Últimas indefectivações

terça-feira, 8 de outubro de 2019

Um Benfica (e não só) apenas para consumo nacional?

"De repente, o doméstico gigante Benfica entra nos jogos da Champions metamorfoseado em anão Benfica europeu

1. Não foi apenas o jogo em São Petersburgo. Têm sido quase todos os jogos europeus, de há umas épocas a esta parte. A regra - evidentemente com excepções para a confirmar - tem sido a mutação do Benfica europeu num conjunto de bons rapazes, que não conseguem disfarçar a dificuldade de transição de um joguinho por cá, contra equipas menores, para um jogo por lá, contra equipas europeias. Muito me custa constatar a insuficiência e a penosidade com que, há já tanto tempo, o Benfica se apresenta na Liga dos Campeões. E se é certo que, contra clubes de outra galáxia, não admira que tal aconteça, contra clubes mais acessíveis, senão mesmo sofríveis, não é entendível que assim seja. Chame-se o opositor o Basileia da Suíça, o Zenit ou o CSKA da Rússia, ou outra qualquer equipa mediana. Dói-me a comparação com outras equipas também medianas, que conseguem medir forças com os poderosos. Só nesta jornada europeia, vimos os belgas do Club Brugge a empatar em Madrid, o Salzburgo a perder por 3-4 em Liverpool, depois de notável recuperação, e o Ajax a dar três secos em Valência.
A verdade é que o Benfica joga com medos, comete erros de amadorismo, perde sistematicamente confrontos mais físicos e robustos, erra passes com uma frequência inusitada, oferece golos de toda a espécie (ainda agora foram três, sendo o facilitado por Fejsa resultante de se jogar mastigadamente em zona defensiva de risco). De repente, o doméstico gigante Benfica entra nos jogos da Champions metamorfoseado em anão Benfica europeu. Os jogadores até podem ser os mesmos, o que é diferente é o ritmo, a intensidade, a luta nos lances divididos, a verticalidade e a eficácia, para o que - por falta de hábito no campeonato doméstico e outras coisas - a equipa não tem antídoto. Por cá, as pequenas equipas tremem diante do Benfica. Lá fora, a música é outra: é o Benfica a tremer diante de qualquer apenas razoável clube, denotado uma evidente falta de estatuto ou arcaboiço. Aliás, vimos nesta jornada Benfica e Porto, com notórias dificuldades defensivas, que cá só sentem nos poucos jogos a doer entre eles e pouco mais, sendo que o normal é um passeio pelo nosso campeonato sem serem postos à prova. O que, em regra, mais salta à vista nas equipas portuguesas são os deficitários grau de intensidade e nível de concentração, mesmo contra equipas de campeonatos não longe do estatuto do nosso.

