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quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Eusébio: 10 anos de eterna saudade


"Cumprem-se nesta sexta-feira, 5 de janeiro, 10 anos do falecimento de Eusébio da Silva Ferreira. Neste dia, recordamos 10 factos/momentos da carreira da maior figura da história do Sport Lisboa e Benfica.

O MEU NOME É EUSÉBIO
A fama precedia Eusébio. Chegou a Lisboa em 15 de dezembro de 1960, faltava meia hora para a meia-noite. Desde um ano antes que se começara a ventilar a hipótese de um talento invulgar do Sporting de Lourenço Marques poder ingressar num clube da metrópole.
O benfiquismo ao serviço do Benfica constituiu-se como vantagem decisiva na contratação do miúdo de Moçambique. Onde quer que despontasse um novo valor, logo um benfiquista trataria de informar os dirigentes do Clube, o que permitiu a antecipação à concorrência e o acordo com o jogador e o SLB.
À chegada ao aeroporto, perante jornalistas e fotógrafos que o aguardavam, Eusébio apresentou-se. Disse o nome completo, a idade, há quanto tempo jogava futebol e o número de chamadas à seleção da província. Revelou ainda que jogara sempre com o n.º 10 nas costas. Escreveu o jornalista do Mundo Desportivo: "Entre sisudo e sorridente, despediu-se de nós e lá foi a caminho do Lar do Benfica com muitas esperanças na bagagem."

CARTÃO DE VISITA
A estreia de Eusébio demorou. O Sporting tentou resgatar o antigo jogador da sua filial. A viagem para Portugal assumiu contornos de missão secreta, com o nome de código Ruth a ser utilizado para afastar intrometidos. O processo arrastou-se durante meses (em abril, Eusébio permaneceu em lugar incerto – soube-se depois ter sido o Algarve, levado pelo dirigente benfiquista Domingos Claudino) e requereu decisão superior, a qual validou o contrato firmado com as águias.
Os relatos sobre o extraordinário talento de Eusébio multiplicavam-se. Logo num dos primeiros treinos, uma jogada formidável levou Guttmann a dizer a Calado: "É ouro, é ouro." Os titulares da linha avançada perguntavam-se qual deles sairia do onze para entrar o miúdo. E o momento tão aguardado finalmente chegou. Em meados de maio de 1961, com o bicampeonato garantido, o Benfica preparava a estreia na final da Taça dos Clubes Campeões Europeus. Dias antes da partida para Berna, a 23, os encarnados defrontaram o Atlético no Estádio da Luz, um amigável para a despedida dos jogadores. Eusébio estreou-se e fez um hat-trick na vitória por 4-2. Incompreensivelmente, o Benfica foi obrigado a disputar a 2.ª mão dos quartos de final da Taça de Portugal no dia seguinte ao feito europeu. Enquanto a primeira equipa celebrava, os reservas atuaram. Não chegou para a passagem de eliminatória, mas Eusébio apontou o seu primeiro golo oficial de águia ao peito. Ainda alinhou frente ao Belenenses na última jornada do campeonato (com um golo apontado), sagrando-se campeão nacional. Mas foi em Paris, passadas duas semanas da estreia oficial em Setúbal, que Eusébio se deu a conhecer ao mundo. Marcou nas meias-finais do torneio internacional e, na final, foi chamado por Guttmann com o resultado a cifrar-se em 4-0 para o Santos, de Pelé, logo ampliado para a mão-cheia. Eusébio revolucionou a equipa e fez um hat-trick, e José Augusto ainda desperdiçou uma grande penalidade que faria o 5-4. O Santos venceu por 6-3, mas Eusébio foi a figura do jogo.

