"E o próprio António Costa, que tantas vezes aparece ao lado de Luís Filipe Vieira no Estádio da Luz, estará com isso a ‘instrumentalizar o Benfica’ para angariar votos?
«Somos um pequeno grupo de benfiquistas que vem por este meio expressar indignação perante um facto que já passou todos os limites: André Ventura usou e usa o Benfica para criar uma persona política.
A instrumentalização política do Benfica é errada por princípio.
Neste caso, é ainda mais grave, porque o Chega é um partido de extrema-direita abertamente anti-sistema e xenófobo […]
O Benfica é o clube mais popular de Portugal, é de ricos e pobres, de brancos e negros, de muçulmanos e ciganos. A direcção do Benfica não pode continuar a pactuar com a evidência mediática: o Chega chegou ao parlamento porque é liderado por uma personagem que é conhecida apenas e só por causa do Benfica».
Assim reza um documento assinado por cinco ‘notáveis’ benfiquistas: Henrique Raposo, Jacinto Lucas Pires, José Eduardo Martins, Pedro Norton e Ricardo Araújo Pereira.
Leio e não acredito.
Tenho estima por alguns dos subscritores e custa-me a crer que se tenham envolvido numa tonteria destas.
Basicamente, dizem que André Ventura ‘instrumentalizou’ o Benfica e que o Benfica se devia demarcar dele porque é ‘xenófobo’.
Em primeiro lugar, Ventura instrumentalizou o Benfica como?
Apareceu na campanha com um cachecol do Benfica ou terminava os discursos gritando ‘vivas’ ao Benfica?
Parece que não.
A instrumentalização dever-se-á, pois, ao facto de ser comentador desportivo afecto ao Benfica.
Mas por isso não tinha o direito de se candidatar a deputado?
Telmo Correia, Diogo Feio, Santana Lopes, Hélder Amaral, Nuno Magalhães, Rui Gomes da Silva e muitos mais, que são ou foram comentadores futebolísticos, estão impedidos de se candidatar a deputados?
E o próprio António Costa, que tantas vezes aparece ao lado de Luís Filipe Vieira no Estádio da Luz, estará com isso a ‘instrumentalizar o Benfica’ para angariar votos?
Em segundo lugar, o Benfica devia demarcar-se de Ventura, como?
Fazendo um comunicado a dizer: «Atenção que este senhor não representa o Benfica»?
Mas isso já se viu alguma vez?
Ou deveria mesmo expulsá-lo de sócio, com a alegação de ser ‘xenófobo’?
Mas alguém já foi expulso do clube pelas suas posições políticas?
Francamente, não se vê como o Benfica poderia ‘demarcar-se’ de André Ventura.
E se o fizesse, teria de se demarcar de muita gente…
Em terceiro lugar, custa-me perceber a ‘indignação’ de Ricardo Araújo Pereira.
Não tendo ele problemas em votar no PCP, que apoiou os crimes de Estaline e apoia ditaduras como a da Coreia do Norte e da Venezuela, tem problemas em ser do mesmo clube de André Ventura?
Isto faz algum sentido?
Ou será que Araújo Pereira nega os crimes do estalinismo e os atropelos aos direitos humanos de Maduro e Kim Jong-un?
E, já agora, aos outros quatro subscritores da carta não lhes fez comichão subscreverem um documento ao lado de uma pessoa com as posições políticas de Araújo Pereira?
Ou a indignação só funciona para a direita e não para a esquerda?
Em quarto lugar, os subscritores da carta não perceberam uma coisa básica: ela só beneficiou André Ventura.
Aliás, os ataques de que Ventura tem sido alvo um pouco por toda a parte só o beneficiam, porque além de lhe darem visibilidade revelam receio.
Quem o ataca mostra medo dele.
E isso só aumenta a sua importância.
Nessa medida, esta carta foi um ato muito pouco inteligente.
Os seus efeitos foram exactamente opostos ao objectivo pretendido.
Em quinto lugar – e muito mais grave do que tudo o resto – esta carta levou a política para dentro do Benfica.
Até aqui, no Benfica não havia partidos: comunistas, socialistas, sociais-democratas, centristas, esquerdistas, fascistas sentavam-se lado a lado nas bancadas da Luz sem preconceitos políticos.
Eram todos benfiquistas, ponto final.
Ora, esta carta veio criar clivagens entre os benfiquistas.
«Eu não quero estar ao lado deste senhor, porque é fascista».
«Eu evito sentar-me ao lado daquele, porque é comunista».
«Eu recuso-me a vestir a mesma camisola daqueloutro, porque é homofóbico».
Se entrarmos por aqui, nunca mais paramos.
Por todas estas razões, a carta do ‘pequeno grupo de benfiquistas’ foi uma enorme tonteria, como comecei por dizer.
Não se percebe o que diferencia Ventura dos outros comentadores desportivos que se candidataram a deputados.
Não se vê como o Benfica poderia demarcar-se dele.
Não se compreende a ‘indignação’ de Araújo Pereira.
Além disso, a carta teria sempre efeitos opostos aos pretendidos e levou indesejavelmente a política para dentro do clube.
Nesta questão, o Benfica teve mais tino. Não se demarcou de André Ventura, como sabemos – mas demarcou-se dos subscritores da carta, respondendo-lhes aliás laconicamente.
Era o que mereciam."
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