2. O exagero no futebol é o que melhor embrulha a paixão. O exagero vive de sinais exteriores. Expressionista, precisa de interlocutor que o aproprie. E que, de exagero em exagero, o propague. Até se anular por excesso. Como o peixe que morre pela boca, a exageração morre por apoplexia. Constrói a sua própria morte. Mas deixa as suas próprias cinzas.
Proclama-se alto e bom som que o título europeu vai ser uma realidade já não longínqua. Como se tais palavras passarem a fronteira e se ouvissem, ao menos em Badajoz. Infelizmente, proclamar um Benfica triunfal na Europa, é, por agora, um desvario onírico, tal qual seria o de um Vitória ou Marítimo anunciarem a próxima conquista do campeonato nacional.
Sejamos realistas. Verdadeiramente, o exagero esvazia-se em nós, porque a nossa medida fora dos outros sempre se reduz à normalidade, que é que resta depois de extraída a exageração. Dispensemos, pois, a inflação métrica contida no exagero.
Sejamos atrevidos e ousados. Mas com uma dose certa e prudentemente calibrada entre a racionalidade da percepção e a emocionalidade da sensação. É bom almejar objectivos que nos desassosseguem positivamente, que nos façam olhar para a frente com ganas, que sejam um incentivo para ultrapassar temores, obstáculos, tradições, estatísticas. Mas que não se confundam com utopias que, por tão irrealizáveis, se transformem em desnecessárias frustrações anímicas.
Sejamos pragmáticos. Isto não vai lá com a fábrica do Seixal, por melhores resultados que tenha (e tem sido mesmo). E também não vai lá com o excesso de mercantilismo de o Benfica ser um óptimo aviário, mas com os ovos ainda quentinhos a desaparecer em fulminante pouco tempo.
A aposta estratégica na formação é de enaltecer a aplaudir. Mas não podemos dela fazer a poção mágica asterixiana. Entre a excelente capitalização da formação num ano e a sucessiva descapitalização/venda nos imediatos anos seguintes, correm-se riscos não despiciendos. Foi, assim, que subestimámos o necessário plantel para o penta, quando confiámos demasiado na boa inércia.
Reconheço que o Benfica tem tido um assinalável encaixe com os seus jogadores, que muito terão contribuído para um balanço a caminho de um desejável equilíbrio e indutor de sustentação no futuro, ultrapassada a terrível fase em que, no clube, não havia dinheiro sequer para fazer cantar um cego. Mas, nostálgico que sou, acho que, por vezes, não se podendo evitar a saída de grandes jogadores, talvez se devesse fazer mais qualquer coisa para alongar a sua permanência. Vejamos alguns exemplos, desde a temporada 2010/11 /entre parêntesis, os anos na equipa principal): Di Maria (2 anos), Witsel (1 ano), Ramires (1 ano), Nolito (1 ano), Matic (2 anos), Enzo Pérez (2 anos), Oblak (meio ano), Lindelof (1 ano), Mitriglou (1 ano), Jovic (1 ano, não jogando), Jiménez (2 anos), Ederson (ano e meio), Talisca (2 anos). E quando a jovens saídos da formação, entre outros, tivemos Nélson Semedo (2 anos), Gonçalo Guedes (1 ano), André Gomes (2 anos), João Cancelo e Bernardo Silva (quase não jogando na equipa principal) e João Félix (meio ano).

3. Como sócio benfiquista, avalio esta década directiva muito positivamente, jamais diminuindo a importância da reconquista da hegemonia nacional traduzida em cinco campeonatos nas últimas seis temporadas. Mas, com o mesmo benfiquismo, não me isento de, séria e ponderadamente, exprimir tanto a convergência como a diferença de pontos de vista. Nesse contexto, há um ponto que deveria merecer uma reponderação estratégica, qual seja a de encontrar um mais cadenciado ritmo do poliedro do futuro. As faces deste ecléctico poliedro (entre outras) são os resultados desportivos, a sustentabilidade financeira, a valorização patrimonial, a formação de homens e atletas e a qualificação permanente de uma estrutura profissional eficiente. Ora, tal como num poliedro, todas as faces contam e nenhuma se submete a qualquer outra, pois só assim o resultado global é melhor o mais permanente, ainda que, às vezes, mais demorado nos efeitos. Domingos Soares de Oliveira disse há pouco tempo que «a intenção é reforçar sempre a nossa capacidade competitiva, sem comprometer o equilíbrio». Não posso estar mais de acordo. Mas, escolher é uma opção que implica renúncias. Quero dizer: se se quer ter uma equipa à prova da Europa tem de se tentar agarrar durante mais tempos os talentos (é até curioso que na classificação do montante das vendas de passes o Benfica está sempre no top, e, ao invés, perde sucessivamente nos jogos no campo=. Tenho plena consciência de quão difícil isto é num mercado desnivelado e no eldorado de oportunidades para jovens aturdidos pelo dinheiro fácil. Não estou - repito - a desmerecer óptimos negócios que se fizeram, mesmo que a contragosto directivo. Mas, por vezes, fica-me a ideia (justa e injustamente) que se opõe o mercado à frente do objectivo de construir e sobretudo estabilizar (sublinho: estabilizar) uma equipa à altura dos pergaminhos europeus do clube. O mesmo se pode questionar quanto ao crescimento tão intensivo e acelerado do Seixal 5 estrelas, no que ao desenvolvimento logístico e de infra-estruturas diz respeito. Ou a um Estádio da Luz que, secundarizando direitos e a genuinidade do apoio dos seus indefectíveis sócios, faz do modelo corporate da sua lotação um ganho financeiro acrescido, com ilustres visitantes (muitos não benfiquistas) que por lá passam para beber uns copos e dar umas garfadas nos intervalos. Ou, agora, essa patética questão da mudança do emblema do Sport Lisboa e Benfica, para o adaptar aos novos desafios de um modo global, como exigência para a dita «internacionalização da marca»...

