"Na longa lista de treinadores que já dirigiram a canarinha, há um único estrangeiro que desempenhou o cargo a sério: Jorge Gomes de Lima, um alfacinha que fez do Brasil a sua casa e levou o escrete a duas vitórias contra o Uruguai uns anos antes do Maracanaço
Quem aceitar pegar nas rédeas da canarinha arrisca-se a duas coisas: ser campeão do Mundo ou ser apelidado de burro porque não convocou este jogador ou perdeu aquele jogo contra uma equipa mais fraca. E comparadas com o Brasil, são quase todas, tanto para os brasileiros como para o mundo em geral.
Em 1944, quando o mundo ainda estava envolvido no banho de sangue da II Guerra Mundial, um treinador português já era um mister de sucesso no Brasil. Nesse ano, uma década antes de Jorge “o Mister” Jesus nascer na já popular cidade da Amadora, Jorge Gomes da Silva aceitava o convite para dirigir a seleção a meias com Flávio Costa, que ficaria no cargo até 1950. Joreca, como era conhecido, já tinha sido campeão paulista pelo São Paulo e sentou-se no banco do escrete em dois jogos contra o Uruguai, vencendo ambos, o primeiro por 6-1 e o segundo por 4-0.
Na altura, apesar de o Brasil ter grandes jogadores como Leônidas da Silva ou Ademir, os uruguaios já tinham sido campeões do mundo. Depois destas goleadas, em 1950, já só com Flávio Costa no banco, o Brasil sofreria um dos maiores desgostos da história coletiva do país com uma derrota na final com o Uruguai, no Rio de Janeiro, perante 200 mil pessoas que lotavam o acabado de estrear Estádio do Maracanã. Flávio “Burro” Costa saiu do cargo, o goleiro Barbosa carregaria a cruz da derrota até ao fim da vida e até a camisola branca com que o Brasil jogou a final foi banida durante décadas.
Joreca já não viu nada disto. O coração traiu-o um ano antes, matando-o relativamente novo (para os parâmetros da época), aos 45 anos.
Mas está na história do desporto e do futebol brasileiros e nem sequer, ou apenas, por ter sido o único estrangeiro a dirigir a seleção. Chegou ao Brasil ainda jovem, formou-se em Educação Física e iniciou-se na vida profissional como jornalista desportivo e depois relatador e comentador de jogos na rádio. A boa locução e preparação técnica fizeram dele uma figura conhecida.
Iniciou-se no futebol na já então muito pouco invejada função de árbitro e dirigiu o jogo de estreia de Leônidas “Diamante Negro” da Silva, o homem que os brasileiros gostam de creditar como o inventor da bicicleta, mas que confessou ter copiado o difícil gesto técnico do chileno Ramón Unzaga.
No ano seguinte, em 1943, foi contratado como treinador para salvar o São Paulo de um início de época devastador. Tinha largado o apito para treinar a seleção amadora de São Paulo e os bons resultados foram imediatos. Nesse mesmo ano, já pelo São Paulo, conquistaria o primeiro de três campeonatos paulistas. O primeiro, reza a lenda, terá sido ganho com o sistema de moeda ao ar e o “portuga” apostou que a moeda ficaria de pé, como o folclore tricolor diz que ficou.
Depois da experiência na seleção, ainda dirigiu o rival Corinthians. Não ganhou títulos, mas terá sido ele a ensinar o avançado Baltazar a cabecear as bolas tão bem que ganhou a alcunha (apelido, em português do Brasil) de cabecinha de ouro.
O físico compacto e a boa forma ainda o levaram a uma experiência cem por cento vitoriosa no boxe: dois combates, duas vitórias.
Continua, até agora, a ser o único estrangeiro a dirigir a seleção do Brasil num par de jogos minimamente competitivos, apesar de serem amigáveis. Depois dele, já em 1965, o argentino Filpo Nuñes dirigiria uma equipa brasileira só formada por jogadores do Palmeiras. Nada que se compare ao feito de Joreca, o primeiro Mister português a conquistar o Brasil."
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