Últimas indefectivações

segunda-feira, 11 de março de 2013

Texas Jack

"Uma das frases mais extraordinárias da história da literatura vem embrulhada em papel barato num livro aos quadradinhos do famoso Texas Jack. Perante uma imagem de vários corpos estendidos numa pradaria, o autor sublinha dramaticamente: «Entre os mortos havia um que respirava - Texas Jack». Esta bela capacidade que um morto pode ter de respirar é algo que merece destaque. E distinguia um bandido de um herói  Outra coisa que distinguia bandidos de heróis era o facto de, geralmente, os primeiros se apresentarem nos assaltos com lenços a taparem a cara até ao nariz, deixando apenas os olhos à mostra. E, assim sendo, ficavam dificilmente reconhecíveis.
Claro que havia bandidos e bandidos. E alguns tão trapalhões, tão incompetentes, que entravam nos bancos gritando «Mãos ao lato, isto é um assalto!» com as caras a descoberto, tornando-se presas fáceis de heróis como Texas Jack que era tão competente que conseguia ser um morto que respirava, à revelia das regras naturais dos mortos. Mas, por muito asno que fosse, não havia bandido capaz de se infiltrar pela calada da noite na sede da Wells & Fargo à procura do cofre forte deixando atrás de si, por exemplo, um rasto espectacular deste calibre - uma mochila, um martelo e sangue! A trabalheira que seria preciso para que tal zebróide se lembrasse de esquecer tanta tralha pelo caminho... Ou seja, nesta história mais recente de um qualquer Texas Jack o que espanta não é que ainda haja um a respirar por entre os mortos; o que espanta é alguém dar-se ao trabalho de levar um martelo e uma mochila para abandonar no local do assalto. E ter desatado a sangrar na hora mais imprópria. Há veias e vasos capilares que não têm noção das conveniências."

Afonso de Melo, in O Benfica

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