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terça-feira, 4 de outubro de 2016

Vitória também é nome de líder

"Na vaga de lesões, em vez de chorar os ausentes, incentivou os presentes e prometeu outras soluções, sobre os quais depositou total confiança.

Rui Vitória já deu provas da sua sensatez. É uma pessoa que se sabe quanto custa subir na vida e no caso particular do futebol nada do que alcançou até agora lhe foi oferecido por causa dos seus lindos olhos. Foi pela seriedade, pelo trabalho e pela competência. Por isso, aprendeu cedo a dar passos seguros. Basta reparar na sua carreira até chegar à Luz, talvez pouco festejada, tradutora da sua personalidade reservada, mas firme e saudável: Fátima, campeão da 2.ª Divisão, Paços de Ferreira e Vitória de Guimarães, vencedor da Taça de Portugal.
Portanto, já tinha títulos para emoldurar o currículo quando Luís Filipe Vieira lhe proporcionou o grande salto na carreira. Agradeceu a oportunidade com palavras de muita esperança, ditas com elevação, como deve ser sempre no desporto, principalmente em clube de dimensão mundial, em vez de alinhar em promessas vãs, frases cómicas, saltos e saltinhos. São estilos que divergem. Pessoalmente, prefiro o primeiro, mas aceito que haja quem se delicie com o segundo.

Vitória chegou à Luz, com 45 anos de idade, debaixo de compreensível desconfiança da família benfiquista, alimentada, como toda a gente sabe, por iniludíveis tiques ciumentos do antecessor, o qual passou uma época inteira dividido entre os problemas que tinha de resolver no seu novo empregador e o irreprimível impulso de continuar a olhar para a casa do vizinho para nela vislumbrar pecados que lhe aconchegassem o umbigo. Em determinada altura tornou-se moda 'bater' em Vitória. Era socialmente 'bem' dizer mal dele, a propósito de uma insignificância qualquer, tendo sido imensa e variada a argumentação utilizada, sem se dar conta que, um pouco como a fábula da cigarra e da formiga, enquanto uns proclamavam virtudes e qualidades únicas, anunciando conquistas virtuais, Rui Vitória trabalhava e, respaldado na organização profissional do Benfica, defendeu-se como pôde, guardando para si o que lhe ia na alma. Jamais se deixou descontrolar pela emoção, embora tivessem sido várias as situações em que existiu esse perigo. Resistiu, porém, e deu a melhor resposta que, como treinador, podia ter dado: ganhar. Foi campeão nacional. Venceu a Taça da Liga, Chegou aos quartos-de-final da Liga dos Campeões, com o Bayern,  tendo sido eliminado com empate em Lisboa (2-2) e derrota em Munique (0-1).

Na temporada 2016/17, Vitória entrou como desejava: venceu a Supertaça e deixou a porta entreaberta para mais títulos e troféus enriquecerem o museu do Benfica. No entanto, inesperada surpresa estava reservada e através dela foi possível descortinar-lhe outra qualidade humana, imprescindível a quem no posto de comando de um navio de grande porte sabe estar obrigado a navegar em todos os oceanos sem recear ventos nem marés:confrontado com vaga de lesões que 'atacou' o plantel da águia, pondo fora de combate, em simultâneo, todos os seus avançados titulares, nem assim, num quadro de crise muito grave, o treinador do Benfica perdeu a compostura, revelou medo ou deu algum sinal que indicasse, no mínimo, inquietação.
Quando o costume é um treinador vir a público pôr a sua imagem a salvo perante ameaça iminente de catástrofe, Vitória assumiu uma posição inversa, de muita coragem. Em vez de chorar os ausentes, incentivou os presentes e prometeu outras soluções, sobre as quais depositou total confiança na prossecução do projecto vitorioso que tem como próximo objectivo a conquista do tetracampeonato.

Ser líder à sétima jornada nenhum deslumbramento provoca no treinador benfiquista. «Essas visões imediatistas de campeões precoces não são espelhadas no final», teve o cuidado de alertar para travar entusiasmos que se compreendem, mas que, na opinião dele, são inúteis nesta fase inicial da demorada corrida que só termina em Maio do próximo ano. De toda maneira, apesar da prudência que repetidamente coloca no seu discurso, e sabendo todos que não há títulos intermédios, chegar à segunda interrupção do Campeonato lá em cima, em companhia, a precisar de olhar para baixo para ver os outros é empreitada digna de ser aplaudida. Não tem a ver com a dor de camisola ou o desenho do emblema, é por justiça. É a assunção da força solidária do 'nós' sobre o conceito parolo do 'eu'.
Líder não é quem fala muito e alto, se vangloria do que faz e despreza os subordinados. Líder é quem fala necessário, no tom certo, ouve opiniões e granjeia o respeito e a confiança de quem com ele trabalha."

Fernando Guerra, in A Bola

1 comentário:

  1. Entretanto em Canelas, Vila Nova de Gaia, continua a saga de Fernando Madureira e seus amigos:
    https://www.youtube.com/watch?v=TouDXwi2gfs
    https://www.youtube.com/watch?v=viMwyaqiHYE
    https://www.youtube.com/watch?v=LbvT-3eC7Ho
    https://www.youtube.com/watch?v=MragWsJvids

    É a "identidade" do Canelas, ou a continuação de um certo tipo de "escola" do futebol português.

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