"Personifica a figura de anti-herói do futebol contemporâneo: rejeita vedetismo, mostra-se avesso às redes sociais mas, apesar de parcimonioso na escolha de palavras, não deixou nada por dizer. Em 2017, tornou-se o jogador mais velho de sempre a competir na Primeira Liga ao serviço do Desportivo da Aves, clube onde actualmente desempenha as funções de treinador de guarda-redes. Sporting de Braga e Benfica completam o escasso rol de emblemas que representou, numa das mais extensas carreiras que o futebol português conhece. Em mais um exclusivo Bola na Rede, fomos à bola com Quim, um jogador à antiga.
– Ó tempo volta para trás –
“Jorge Jesus considerava que eu era baixo”
Quim, obrigado por teres aceitado o nosso convite. Deixa-me começar esta entrevista por aquela que foi, provavelmente, a melhor opção da tua carreira: não teres substituído a inicial do teu nome por um “K”, quando te disseram que Joaquim não era nome de jogador.
(risos) Foi logo no início da minha carreira no Braga. Quando saí do Ruivanense para o SC Braga, ainda iniciado – tinha 14 anos quando lá cheguei -, o falecido treinador Orlando Sampaio perguntou-me o nome e respondi “Quim”; “Com “k” ou sem “k”?” e eu disse “Quim normal”.
Já voltaste a fazer uma corridinha desde a final do Jamor?
Fiz, mas não foi nada de especial. Como comecei este ano a treinar os guarda-redes, vou fazendo algumas coisas. Após a final do Jamor, estive ligado ao dirigismo e, nesse período, não fiz nada. Estive um ano praticamente parado.
Sequelas das duas cãibras que tiveste durante o jogo?
Em alguns jogos temos necessidade de parar o jogo, de cair no chão para acalmar a equipa… é uma estratégia de jogo e eu tinha muito isso: quando a equipa estava a ser muito sobrecarregada na defesa, tinha muitas iniciativas dessas. Não é bom para o futebol, reconheço, mas é bom para a minha equipa. Mas nesse jogo lembro-me que tive duas cãibras e não foi para passar tempo, foi mesmo porque era um jogo muito complicado, com muita carga emotiva e se calhar foi por aí.
O principal factor num guarda-redes continua a ser, a teu ver, a força mental?
Sem dúvida. Enquanto treinador de guarda-redes, tento incutir isso no meu grupo de trabalho. Os treinadores de guarda-redes baseiam-se muito em aspectos que (…) há outras prioridades. Para mim, um dos principais focos tem que ser o psicológico. Ser guarda-redes não é fácil, é um lugar específico: é o último a ser batido e requer muita responsabilidade. Olhar para trás é o pior que podemos fazer; temos é de olhar em frente e trabalhar esse erro.
Manuel Cajuda dizia na semana passada ao Bola na Rede que foi o primeiro treinador a trazer a figura do psicólogo para o futebol português e, inicialmente, não foi algo bem-visto. És da opinião que faz sentido a inclusão de um psicólogo na equipa técnica?
Sim, sou a favor disso. Vemos que, hoje em dia, as grandes equipas têm na sua estrutura um psicólogo que ajuda não só jogadores, mas staff também. Para além do Manuel Cajuda, recordo-me que o Scolari também trouxe um psicólogo que, a meu ver, ajudou muito a Selecção.
Era esta força que te fazia acordar e levantar da cama quando, em estágios, o Tiago te mandava ir apagar a luz do quarto?
Isso são brincadeiras de estágios, entre amigos, que são importantes dentro de um balneário.
A camaradagem de outrora já lá vai ou resistiu ao tempo?
Já lá vai. Sou do tempo em que não havia telemóveis nos balneários. Havia brincadeiras entre todos, não era só um ou outro; eram todos: estrangeiros, portugueses… era tudo diferente de hoje em dia. Actualmente entra-se num balneário e vê-se três ou quatro a conversar e o resto com os fones, ou no Instagram… os tempos são diferentes e prejudicam o ambiente de balneário. Antigamente, as brincadeiras ajudavam um grupo a criar laços importantes no futebol. Felizmente tive sempre grandes balneários. Muita gente fala da família do futebol e eu tive a felicidade da maior parte ser uma família. As tecnologias vieram tirar muito disto.
