"As observações (de 1915 a 1918) de Bronislaw Malinowski (1884-1942), etnólogo polaco, nas Ilhas Trobiand juntam-se às análises antropológicas realizadas por Marcel Mauss (1872-1950), sobrinho de Émile Durkheim (1858-1917). Elas revelam que as trocas nas sociedades tradicionais se organizam segundo um contrato geral e são, permanentemente, submetidos a uma tripla obrigação: “dar-receber-devolver”. É o dom e contra-dom de que fala Marcel Mauss. As partes envolvidas no contrato são pessoas morais: clãs, tribos, famílias, que se enfrentam e se opõem em grupo ou por intermédio dos seus chefes, ou pelos dois ao mesmo tempo. O que eles trocam são delicadezas, festins, ritos, danças, etc. Estas prestações e contraprestações, aparentemente voluntárias pelas oferendas, são, no fundo, obrigatórias.
Os sociólogos não estiveram envolvidos nas operações de codificações das práticas desportivas. Eles limitam-se a registar essas práticas nas sociedades, mas as operações de recenseamento não são apenas simples constatações de realidades pré-existentes, prontas a ser “contadas” como tal. A descrição da realidade social é sempre prescritiva, sobretudo quando ela parte do Estado ou das entidades delegadas, com a responsabilidade de gerir essas práticas. Podemos então perguntar qual é a autonomia das práticas desportivas? Evocando o trabalho de codificação, poderemos pensar que aceitamos uma definição do tipo construtivista, isto é, a de que o desporto se reduz a uma construção, multiforme e indefinida, de uma actividade que se apoia no uso agonístico-lúdico. O desporto seria, então, uma realidade exterior das interpretações dos dirigentes, dos treinadores e dos praticantes. Apoiados em Malinowski e Mauss, recusamos esta ideia. O desporto é uma invenção cultural. As práticas desportivas mobilizam o corpo dos indivíduos que, em função do contexto histórico e social, e do trabalho de codificação realizado pelas entidades envolvidas, acumulam significados mais abertos e mais diversos."
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