Últimas indefectivações

sábado, 13 de junho de 2020

João & Markus... Alemanha!!!

Chalana nos Arcos em 1988

Carta aberta aos não-adeptos

"Caros não-adeptos,
Um misto de tristeza e revolta estão de mãos dadas neste artigo! Um sentimento de repúdio assenta nestas palavras, escritas por um adepto de futebol que realmente ama o futebol.
Ganhar, empatar ou perder fazem parte deste desporto pelo qual muitos de nós somos apaixonados e não me ocorre uma única situação em que agredir os jogadores e/ou equipas técnicas seja de alguma forma aceitável. Até porque nunca o pode ser.
Posso garantir-vos que ninguém, seja qual for o trabalho que tenha de desempenhar, trabalha melhor com pedras a serem arremessadas, antes pelo contrário.
Sim, o Sport Lisboa e Benfica vive uma crise de resultados, mas não há crise alguma que justifique tais actos hediondos, como arremessar pedras ao autocarro do clube encarnado, clube esse do qual “dizem ser adeptos”.
Vidros partidos e jogadores maltratados, e digam-me, caros não-adeptos, em que é que isso ajudou a “vossa” equipa? Em literalmente nada! Sujam o nome do Sport Lisboa e Benfica, sujam o nome da liga portuguesa, sujam o nome dos adeptos com os vossos actos de covardia, até porque isto não se trata nada mais, nada menos, que um ato de covardia e ignorância.
Não descarreguem as vossas frustrações no futebol, porque há quem realmente queira um futebol sem violência, sem injustiças, há quem queira um futebol limpo de pessoas que de bom não trazem nada. Desde pequeno que me ensinaram que ganhar ou perder é desporto, e claro que ninguém gosta de perder, mas até que ponto estão dispostos a ir com actos de vandalismo, com actos violência, com atitudes de arruaceiros?
Se a Primeira Liga portuguesa já está distanciada da elite das ligas europeias, os actos violentos de que a nossa liga é palco, seja qual for o clube, colocam-nos cada vez mais próximos de outros campeonatos de segunda categoria. E este não deveria ser o caminho a seguir.
Fomos, como adeptos do futebol português, notícia um pouco por todo o mundo, e isso envergonha-me. Começamos a ser conhecidos por ataques a academias, por apedrejamentos a autocarros, ataques de vandalismo e petardos. É tempo de repensar em certas atitudes. É tempo de fazer uma introspeção e ver onde podemos melhorar. É tempo de trazer dignidade ao nosso campeonato.
As capas dos jornais deveriam falar dos jogos e não do que se passa fora das quatro linhas. Os noticiários deveriam mostrar os melhores momentos dos jogos e não imagens de violência gratuita. Deveríamos caminhar para a grandeza, mas caminhamos a passos largos para o desprestígio. 
Mudemos a nossa forma de pensar, mudemos por um futuro melhor, até porque seguimos ao encontro da segunda ou terceira divisão europeia, onde os campeonatos são conhecidos pela violência nas bancadas e fora dos estádios. Campeonatos em que as equipas são conhecidas pelos não-adeptos. É isso que queremos?
Sirvam-se deste desabafo e repensem nas vossas atitudes, porque esta carta é só para vocês, não-adeptos. E mais uma coisa: o problema não está no vermelho, no azul, no verde, no amarelo ou no rosa; está na mentalidade, e nisso ainda há muito para mudar em Portugal. Infelizmente, há e haverá sempre maus adeptos, mas tentemos progredir e aprender com os erros. Até porque o “nosso” futuro depende disto mesmo."

O que correu mal na Bola Parada defensiva do Benfica em Portimão?

"No empate 2-2 do Benfica em Portimão, ambos os golos do Portimonense foram criados através de lances de bola parada (um canto e um livre quase junto à bandeirola). O Benfica posicionou-se na sua habitual defesa zonal, no entanto o Portimonense ganhou vantagem nas zonas mais perigosas da área com relativa facilidade. A defesa do Benfica não se ajustou ao posicionamento inicial dos algarvios, que sobrecarregaram a zona do segundo poste e tiveram até, em ambos os lances, igualdade ou superioridade numérica no coração da área encarnada.
O que permitiu esta vantagem? O que poderia ter sido alterado neste caso? Algumas ideias e comentários

"

I can’t breathe. A urgência de um outro futebol

"Três meses depois de uma paragem prolongada, exige-se um futebol diferente. Exige-se um futebol de causa, tal como o foi em muitos momentos da sua história.