AFIRMAÇÃO EUROPEIA
O descalabro frente ao Peñarol na 2.ª mão, no Uruguai, da Taça Intercontinental motivou Guttmann a chamar Eusébio e Simões de urgência para o jogo de desempate. Os dois jovens jogadores rumaram de Lisboa a Montevideu, representaram as águias, e Eusébio marcou o golo benfiquista na derrota por 2-1. Não mais largou a titularidade.
Na primeira época completa (1961/62) pelos encarnados, Eusébio participou em 31 jogos e apontou 30 golos. Fez 20 anos em janeiro e já era escolha permanente num Benfica campeão europeu, bicampeão nacional e, de novo, finalista europeu.
A final com o Real Madrid era o tira-teimas. O campeão europeu em título defrontaria o vencedor das cinco primeiras edições. E o jogo começou de feição para os madridistas, com um bis de Puskás. Águas e Cavém recolocaram o Benfica no jogo, mas o avançado húngaro devolveu a vantagem ao Madrid. No segundo tempo, Coluna fez o terceiro golo benfiquista, e eis que surgiu Eusébio em grande destaque. Ainda antes da linha de meio-campo, o moçambicano encetou uma jogada individual para só ser travado em falta já na área contrária. Concretizou de grande penalidade e bisou passados cerca de cinco minutos, ao desferir um potente remate de fora da área a passe curto de Coluna num livre direto. O Benfica foi bicampeão europeu, e nasceu uma lenda.

MELHOR JOGADOR DA EUROPA
Eusébio é o único vencedor de uma Bola de Ouro ao serviço de um clube português. O prémio da France Football foi-lhe atribuído em 1965.
Já ficara perto da vitória em 1962, ano em que Masopust, do Dukla Praga, foi o eleito com mais 8 pontos do que Eusébio, o seu direto perseguidor. Foi o 5.º mais votado em 1963 e o 4.º em 1964. Voltou a ser 2.º em 1966 a apenas 1 ponto de Bobby Charlton (o correspondente português da France Football deu o voto ao inglês). Voltou a figurar no top 10 em 1967 (5.º), em 1968 (8.º) e em 1973 (7.º).
Em 2003, no cinquentenário da UEFA, foi eleito 7.º melhor jogador da história. O IFFHS considerou-o o 9.º melhor jogador do século XX.

O MUNDIAL DE EUSÉBIO
Foram 7 os benfiquistas convocados por Manuel da Luz Afonso para o Campeonato do Mundo de 1966. E, além de Coluna, Cruz, Eusébio, Germano, José Augusto, Simões e Torres, Otto Glória tinha também sob as suas ordens Jaime Graça, entretanto contratado pelo Benfica após brilhar no Vitória de Setúbal.
Nas eliminatórias de qualificação, tendo por opositores Checoslováquia, Roménia e Turquia, dos 9 golos apontados por Portugal, 1 foi de Jaime Graça, outro, de Coluna, e os restantes 7, de Eusébio. Já na fase final, a estrela do Benfica, desta feita com o 13 no dorsal da camisola, marcou 9 dos 17 golos portugueses (os restantes, exceto o autogolo de um búlgaro, foram todos da autoria de jogadores do Benfica), sagrando-se melhor marcador do Mundial.
Portugal logrou a obtenção do 3.º lugar, fruto de uma campanha totalmente vitoriosa na fase de grupos (Hungria, Bulgária e Brasil), de uma vitória épica frente à Coreia do Norte, por 5-3, nos quartos de final, e de ter derrotado a URSS, por 2-1, no jogo de atribuição do 3.º lugar após sair derrotado, por 1-2, nas meias-finais, pela seleção anfitriã, a Inglaterra, que venceria a competição. O segundo golo do Pantera Negra frente ao Brasil é antológico, o póquer à Coreia do Norte, virando um jogo que parecia perdido aos 25 minutos com o resultado em 0-3 para os norte-coreanos, lendário.

GOLOS E MAIS GOLOS
Eusébio foi amigo das redes das balizas. Sem os remates poderosos do avançado do Benfica, teriam passado bem mais despercebidas. Num total de 614 jogos pela primeira equipa das águias, o Pantera Negra marcou 638 golos. Em competições oficiais somou 482 golos em 450 jogos. No Campeonato Nacional, pelo Benfica, foi autor de 317 golos em 301 partidas (marcou mais 3 pelo Beira-Mar).
Na Taça de Portugal acrescentou 98 ao seu pecúlio (em 61 jogos). Apontou 57 nas competições europeias, dos quais 46 na Taça dos Clubes Campeões Europeus. Foi especialista das bolas paradas (um estudo de Alberto Miguéns indica 74 grandes penalidades convertidas e 46 livres diretos transformados em golo – incluindo jogos amigáveis).
Foi o melhor marcador do Campeonato Nacional em 7 temporadas, da Taça dos Clubes Campeões Europeus em 3, e do Mundial de 1966. Ganhou a Bota de Ouro, o prémio destinado ao melhor marcador de todos os campeonatos europeus, em 1967/68 (primeira edição) e em 1972/73. Apontou 41 golos nas 64 internacionalizações A. E foi também pródigo nas assistências, tanto em bola corrida como em bolas paradas (exímio marcador de cantos).

