"Tudo se passou por 1914. Na primeira vez em que o Benfica foi jogar com o FC Porto ganhou por 8-2. Se por todos os jornais correu a ideia de que Artur José Pereira era «jogador extraordinário», só num deles de falou do «lance insólito» que se vira no Campo da Constituição: «Um jogador do Benfica meteu uma bola na própria baliza, sofrendo a seguir um pontapé de canto, porque o referee achava que assim rezava a lei» - e, apesar disso, não houve protestos, iras ou destrambelhos. (ainda era um futebol muito romântico - mas também não era preciso chegar-se onde se chegou...)
Do Porto foi o Benfica à Corunha - para mais três desafios. No último, para recolha de fundos a favor dos «Niños Descalzos», tinha a vê-lo «muitas senhoras de mais alta sociedade galega» - e, a dado instante, Artur José Pereira sofreu entrada rude. Quando o jogador do Corunha se levantou para lhe pedir desculpa, recebeu, em fúria, insulto que se ouviu «como trovão» na tribuna - «fazendo corar algumas das senhoras». «Vexado» pelo vitupério (e pela «falta de educação e compostura») na sua condição de capitão de equipa, Cosme Damião acercou-se do Artur e expulsou-o do campo (o árbitro não achara razão para tanto) - e quando chegaram ao hotel, fechou-o à chave no quarto, para que não fosse ao jantar de gala que o Corunha oferecera. Ao sabê-lo, Carruncho, o capitão galego, suplicou-lhe que lhe cessasse o castigo. Por duas vezes escutou que não, só à terceira ouviu de Cosme:
- Não querendo eu ser descortês consigo senhor Carruncho - vamos, então, buscar o preso ao hotel!
PS: Está história é (obviamente...), dedicada a todos os que continuam a fazer do futebol (que não é o futebol) o que parece ser cada vez mais a ala psiquiátrica dum hospital num jogo jogado através de actos vis ou palavras sujas espalhadas pelo Facebook (e não só) - ou através do ventriloquismo reles de cartilheiros e directores de comunicação (aliás, de propaganda), de manigâncias em denúncias anónimas ou de outros ardis."
António Simões, in A Bola
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