Três meses após a paragem das competições futebolísticas em Portugal, o futebol está de regresso com o retomar da I Liga. Nos últimos dias recuperou-se a memória da tabela classificativa e de todas as contingências que marcaram as jornadas anteriores. Afirmou-se o carácter distintivo da época 2019/2020 pelo facto de este ser o campeonato mais longo de toda a história do futebol português. Assim é, efectivamente. Mas esta época está inexoravelmente marcada pelo que sucedeu no dia 16 de Fevereiro, no Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, quando Moussa Marega, jogador do FC Porto, abandonou o terreno de jogo na sequência de insultos racistas que lhe eram dirigidos. Um dos mais vergonhosos momentos de toda a história do desporto nacional. O árbitro não interrompeu o jogo. Os restantes jogadores continuaram em campo. Os adeptos continuaram os seus cânticos boçais. Daqui resultou uma indignação generalizada, que a espuma dos dias diluiu. Consequência: o Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol multou o Vitória de Guimarães, enquanto promotor do evento, em 714 euros por insultos a Marega, e decorre um processo que está em fase de inquérito.
Após a morte do afro-americano George Floyd pela polícia de Mineápolis, em 25 de maio, as ruas dos Estados Unidos explodiram num clamor contra o racismo, e em muitos outros países sucedem-se manifestações antirracismo. O universo do futebol também não ficou indiferente ao sucedido e, na recente retoma da Bundesliga, quatro futebolistas, durante os jogos, manifestaram-se pelo assassínio de Floyd: Marcus Thuram, do Borussia Mönchengladbach, ajoelhou-se; Hakimi e Jadon Sancho, do Borussia Dortmund, exibiram nas camisolas a mensagem “justiça para George Floyd”; McKennie, do Schalke 04, usou uma braçadeira de capitão a pedir também “justiça para George Floyd”.
Na sequência destes atos, a FIFA, em comunicado, pede às federações nacionais para serem flexíveis em relação a possíveis castigos aos jogadores que se manifestaram. O presidente da FIFA diz mesmo que esses jogadores “merecem aplausos e não punições”. Causa estupefação que entidades como as federações de futebol, constantemente a exibir slogans antirracismo, equacionem a possibilidade de castigar quem se manifestou contra o racismo. Essa possibilidade resulta dos regulamentos das competições, nos quais os jogadores estão proibidos de exibirem mensagens políticas ou de cariz racial. Entretanto, a Federação Alemã de Futebol, apesar de abrir inquérito à atitude dos jogadores, comunicou que não aplicará sanções, justificando que os princípios desses actos são de combate à discriminação e ao racismo.
Percebe-se o processo de despolitização dos jogadores, numa lógica economicista de os converter em entidades híbridas para consumo mediático da massa de adeptos. Aparentemente inocente, este processo revela-se perverso quando apropriado indevidamente. Vem a propósito o episódio entre o deputado André Ventura e o futebolista Ricardo Quaresma. Na sequência da proposta xenófoba do líder do Chega, de se criar um plano de confinamento específico para a comunidade cigana, Quaresma respondeu: “Olhos abertos, amigos, a nossa vida é demasiado preciosa para ouvirmos vozes de burros.” Em reacção, André Ventura considerou lamentável que um jogador da selecção nacional se envolva em política, e apelou à intervenção da Federação. A perversão está precisamente em se considerar que o futebol tem de ser apolítico, e os jogadores seres sem voz, insensíveis às causas cívicas e aos direitos fundamentais, apenas trabalhadores de um espectáculo mercantilizado. 
Três meses depois de uma paragem prolongada, exige-se um futebol diferente. Exige-se um futebol de causa, tal como o foi em muitos momentos da sua história. Como se tem afirmado ultimamente, não basta dizer que não se é racista, é imperativo ser-se antirracista. Já não chegam as tarjas contra o racismo, já não é suficiente o hashtag #notoracism da UEFA, nem o título Stop Racism que a FIFA exibe actualmente na sua página web. Nenhuma dessas declarações impediu insultos racistas proferidos desde as bancadas. Da mesma forma que quando um polícia coloca um joelho no pescoço de George Floyd, fá-lo porque se sente social e institucionalmente confortável em fazê-lo, também os adeptos se sentem impunes no enxovalho racista.
No futebol não vale tudo, e desde logo não vale diminuir o adversário pelos sinais diacríticos da cor da sua pele. O racismo é crime, e as entidades que gerem o futebol não podem ficar-se pelas declarações de intenções, protegendo um negócio que se julga imaculado. A Federação Portuguesa de Futebol, que tem a “diversidade e inclusão” como responsabilidade social, faltou à convocatória quando a ela se fez alusão no diferendo que envolveu Ricardo Quaresma. A Liga tem de manter presente o caso Marega e levar o processo até às últimas consequências. Os jogadores não têm de solicitar autorização para pedir justiça por Floyd. Tal como na vida, também no futebol tem de se conseguir respirar."