4. Uma última nota para Bruno Lage, que, subitamente, é alvo de críticas, sobretudo de quem tem memória curta, ou de quem vai na onda de certas conclusões excitadas dos sempre excitados canais tabloidizados. Bem sei que a apreciação de um treinador é semelhante ao registo num sismógrafo, uns tempos em estado de graça plena, outros tempos em plena desgraça, e quão eloquente é o ser-se treinador-às-segundas-feiras. Continuo a pensar que Lage é o treinador certo para o Benfica. Creio que qualquer outra alternativa possível para ocupar o seu lugar não teria vencimento. É um homem inteligente, sério, educado, motivador, sensato, bom gestor de meios. Toma, em regra, boas decisões e assume riscos, não se escondendo na omissão, no deixa andar, no passar entre os pingos da chuva. Comete erros? Quem não os comete? Para mim, o saldo continua a ser muito positivo e merece, sem reservas, a minha gratidão."

Bagão Félix, in A Bola

As faces do VAR

"IFAB impôs um protocolo universal mas não criou uma só estratégia de actuação

No domingo, a Roma cedeu empate frente ao Cagliari, em jogo onde mostrou o seu desagrado por uma indicação do VAR, que anulou um golo por alegada falta de um atacante antes da bola entrar. Na semana anterior, os adeptos do Aston Villa ficaram a espumar de raiva depois do videoárbitro propor anulação de golo por eventual fora de jogo. A verdade é que as imagens deixaram dúvidas.
Há poucos dias, a CONMEBOL optou por divulgar os áudios relativos à decisão de anular três golos ao Flamengo (jogo a contar para a meia final da Libertadores). Fê-lo para tentar dar credibilidade ás intervenções do videoárbitro que coadjuvou Nestor Pitana, um dos melhores do mundo. Também os adeptos da Chapecoense apelidaram de «roubo de igreja» o golo validado a Bruno Henrique, que permitiu ao Fla sair vitorioso da visita ao lanterna vermelha do Brasileirão. Anteontem, Herrera confessou não compreender o «critério de algumas intervenções» do VAR na La Liga, referindo-se concretamente a um pontapé de penálti assinalado a favor do Valladolid na partida em que os colchoneros empataram. Quem também ficou com os cabelos em pé foram os adeptos do West Ham, perante derrota frente ao Crystal Palace (1-2), alegadamente por influência nefasta do árbitro de sala.
Estes são apenas alguns dos muitos exemplos que uma pesquisa rápida pelo Google permitiu encontrar sobre «decisões polémicas» nos últimos dias. O VAR, que veio para ficar e é uma das melhores invenções que a tecnologia já ofereceu ao futebol, tem o tal longo caminho a percorrer. E esse é um caminho transversal a todas as ligas e competições onde está agora implementado. A introdução da ferramenta mudou o paradigma do jogo e já todos percebemos isso: criou uma nova forma de decidir; impôs aos árbitros, que sempre decidiram em campo, a obrigatoriedade de passarem a fazê-lo fora dele; obrigou-os a preterir das vivências físicas para video-optarem pela decisão que as imagens impõem, enfim, deu-lhes mais meios mas pouco tempo para amadurecerem a sua nova função.
Também as estruturas - todas as que usam VAR nas suas competições - estão agora a aprender a lidar com este menino, que parece ter nascido sem livro de instruções. Se calhar é por isso que cada uma cuida do bebé à sua maneira. Enquanto umas mostram todas as decisões nos ecrãs gigantes, outras omitem essa informação dos adeptos. Enquanto algumas divulgam áudios das decisões sensíveis, outras escolhem não divulgar o que quer que seja. Enquanto umas comentam lances controversos, outras preferem não falar sobre nenhum. Há todo um leque de opções, usado aqui mas não ali, acolá mas não além. É uma pequena grande confusão, onde cada um parece tentar controlar danos o melhor que pode e sabe, mas em que apenas sobressai uma gigantesca falta de organização e preparação para o que aí vinha.
Era expectável que a viagem fosse turbulenta. Era expectável que gerasse ruído, desconfiança e descrença. Certo. Mas até por isso, convém perguntar: como é que o IFAB, que impõe um protocolo universal, não se antecipou a tudo isso, criando também uma só estratégia de atenção? Algo que não dependesse desta ou daquele mas que estivesse bem acima de penaltis e contestação, em qualquer competição, após qualquer tipo de decisão? Como é que não pensou nisso antes, com cabeça, tronco e membro?
Quando as motivações políticas são mais fortes do que aquilo que verdadeiramente importa, dá nisto.
Enfim."

