outros ministros.
Ainda hoje me lembro das imagens de Belém, as quais deveriam envergonhar qualquer pessoa que tenha uma noção institucional do exercício do poder político. Foi uma vergonha, pelo menos para mim, assistir à competição entre os nossos políticos para ver quem ficava melhor na fotografia com a selecção e com o Ronaldo. Tudo aquilo foi indigno e mau de mais. Eu adoro futebol, estou longe de ser um puritano anti-futebol, e a vitória no Campeonato da Europa foi seguramente uma das maiores alegrias que senti como adepto, mas há limites em relação à imagem pública do poder político e naquele dia foram claramente violados.
O regresso da selecção nacional de França transformou-se num momento de exaltação nacionalista e num episódio de populismo político, nos quais o PR e o PM ocuparam um lugar central. A mensagem que se passou a todos os portugueses foi que o futebol é muito mais do que um jogo, ou de que um desporto, é uma questão de orgulho nacional, e que os jogadores são os verdadeiros heróis da pátria. É assim que se dá legitimidade ao fanatismo.
Episódio 2. Os programas de televisão onde se discute futebol. Quando estou em Portugal numa segunda-feira, é impossível ver um canal de notícias sem se ouvir uma discussão sobre futebol. Todos os canais passam programas para “analisar os lances mais polémicos“ dos jogos do Benfica, Sporting e Porto. Invariavelmente, há três comentadores (um adepto de cada um dos três clubes) e um antigo árbitro. As discussões desafiam qualquer critério de racionalidade que existe no mundo desde o Império Romano. Qualquer grupo de crianças entre os 8 e os 12 anos têm conversas mais sofisticadas do que aquelas almas fanáticas.
Daqueles programas tiram-se duas conclusões. Em primeiro lugar, não algum jogo de futebol em Portugal sem erros dos árbitros. As televisões usam todos os ângulos e imagens possíveis para descobrirem e exporem esses erros. Em segundo lugar, todos os adeptos em Portugal ficam absolutamente convencidos de que os seus clubes são “roubados pelos árbitros.“ Aqueles programas constituem os maiores estimuladores nacionais do clima de fanatismo e de ódio que existe hoje no futebol em Portugal.
Episódio 3. Uma imagem no Estádio da Luz com o presidente do Benfica, Luis Filipe Vieira, ladeado pelo PM, António Costa e pelo ministro das Finanças, Mário Centeno. Como disse, adoro futebol e acho muito bem que Costa e Centeno também gostem e não tenho qualquer problema com o facto de serem adeptos do Benfica. Mas como PM e ministro das Finanças não devem em caso algum aparecer num jogo de futebol ao lado de um presidente de um clube (e diria exactamente o mesmo se fosse no estádio do meu clube, o FC Porto, com o Pinto da Costa). São imagens como aquela que dão um enorme poder aos presidentes dos clubes de futebol. Sobretudo num momento em que há clubes investigados pela justiça, com dívidas ao fisco e com problemas com empréstimos bancários. 
Episódio 4 e o título desta crónica. Ninguém assistiu em público, mas contou-o Manuel Pinho ao Expresso desta semana: “Foi António Costa quem me apresentou Sócrates no camarote do BES no Estádio Luz.” Esta simples frase resume muito do que aconteceu em Portugal na última década. Política, futebol e banca, todos juntos a discutir negócios.
Estes episódios mostram um ponto muito simples. Nos últimos anos, os governantes e as televisões contribuíram para o fanatismo dos adeptos e para fazer das presidências dos maiores clubes portugueses cargos apetecíveis para todo o tipo de oportunistas e gente sem quaisquer escrúpulos.
Os responsáveis políticos estão “chocados” com o que se passou em Alcochete? Pensem no que andaram a fazer nos últimos anos. Querem começar a mudar as coisas? Deixo duas sugestões. Uma, as televisões acabam imediatamente com programas onde se discute as decisões dos árbitros. A outra, os políticos deixam de aparecer em cerimónias públicas com dirigentes do futebol e com os jogadores. Tratem o futebol como tratam a Igreja Católica. São capazes?
2. Obrigado Sérgio Conceição. Disse que adoro futebol e que sou adepto do Porto. Quero aproveitar o fim da época para agradecer ao Sérgio Conceição o título de campeão. A ele se deve, os jogadores foram os mesmos e os dirigentes também. Ele foi a novidade. Colocou o Porto a jogar bom futebol e de ataque e criou uma verdadeira equipa com os jogadores a darem tudo em cada jogo. Criou ainda um entusiasmo único entre os adeptos. Assisti a jogos onde o Porto sofreu as piores derrotas da época, em casa com o Liverpool para a Liga dos Campeões e no Restelo com o Belenenses. Em ambos os jogos, os adeptos ficaram a aplaudir a equipa muitos minutos para além do fim do jogo. No Restelo, não me esqueço dos milhares de portistas a cantarem “quero o Porto campeão”, apesar da equipa ter acabado de perder a liderança do Campeonato naquele jogo. E no fim tivemos mesmo o Porto campeão.
Deixo também as felicitações ao Benfica, quatro anos seguidos a ganhar o Campeonato e um segundo lugar são cinco anos quase perfeitos. E um desejo. Ao contrário do que seria o habitual, hoje gostava que o Sporting ganhasse a Taça de Portugal. Jorge Jesus e os jogadores merecem. A maioria dos adeptos também. E Bruno de Carvalho não merece ver o Aves ganhar."


