"Não sei se o Benfica será a única fonte de inspiração do presidente leonino, mas é, seguramente, a principal e sem ela veria a sua caudalosa inspiração secar-se-lhe num ápice. Ficaria sem temas de conversa, o que, apesar dos incentivos que alguns adeptos lhe dispensam, não seria mau de todo, na medida em que, no universo do leão, está por avaliar a influência da ala mais frenética no apoio a esta política truculenta, do tipo nós contra todos.
A propósito, depois de se ter pronunciado nos modos em que o fez acerca de um almoço entre figuras benfiquistas e sportinguistas que parece ter anos e acontecer com alguma regularidade, não será de estranhar que os jogadores que representaram o emblema do leão na campanha de Inglaterra em 1966 sejam igualmente alvo da fúria presidencial por terem aceitado a homenagem que o Benfica, na pessoa de Luís Filipe Vieira, fez aos magriços por ocasião da gala dos Prémios Cosme Damião.
O futebol cativa e entusiasma. É espectáculo de multidões, intenso e vibrante, além de cenário de apreciável beleza quando praticado por jogadores de elevada craveira técnica. É ainda factor de agregação e de convívio e nunca pasto de intriga e de agressão verbal (ou até física...). O futebol suscita a discussão acalorada, mas jamais deve ser utilizado como via de promoção da maledicência ou do insulto.
Atenção, que não quero dizer que o presidente benfiquista é o cordeiro e sportinguista o lobo mau, nada disso, mas é evidente que existem diferenças entre ambos, muitas e significativas.
1. Luís Filipe Vieira chegou à presidência do Benfica há mais de dez anos com quase tudo por (re)fazer. O actual Estádio do Sport Lisboa e Benfica acabara de ser inaugurado, coincidindo com o final de mandato de Manuel Vilarinho. A seguir foi preciso recuperar a credibilidade de instituição espezinhada por gestões irresponsáveis, tirá-la da situação de ruína e travar árduas batalhas na recuperação do bom nome da águia. Ao mesmo tempo que se desenvolvia o fantástico espaço do Seixal e se erguia em redor do estádio um complexo moderno e à dimensão da grandeza do clube.
Bruno de Carvalho só teve de sentar-se à mesa e servir-se do que algumas ovelhas tresmalhadas do rebanho lhe deixaram. O resto já estava feito. Lançou, no entanto, a primeira pedra do pavilhão e prometeu a conclusão para este ano de 2016.
2. Luís Filipe Vieira é um presidente de tribuna, defensor de projectos e de causas. Desde a primeira hora pugnou pela verdade no futebol português, sem truques, nem esquemas. Privilegia a discrição e creio que durante o seu já longo consulado os dedos de uma mão sobram para registar os excessos por ele praticados, o que nada tem a ver com a elevação do tom de voz na salvaguarda dos interesses da águia.
Bruno de Carvalho é um presidente de banco, cercado por inimigos que só ele consegue ver para mais facilmente dar gás aos conflitos que gera. Tem-se limitado a adaptar manigâncias do passado e a recolocar no centro da discussão a arbitragem, esgrimindo, porém, argumentação já gasta de tanto uso.
3. Luís Filipe Vieira deseja conquistar muitos títulos, sobretudo no futebol, mas nunca permitiu ficar refém deles e demonstrou-o há três anos quando, contra tudo e contra todos, segurou Jesus em temporada de fracassos. Fê-lo em obediência ao plano que idealizara, convicto de que um título perdido não pode afectar a estrutura do edifício desportivo.
Bruno de Carvalho enveredou pela promessa fácil e inventou dinheiro para captar a cumplicidade dos mais distraídos da família leonina, acenando-lhes com um campeonato, sem se dar conta que ao fazê-lo ficou prisioneiro dessa estratégia de casino, por ter mais a perder do que a ganhar. Se não for campeão vai ser o primeiro, e se calhar único, culpado a quem será apontado o dedo acusador por falta grave. Se o Sporting for campeão, como provavelmente será, vai ter de contentar-se com o resto da sobremesa que lhe puserem no prato. Sim, porque em cada jogo, quem ganha ou quem perde é o treinador, não é o presidente, e com o feitio que se lhe conhece, se os foguetes estrelejarem, Jesus não costuma facilitar nos aplausos. O pai do título será ele e mais ninguém..."
Fernando Guerra, in A Bola