Duarte Gomes, in A Bola

Saco para bater à vontade

"Quando o ambiente deveria estar mais carregado para Conceição, por ter deitado janela fora 50 milhões de euros, é Lage que está a ser julgado no tribunal de rua

Se as duas principais referências do futebol do Benfica neste momento, Rafa Silva e Pizzi, na Selecção apenas detêm o estatuto de suplentes pouco utilizados, sobretudo o segundo, é porque algum défice qualitativo haverá no plantel encarnado, além de constituir prova inequívoca de ligeireza como foi abordada e substituição de dois elementos que há um ano desempenharam papel muito relevante na concretização de reconquista, Jonas e João Félix, ambos em meia época, mas que, no conjunto, valeram 26 golos.
Há, nitidamente, uma dependência excessiva daqueles jogadores e isso é preocupante por espelhar a dificuldade do colectivo em apresentar alternativas de acordo com as suas ambições desportivas.
Empolgado pela soberba afirmação futebolística do miúdo Félix, Lage ter-se-á iludido e não deu ouvidos ao que a prudência lhes sussurrou: miúdos há muitos, mas não como este, uma rara preciosidade, pelos golos que produz e pela arte que exibe, suscitando a eterna discussão sobre se deveria ficar mais um ano ou se, pelo contrário, o valor da sua venda foi argumento irrecusável. Claro que foi. O problema residiu, quanto a mim, na reorganização do plantel em função das saídas das peças mais talentosas e diferenciadoras. Essencialmente, o Benfica perdeu engenho e classe e ao tentar compensações na força e no músculo, adquirindo ou promovendo artífices de duvidosa aptidão, além de opção muito discutível, abusou da sorte e abriu antena ao ruído da discussão inútil.
Juntar no pilar central um Taarabt voluntarioso e trapalhão a um Fejsa vagaroso e limitado, em que cada qual jogo para si, é meio caminho para as coisas correram mal, como se tem verificado. Acrescentarei mesmo tratar-se de um equívoco completo porque o sérvio já não devia estar e o marroquino, além de não ser nenhum talento, aos 30 anos, já esbanjou tempo demasiado na sua carreira.
Admito que Lage veja nele chave para uma dificuldade concreta, mas deve moderar o entusiasmo quando se refere ao seu Adel, muita parra e pouca uva, ao mesmo tempo que continua a ostracizar Samaris, esse sim, o cimento de que foi construída a trave mestra do campeonato 38, primeiro com Gabriel e depois com Florentino. Isto, os adeptos sabem, porque viram, foram testemunhas dessa revolução triunfal e legitimamente interrogam-se: será que o grego treina-se mal? É rezingão? Provoca mau ambiente? Talvez um pouco de tudo, mas como quem tem a obrigação de explicar escolhe o silêncio é natural que se sujeite a comentários depreciativos que podiam muito bem ser evitados.
E a respeito de Zivkovic? Outro mistério, por se ver nele, com aquele prendado pé esquerdo, condições favoráveis para mais satisfatoriamente responder às adaptações que Lage já experimentou e fracassaram à nascença, exemplos de Gedson e Taarabt no apoio a Seferovic, outro que mantém uma conversação difícil com a bola.