PS: Tantos Ministros e Juízes sentados em todos os jogos ao lado do condenado presidente do Clube do cronista, e não se recordou de um só, para usar como exemplo nesta crónica?!!!
E já agora, além dos debates televisivos, talvez o roubo de correspondência privada e a sua divulgação manipulada, por parte de gabinetes de propaganda, que existem exclusivamente para difamar o outro, também pudesse ser Exemplar !!!

Do que são feitos os profissionais do Sporting


"Os jogadores do Sporting deram uma grande resposta aos incidentes em que se viram envolvidos nos últimos dias e os do Aves mostraram predicados que talvez não esperássemos ver num clube que ficou abaixo do meio da tabela.

lhe chamaram novela mexicana, ópera bufa e até filme de terror. De uma coisa ninguém tem dúvidas: esta última semana foi verdadeiramente horrível para o Sporting e teve um desfecho a condizer. A derrota na final da Taça contra uma equipa teoricamente muito mais fraca, o Desportivo das Aves, foi uma espécie de cereja no topo do bolo, mas ao contrário. A lei de Murphy - qualquer coisa como “o que pode correr mal vai mesmo correr mal” - verificou-se de forma implacável. 
Apesar disso, julgo que alguma coisa se salvou no meio deste descalabro. Para começar, o jogo do Jamor foi, para quem o viu com algum distanciamento, um belo desafio de futebol. Os jogadores do Sporting deram uma grande resposta aos incidentes em que se viram envolvidos nos últimos dias e os do Aves mostraram predicados que talvez não esperássemos ver num clube que ficou abaixo do meio da tabela. Houve festa nas bancadas, jogadas bonitas, golos para os dois lados e emoção até ao fim. Ao contrário daquilo de que costumam acusá-los, os atletas do clube de Alvalade correram e esforçaram-se até ao último instante. Resumindo: ambas as equipas valorizaram o espectáculo. 
Porém, mais ainda do que em campo, foi talvez depois do apito final, quando as emoções assomaram à superfície, que os jogadores e equipa técnica do Sporting revelaram do que são feitos. Aquelas lágrimas não enganam: mostraram um grupo de profissionais que, em condições muito adversas, deram tudo o que tinham, com suor, paixão e sacrifício, até ao último minuto. E que, apesar disso, perderam o troféu que poderia salvar a época e dar um sentido ao pesadelo vivido.
Finalmente, também foi bonito ver todos aqueles que confortaram e aplaudiram os homens cabisbaixos que subiam para a tribuna. O verdadeiro adepto é esse, o que honra o clube e respeita os seus profissionais. Não é o que os ameaça, agride, humilha e cobre de insultos."


Sem solução à vista


"O futuro do Sporting está já a decorrer a grande velocidade, sendo por isso urgente iniciar a sua preparação para que não seja posto tudo a perder.

O enorme caudal de notícias com origem no estádio José Alvalade teve ontem mais um dia em cheio. 
Não se goraram as expectativas sobre a decisão final dos juízes relacionada com os tristes acontecimentos da Academia de Alcochete, enquanto, por outro lado, foi inconclusiva a reunião dos órgãos sociais do Sporting, que havia despertado especial interesse.
Em relação aos arguidos, terminou uma fase dura do processo com a conclusão das audições e o conhecimento das medidas de coação impostas por quem tinha essa prerrogativa.
E, neste aspecto, há que reconhecer que não foram brandas as penas impostas.
Agora, os 23 detidos preventivamente, distribuídos por quatro estabelecimentos prisionais, vão iniciar um longo período de internamento que pode chegar até seis meses.
Tanto como aplicar um castigo a delinquentes, o juiz poderá ter deixado à vista a intenção de fazer um aviso sério a todos quantos possam querer repetir as suas práticas.
No caso da reunião realizada sob a égide de Marta Soares, presidente da assembleia geral do Sporting, da mesma saiu uma única decisão, remetendo para quinta-feira um novo encontro igualmente abrangente, então, sim para tomar decisões finais sobre o futuro imediato do clube.
Para uns trata-se apenas de ganhar tempo, o que, aparentemente, favorece os elementos ainda em funções, permitindo-lhes traçar novas estratégias que possam ajudar a evitar a queda do actual conselho directivo e permitir a sua reorganização.
Há, no entanto, uma circunstância que se sobrepõe a tudo isto: o futuro do Sporting está já a decorrer a grande velocidade, sendo por isso urgente iniciar a sua preparação para que não seja posto tudo a perder.
Outro facto também interessante relaciona-se com o corte de benefícios anunciado com claque da Juventude Leonina.
Mas, afinal, que benefícios eram esses?
Ficou por esclarecer esta grande dúvida."