Que história de balneário nunca contaste publicamente?
O que se passa lá dentro fica lá dentro. Tem de ser assim.
Porque é que, em mais de 20 anos de carreira, dizes que a transição de júnior para sénior foi a maior dificuldade que sentiste?
Os tempos mudaram, não só nestas coisas da tecnologia nos balneários. Actualmente existem campeonato sub-23 e equipas B, que no meu tempo não havia. Na transição de júnior para sénior, estive praticamente três anos sem jogar. Essa altura é difícil para um jogador de futebol; felizmente tive a sorte de pensarem que podia ter qualidade para jogar na equipa principal e mantiveram-me nos plantéis, mas sei de jogadores do meu tempo que não tiveram essa oportunidade. Havendo equipas B e sub-23 seriam mais dois ou três anos para provarem que tinham qualidade para jogar na equipa principal. Quanta mais competição tivermos, melhor somos, porque treinar não é a mesma coisa que jogar.
A questão da altura para guarda-redes também representou uma limitação?
Toda a gente diz que um guarda-redes tem que ser alto. O Jorge Jesus, por exemplo, considerava que eu era baixo; para ele, um guarda-redes tinha de ter para cima de 1,90m. Fiz a carreira que fiz com 1,84m, do qual eu me orgulho e fui campeão pelo Benfica duas vezes, ganhei a Taça de Portugal pelo Aves… orgulho-me daquilo que fui. Mas também te digo: se me senti prejudicado? Se calhar senti. Sei perfeitamente que, cada vez mais, as estruturas das equipas têm nas camadas jovens métodos que anteriormente não tinham, têm maneiras de conseguir ver, aos 13 ou 14 anos, a altura que irão ter quando tiverem 18 ou 19 anos.
– Anti-herói –
“Cajuda dizia-me que não era estético usar calças em vez de calções em campo”
Lembras-te do momento em que o mister Manuel Cajuda te disse que ias estrear-te pela equipa principal do Braga?
Lembro-me, porque o primeiro jogo fica sempre na memória. Só soube na palestra antes do jogo e, se calhar, foi o ideal, porque não houve tremedeira durante a semana ou no estágio. Fui mandado para dentro do campo poucas horas depois e foi óptimo. A partir do momento em que o árbitro apitou, passou o nervosismo, porque o foco é dentro das quatro linhas e esquecemos o resto.
Quanto ficou esse jogo?
Sei que foi em Setúbal (…) ficou 0-0!
Isto foi antes ou depois do mister Cajuda ter descoberto que fumavas às escondidas?
Não faço ideia (risos). É algo de que não me orgulho. Hoje em dia não fumo. Deixei a partir do momento em que tive uma lesão no tendão de Aquiles, mas posso dizer que fumei desde os 18 até aos 34 anos. É um vício tremendo, não foi fácil deixar, mas felizmente consegui.
A titularidade não teve continuidade e nas primeiras três épocas como sénior do Braga somas apenas cinco jogos no campeonato. Como geriste esta situação?
Tendo consciência da qualidade que sabia que tinha e tendo a confiança das pessoas da estrutura do clube. Sabia que mais cedo ou mais tarde poderia jogar assiduamente e veio a acontecer. Tive também a felicidade de trabalhar com grandes guarda-redes, que me ajudaram nessa altura, como o Rui Correia e o José Nuno Amaro.
É-te reconhecido um talento natural e és tido como alguém pacato e humilde, mas que guardava o esforço para os jogos. Esta postura pode ter-te custado caro ao longo da tua carreira?
Não concordo muito com essas opiniões… trabalhava, mas, como disse anteriormente, treinar é diferente de jogar. Havia sempre aqueles treinos, normalmente no dia antes do jogo, em que relaxamos mais e, se calhar aí, posso admitir que sim. Mas tentava dar sempre o meu melhor. Também te posso dizer que há jogadores que chegam aos treinos e partem tudo, com uma qualidade tremenda, e chegam aos jogos e as coisas não saem; isso é pior.
