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sábado, 20 de setembro de 2025

Um novo Mourinho


"Nada tem feito pior à carreira de José Mourinho do que os seus aduladores permanentes, como se fosse preciso mais coragem para lhe enaltecer o notável currículo do que para lhe apontar os sinais de estagnação. Ou como se dizer que o futebol das equipas de Mourinho tem perdido qualidade fosse sinónimo de desrespeito pelo trajeto do setubalense. Obviamente não é, ou não é necessariamente e no meu caso não é decerto, mas há pelo menos uma década, desde o último título de campeão no Chelsea, que o melhor treinador português de sempre não se parece com o melhor treinador português de sempre.
O futebol que recordamos do seu FC Porto e do primeiro Chelsea é hoje uma saudade, e mesmo os resultados estão longe de acompanhar a reputação que fez por merecer. E nem as lembradas presenças recentes em finais europeias são um desmentido eloquente. Sendo sempre meritório lá chegar, ninguém nega, também é sempre muito provável que o vencedor da Liga Europa ou da Liga Conferência seja um emblema inglês, italiano ou espanhol, mesmo que não de primeira linha. Tirando o exemplo solitário do Eintracht de Frankfurt – mesmo assim de um campeonato forte – é preciso ir ao Porto de Villas-Boas em 2011 para encontrar um vencedor da Liga Europa de outro país que não os que citei. E em quatro anos de Liga Conferência só o Olympiacos interrompeu a norma geográfica. Exemplo concreto: na época passada, e num dos anos mais horríveis do trajeto recente tanto de Tottenham como de Manchester United (duas equipas que Mourinho treinou), esses emblemas lutaram entre si na final da Liga Europa. Ou seja, Rúben Amorim esteve perto de vencer uma prova europeia no trágico ano de estreia além-Mancha e Ange Postecoglu celebrou-a dias antes de ser despedido. E até o West Ham, não propriamente um clube com histórico de conquistas, treinado por David Moyes, não propriamente um dos melhores treinadores do mundo, esteve em finais europeias em anos consecutivos e venceu uma delas.
Discussão diferente é se José Mourinho serve para treinar o Benfica e se o clube fica mais bem servido do que estava. E aí a resposta é sim, duas vezes, natural e obviamente. Ou mesmo se, aqui chegados, Rui Costa podia decidir algo muito diferente, e aí a resposta é não, natural e obviamente. Claro que haveria a possibilidade de escolher outro técnico, mas encontrar quem reunisse, como Mourinho, competências técnicas, conhecimento do futebol português, currículo rico e, particularmente relevante dada a premência, estivesse livre no mercado, não era tarefa fácil. E acresce o contexto pré-eleitoral, que a escolha do treinador tinha, no mínimo, de representar acréscimo de esperança para os adeptos. O erro de Rui Costa foi outro e repetido: insistiu sem se perceber porquê em Bruno Lage como antes em Roger Schmidt, quando já eram evidentes os sinais de que iria, muito provavelmente, correr mal. Se tivesse mudado de treinador antes do Mundial, como devia ter feito, mais favorável seria o contexto para o novo treinador, qualquer que ele fosse.
Volto a Mourinho. Durante anos surgiram no país, recorrentemente, “novos Mourinhos”, gente que parecia prometer uma revolução de ideias e métodos em diversas áreas de atividade. E havia Mourinhos nas empresas, Mourinhos nas finanças, Mourinhos nos jornais, esperança de Mourinhos por todo o lado. Mas Mourinho, o bom e velho Mourinho, era só um e colecionava títulos em Inglaterra, Itália, Espanha, na Europa. Passados estes anos, o problema deste novo Mourinho, o autêntico, ele próprio, é que tem de voltar a ser parecido com o velho Mourinho. E concretizo: tem de voltar a ser pelo menos tão eficaz no treino como é a comunicar, empenhar-se mais na construção de um jogar sedutor (em que se defende bem mas também se ataca com criatividade) do que refugiar-se num pragmatismo comum ao discurso de técnicos banais, voltar a valorizar jogadores em vez de chocar de frente com eles, manter equipas técnicas competentes com gente que o interpele, criar grupos unidos em vez de colecionar inimigos. Só o velho Mourinho pode dar ao Benfica e devolver ao futebol um novo Mourinho, claramente melhor que o da última década."

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