SINÓNIMO DE CONQUISTAS
A notável carreira de Eusébio, repleta de golos e extraordinárias exibições, é ainda mais valorizada pelo impressionante palmarés. Serviu o Benfica durante 15 temporadas, sendo figura de proa em quase todas. Foi campeão europeu, ajudou o Benfica a chegar a mais 3 finais da principal prova europeia, sagrou-se campeão nacional 11 vezes (recordista no Clube) e ganhou 5 Taças de Portugal e 5 Taças de Honra.

SE NÃO FOSSEM AS LESÕES…
Imagine-se o que teria sido a carreira de Eusébio na plenitude das suas capacidades físicas. Quantos mais anos teria jogado pelo Benfica? Qual seria o total de jogos e golos de águia ao peito? Que celebrações de títulos e troféus ficaram por fazer?
No tempo em que "ir à faca" era uma expressão mais literal do que se poderá imaginar no presente, Eusébio foi alvo de seis operações ao joelho esquerdo e uma ao direito durante a carreira. Para agravar, as metodologias de recuperação eram ainda pouco desenvolvidas.
Eusébio, sempre uma seta apontada à baliza, foi vítima de marcações impiedosas (eufemismo para violentas) numa era do futebol em que não havia ainda cartões amarelos, e as condições dos relvados (ou pelados!) eram genericamente precárias.
Acresce a impossibilidade de substituições até ao final dos anos 60: ou seja, um jogador entrava de início ou não jogava. Eusébio, mesmo debilitado, tinha de estar sempre em campo (como o fez, por exemplo, na final da Taça dos Clubes Campeões Europeus em 1963, na qual marcou um golo). Ademais, vivia-se num tempo em que a relevância das receitas dos jogos particulares, nomeadamente daqueles inseridos em digressões pelo estrangeiro, era muito significativa. E o cachet, para o Benfica, variava consoante a presença de Eusébio em campo ou não...

HUMILDADE E DESPORTIVISMO
A celebração, por Eusébio, da conquista da Taça dos Clubes Campeões Europeus, de tronco nu carregado em ombros, é uma imagem icónica. Com uma das suas mãos, enfiada nos calções, agarrava a camisola de Di Stéfano. A blanca do seu ídolo no futebol era, para o moçambicano, tão valiosa quanto a conquista da prova europeia, não obstante a sua participação decisiva no desfecho do encontro. Outro gesto do astro do Benfica por todos recordado foi o cumprimento a Stepney, guarda-redes do Manchester United, pela defesa a remate isolado, próximo do derradeiro apito, que daria a vitória ao Benfica na final da Taça dos Clubes Campeões Europeus em 1968.
Estes são apenas dois dos muitos episódios reveladores da personalidade de Eusébio, por todos reconhecida e apreciada, até por adversários bastas vezes "castigados", em campo, pela genialidade do símbolo do Benfica.

HOMENAGEM EM VIDA E MORTE
Eusébio faleceu em 5 de janeiro de 2014, tinha 71 anos. A romaria de milhares de benfiquistas ao Estádio da Luz, ao longo desse dia e do seguinte, foi impressionante. Assim como o foi a presença de tantos milhares de adeptos nas ruas de Lisboa para acompanharem o cortejo fúnebre. As homenagens prestadas por clubes de todo o mundo fizeram jus a um dos mais formidáveis jogadores da história do futebol. As realizadas por Real Madrid e Manchester United sobressaíram entre as demais.
Diz-se, no entanto, que as homenagens devem ser feitas em vida. Eusébio teve muitas e mereceu-as todas. Embaixador do Benfica e da seleção nacional, foi imensamente acarinhado por adeptos locais onde quer que se deslocou no estrangeiro. O Benfica criou a Eusébio Cup, dedicou-lhe um espaço exclusivo no museu e erigiu uma estátua, inaugurada em 1992 por ocasião do 50.º aniversário da maior figura do Clube, que ainda hoje é cenário preferencial de fotografias no Estádio da Luz.
O enorme Benfica tornou-se ainda maior com Eusébio. Uma lenda, um mito, protagonista de incontáveis feitos extraordinários e bem reais. Obrigado!"

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