É inevitável perguntar-te também pela questão da imagem. Numa entrevista ao Jornal i, o mister Manuel Cajuda disse “Não era vaidoso, nunca gostou de falar muito, de dar muitas entrevistas. Por essa razão não tinha o marketing de outros.” Sentes que foste prejudicado por não ir ao encontro das axtuais convenções do mundo do futebol?
Sem dúvida. Não ia mudar a minha maneira de ser. Muita gente chegava ao pé de mim e dizia “Tens de mudar o visual, a tua maneira de ser” e eu dizia “Sou o que sou, farei a carreira que tiver de fazer e o valor é meu, não é do meu visual”. Fiz o que fiz graças à minha qualidade, não por causa da minha cara, do meu cabelo, como me visto ou como me equipo… lembro-me do mister Cajuda dizia que não era estético usar calças em vez de calções em campo. Sei que o visual é importante num jogador de futebol, cada vez mais; as próprias redes socias, que não utilizo… fui sempre diferente neste sentido.
Mais difícil era manteres-te fiel à tua vontade numa mesa com o Barroso e com o José Nuno Azevedo.
(risos) Epá, isso é uma história… Não foi só comigo! Eles guardavam sempre um lugar na mesa para o mais novo e a primeira vez que fui convocado disseram-me “Ó Quim vais sentar-te aqui” e lá me sentei. Depois percebi porquê: quando vieram servir-nos o vinho, disse ao senhor do restaurante que não bebia e o Barroso e o Zé Nuno diziam “Tens de beber! Bora!” e lá deixei que me enchesse o copo; quando acabaram os deles, vieram buscar o meu. Assim bebiam dois copos de Muralhas.
Na temporada 1997/98 ganhas o lugar a Wozniak e nunca mais o largas até saíres para o Benfica, em 2004. As gentes de Braga ficaram chateadas contigo?
É difícil responder… o Braga autorizou-me a sair, recebeu uma proposta e viu que era boa para o clube. As condições que me foram oferecidas pelo SL Benfica também eram melhores do que as que tinha, senão não ia. Não é por aí que as pessoas possam ficar sentidas comigo. Continuo a dizer que devo a minha carreira ao Braga e aquela cidade será sempre uma casa. Se me perguntarem por um clube de que gosto e apoio na primeira divisão digo o Braga, sem problemas. No entanto, e porque lá estive seis anos, também posso dizer que aprendi a ser do Benfica, porque é um clube fantástico; para mim é o maior clube português, sem qualquer dúvida.
– Trapattoni, Koeman e Jesus ou O Bom, O Mau e O Vilão –
“Saber pela televisão [que não contava para Jesus] não foi fácil”
Quando chegas ao Benfica, já havias dividido o balneário e a baliza da Selecção com Moreira. Como era a vossa relação?
Era boa. Como disseste, já conhecia o Moreira do Euro 2004 e não tenho nada a apontar-lhe. Era um jovem com qualidade e, tal como eu, queria jogar. Continuo a dizer que fiz a carreira que fiz graças aos meus concorrentes, porque obrigaram-me a trabalhar mais e melhor.
O que aconteceu para que, após a pesada derrota no Restelo, Trapattoni te desse a titularidade?
Lembro-me perfeitamente desse jogo e não deu qualquer justificação, nem ao Moreira, nem a mim; simplesmente disse-nos que ia mudar. Foi um resultado difícil [4-1] e, se calhar, foi por aí.
Como era o italiano em privado?
Era uma pessoa fantástica. Não é por nada que lhe chamam “Velha Raposa”. Ele não aprendia porque, de futebol, sabia tudo, só tinha a ensinar. E apesar da idade e do estatuto, chegou ali e corria connosco; ia à frente do pelotão. Tinha grandes conversas connosco… dentro do balneário, o importante é puxar os jogadores para o lado do treinador e ele conseguiu ter o plantel todo do seu lado. O Karadas veio como avançado-centro e ele foi capaz de convencê-lo a jogar a central, algo impensável. Para um treinador isto é meio caminho para as coisas saírem bem. Foi a peça mais importante para a conquista do título.
Que momentos recordas desse campeonato?
