"Dois sinais que falam de uma atitude alterada. Vêm da Premier League, o campeonato que no início dos anos 90 apontou ao futebol o caminho do Grande Negócio e o transformou num assunto de turbo-capitalismo. Durante um quarto de século, o campeonato inglês foi indicado como modelo a seguir por todos os gestores a quem toca a tarefa de converter uma Liga nacional numa máquina registadora. E ainda que essa narrativa tenha sido muito estereotipada e montada na exaltação dos aspectos positivos e na subvalorização dos negativos, continua a ser indiscutível que o principal campeonato inglês se transformou numa NBA do futebol. Mas talvez tenha chegado o momento em que até esta corrida em direcção ao gigantismo deve ser sujeita a regulação, para evitar que um excesso de crescimento conduza ao esgotamento.
Na verdade, os sinais enviados nas últimas semanas vão na direcção de um travão ao despesismo. Primeiro, foi a decisão de encerrar o período de mercado de transferências um dia antes do início do campeonato, a 11 de Agosto. Para os clubes da Premier League tratou-se de um encurtamento de 20 dias em relação em quase todos os concorrentes europeus (só os italianos tiveram de se contentar com a mesma limitação). Tal como considerei em artigo escrito aqui no Bancada, esta renúncia pode ser uma desvantagem competitiva. Mas, ao mesmo tempo, é um procedimento que, entre outras coisas, trata de limitar o despesismo dos clubes. Mas depois apareceu o segundo sinal: uma proposta para que o pagamento do serviço prestado pelos agentes aos jogadores seja feito por estes e não pelos clubes. Algo que seria lógico e normal, mas que, no entanto, não acontece há vários anos.
Tornou-se da praxe, que o serviço do agente ao jogador seja pago pelo clube. Isto é, um interveniente no negócio paga o serviço ao profissional que trabalha para a outra parte. Agora tentem explicar esta situação a alguém que não esteja familiarizado com os estranhos rituais do mundo do futebol. Chamar-vos-ão loucos. Mas no futebol esta loucura é a normalidade: os clubes pagam aos agentes dos futebolistas pelos serviços que estes prestam aos futebolistas nas negociações com os clubes. A situação que isto cria é perigosamente promíscua, até por ser uma premissa para uma aliança entre os agentes e os clubes. Além disso, os custos das transacções para os clubes podem subir em flecha, porque podemos chegar a situações paradoxais, como aquela em que um agente seja encarregue por um clube de aconselhar o jogador para quem trabalha a renovar contrato. E assim que o contrato seja renovado, o clube pagará duas comissões ao agente: aquela devida por ter “favorecido” a renovação e aquela que o jogador deveria pagar-lhe pela conclusão do negócio.
Entramos assim numa espiral de despesa que pode fazer desaparecer em custos com transferências qualquer aumento do volume de negócios gerado pela tal máquina registadora em que se transformou o grande futebol. E daqui nasceu a proposta que visa impedir que sejam os clubes a pagar aos agentes os serviços desenvolvidos no interesse dos futebolistas. E, mais uma vez, o objectivo é só um: conter os custos antes que seja tarde demais.
Que conclusões devemos retirar dos sinais vindos de Inglaterra? A resposta é que se trata de um sinal de sensibilização para a perda de controlo sobre o estado económico-financeiro do futebol. Que este é um mundo em que continua a agir-se como se se tivessem à disposição recursos ilimitados. E é do campeonato que gera muito mais receita do que qualquer outro que surge o despertar para a realidade. Os recursos não são ilimitados e, mais cedo ou mais tarde, vão esgotar-se. E uma vez que grande parte deles são utilizados em transferências de jogadores, é ali que terá de se intervir, antecipando o encerramento do mercado de transferências e pondo um travão às despesas dos clubes com os agentes. São sinais tímidos de responsabilidade que as outras ligas fariam bem em seguir."
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