A procura do 'ki'

"Os japoneses utilizam muitas palavras e expressões compostas com a palavra “ki”. Alguns exemplos: “está agradável”, referem que “o ki mantém-se bom”; “está bom tempo”, dizem “o ki do céu é bom”; “ter força de carácter”, sublinham “ter o ki forte”. “Ele é uma evidência, que escapa a uma reflexão especulativa. O ki é como o ar”, como refere o sociólogo japonês Kenji Tokistu, no seu livro “La recherche du ki dans le combat” (2004, p. 8). Encontra-se omnipresente na vida quotidiana nipónica, mas, se lhes perguntarmos, muitos não sabem explicar claramente o que significa. O “ki” é uma forma linguística aplicada a um fenómeno energético universal. Para um espírito racional, é difícil admitir os fenómenos do “ki” e a sua existência. Não se vê. E se não se vê como é que é possível ter critérios objectivos para sensações subjectivas? O único instrumento é o corpo humano. E este difere nos indivíduos. Assim sendo, o método científico (com os critérios de cientificidade proclamados por Popper) não se aplica aqui. Comecei a praticar karaté, estilo Shotokai, com 14 ou 15 anos de idade. Mantive-me nesta prática, com algumas interrupções, até aos 38 anos de idade. Conheci vários mestres/instrutores ou, numa linguagem mais desportiva, treinadores. Questões profissionais, levaram-se a afastar progressivamente do exercício do combate. Durante muitos anos ouvi falar do “ki” e da sua importância para se praticar uma arte de combate com eficácia. E isso requer uma atitude de abertura intelectual. Aquele que se obstina a negar a existência do “ki” não poderá explorar este domínio. E sabemos o quanto ele é importante na medicina chinesa, que procura curar o corpo físico a partir do corpo energético e vice-versa. O homem concentra em si múltiplas tensões: angústias, invejas, desejos, ódios… estas tensões são uma causa de stresse, que amplifica o efeito de poluição interior. O que se passa no espírito reflecte-se no corpo e as tensões mentais tornam-se as causas de problemas somáticos. Muitos mestres de artes marciais e desportos de combate recomendam exercícios para a livre circulação do “ki” no corpo. O estado ideal é que ele circule livremente, sem nenhum obstáculo. O “ki” positivo é assimilado a uma energia criadora, de nascimento e de vida. O “ki” negativo é a energia da destruição, da deterioração, da morte. O “ki” negativo é associado ao mal e o “ki” positivo é associado ao bem. Na elaboração do conceito de “ki”, os indivíduos dão-lhe um sentido. Mas, esta energia, que faz parte do Universo, não é boa nem má."

Benfiquismo (MDLIII)

Michel...

Sair do inferno em Vila do Conde

"Sensação de ter oferecido o título a um FC Porto paupérrimo e falido não diminui mérito deste na conquista, antes aumenta o nosso demérito

O Benfica prosseguiu em Portimão série tenebrosa de maus resultados. Não há duas palavras para diminuir a sensação vivida, mas serão precisos nervos de aço e capacidade de liderança para saber inverter o rumo.
No dia 10 de Junho, Dia de Portugal, Dom Telontino Mendonça fez discurso notável, reflectindo de forma sábia sobre as vicissitudes do presente e a forma como enquanto sociedade poderemos sair mais fortes desta encruzilhada. No âmbito desse discurso, lembrava o Cardeal: 'Numa estação de tectos baixos, Camões é uma inspiração para sonhar sonhos grandes'. É o que esperam os benfiquistas, capacidade de inverter rumo que não é do nosso agrado. Capacidade de superação e liderança são ingredientes obrigatórios para sonhar esses sonhos grandes mesmo em época de tectos baixos. A ganhar por dois golos face a adversário modesto não se encontram justificações aceitáveis para o desaire.
Nem apetece escrever sobre o jogo e a sucessão de infortúnios, desde a lesão de Jardel à de Grimaldo, do quinto amarelo Xistrado a André Almeida até à segunda parte em que pouco se jogou. A sensação de ter oferecido o título a um Porto paupérrimo e falido não diminui o mérito deste na sua conquista, antes aumenta o nosso demérito. No último ano foi a derrota por 2-0 em Portimão que precipitou a inversão de rumo e a conquista do título nacional pelos comandados de Bruno Lage. Haja no grupo a mesma capacidade e vontade de inverter o rumo. Uma vitória em dez jogos não é aceitável nos adeptos do Casa Pia quanto mais do Benfica. Nada no passado pode ser alterado, mas tudo no futuro tem que ser diferente.
Nesta altura aparecem muitas críticas e poucas soluções, muito mais populismo que sabedoria. Importa distinguir quem ajuda de quem atrapalha, importa discernir o rumo certo dos caminhos suicidários. O futebol tem essa maravilhosa virtude de não ser ciência exacta e ter solução que ponha, e já, o Benfica a ganhar e a jogar futebol. Em terei uma, o leitor a sua, cada um terá uma, mas quero é que haja uma ideia e futebol que em Vila do Conde, na quarta-feira, nos tire do inferno e coloque num purgatório, que sempre alivia qualquer coisa o momento."

Sílvio Cervan, in A Bola