As falácias sobre o futebol

"Em Portugal todos sabem porque é que as coisas acontecem e todos sabem como se resolvem depois de acontecerem. O problema é que muita gente trabalha em cima de uma série de falácias, resultado de generalizações perigosas.
A mais actual das falácias é a que culpa os comentadores-adeptos, que participam em programas televisivos, de tudo o que agora acontece. Saberão alguns dos leitores do JN que sou portista e participo no programa "Aposta tripla" da Sport TV+, com Pedro Adão e Silva, do Benfica, António Macedo, do Sporting, e o ex-jogador Pedro Henriques. É um programa civilizado, com pessoas que se respeitam no programa e fora dele, como é o da RTP ou o da SIC, muito longe da gritaria da TVI ou da CMTV. Logo à partida se percebe como podem ser perigosas as generalizações. Há programas em que as pessoas se insultam e gritam umas com as outras, passando para os restantes adeptos a ideia de que não pode haver tolerância com os adversários? Há! Mas não são a maioria, longe disso. E o que aconteceu em Alcochete pode ser imputado aos tais programas grotescos? Não me parece. Se eles incendeiam almas é de adeptos de um clube contra adeptos de outro clube e não de adeptos de um clube contra os seus próprios jogadores.
Falácia é igualmente considerar que denunciar a batota de adversários ou discutir os erros dos árbitros é fazer um discurso que apela à violência. A razão por que se gosta sempre de um clube é porque a paixão é irracional e permite que uns vejam penáltis onde eles não existem e outros não os vejam quando eles são flagrantes. Ainda assim, a larguíssima maioria dos adeptos que levam o futebol a sério não o levam tão a sério que o deixem condicionar a sua vida. Lá em casa somos portistas e benfiquistas, na família alargada há portistas, benfiquistas, sportinguistas e até um leixonense. Entra os amigos, há gente de muitos outros clubes. Muitas vezes discutimos o jogo jogado e as arbitragens. Nunca nos chateámos, nunca faltámos ao respeito uns aos outros.
É também uma falácia considerar que cada vez que um clube tem os holofotes dirigidos sobre si, isso é um problema do futebol português. Outra generalização perigosa. Se adeptos de um clube agridem os seus jogadores ou se outro está a ser investigado porque a revelação de emails denuncia a alegada prática de corrupção, isso não faz de todos os outros clubes culpados. De igual forma, é uma falácia apontar o dedo ao clube, não percebendo que essas práticas definem os dirigentes que estiverem em funções e não a história do clube ou os seus adeptos.
Outra falácia é considerar que as claques de futebol transformam os adeptos em "hooligans". Nas claques, os adeptos violentos e criminosos são primeiro violentos e criminosos fora do universo do futebol. A larga maioria dos que já foram condenados, praticaram crimes que nada têm a ver com o futebol. Se fosse de facto obrigatório legalizar todas as claques, talvez se pudesse avançar com a ideia de que era preciso ter o cadastro limpo para ser membro de uma claque.
A mais perigosa das falácias é, no entanto, a que vê no futebol um antro de gente perigosa, com adeptos imbecis e dirigentes corruptos. Por isso, há quem defenda que a política se deve afastar do futebol. Há adeptos imbecis e dirigentes corruptos? Há, sabemos que sim. Mas é por isso que os eleitos do povo se deviam preocupar mais com o estabelecimento de regras que balizassem a irracionalidade da paixão futebolística. E o Mundo fica mais perigoso com o populismo. Não me esqueço quando, em 2001, Rui Rio passou a ser "persona non grata" no F. C. Porto. Eu era editor de política na TSF e perguntei a Durão Barroso se não temia perder votos no Porto por causa desse conflito. A resposta foi: "Os votos que possa perder no Porto serão compensados pelos votos que o PSD vai ganhar no resto do país" que é contra o F. C. Porto. O PSD ganhou as eleições. Ainda conseguem dizer que o futebol é que é perigoso?

Falácia: acção de enganar com má intenção. Sofisma ou engano que faz com razões faltas ou mal deduzidas, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa."


PS: Curioso como o sr. Baldaia, nos vários exemplos que achou pertinente usar, não tenha referido a 'falácia' das Escutas...!!!

Como reduzir o tempo da justiça nos processos sobre corrupção

"Os portugueses, com razão, têm a percepção de que os grandes processos judiciais se arrastam eternamente sem que algo de punitivo daí surja para os seus autores.