Bruno Lage não vai cometer o erro de transformar o Benfica numa equipa de adaptados, nem recusar as mudanças que se impõem. Por isso, encaro mal esta vaga maledicente que pretende transformá-lo num saco no qual se pode bater à vontade sem receio de reacção, embora reconheça que foi um lapso de avaliação grosseiro pensar que saíam Jonas e Félix e tudo se resolveria com Tomás e Vinícius, sem mais nada.
Em relação à última época, por esta altura, nenhuma diferença significativa existe em comparação com o principal rival, FC Porto. Há um ano o Benfica tinha mais dois pontos, agora estão a par, mas a questão central é outra e quando o ambiente deveria estar mais carregado de nuvens para Sérgio Conceição, por ter falhado a entrada na Liga dos Campeões, deitando janela fora 50 milhões de euros coincidentemente com o maior investimento de sempre feito pelo dragão, como li em A Bola, na ordem de 60 milhões, para recuperar a hegemonia perdida para o Benfica, é o trabalho de Bruno Lage que está a ser julgado no tribunal de rua.
O treinador encarnado foi apanhado na corrente de ar provocada pelos que cobiçam o poder na águia - abro aqui um parêntesis por causa das mais recentes declarações do treinador da equipa B, desmesuradas e merecedoras de rápido e total esclarecimento interno - e tropeçou nas suas próprias dúvidas, o que é absolutamente normal, em relação às opções a tomar, ao nível da filosofia, da estratégia ou da táctica. Venceu, todavia, na batalha da comunicação. Conseguiu fazer prevalecer as suas regras, é verdade, mas exagera na teorização do conhecimento académico, a que o adepto comum liga pouco, em vez de se aproveitar dele na valorização da prática diária e virar o discurso na direcção dos temas que os destinatários querem ouvir: causas, responsabilidades e soluções, sem máscaras.

Fernando Santos - Cada caso é um caso. Em obediência a esse princípio, Fernando Santos fez bem em respeitar as suas convicções e convocar Rúben Semedo, apesar de tudo. Selecção que representa um país civilizado não é albergue obrigatório de todos os futebolistas sobretotados. Primeiro está a sociedade, os títulos vêm a seguir. A França deu o exemplo ao Mundo com Benzema. Sem ferir este princípio, Portugal privilegia igualmente a reinserção, objectivo capital de todas as políticas sociais: para Fernando Santos, primeiro estão os homens, os resultados vêm a seguir."

Fernando Guerra, in A Bola

O dândi do Vale de Chelas...

"Casaco cintado, colarinhos engomados, a poupa do cabelo arranjada à força de brilhantina. Rogério, o Pipi, foi inconfundível. Só no Brasil encontrou um jogador que não suportava ter um cavalheiro a seu lado. A experiência no Botafogo foi curta. O Benfica foi sempre o seu destino.

Chelas. Uma cidade dentro da cidade. Vale de Chelas. E Marvila. E a freguesia do Beato, a antiga fábrica dos fósforos, no tempo em que se escrevia phósphoros, o Alto de São João lá em cima.
Foi aí que nasceu Rogério.
Precisamente no local onde viria a ser, mais tarde, o Bairro da Madre de Deus.
O irmão, Armínio França, jogava no Chelas. Rogério seguiu-lhe as pisadas.
Já o pai de Rogério fora fundador do clube.
Ainda estudou até ao 4.º ano do liceu. O Rogério, digo. Depois foi trabalhar, porque Chelas era lugar de gente de trabalho, de lojas e armazéns e indústrias que alimentavam os desejos incontidos da grande Lisboa. No Grémio das Carnes conheceu Fernando Peyroteo, vindo lá de Humpata, Angola, africano branco, avançado poderoso, goleador como quase nenhum.
Peyroteo viu-o jogar. Aliás, chegaram a jogar juntos. Peladas inconsequentes, de brincadeira.
Estavam destinados a ser adversários.
Houve a proposta do Sporting, claro. O Lumiar e os seus luxos.
Mas o Benfica foi mais longe: 10 contos de réis para o Chelas, que não nadava em dinheiro, e 16 para Rogério Lantres de Carvalho.
Mais mil escudos do que a oferta leonina, não tão leonina quanto isso, se nos ativermos ao adjectivo.
Rogério queria o Benfica. O Benfica queria Rogério.
Assim foi.
Nos seus primeiros jogos de camisola encarnada vestida, havia sempre um público especial a acompanhá-lo: os seus amigos de infância camaradas de Chelas, esse bairro com memória, que não esquece nunca. Ocupavam os seus lugares nas bancadas e só tinham olhos para Rogério e palmas para Rogério.
E Rogério oferecia-lhes, em troca, algum do futebol mais bonito, mais elegante, mais perfeito que Portugal já viu.