Dou-te três momentos. O último jogo no Bessa: foi um sentimento que ficará connosco. Sonhamos jogar num grande clube e ser campeão nacional e consegui. Foi um sonho concretizado. Outro foi a viagem do Bessa até Lisboa. Só do estádio até ao aeroporto Francisco Sá Carneiro demorámos não sei quantas horas; tantos benfiquistas que não nos deixavam passar, ainda para mais no Porto! E o golo do Luisão frente ao Sporting nos instantes finais.
Com Koeman, após a chegada de Moretto, perdes o lugar de titular até ao final da época. Foi-te dada alguma explicação?
Essa fase da minha carreira não foi fácil, porque eu estava a jogar e tive a infelicidade de, num jogo da Liga dos Campeões, em Villarreal, contrair uma hérnia inguinal. Fui operado na Alemanha e, pouco tempo depois, apesar de dizer claramente que ainda não estava em condições, fiz um forcing para jogar, apesar das dores: o mister Ronald Koeman insistiu, porque a equipa precisava de mim – o Moreira estava lesionado e só tínhamos o Rui Nereu – e ainda que não pudesse bater os pontapés de baliza, lá consegui. Durante duas ou três semanas, estive a jogar limitado, prejudicando a minha saúde, a pedido do treinador. Foi para mim um espanto quando, em dezembro, contrataram o Moretto numa quarta-feira e no sábado estava a jogar. Sem explicações. O futebol tem injustiças que não conseguimos explicar.
O que é que mudou com a chegada de Jorge Jesus à Luz?
O Jorge Jesus tem uma maneira de ser especial. Como treinador, ajudou muito a equipa. O que ele trouxe, a nível defensivo (…) não é fácil fazer o que Jesus fez nesse ano. Conseguiu pôr a defesa tão organizada que parecia que estavam sempre em linha. A exigência dele no treino era tão grande que a equipa chegava aos jogos e fazia igual. Ele tinha uma expressão “Bola coberta” e “Bola descoberta”… só mesmo ele. Defensivamente essa equipa era fantástica. Para a frente, a qualidade de jogadores que tínhamos nesse ano era imensa; era fácil.
Essa exigência é um pau de dois bicos?
Como treinador, é dos melhores com quem trabalhei. Vai ao pormenor, mas muitas vezes torna-se cansativo. Um ano inteiro a trabalhar com ele não é fácil, mas para as coisas saírem perfeitas tem de ser mesmo assim.
Convidado do programa “Trio D’Ataque”, o agora treinador do Flamengo disse “O Benfica vai contratar um guarda-redes e ficar com três. O Quim sabe, perfeitamente, qual é a minha ideia”. Sabias realmente qual era a ideia de Jorge Jesus?
Não sabia. Foi uma das coisas que não percebi no futebol. Não é fácil fazer 30 jogos e sair. Não digo que fui dispensado, porque terminava o contrato, mas o Moreira também acabava – não fez jogo nenhum para o campeonato – e continuou; o próprio Júlio César ficou. O guarda-redes que fez 30 jogos no campeonato não foi sequer consultado para saber se queria continuar. Para mim foi complicado e, o que soube, foi pela televisão. Mas sabia perfeitamente que, se houvesse vontade do treinador em que eu continuasse, ter-me-iam dito mais cedo; tinha esta consciência, mas saber pela televisão não foi fácil.
Terias aceitado ficar no Benfica sabendo que não serias a primeira opção?
Não vejo por que não. A minha maneira de pensar não iria ser a de segunda opção: iria trabalhar para ser a primeira. Se calhar no início (…) repara numa coisa: o Roberto, quando chegou, as coisas não lhe correram muito bem… eu ficando lá, sabia perfeitamente que podia entrar e seria tudo diferente. O futebol é mesmo assim.
– Imperador em Bracara Augusta –
“Acredito que, mais ano, menos ano, o Braga será campeão nacional”
Porque é que voltas a Braga?
Como foi público que não ia ficar no Benfica, passados poucos dias ligou-me o Presidente do Braga, a perguntar-me se queria voltar. Não pensei duas vezes: o Braga para mim foi tudo e adoraria ter terminado lá a carreira. Era o meu objectivo quando saí do Benfica.