Na recente entrevista ao Público/Renascença, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, mostrou-se muito preocupado com a morosidade da justiça, dizendo que “é de tal forma lenta que se morre antes de um processo chegar ao fim”. Já antes tinha chamado à atenção dos partidos para debaterem a questão, com vista a melhorar o sistema.
Os portugueses, com razão, têm a percepção de que os grandes processos judiciais se arrastam eternamente sem que algo de punitivo daí surja para os seus autores. O fenómeno leva alguns humoristas a representar a justiça com uns óculos escuros, uma bengala na mão e uma balança totalmente desequilibrada, em vez da clássica mulher com uma venda nos olhos e uma balança perfeitamente equilibrada.
Para se obter a perspectiva adequada à compreensão da estrutura básica do modelo de processo judicial, das suas soluções e dos seus princípios fundamentais, convirá começar por uma referência prévia aos fins ou metas que, em última instância, é legítimo esperar de um processo judicial no quadro de um Estado de direito democrático.
Quem estudar a matéria, verificará que o legislador do Código Processo Penal (CPP) se preocupou com a celeridade processual. Na verdade, no preâmbulo ao CPP, diz-se que a reforma processual penal, seguindo parâmetros do direito comparado, procurou, formalmente, a máxima celeridade na administração da justiça, apenas com um limite: o da sua compatibilidade com as garantias de defesa do arguido. No entanto, o dia a dia dos tribunais, nomeadamente os processos mediáticos sobre a alta corrupção, a correr termos nos tribunais, devem deixar preocupados todos os portugueses, uma vez que a previsibilidade da sua duração poderá apontar para uma total impunidade.
A máxima celeridade na tramitação processual assenta, em primeiro lugar, na consideração de que os julgamentos realizados no mais curto prazo e compatível com as garantias de defesa, é um direito fundamental dos cidadãos. Por outro lado, a máxima celeridade é também exigida por razões de prevenção geral, cujo efeito dissuasor é reconhecidamente maior do que o da severidade da pena tardiamente aplicada. Na prevenção especial, a celeridade serve para evitar uma estigmatização e adulteração irreversível da identidade dos arguidos.
E a quem interessa a celeridade processual?
O processo penal demasiado longo significa uma correspondente submissão do arguido inocente, a ficar mais tempo sujeito a medidas de coacção e poderá ficar socialmente prejudicado: empregos que se podem perder, permanente atentado à honra de alguém que se presume inocente, a saúde física e mental que poderá ser afectada, o stress, a angústia, a frustração, etc.
O interesse dos lesados ficam igualmente prejudicados no ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, porquanto ser indemnizado tarde e a más horas equivale, em certa medida, a não o ser: indemnização tardia é meia indemnização, pois a sua utilidade económica ficará gravemente comprometida.
A celeridade processual justifica-se ainda por uma razão de credibilidades do sistema judiciário e de vigência do Estado de direito. A propósito do sistema formal relativamente aos grandes e mediáticos processos, caminha-se a passos largos para um descrédito generalizado da justiça, devido à sua lentidão nos casos de corrupção, cifras negras de impunidade escandalosa, conduzindo ao que alguns autores chamam “sistema de injustiça criminal”.
A Constituição, no artigo 20º nº 4, fala em “ prazo razoável mediante processo equitativo”. O que é a equidade? Os moralistas dizem tratar-se de uma virtude especial, integrada na justiça e ligada à prudência, mais precisamente respeitante aos discernimentos dos casos singulares que escapam ao teor geral da norma. É encarada como uma justiça natural, superior à justiça positiva e, eventualmente, de outros valores necessários à humanização do direito. Por sua vez, os juristas dizem tratar-se de um valor, parte subjectiva da justiça, mediante a qual, consideradas as circunstâncias do caso, se deixa de observar a lei no seu teor literal, para salvaguarda da justiça e do bem comum. Assim, os dois conceitos constitucionais – prazo razoável e equidade – devem estar presentes numa boa interpretação das normas referentes aos prazos.
Perante o direito criminal vigente, devem, portanto, os tribunais encontrar o ponto de equilíbrio, ou seja, o prazo razoável, entre a procura da verdade material e o respeito pelos direitos de defesa dos arguidos. Mas, ninguém compreenderia que os crimes mais graves e cada vez mais complexos, como a corrupção, com cartas rogatórias (enviadas para o estrangeiro) para cumprir, ficassem por terminar, devido à limitação de tempo, frustrando-se o objectivo geral de prevenção do crime.
Daí que a celeridade processual dos crimes de corrupção deva ser obtida através de outros mecanismos processuais, pelo que se sugere aos partidos e deputados as seguintes medidas legislativas:
1.ª - Conceder carácter de urgência, em todas as fases, aos processos sobre corrupção.
2.ª - Em matéria criminal, sem prejuízo do disposto no n.ºs 2 e 3 do artigo 410 do CPP, os recursos interpostos para o Supremo Tribunal de Justiça visam exclusivamente o reexame de matéria de direito (art.º 434 do CPP). Ora, normalmente, a matéria de direito no âmbito criminal, suscita questões simples de resolver, pelo que seria de eliminar o recurso o para o Supremo, atribuindo aos Tribunais da Relação o poder de decidir, definitivamente, em matéria de facto e de direito. Esta alteração não colide com as normas constitucionais.
Não aplicando estas duas medidas legislativas aos casos de corrupção, não se vislumbra maneira de obter maior celeridade processual nestes processos e, dada a dimensão destes crimes em Portugal, o regime democrático caminha a passos largos para o seu total descrédito. (Juiz desembargador jubilado)."

Até à derrota final

"O grande problema do Sporting é, na génese, o mesmo que afecta a sociedade portuguesa. Reside na total ausência de qualidade, seriedade intelectual e formação da classe dirigente. A quantidade de ex-governantes, políticos, altos quadros do sector bancário e empresários envolvidos, por exemplo, em casos de corrupção serve de amostra. Não dá para enganar. O facto de os políticos aparecerem, agora, como arautos do bom senso a comentar a crise do Sporting chegaria a ser cómico, se não estivéssemos a viver um período de gravidade extrema, em que profissionais de futebol são atacados por bandidos no local de trabalho. Mas por que razão não falta quem agora aproveite os microfones para debitar opiniões tontas, tendo estado calado quando algo na mesma linha se passou num treino do Vitória de Guimarães? A resposta é óbvia e está no aproveitamento da projecção mediática de um dos maiores clubes de Portugal.
Esclarecida a questão desta colagem da classe política, tantas vezes em silêncio face a temas bem mais importantes, regressemos ao Sporting e aos seus dias negros. Em vez de andarmos a dissecar a personalidade do presidente Bruno de Carvalho, devíamos era tentar rapidamente perceber como é possível ter recebido, há três meses, o apoio de quase 90% dos associados em assembleia-geral, até dos que, agora, congeminam, no escuro dos gabinetes, uma fórmula para o tirar da cadeira do poder. Sejamos claros: as redes sociais não são a sociedade, mas dão-nos, cada vez mais, pistas para a interpretar: quem nunca sentiu uma alegriazinha ao ver os ataques do presidente do Sporting aos rivais? Poucos estarão inocentes, pois se agora o seu foco está apontado ao Benfica, esteve, quando chegou à presidência, direccionado ao F. C. Porto. Nesta caminhada rumo ao precipício, poucos escaparam ao discurso de um dirigente diferente dos outros, que se autoproclama "presidente-adepto".
Perante este quadro, ninguém é ilibado, embora a grande fatia de responsabilidade tenha de ser endossada aos sócios do Sporting, que se deixaram seduzir pelo discurso bélico e irrealista de Bruno de Carvalho. O futebol é uma seara propícia ao fogo do populismo. Não é de hoje. E será sempre assim, enquanto não percebermos todos que, no fim das competições, só um clube pode vencer. Mas Portugal, infelizmente, continua a ser o único país do Mundo onde os três resultados possíveis são vitória, empate e... culpa do árbitro ou de factores externos. A derrota, pura e dura, não existe."