O dândi
Era moço apessoado.
Casaco cintado, colarinhos engomados, poupa encharcada em brilhantina. Um elegante. Um dândi. Um pipi.
Ficou Pipi: Rogério Pipi.
Esteve no Brasil, no Botafogo. Era tão bom, que até os brasileiros se dispuseram a gastar 40 contos nele. Muito dinheiro. Dinheiro forte. Rogério foi.
Tinha acabado de casar, suportou a vaidade de uma das maiores vedetas do futebol de todos os tempos, Heleno de Freitas, viciado em lança-perfume, em casinos, em mulheres, na adulação das pessoas que gravitavam em seu redor. Heleno de Freitas era pipi que chegasse para não querer um Pipi, ainda por cima português, perto de si. Morreu louco. Inevitavelmente louco.
Rogério regressou ao Benfica. Chegou a ser absolutamente, profissional, nessa altura. Isto é, vivia do futebol, só do futebol, o que não era grande coisa, convenhamos, o futebol não servia para pagar todas as contas lá de casa, mulher e filho e tudo.
Encontrou novo emprego, agora na Auto Boavista, como vencedor. Era sedutor, o Rogério Pipi. E famoso. Não havia quem não quisesse ter um carro comprado ao Rogério do Benfica. Do Benfica e da selecção.
Há um fotografia de Rogério que fica para sempre!
Ergue, orgulhoso, a Taça de Latina, ganha ao Bordéus depois de dois prolongamentos.
A única Taça da Latina que existe em Portugal.
É verdade que o capitão não era ele, mas foi capitão nessa tarde de glória do Jamor. O capitão era Moreira, mas Moreira caiu durante a batalha. Estavam Félix Antunes e Rosário. E Arsénio e Julinho e Corona. E Rogério Lantres de Carvalho.
O seu sorriso é contido, como se exige a um cavalheiro. Tem a taça, lindíssima, levantada ao ar, mãos ambas. A noite já caía no Estádio Nacional.
Quatro anos depois foi embora. Era outro Benfica. O Benfica do profissionalismo por completo, e Rogério já não tinha tempo para isso. Regressou a Chelas, e o Chelas já não existia. Misturava-se com o Fósforos e dera lugar ao Oriental.
Armínio, seu irmão, convenceu-o a continuar a jogar. Em boa hora. Em 1956, o Oriental voltava à I Divisão. Na frente do ataque, um homem bem equipado, na sua pose quase inconsciente de lorde inglês, os cabelos penteados a brilhantina e um fogo no olhar que pressagiava golos.
Era o Rogério.
O Pipi."

Afonso de Melo, in O Benfica

Renascer das cinzas

"Os 'encarnados' foram os primeiros a prestar auxílio à Associação Desportiva Ovarense, num bonito gesto de solidariedade

18 de Maio de 1950, o relógio marcava 02:30 da madrugada e a pacata vila de Ovar acordava alarmada. Um violento incêndio deflagrava na estreita Rua Cândido dos Reis, num prédio de dois andares. No rés do chão, quatro estabelecimentos comerciais ficaram danificados e no 1.º andar, onde estava a sede da Associação Desportiva Ovarense, tudo ficou brutalmente reduzido a cinzas. Num par de horas ardeu 'todo o relicário desportivo de 20 anos de clube', inclusive a taça do Campeonato Nacional da III Divisão, única no distrito, 'ganha com tanta lisura e fadiga' 15 dias antes da tragédia. Rapidamente o clube vareiro recebeu, de várias agremiações desportivas, provas de amizade e simpatia, mas o primeiro a dar expressão prática aos desejos de auxílio foi o Benfica.
No regresso de Braga, onde foi convidada a fazer parte do festival de inauguração do Estádio 28 de Maio, a equipa principal do Benfica efectuou, por iniciativa própria, um jogo com a equipa de Ovar cujas receitas reverteram, na íntegra, para a reconstrução da sede daquele clube. Num dia fizeram parte de um espectáculo grandioso, assistido por altas individualidades do país em todos os sectores de actividade e, no dia seguinte, imbuídos dos valores de fraternidade, solidariedade e humildade, partiram em auxílio de uma agremiação reduzida a cinzas. É, também, isto que define o Benfica.
As ruas encheram-se para receber os campeões nacionais. Havia bandeiras, bandas filarmónicas, vivas, palmas..., uma festa. Não só tinha chegado o Benfica, mas, mais importante, aquele era o primeiro acto de auxílio prestado ao clube da terra. O campo Francisco Marques da Silva estava lotado e o jogo entre os 'encarnados', formados por uma equipa mista de honra e reservas, e o clube vareiro decorreu em atmosfera de entusiasmo. O gesto altruísta do Benfica ficou perpetuado numa placa de mármore à entrada do campo.
Para casa trouxeram a Taça Solidariedade, oferecida pelos benfiquistas de Ovar, e uma salva de prata, oferecida pela direcção da Associação. Quatro anos depois, convidaram o Benfica para a inauguração do novo parque de jogos da Ovarense, prova da estreita relação de amizade que os dois clubes mantiveram.
Pode saber que outros troféus resultaram de causas de solidariedade e amizade entre o Benfica e outros clubes da área 8 - Outras Conquistas, no Museu Benfica - Cosme Damião."