A lesão no tendão de Aquiles, contraída ainda durante a pré-época, levou-te a ponderar terminar ali a carreira?
Algumas pessoas quiseram que eu pensasse nisso. Não digo que foi propositado; fizeram-no porque a lesão era tão complicada que, para meu bem, tentaram “alertar-me” que seria difícil continuar a jogar ao mesmo nível. Mas disse para mim mesmo “Não! Isto vai passar-me, vou trabalhar para voltar a jogar!”. Não me fiquei, não me dei por vencido e, felizmente, consegui – apesar de, dois meses após ser operado, ter tido uma recidiva e ter de voltar a ser operado, que me deixou praticamente um ano sem jogar.
É nessa altura, de maior stress, que deixas de fumar.
Os médicos do clube aconselharam-me a fazê-lo, porque fumar prejudicava a recuperação.
Regressas à competição na época seguinte e assumes-te como titular indiscutível na equipa de Leonardo Jardim. Já se lhe antevia qualidade para outros voos?
Lembro-me que existiam algumas dúvidas acerca da qualidade do mister Leonardo quando chegou a Braga, apesar da boa réplica no Beira-Mar, mas que ficaram desfeitas após essa época. Tinha uma grande qualidade, não só como treinador, mas também como pessoa. Conseguiu pôr um grupo de jogadores, titulares e suplentes, a lutar pelo mesmo objectivo; tinha mão neles todos.
Na última época ao serviço dos minhotos, pese embora percas o estatuto de titular absoluto, és determinante na conquista da Taça da Liga. Foi este o accionar do gatilho que faltava ao Braga para se assumir de vez como candidato ao título de todas as provas internas?
Acredito que sim. Quando regressei ao Braga, era tudo muito diferente de quando fui para o Benfica… quando saí, o clube já estava a subir, mas, quando voltei, deparei-me com um clube que já podia ser considerado “grande”. Ainda sou do tempo em que o Braga lutava para não descer. Consegui apanhar o clube em crescendo, as várias fases, que culminaram num Braga a lutar pelos primeiros lugares e pela Europa, mas faltava sempre um título. As pessoas sabiam que o mais difícil seria o primeiro e, quando conquistámos essa Taça da Liga, sentimos isso. Foi muito importante para o clube ter conquistado esse troféu. Acredito que mais ano, menos ano, o Braga será campeão nacional.
Para fechar o capítulo Braga, não posso deixar de perguntar se tens remorsos por ter tirado ao Hulk a possibilidade de repetir o golo de Roberto Carlos frente ao Tenerife com uma defesa impossível.
Essa foi daquelas defesas que não consigo explicar, que saem (…) tive a felicidade de tocar na bola e desviá-la para cima, porque em lances daqueles tocamos na bola e ela vai para dentro da baliza. Não estava à espera que o Hulk fosse pô-la na baliza. É uma defesa que fica na memória.
– Velhos são os trapos –
“Se não tivéssemos vencido a Taça e se o clube quisesse, continuava mais uma época”
O ingresso no Desportivo das Aves foi encarado como um passo atrás para dar dois à frente ou deveu-se apenas ao prazer de continuar a jogar?
De maneira alguma. Tinha possibilidade de continuar a jogar na Primeira Liga depois de sair do Braga, mas a partir do momento em que apareceu o Desportivo das Aves disse “É isto!”. A idade já era um bocado avançada e queria ficar em “casa”, estar próximo da família; da Vila das Aves até onde moro são 15/20 minutos. O Aves era um clube com o qual me identificava, um clube humilde e que me abordou de uma maneira de que gostei. O objectivo era ajudar o clube a subir de divisão e conseguimos. Nunca me irei arrepender desta decisão.
Nos anos que antecederam a subida de divisão, foste eleito o melhor guarda-redes a actuar na Segunda Liga por duas ocasiões. Sentias que ainda tinhas capacidade para estar na primeira divisão?
Posso dizer-te que, no final do primeiro e segundo ano no Aves – e, se calhar, no final do terceiro ano, também – tive propostas para voltar à Primeira Liga. O objectivo não era jogar na primeira ou na segunda divisão, mas sim jogar onde me sentia bem e onde as pessoas gostassem de mim. Vi no Aves esta oportunidade e preferi continuar no clube, mesmo sendo numa segunda liga, porque mantinha a paixão de jogar futebol e o clube deu-me a possibilidade de fazê-lo até aos 42 anos.
