"Sérgio Conceição tem razão muitas vezes, mas errou quando, há um par de semanas, após uma exibição sofrível no Dragão, se insurgiu com os adeptos que estavam descontentes com o nível exibicional do FC Porto. Para o treinador, quem quer espectáculo devia dirigir-se ao Coliseu ou ao Teatro Sá da Bandeira. Não é nova esta dicotomia entre vencer ou oferecer espectáculo, como se fosse necessário escolher entre as duas. Claro está que todos os adeptos preferem vencer com um futebol medíocre, a perder com nota artística. Em todo o caso, nada impede que se concilie bom futebol com vitórias e, além do mais, quem melhor joga é, também, quem mais próximo fica de vencer, nomeadamente em competições longas.
Regresso a domingo, ao Estádio da Luz. Como todos os outros benfiquistas que se sentaram nas bancadas, não troco a vitória justa frente ao Porto por nada. Mas como, entre bilhetes de época para a família e subscrição da Sport TV, gasto bom dinheiro em futebol, tenho direito a exigir também espectáculo. Não só o futebol praticado no clássico foi pobre, como corresponde a uma trajectória de empobrecimento do jogar dos três grandes que deve ser motivo de reflexão.
Recorro, uma vez mais, ao excelente GoalPoint para dar conta do que se passou: um número risível de remates enquadrados (dois para o Benfica, um para o Porto); níveis negativos de eficácia nos passes verticais (42% e 38% e, no total, 221 passes falhados!), jogo muito físico (44 faltas) e recorde do ano em partidas da Liga para duelos aéreos (66) – o que constitui novo máximo, a larga distância, em clássicos desde que há registos. Na ressaca do jogo, na sua conta de Twitter, o analista do GoalPoint, Hernâni Ribeiro, traçava um paralelo com o que, praticamente à mesma hora, se havia passado no Liverpool-Man. City. Os 23 duelos aéreos do clássico inglês contrastavam com os 66 do Benfica-FC Porto. Pode, assim, concluir-se que enquanto uns abandonam o ‘kick and rush’, noutras paragens esta opção faz escola.
Estes indicadores podiam ser apenas uma curiosidade estatística. Temo bem que sejam mais do que isso: o resultadismo está a instalar-se no campeonato português e as explicações são várias.
Desde logo, um clima adversativo que reduz a propensão ao risco. Nos clássicos, os três grandes têm como prioridade anular o adversário e só atacam pela certa. Depois, uma diminuição evidente da qualidade individual dos protagonistas. Num passado recente, passaram por Portugal jogadores de topo. Hoje, há bastante qualidade nos plantéis do Benfica e do Porto. Contudo, já não há nem James, Falcao, Hulk ou Moutinho, de um lado, e Di María, Witsel, Gaitán ou Matic, do outro. Finalmente, no que é decisivo, os treinadores do Benfica e do Porto, se bem que com ideias muito diferentes, sacrificam uma ideia de jogo colectiva e associativa à eficácia. Nós, adeptos, não nos devemos conformar com isto."
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