"Levou o cão, o treinador teve de deixá-lo ficar preso ao poste; Hagan atirou-lhe bola à cara, safou-se da pedra...
1. Ainda antes dos 18 anos, assinou com o primeiro contrato profissional. «Deram-me uma insignificância de luvas: 15 contos - e 3000 escudos de ordenado. Para quem tão pouco tinha, pareceu-me uma fortuna, claro...»
2. Fernando Vaz abriu-lhe a equipa que ganhou à Académica a final da Taça de 1967. Era já estrela quando se chegou a Março de 1970. Por Setúbal andava Pedroto - e encantou-se com o isqueiro de ouro que lhe viu na mão, nas Antas. Pedroto prometeu-lhe: «se marcares dois golos é teu». O Vitória venceu o FC Porto por 3-0 e aos 57 minutos já tinha o isqueiro ganho.
3. Fulgurante, a sua época em 1970-1971. Só na última jornada perdeu a Bola de Prata para Artur Jorge. Comprometera-se com o Sporting - mas o Benfica correu a desviá-lo de lá. O Vitória arrecadou 3000 contos (que actualmente seria menos que 800 mil euros) - e ainda ficou com José Torres, Praia e Matine. «Eu? Não fui muito beneficiado. Fui ganhar 40 contos por mês, já com luvas». (Os 40 contos não chegariam agora a 10620 euros).
4. Os dias foram correndo em vertigem, com ele vivendo numa espécie de James Dean de chuteiras. Na queda da ditadura, um capitalista assustado com os ventos do PREC vendeu-lhe um Jaguar por 150 contos. Contratou um motorista, comprou-lhe traje a preceito, exigiu-lhe que andasse sempre assim (de boné e tudo...) nas viagens que o levavam de Setúbal para Lisboa e de Lisboa para Setúbal.
5. Lançou-se, entretanto, em braço de ferro: «Sou o melhor futebolista português, sou o Maior, pelo dinheiro que me pagam não jogo mais no Benfica». Umas vezes aparecia a treinar, outras não. (Antes, já chegara a levar cão para o treino, obrigando o treinador a deixá-lo ficar preso a um dos postes da baliza). Era já Outubro de 1975 quando renovou: «Estava mentalizado para ficar um ano sem jogar, se fosse preciso. Felizmente para o Benfica, isso não aconteceu. Chamam-me tudo e mais, alguma coisa, mas eu faço vida de verdadeiro profissional. E, comigo, agora, o Benfica volta a ter grande equipa!»
6. No último domingo de 1976, o Benfica bateu o Leixões por 3-1 - um golo marcou. A caminho do balneário insultou Alder Dante. O árbitro fez de conta que não ouviu, um adepto seu, ouvindo-o, repreendeu-o com um piropo - descalçou a chuteira, só não lhe acertou com ela no rosto porque a grade metálica o impediu. Foi suspenso por seis jogos. Mortimore não o utilizou mais a titular (e foi o ano do seu último título no Benfica).
7. Na temporada de 1977-78, Mortimore voltou a lança-lo a jogo - e o Benfica foi a Moscovo jogar com o Torpedo para a Taça dos Campeões. Mosquitos por cordas se notaram logo no aeroporto: «Eu vestia calças de ganga, os outros levavam fatos e calças de fazenda. Também ia de chinelas, estava na moda. Directores e o treinador disseram-me que era feio estar assim vestido e mandaram-me mudar de roupa. Não mudei, é mentira terem-me metido no avião à força».
8. Em Moscovo, levantou-se o rumor de que decidira não jogar, afirmando: «Disseram-me que os russos são amadores, não jogo contra amadores - só jogo contra profissionais». Que não foi bem assim, revelou-o em A Bola: «O que é verdade, verdadinha e que senti dores ao sprintar e disse ao sr. Mortimore que só jogaria se, no caso de se agravar a lesão, o Benfica me pagasse o ordenado por inteiro durante a inactividade. A resposta foi não - perante isso disse que então, era preciso arranjarem outro para colocar no meu lugar...»
9. No regresso da URSS, Ferreira Queimado suspendeu-o. Toni convenceu o presidente a dar-lhe mais uma oportunidade. Deu-lha - e contra o Boavista no desafio seguinte até foi dele o passe para o golo de Chalana que permitiu o empate (Campeão não foi, foi o FC Porto de Pedroto...).
10. Amuado por o Benfica não lhe querer aumentar o ordenado e dar-lhe um Porche foi para Setúbal ganhar seis vezes menos. Por lá, cruzou-se com Jimmy Hagan - que, certo dia, cansado dos seus desatinos, lhe atirou com chuteira à cara. Foi buscar uma pedra e, enfarinhado, atirou-lhe em urro: «Agora, faz lá o mesmo com isto, se tiveres coragem!» Não fez - e andava, cada vez mais arrastado, a caminho do abismo, levado pela droga."
António Simões, in A Bola
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