Tocaste num marco histórico. Qual é o significado de bater o recorde de jogador mais velho de sempre a competir na Primeira Liga, ainda mais contra o Benfica e com a exibição que fizeste?
É um como tantos outros. Nunca procurei jogar para bater esse recorde. Aconteceu. Procurava, sim, jogar e sentir-me bem.
Se não tivesses ganho a Taça de Portugal, tinhas-te reformado?
Pergunta difícil (risos). Se não tivéssemos vencido a Taça e se o clube quisesse que continuasse, se calhar continuava mais uma época. Nesse ano, o último de contrato, o Aves praticamente disse-me para fazer o que eu quisesse.
Qual a memória mais forte dessa altura?
A semana seguinte a termos conquistado a Taça de Portugal. Estamos a falar de uma vila com poucas pessoas, mas que mereciam tanto aquela vitória que eu não consigo salientar um momento… foi a semana antes, a semana depois (…) o que as pessoas vibraram! Foi uma alegria imensa para as gentes da Vila das Aves, que continuam, ainda, a sentir esse jogo. Quer queiramos, quer não, o Aves foi apenas o 13.º clube a ganhar uma Taça de Portugal e isto não é para qualquer um.
– Roleta Russa –
“Não é fácil o Aves manter-se na Primeira Liga”
Arrependes-te de não ter experimentado o estrangeiro?
Não sei… tive uma ou outra situação para emigrar, mas os momentos não foram os ideais. Por exemplo, numa delas, a minha esposa estava grávida do nosso primeiro filho e preferi ficar próximo da minha família.
De que equipas estamos a falar?
Esta de que te falei era para a Rússia, para o Dínamo de Moscovo, para onde foram muitos portugueses.
Começaste a ser convocado para as selecções nacionais nos juvenis do Braga e és campeão europeu de juniores em 1994. Quem era a estrela da equipa?
A estrela era a própria selecção. Era composta por jogadores que vinham a fazer grandes campanhas desde os sub-15 e que jogavam juntos há muitos anos. Lembro-me de muitos jogadores que fizeram uma grande carreira: Nuno Gomes, Dani, o próprio Beto…
Baía e Ricardo foram os justos titulares da baliza da Selecção em 2002 e 2004, respectivamente?
Não é a mim que tens de perguntar. Foram dois grandes guarda-redes, que fizeram muito pelos seus clubes e pela Selecção Nacional. Foram opções dos treinadores. O Vítor será sempre o ídolo de infância e o Ricardo também era outro grande guarda-redes. Tive o prazer de jogar com eles e disputar com ambos a baliza da Selecção.
Actualmente és Treinador de Guarda-Redes do Desportivo das Aves. Como vês a actual situação financeira e desportiva do clube?
Não é fácil, mas acredito que as coisas poderão ser diferentes. São situações sobre as quais preferia não falar. Acima de tudo, dizer que o clube tem de ir para a frente, apesar de estar a passar por uma fase difícil; temos de saber conviver com os bons e com os maus momentos, da mesma forma que os jogadores de futebol. Neste momento, sabemos que não é fácil o Aves manter-se na Primeira Liga, mas, caso desça, o objectivo é regressar o mais rápido possível, porque é este o lugar do clube.
Lembrar o Quim é lembrar grandes defesas, títulos e… um gesto muito peculiar quando sofria golos. Tinhas essa percepção?
(risos) Sinceramente não tinha! Só há uns tempos é que me disseram que existia um vídeo no Youtube com esse gesto e realmente confirma-se… era o instinto! Quem reparou, reparou bem!
A defesa mais fácil continua a ser mais importante do que a difícil?
Penso que sim. Enquanto treinador de guarda-redes tento explicar isso. Hoje em dia, o mais difícil é o mais fácil. Podes estar oitenta e tal minutos sem fazer uma defesa e, de um momento para o outro, ser chamado a intervir; tens de estar com a concentração no máximo para quando esse momento chegar.
Obrigado, Quim."
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