Marisa Furtado, in O Benfica

Estabilidade no Voleibol

"A nossa equipa masculina de voleibol disputará a Supertaça no próximo sábado, em Almada, às 17h00. Depois de ter conseguido o triplete em 2018/19, algo que aconteceu pela segunda vez na história, os seniores encaram a nova temporada com o objectivo de voltar a ganhar todas os troféus nacionais e de dar um passo em frente em termos europeus.
Após várias épocas a competir na Challenge Cup, competição na qual chegou a atingir uma final, o Benfica inscreveu-se na Liga dos Campeões e lutará pelo acesso à fase de grupos. Um avanço importante para a evolução dos seus atletas nos palcos internacionais, mas também para a própria modalidade.
Sob o seu comando pela segunda época consecutiva, Marcel Matz garantiu, na apresentação da equipa à comunicação social, foco e empenho para enfrentar a temporada com esta particularidade especial da participação na pré-qualificação da Champions. “Fizemos uma época muito boa, alcançámos quase todos os objectivos que tínhamos traçado e a expectativa para a nova temporada é mantermo-nos no topo e trabalhar mais ainda. Há muita motivação por parte do staff. Estamos muito preparados e ansiosos para começar e alcançar todos os objectivos que são muito claros para nós: vencer todas as competições em Portugal e tentar fazer um trabalho bem longo na Europa”.
E no trabalho que tem vindo a ser feito, nota de destaque para a presença de cinco atletas provenientes da formação no plantel. Manuel Rodrigues e João Simões estão desde os minis e contam com oito anos de casa. Miguel Sinfrónio, Afonso Guerreiro e Kelton Tavares são os outros exemplos de como a formação também não é esquecida no voleibol. Ao mercado externo, a equipa avançou somente para a aquisição do atleta brasileiro André Aleixo, mais conhecido por Japa, numa clara aposta na estabilidade para esta época.
Ao longo da pré-época, a nossa equipa disputou várias partidas, destacando-se os triunfos no Torneio Internacional, organizado na Luz, e no Torneio das Vindimas, no qual defrontou e venceu na final a Fonte do Bastardo, o adversário da Supertaça que se realizará no próximo fim-de-semana.

P.S: Destaque para a realização, em Setembro, do Torneio de Apresentação das equipas de Formação. Mais de 215 praticantes do Sport Lisboa e Benfica estiveram na Luz, num claro sinal de vitalidade do voleibol no Clube. Nota ainda para a nossa equipa feminina, cujo regresso à competição, na temporada passada, resultou na subida à 2.ª divisão. O campeonato já começou e vencemos, por 0-3, o CN Ginástica na primeira jornada."

Chama Imensa... Diogo, Pinheiro, Marinho & Rola

Benfica FM #85 - Zenit...

Benfiquismo (MCCCXVI)

Tapete vermelho...!!!