Sim, é o fascismo (não há volta a dar)

"Vale a pena continuar a bater no ceguinho? Sim, vale a pena. Primeiro do que tudo, porque o ceguinho é tudo menos ceguinho; e depois (e acima de tudo) porque aquilo que ele representa no futebol vai muito para lá do futebol. É político, só político, exclusivamente político - e não me espantaria nada se o homem não estivesse já a pensar, um dia, lançar-se para a arena política, sabe-se lá com a cobertura de quem (ou sem a cobertura de ninguém, porque não é muito difícil inventar um partido em Portugal).
O que está em causa é político porque a forma como o homem assenta o seu poder naquele clube está há muitos anos escrita na história, teorizada de alto a baixo, diagnosticada, com provas dadas e milhões de mortos no caminho. Chama-se fascismo. Não tem outro nome: fascismo. Porque não se trata apenas de uma forma autoritária de exercer o poder. É uma forma autoritária de exercer o poder que alcança usando as regras da democracia, operando dentro dessas regras - e com o único propósito de as subverter, para não dizer arrasar. Esse é o mecanismo do fascismo. E faz isso falando ao coração de uma ralé violenta, multiplicando discursos de exploração da inveja social dessa ralé, fazendo de tudo uma permanente luta de classes. Dando a essa vasta massa, até agora inorgânica, a ilusão de que são eles que mandam, penalizando a seu bel-prazer os que na organização falham - ou seja, conferindo-lhes afinal um poder que acaba por ser bastante orgânico, portanto instrumentalizável (em favor do chefe), articulável, intimidatório. Um poder que, ainda por cima, tem outra virtualidade (do ponto de vista do interesse do líder): afastar para as periferias os que internamente se indignam mas que ao mesmo tempo pensam que isso não merece o seu máximo empenhamento porque afinal isto "é só futebol". Não, não é só futebol.
Ou melhor: é futebol, mas como terreno propício para que outras coisas bem mais vastas germinem, quiçá se transformem em votos, quiçá escolhendo políticos e quiçá começando também a ameaçar directamente os outros políticos concorrentes (ou do próprio partido que teimem em não ser reverentes ao chefe).
É certo que à credibilidade da organização de que falamos não ajuda o facto de o debate estar polarizado entre um chefe alucinado e dois banqueiros que quase só aparecerem nos jornais nas páginas de assuntos criminais. Mas entre uns e outros haverá pessoas sérias, e são essas que devem avançar. Percebam: é muito mais do que um clube que está em causa.

PS - Morreu António Arnaut. Não foi só o pai do SNS em 1978--79. Foi alguém que em 1973 ajudou muito Mário Soares a criar o PS e alguém que se manteve desde o início bastante bem informado sobre as movimentações dos militares que depois fariam Abril. E foi mais: um político como já há poucos, que não só deixou obra como o fez não ficando no fim nem mais rico nem mais pobre do que era antes da política. Tristes os tempos em que começamos a achar que homens assim são de excepção. Não deviam ser."

Corrupções, desinformações & populismos em ações. Um alerta!

"Penso que só há uma forma de retirar terreno a estes populismos: apostar numa comunicação plena e acessível, com informação factual sobre as nossas situações e políticas em curso, sempre na defesa do aprofundamento da coesão social e territorial.

Se é uma verdade factual-institucional, que em Portugal não existem partidos e ou movimentos organizados que possam ser baptizados de “populistas”, já não cola com a realidade, que se diga que não há no país a defesa de políticas, interveções e doutrinas “populistas”; há e revelam-se em “Partidos do Sistema” e em movimentos inorgânicos que, pela base e pela calada, agitam ideias e posturas anti-democráticas de cariz de “Salvação Nacional e Saudosismo”. Nos partidos, revelam-se em propostas, proclamações e posturas de cariz “populista”.
Considero que o “Populismo” de referência por cá, é o “Trumpismo”. Referência na metodologia para atingir o Poder (conquistando “Partido do Sistema”), na aposta, como público-alvo preferencial, no “Povo de Baixo”, na defesa de medidas anti-estrangeiros e na defesa de “soluções absolutas de poder”.
E actualmente, com a proliferação de casos pesados de corrupções, com uma justiça hiper lenta, e com a ausência de informação e debates de cariz ideológico e programático, por parte de partidos e órgãos de comunicação social, temos campo aberto para a proliferação do “Trumpismo à Portuguesa”.
Para aquecer o “caldo”, temos a proliferação de notícias falsas ou deturpadas ( “FakeNews” ) nas redes sociais, que ganham palco e assistências nas “conversas de café”. “Vimos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar!”.
Penso que só há uma forma de retirar terreno a estes populismos: apostar numa comunicação plena e acessível, com informação factual sobre as nossas situações e políticas em curso, sempre na defesa do aprofundamento da coesão social e territorial.
Para que tal aconteça e faça caminho, precisamos dos partidos, todos, dos órgãos de comunicação social, todos, e das intervenções das cidadanias democráticas, mais ou menos organizadas, mas todas.
Aos partidos, exige-se que defendam as suas políticas de forma clara e no quadro das correntes ideológicas que os fundaram e deverão sustentar. Ficarem-se por slogans, é quase nada.
Aos órgãos de comunicação social - jornais, televisões, rádios e plataformas internáuticas -, exige-se que o sejam de verdade. Que produzam informação rigorosa e acessível, promovam debates plurais e diversificados e que actuem no respeito do Estado democrático. Para tal, deve o Estado promover incentivos e medidas-programas.
Quanto às “Cidadanias”, cabe-lhes um papel fundamental, sem o qual o resto se esvairá, promovendo e realizando informação-comunicação, tertúlias e debates, programas culturais, acções de esclarecimento, visitas de estudo e intervenções formativas para cidadãos em pleno,´todas de base local de proximidade; nestas, considero que se devem incluir as “bases locais partidárias”, se o forem de facto.
Enunciado simples de escrever, embora discutível, mas de grande dimensão e complexidade para vir sendo realizado, tanto mais que se confronta com poderosos meios de escala global. Complexidade, muito porque exige tempo e perseverança para que os resultados floresçam.
Seja como for, fica o alerta e o desejo que não caia em saco roto, antes motive opiniões, intervenções e iniciativas que fortaleçam a Democracia e a Justiça Social.
“Mãos à obra”!?!

