"Jota tem a genética de um craque e é dos maiores talentos do futebol mundial da sua geração. Se daqui por um ano houver mais gente a corroborar a ideia expressa nestas linhas, não se admirem: e só o tempo a cumprir o seu dever
Cedo lhe detectaram um talento grandioso o nome tornou-se familiar a todos os scouts do Mundo. Era uma criança com evolução psicológica, física e biológica para concluir, mas a notícia de que o Benfica tinha um fenómeno entre os mais jovens andava de boca em boca - a informação, nestes casos, costuma correr à velocidade do som. Os treinadores do clube e a quase totalidade do corpo técnico da FPF coincidiam na convicção de que o futebol português tinha encontrado o expoente da nova geração. Foi nesse ambiente de admiração e expectativa que Jota (inicialmente João Filipe) viveu e cresceu. Era o herói da comunidade, alvo das atenções do comando e beneficiário do maior temor e admiração dos adversários.
Uma lesão grave travou a afirmação e atrasou o processo de consagração como craque universal. Nada que o tenha impedido de ser estrela das equipas campeãs da Europa de sub-17 e sub-19, feitos que lhe permitiram das lustro à arte de transformar o excepcional em rotina. Porque a maturação da juventude não se faz sempre no mesmo tempo, não delimitou logo espaço na primeira equipa dos encarnados. Instalada a decepção e a dúvida, que funcionavam como sacrilégio, atendendo ao seu passado, viu criadas condições para inviabilizar o reconhecimento unânime. E neste ponto em que nos encontramos.
Jota pertence ao grupo dos que amam o futebol; é elemento de um núcleo privilegiado que não precisou de pobreza, miséria e fome para se expressar. Ao contrário de outros, que só foram vencedores porque se agarraram à bola com apurado instinto de sobrevivência, evitando a derrota social a que pareciam condenados, não precisou de privações para ser orgulhoso e comprometido. Os exemplos de sucesso entre essa população costumam ser mais escassos e só com coragem, atitude, inteligência e convicções fortes é possível superar o suplemento motivacional daqueles que só têm o futebol para ser alguém na vida. Johan Cruyff disse sobre Michael Laudrup que, se encarasse a profissão como a coisa mais importante da sua existência, o dinamarquês teria atingido o nível de Maradona. É essa leveza que Jota terá de combater. Mesmo habituado a que as coisas lhe corram bem, terá de entender que, enquanto a inspiração não chega, é preciso procurá-la com suor sacrifício, trabalhando como operário.
Jota está a perder crédito junto da nação benfiquista, mesmo entre aqueles que se entusiasmaram quando era menino-prodígio do Seixal. As reacções emocionais não assentam em conceitos de fidelidade - por vezes até omitem bom senso e respeito. O adepto responde a impulsos passionais de circunstâncias, pelo que o jogador deve responder na mesma moeda, isto é, com elevado sentido do imediato - aplausos e assobios são sempre efémeros e voláteis. A tarefa é mais difícil para quem só conhecia a face do êxito, da exaltação e do elogio, e tem de ligar com dúvida, indiferença e desconfiança. Encontrou as primeiras perdas no caminho.
Antes de abordar este final de época atípico, Jota terá aceitado sair por empréstimo. Definiu Inglaterra como destino ideal e só em alternativa dará resposta positiva ao fervoroso apelo do Olympiakos de Pedro Martins. O Benfica reconhece nele uma pérola preciosa e o jogador mantém ligado o motor de talento e sonho para cumprir a promessa do fenómeno que sempre foi. Qualquer que seja a decisão, a saída temporária constitui só mais um episódio da história e nunca o seu epílogo prematuro e decepcionante. Jota tem código genético de craque e é dos maiores talentos do futebol mundial da sua geração. Se daqui por um ano houver mais gente a corroborar a ideia expressa nestas linhas, não se admirem: é só o tempo cumprir o seu dever. Não digam, depois, que não foram avisados."
Rui Dias, in Record
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