"Há precisamente cem anos o nosso Cosme Damião fez o último jogo com o Manto Sagrado: 26 de Fevereiro de 1916
Decidiu despedir-se antes do final da temporada. Num jogo internacional, quando estava concluído - e conquistado - o Campeonato Regional de Lisboa, mas faltava disputar ainda a Taça de Honra de Lisboa! E ele, no Futebol, nada fazia por acaso. Foi um adeus pensado.
Cosme Damião tinha uma resistência invulgar. Desde que o plantel da 2.ª categoria de 1906/07, para responder à debandada para o Sporting dos principais futebolistas, assumiu inscrever-se no campeonato da 1.ª categoria em 1907/08 fez 167 jogos, com 156 consecutivos, mas só não foram os 167 porque 'falhou um, o último da temporada de 1914/15, para «perceber» o impacto da sua ausência na equipa. Como não gostou do que viu, manteve-se durante mais 12 encontros em 1915/16. Esta temporada ainda teria mais 13 jogos mas já sem contar com ele a jogar como médio centro. Além destes 167 encontros, há ainda mais um jogo que até foi a sua estreia, ainda que episódica, na 1.ª categoria, em 17 de Março de 1906, para substituir um futebolista que não compareceu. A jogar na 2.ª categoria como médio-centro foi fazer o lugar de José Cruz Viegas como defesa direito. Há ainda outro jogo, em 10 de Junho de 1922, daí Cosme Damião contar com um total de 169 jogos, mas que tem história à parte!
1905: Cosme Damião e a tarimba na 2.ª categoria
Com 24 fundadores e inúmeros aderentes ao novo clube não foi difícil o Grupo Sport Lisboa, através do seu 'técnico-de-carolice' Manuel Goularde, constituir duas equipas ou 'teams' como se dizia e escrevia nesses tempos em que o Futebol ainda era Foot-Ball. Logo nas primeiras presenças da segunda equipa em campo surge Cosme Damião como médio centro, embora a posição em 1904/05 e épocas seguintes fosse designada por meia-defesa central.
Depois de muitos anos a jogar-se de improviso e esporadicamente, ao ritmo de desafios e reptos, lançados em tertúlias e jornais surgiu uma iniciativa louvável, por sugestão de um estabelecimento de venda de artigos desportivos que também editava uma revista, a Casa Senna. Foi a publicação 'Tiro e Sport' que lançou e acompanhou o primeiro torneio 'à séria' para clubes, realizado em Lisboa, fazendo disputar um troféu, o 'Bronze Viúva Alexandre Senna'. Nem todos os clubes existentes em Lisboa tiveram coragem de se apresentar em campo para medir forças e mostrar o que valiam. O Sport Lisboa não teve problemas e inscreveu-se. No dia do jogo, uma espécie de meias-finais, em 17 de Março de 1906, foi necessário recorrer a um futebolista da 2.ª categoria, para completar a equipa, o nosso 'onze'. O escolhido foi Cosme Damião para jogar como defesa-direito, algo de extraordinário ou talvez não. É que o defesa-direito da 2.ª categoria era Henrique Teixeira, mas Manuel Goularde confiou mais no médio-centro dessa categoria para fazer o lugar. Ou talvez Henrique Teixeira não estivesse disponível. Talvez um dia se consiga saber com maior precisão o que se passou nesse dia um da vida de futebolista, na 1.ª categoria, de Cosme Damião.
1907: resistência e soluções
Uma temporada depois, em 1906/07, já Cosme Damião na 2.ª categoria conquistara, em Abril de 1907, para o Sport Lisboa um troféu no torneio do Internacional (CIF) quando no Verão se assiste à debandada dos melhores futebolistas (oito da 1.ª categoria) para o Sporting. Entre tantas dificuldades emergem os resistentes, com Cosme Damião a ter papel decisivo na reorganização do Sport Lisboa optando-se por manter o clube activo inscrevendo a equipa (plantel) da 2.ª categoria e os que restaram da 1.ª equipa no campeonato de Lisboa para 1.ªs categorias. O Sport Lisboa estava mais forte porque soubera resistir quando tudo indicava que iria sucumbir.
1908 a 1915: Conduta acertada com rumos e sapiência
Resolvida a componente desportiva (e futebolística) sempre o fundamento do Glorioso até à actualidade não se 'cruzaram os braços'. O próximo passo foi dado com segurança. Juntar o Sport Lisboa ao Sport Benfica, garantido a autonomia do Futebol e a utilização pelos futebolistas dos principais símbolos do Clube fundado em 28 de Fevereiro de 1904. Uma espécie de 'Em Clube que vence (e é gloriosíssimo) não se mexe'! E assim foi em 13 de Setembro de 1908, quando o campo da Feiteira passou a ter futebolistas ilustres e de excelsa qualidade a utilizá-lo. Com Cosme Damião a assumir cada vez mais protagonismo, até à sua nomeação como dirigente e capitão-geral, em Maio de 1909, ou seja, responsável por toda a actividade desportiva do Sport Lisboa e Benfica. Depois seguiram-se anos atrás de anos, com Cosme Damião rodeado de outros associados cheios de genica e boa vontade que criaram um Clube ímpar. Estava em marcha o Benfiquismo.
1915/16: derradeira temporada
Depois de mais de uma década a 'jogar à bola' Cosme Damião decidiu 'arrumar as chuteiras'. Tentou em final de 1914/15, não jogando no último jogo da época. Não gostou do que viu. Havia um Regional para vencer na temporada seguinte (1915/16), pois o Sporting conquistara o título pela primeira vez em 1914/15. Não podia arriscar novo desaire. O Benfica ficar duas temporadas consecutivas a ver passar a glória. Havia que recuperar o 'ceptro' de campeão regional. Tinha de continuar a jogar para garantir maiores probabilidades e fazer a integração dos futebolistas com valor que aceitara no Clube no final de 1914/15. E assim foi. Campeonato recuperado, Cosme Damião de despedida.
Capitão-geral até 1926
«Arrumou as chuteiras» mas não desleixou a dedicação e o orgulho de ser Benfiquista. Continuou como capitão-geral a orientar os mais novos, avisar os mais velhos, coordenar, equilibrar e orientar as equipas (as quatro categorias) de modo a fazer do Sport Lisboa e Benfica um clube cada vez mais campeão, mais triunfador, mais forte, mais conhecido, mais popular, mais atractivo para quem queria jogar ou associar-se, pagando quotas, a uma grandeza que se revelava imparável. Em 1926 o modelo estava esgotado, sem que ele se apercebesse. Mas o seu Benfiquismo criara raízes, permitindo que outros Benfiquistas de gerações mais novas soubessem, no momento certo, tomar as decisões que se impunham. E assim foi.
'Águia de Ouro' em 1935
Cosme Damião afastou-se desgostoso, em 1926, regressou em 1931 para presidir à Mesa da Assembleia Geral até 1935 quando foi agraciado com o galardão supremo do Benfiquismo que ele laboriosamente criara, com a 'Águia de Ouro'. Depois de 1935 restaram-lhe uma dúzia de anos de vida. Faleceu em 12 de Junho de 1947, com 61 anos e 21 anos depois de ter 'arrumado as chuteiras'. Precisamente a data que assinalamos hoje. 26 de Fevereiro de 2016. Cem anos depois!"
Alberto Miguéns, in O Benfica
O que isto tem a ver com futebol ou com o SL Benfica???
ResponderEliminarPara anunciar idiotices que ponha anúncios no Correio Manhoso, Rascord ou algo semelhante