Ps: Texto escrito antes dos bárbaros acontecimentos do Sporting-Bruno de Carvalho, agora apenas digo que reforçam o que escrevi quanto ao “Trumpismo à Portuguesa”."

O verde e branco a brilhar bonito numa parede tão feia

"Perante o que aconteceu ao longo da semana, perante o que ouvi durante a final, é a pequenas imagens de jogadores de verde e branco que volto para me preservar, para preservar o Sporting que é o meu e que quero que continue a ser o meu.

O pior não foi a derrota, porque isto era só um jogo e havia coisas mais importantes a tratar. No Jamor, importava resgatar alguma coisa, um espírito, uma luz de esperança, uma reconciliação com o clube e com a ideia de clube que esta semana foi atacada e dinamitada de uma forma que deixará marcas terríveis, espero que não irreversíveis. Portanto, no Jamor, na mata do Jamor onde se organiza a festa mais bonita do futebol português, com gente a chegar de todo o país de madrugada para assentar arraiais e partilhar a felicidade que traz o belo jogo entre a comida na grelha e a bebida no copo, tentava recuperar esse espírito, viver esse espírito, tactear uma qualquer inocência perdida há muito, mas que continua a ser a ilusão que, apesar de tudo, apesar da podridão reinante em todo mundo da bola, permite que continuemos a apaixonar-nos pelo desporto que é mais um desporto. 
Esse era o objectivo e foi cumprido como habitualmente — carro estacionado às 9 da manhã, grelha e arcas frigoríficas carregadas desde a dois quilómetros de distância, festa popular instalada às 10h. O outro objectivo parecia-me também muito simples e, julgava eu, consensual. Dar desde as bancadas um abraço aos nossos em campo, aos jogadores que sofreram esta semana uma violência inaudita, sequestrados e agredidos em sua própria casa por um bando de marginais a quem se dá demasiada importância e liberdade de acção. Só o facto de estarem ali a jogar, perante um digníssimo Desportivo das Aves cheio de vontade de fazer história, como acabou por fazer, já me merecia o agradecimento. Queria ganhar, mas isso era, neste caso, secundário — há coisas mais importantes que ganhar, isso me ensinou o sportinguismo, e ali, mais que a vitória, era o Sporting que interessava.
Mas depois, na bancada, fui ouvindo, mais vezes do que desejava ou julgava possível, adeptos de verde e branco como eu falar de “falta de profissionalismo”, de “eles não querem e isto é uma vergonha”. Ouvi até piadas que me enojaram sobre a violência de terça-feira. Parecia que, afinal, isto era apenas uma final e que nada de especial tinha acontecido (coisas chatas do futebol, nada mais, “eles são pagos para jogar” e se não ganharam não passam de uns “merdas ingratos”). Parecia que não tinham sido atacados os princípios que nos foram legados sobre o que é o Sporting, parecia não ser a própria ideia de Sporting a ser posta em causa por toda a sucessão de acontecimentos da semana passada. Claro que não eram a maioria.
Claro que muitos pareciam perceber o que estava em causa. Mas eram muito mais do que julgava possível, muitos mais a manifestarem uma total falta de empatia, uma exigência absurda para com aqueles jogadores, um discurso de futebolês moderno, misto de lógica económica empresarial (o tal eles ganham muito, são empregados do clube e por aí fora) e a incendiária culpabilização de quem perde, porque isto é uma guerra e nem se fale em mérito do adversário, porque o adversário não tem virtudes, só serve para medir o nível da nossa incompetência.
O trabalho obrigou-me a sair do estádio com o jogo ainda a decorrer. Triste por sair mais cedo, triste por sair depois de ouvir aquilo que ouvi, triste por estar a perder 2-0 e triste por, eu que nunca saio antes do apito final, ter que o fazer no jogo em que era mais importante ficar para aplaudir os nossos de verde e branco, eles que tentaram em campo e que acabaram o jogo em lágrimas. Ficar também para dar os parabéns ao pessoal do Aves, ficar pela festa pela qual lutaram e pela luta que os nossos deram num esforço final. Ainda saltei a meio do caminho para o carro, punho erguido no ar, quando ecoou no vale do Jamor o golo do Montero. Liguei o rádio, esperei por um segundo golo, mas ouvi sem prestar toda a atenção. Na minha cabeça passavam outras imagens. Foram chegando terça-feira, enviadas pela João, que não percebe nada de futebol e que, como me ia escrevendo, não tem memórias de golos gloriosos ou de passes impossíveis, mas sabe distinguir o certo do errado, o feio do bonito.
Naquele dia trágico para o meu sportinguismo, enviou-me imagens de um tapume da cidade sempre em obras, um bocado de chapa banal, igual a todas. Discretas a polvilhar o cinzento, estavam umas fotos pequenas coladas entre riscos quase tags e tags quase riscos. Era o Yazalde, o Livramento, o Cristiano Ronaldo ainda miúdo, o João Mário já patrão, os festejos da Taça de 1995 e alguns outros e outra que não reconheci, mas que têm o equipamento verde e branco. Ela corredora do nosso histórico atletismo, eles, pela imagem, parecem dos anos 1960 (pode ser o Mário Lino, ou o Morais, ou o Osvaldo Silva ou o Hilário — tenho que ir lá confirmar). Não interessa, na verdade. São jogadores captados nos mesmos movimentos que os jogadores têm desde o início dos tempos da bola e que os meus avós coleccionaram nos papéis dos rebuçados, que os filhos deles viram nos jornais e, ocasionalmente, na televisão. Os mesmos que eu colei nas paredes, recortados de revistas e jornais, antes de bandas lhes tomarem o lugar.
“Parecem aqueles recortes e colagens que fazemos dos nossos ídolos na adolescência”, escreveu a João. Era exactamente isso e foi a isso que me agarrei naquele dia. A umas pequenas imagens de jogadores de verde e branco, tão bonitos e solares, discretos numa parede tão feia. Perante o que aconteceu ao longo da semana, perante o que ouvi durante a final, é a elas que volto para me preservar, para preservar o Sporting que é o meu e que quero que continue a ser o meu. Neste momento, resta-me isso: pequenas imagens a brilhar um pouco numa grande parede tão feia."