Paragem mais longa

"Estamos em período de paragem das competições nacionais futebolísticas, desta feita mais prolongada que o habitual, devido à realização das eleições legislativas e aos trabalhos das Seleções. O regresso à competição da nossa equipa só acontecerá no próximo dia 18, frente ao Cova da Piedade, em jogo a contar para a Taça de Portugal. Depois receberemos o Lyon, para a Liga dos Campeões, no dia 23, e só no dia 26, para o campeonato, visitaremos o Tondela. Ou seja, como a última partida, no Campeonato Nacional, foi realizada no dia 28 de Setembro, teremos praticamente um mês de paragem naquela prova.
É urgente repensar e alterar estas questões da calendarização. Não se trata somente da paragem prolongada – ainda mais se nos cingirmos ao Campeonato Nacional –, mas também da elevada concentração de jogos que se seguirá a esta paragem.
No caso do Benfica, serão cinco jogos em 14 dias (Lyon em casa, Tondela fora, Portimonense e Rio Ave em casa, Lyon fora, nos dias 23, 26, 30, 2 e 5, respectivamente), mas este é um constrangimento para todos os clubes que disputam as competições europeias. Os quatro representantes portugueses na Liga Europa – FC Porto, Sporting, Braga e V. Guimarães – terão de jogar cinco vezes em 15 dias. E, para agravar, entre o primeiro e o quinto jogo (ambos relativos às competições europeias) desta sequência, haverá três jornadas do Campeonato Nacional, a mais importante prova nacional.
Este não é, definitivamente, um calendário que salvaguarde os interesses do futebol português, tendo em conta, nomeadamente, a questão do ranking europeu com implicação directa na quantidade de clubes portugueses que poderão participar nas competições europeias e em cada uma delas, bem como em que fases das provas iniciarão essas participações. A rever urgentemente!
Entretanto, como é hábito, as paragens para as Seleções implicam muitas ausências no Seixal. Só na equipa principal são 12: Rúben Dias, Pizzi e Rafa (Portugal), Nuno Tavares, Gedson e Jota (Portugal Sub-21), Tomás Tavares (Portugal Sub-20), Seferovic (Suíça), Svilar (Bélgica Sub-21), Adel Taarabt (Marrocos), Odysseas (Grécia) e Ebuehi (Nigéria). Além destes, teremos ainda Nuno Santos na Seleção nacional Sub-21 e sete atletas nos Sub-20.

P.S.: Do fim de semana, há a destacar mais uma conquista da nossa equipa feminina de hóquei em patins, a sétima Supertaça consecutiva. Em matéria de Supertaças, já conquistámos cinco esta temporada, a saber: nos masculinos, futebol; e, nos femininos, futebol, futsal, hóquei em patins e polo aquático. Que estes triunfos sirvam, também, de inspiração e motivação adicionais para a nossa equipa de voleibol, que, no próximo sábado, às 17 horas, em Almada, disputará este troféu com a Fonte do Bastardo."

Cadomblé do Vata (Catástrofe...!!!)

"Está a ser um início de temporada altamente abaixo do que se perspectivava para o SL Benfica. Chegados à paragem de competições de Outubro o registo de 3 derrotas e 1 empate, com saldo de 23-8 em golos é absolutamente perturbador e já há quem coloque em causa a valia de um treinador que em 8 meses venceu um campeonato e uma Supertaça. O registo Glorioso assume especial gravidade se tivermos em conta o brilhante início de época do nosso rival portista, que soma 3 derrotas e 22-10 no que aos golos diz respeito e um não apuramento para a Champions, sendo portanto natural que na imprensa já se escreva que pela os lados do Dragão os nomes de Herrera e Brahimi estão esquecidos e se reconheça diariamente a valia de um técnico que em 2 anos conquistou um campeonato e uma Supertaça.
Perante o catastrófico início do Benfica, têm sido habituais as comparações com o ano transacto, em que chegamos ao início de Outubro com 1 derrota e 2 empates (excluindo as 2 igualdades da pré eliminatória da Champions), não sabendo a Nação que se preparava para encarar 3 derrotas de chofre. Recuando mais um ano na história, descobrimos um início com 3 derrotas e 3 empates, que melhora para 2 empates e 1 derrota se puxarmos a fita atrás até 16/17. Programando a máquina do tempo para Outubro de 2015 descobrimos 3 derrotas a abrir. Claro que neste momento, o Gang do Processo entra em cena e aponta o dedo "sim, mas isso era no tempo do Rui Vitória". Certo, mas no último ano Jesuita, as mãos estavam pregadas à cabeça, graças a 2 empates e 2 derrotas emulando assim o Glorioso ano de 13/14.
Chegados aqui, importa recordar que no período analisado, somamos 5 campeonatos, 2 Taças de Portugal, 3 Taças da Liga, 4 Supertaças e atingimos uma final da Liga Europa. Mesmo iniciando as temporadas com guilhotinas à porta da Catedral e drama a rodos entre o Povo da Nação. Correndo o risco de estar redondamente errado, é possível que o enésimo titubeante início de temporada, possa ter algo a ver com uma preparação que deixa para a segunda metade da época toda a força física, técnica e táctica. Talvez as incontáveis recuperações pontuais dos últimos anos não sejam apenas uma manobra de marketing pensada em conjunto com a Ordem dos Cardiologistas. Fica o aviso ao Famalicão."