"Portugal volta hoje ao valor das árvores. Às vezes, quase sempre, saber História torna a vida mais esclarecida e ajuda-nos a entender melhor o presente e as suas razões para perspectivar da melhor forma o futuro. Esta é uma realidade no que respeita à nossa percepção da floresta. Nascemos e crescemos com a convicção de que Portugal é um país florestal e tomamos as extensas manchas verdes do nosso interior como um dado adquirido, como se as árvores sempre estivessem lá estado e nos bastasse a nós colher os seus frutos. Mas, na verdade, trata-se de uma percepção, não de uma vocação simplesmente natural do território.
Até à generalização dos combustíveis fósseis e da electricidade, resultantes da Revolução Industrial, o uso de lenhas como como combustível industrial e doméstico foi de tal modo intenso, que, aliado ao abate para a construção e engenhos, produziu uma escassez tal, que o país urbanizado entrou no séc. XX quase sem árvores, excepção feita ao Pinhal de Leiria, que foi a salvação de muitas indústrias. Um exemplo disto foi a deslocação de fábricas emblemáticas como a Stephens (antidg vidreira) de Coina, nos arredores de Lisboa, onde escasseavam as lenhas, para a Marinha Grande, perto da fonte energética proporcionada pelo grande pinhal. Estávamos no tempo de avaliar a árvore pelo valor da madeira e da energia.
Emblemático é também todo o movimento de arborização da primeira metade do séc. XX, em que se mudou a face das nossas paisagens rurais e se criou o país florestal que hoje todos damos como adquirido e que, realmente, parece que sempre aqui esteve. Na Primeira República, importantes projectos de arborização e educação ambiental foram lançados, com um triplo sentido económico, ambiental e cidadão, com destaque para as sucessivas 'Festas da Árvore' que envaideciam as vilas e cidades de todo o país. O Estado Novo continuou de forma sistemática e prolongada criando uma certa cultura campesina de plantação de pinhal como forma de entesouramento e investimento da economia doméstica. Dali se casavam os filhos, se valiam na tragédia ou na doença, dali também se comprava a passagem para emigrar e fugir da miséria. Foi o tempo da árvore avaliada pelo uso como matéria-prima e pé-de-meia familiar. Pelo caminho, limpavam-se matos, mondavam-se árvores adultas no abate selectivo para não depenar o pé-de-meia, geriam-se as manchas florestais por entre os terrenos agricultados.
Não tardou que todo este mundo desabasse a partir do Plano Marshall e entrássemos pelas décadas de 60 e 70 a abandonar os campos e substituir áreas agrícolas por pinhais e, sempre em busca de rápido retorno, eucaliptos que medram bem e rendem depressa. Foi o tempo das enormes manchas florestais e da árvore avaliada pela pasta de papel num país que é um dos maiores produtores mundiais. Hoje, o círculo vicioso do aquecimento global e do desordenamento florestal ataca a nossa segurança e o nosso bem-estar colectivo, consumido, paradoxalmente, muita da riqueza que produzimos no esforço de corrigir e repor a situação.
Hoje, sabemos bem que, afinal, o valor de uma árvore não era verdadeiramente nenhum dos que historicamente lhe conferimos. O seu valor é nada menos que a vida na Terra tal como a conhecemos. Por isso tocamos a reunir e convocamos o Benfica, as escolas, as famílias e a sociedade civil. Por isso voltamos ao velho espírito das Festas da Àrvore e queremos 'Fazer de cada Escola um Viveiro'. Começámos pelas zonas ardidas, mas, porque somos quem somos, temos muita ambição!"
Jorge Miranda, in O Benfica
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