O Sporting como epifenómeno

"À luz da crise do Sporting, José Miguel Júdice avalia o sistema democrático em sociedades sem elevada cultura cívica e de cidadania. O que isto tem de grave ultrapassa o futebol, escreve o advogado.

Claro, é inevitável falar da crise do Sporting através dos acontecimentos que culminaram na derrota no Estádio do Jamor. Eu devo ter alguma carga genética errada, pois não leio jornais desportivos, não assisto aos permanentes debates televisivos sobre futebol… embora goste muito de ver jogos na televisão, ao ponto de resistir às constantes e compreensíveis queixas da minha mulher…
O meu problema é tão grande que recusei, para duas eleições distintas, os amigos convites para Presidente da Assembleia Geral de um dos três grandes (de que sou sócio) em listas que se previa que iriam vencer, como venceram. Mas desta vez li muita coisa (embora não em jornais desportivos, confesso cheio de vergonha…) e creio que se escreveram páginas de grande qualidade jornalística. Debates na televisão, ainda tentei; mas não consegui aguentar, por certo devido à minha tal deficiência genética.
Podia, por isso agora, nada dizer, copiando a célebre frase usada antigamente por advogados mais preguiçosos ou com excesso de trabalho e falta de tempo: “Ofereço o merecimento dos autos”. Não sou preguiçoso, tenho talvez trabalho a mais, mas posso alegar alguma coisa, porque creio que há uma abordagem a fazer, que ultrapassa o fenómeno futebolístico, a qual não foi ainda (que tenha notado) objecto de realce.
Essa abordagem tem a ver com o problema do sistema democrático em sociedades sem elevada cultura cívica e de cidadania. E da probabilidade séria de que a tendência para soluções não democráticas alastre por causa disso.

A Democracia exige “virtú”, racionalidade e altruísmo
várias vezes o tema foi por mim aqui suscitado, mas talvez nunca com tanta clareza.
1. Ao contrário do que muitos pensam, a liberdade e a democracia são vectores sociais opostos, existindo a tendência de cada um desses estimáveis valores para levar à destruição do outro.
2. Quer a democracia, quer a liberdade são fenómenos muitíssimo recentes na História da Humanidade. Nada permite afirmar que o que julgamos um estádio supremo de onde se não pode recuar, não se venha a revelar historicamente um curto interregno, apenas tão curioso como por exemplo os 50 anos do reinado siciliano de Frederico II de Hohenstaufen (a quem chamaram o “Stupor Mundi” e isto é um elogio…) na primeira metade do século XIII.
3. Desde o final do Século XVIII (melhor seria dizer, desde a vitória cultural do iluminismo que lhe foi anterior) existe um grande consenso intelectual/científico/moral quanto à tese de que um equilíbrio entre a democracia e o liberalismo será o melhor sistema paras as sociedades humanas (ou, como terá dito Churchill, a menos má de todas as possibilidades), mas que é preciso evitar o excesso de desigualdade e o excesso de igualdade: o primeiro mata a democracia e o outro a liberdade.
4. Os regimes participativos exigem o que os antigos chamavam “virtú” e um grau muito elevado de cultura cívica e moral. São regimes muito exigentes e frágeis, que pressupõem que os cidadãos considerem a participação na coisa pública como uma prioridade e a sua disponibilidade para isso uma realidade.
A ambição deste tipo de regimes é substituir as paixões pela racionalidade, o que pressupõe um grau elevado de moderação e altruísmo (esta última palavra foi curiosamente inventada no século XIX). Veja-se, por exemplo, o caso dos júris nos tribunais americanos: São eles a expressão cimeira do princípio democrático. Cidadãos sorteados a partir das listas eleitorais decidem em nome do povo que o réu é culpado ou inocente. Ora, se e quando o desinteresse cívico seja forte, a lógica do modelo desfaz-se, ficando apenas disponíveis os que por uma razão ou por outra nisso estão interessados.

A Democracia não é a vontade de 11,5%
Tudo isto tem a ver com o Sporting e com o futebol. E o futebol tem a ver com isto tudo: É um prenúncio de uma perigosa, mas lógica tendência. Algumas notas mais.
A primeira nota é óbvia: Não existe nenhuma razão metafísica ou moral para que os clubes de futebol sejam dirigidos de forma democrática. Mas, quando o são, os princípios subjacentes ao modelo democrático exigem a participação e o sentido cívico.
Segunda nota: O Sporting tinha no ano passado 160 000 associados. Na última eleição (em 2017) votou “um número recorde” e os sportinguistas “votaram massa”, disseram os jornais. Foram 18.755 os votantes, ou seja pouco mais de 11,5%, pelo que 88,5% dos eleitores se desinteressaram do dever cívico.
Terceira nota: Quando há pouca participação e apatia cívica, o sucesso ou insucesso de um candidato mede-se sobretudo pelo radicalismo e agressividade que prometa. O que interessa é conquistar minorias ativas radicalizadas, emocionais, nada interessadas no civismo, mas apenas nas vitórias e em saber quem é mais capaz de dar cabo dos rivais. Ou seja, não é a “virtú” e a racionalidade, mas a violência e as paixões selváticas que prevalecem.
Quarta nota: Essa realidade espalha-se como uma mancha de óleo na sociedade, tornando impossível mudar as coisas. Exemplos? Um grande político e ainda maior advogado (a quem chamaram “o príncipe da democracia”) não corou de vergonha quando disse em relação a uma situação de alegada corrupção, “se o dinheiro é para a Académica, não é crime”. Os debates televisivos que deviam envergonhar quem os exibe são instrumentos de criação de trogloditas e de exacerbação dos instintos mais rasteiros da alma humana.

O futebol e as fábricas de salsichas
O que isto tem de grave não é sobretudo a suspeição de que o futebol seja um desporto para alienados e que a “verdade desportiva” possa não passar de uma ilusão para incautos e ingénuos que gostam do desporto. O futebol é … futebol. Mas, em todo o caso, uma entrevista de Poiares Maduro há dias fez-me lembrar a história de que quem gosta de salsichas não deve ir ver como são feitas…
O que isto tem de grave ultrapassa o futebol. É um exemplo expressivo dos vícios imanentes ao modelo democrático, exacerbados em tempos de massificação, desinteresse pela coisa pública, egoísmo, falta de virtudes republicanas.

A Democracia pode matar a Liberdade?
E os sinais andam por aí nos Trump, nas Lega Norte, nos Movimento 5 Estrelas, nos Podemos, nos Viktor Orban, nos Maduro, nos Ortega, nos Jaroslvav Kaczinski, nos Le Pen, nos Melenchon e em tantos outros que já chegaram ou podem acabar por lá chegar. Eu sei que, por exemplo, a vitória de Macron em 2017 foi um sobressalto cívico, um momento de reacção à degenerescência do processo democrático. Mas, infelizmente, a sensação que tenho é que sucessos como esse podem revelar-se não mais do que sobressaltos numa tendência que se mantém para que a democracia destrua as liberdades e a própria ideia do “governo do povo, pelo povo e para o povo”.
Não sou propriamente um pessimista e sei o suficiente de História e dos Homens para não desejar que a democracia desapareça da face da terra ao fim de dois séculos em que tantos sonharam e morreram por ela e pela liberdade.
Sei também que talvez Rodolfo Giuliani não tivesse razão quando dizia que deixando poluir as paredes com graffiti ou permitindo que se quebrassem vidros sem penalizar o vândalo conduz à criminalidade violenta. Mas não é por acaso que associo essas teses ao que se está a passar no Sporting (e não tenham ilusões, podia estar a passar-se com qualquer dos outros clubes).

O escândalo da casa do líder do Podemos
anos, Pablo Iglésias disse que não se podia confiar num ministro da Economia que comprara uma casa por 600 000 euros. Agora, ele próprio comprou uma casa (com terreno ajardinado e piscina) por esse mesmo valor. Ele há coincidências do Diabo…
O ridículo mata duas vezes: Achar que comprar uma casa desse valor desqualifica para governar Espanha; E achar que se quem compra for de esquerda já não faz mal. Iglésias revela-se como um “señorito” e demonstra que por trás de um populista está, enfim, um Pablo Iglésias!

A ingratidão e o esquecimento não podem ser uma obra de arte
Uma nota final neste caso sobre a injustiça. Trata-se da Expo 98. Surgem todos os dias políticos e outros que se põem em bicos dos pés para reescrever a história do que foi um grande sucesso e aparecerem em destaque nas fotografias da época… onde não estão ou apenas surgiram para cortar fitas.
Por isso, queria aqui deixar uma palavra de louvor a três pessoas de que quase ninguém fala: Cardoso e Cunha, que em menos de cinco anos conseguiu que se concretizasse o que todos os especialistas achavam impossível; Mega Ferreira, que foi capaz de criar um evento cultural que nada tinha a ver com o que Portugal alguma vez fizera (pelo menos desde a Exposição do Mundo Português de 1940, mas era então mais fácil); E Manuela Brandão, que chefiava a equipa legal que conseguiu criar as condições jurídicas para que tudo se pudesse fazer e nunca se tivesse perdido um dos muitos processos que poderiam tudo ter impedido.
Sei do que falo, estive muito perto deles nesses cinco anos fascinantes."

Circus Lagartus - VII episódio