"Na primeira vez que Toni o viu ficou deslumbrado, apesar dos 7 golos; Começou avançado e acabou em tragédia.
1. Andava-se pela década de 70 na RDA, o pai corria 400 metros barreiras - e obrigam-no a largar a alta competição simplesmente porque a polícia politica descobriu que recebia postais do irmão que fugira para a RFA, a Alemanha não comunista.
2. Nasceu a 24 de Agosto de 1977 em Jena. Cresceu num bairro de edifícios pré-fabricados de 15 andares, típicas «construções estalinistas». Entre eles havia pátios onde os rapazes criaram jogo a que chamaram «por cima do pau»: «Um ficava a guarda-redes entre os dois paus de roupa, levantava a bola por cima do pau que estava à frente, e do outro lado estavam os companheiros à espera da bola para rematar na direcção da baliza» - e assim se lhe começou a perceber a perícia do remate, o jeito para o golo.
3. Levaram-no para o SV Jenapharm - e indo o FC Carl Zeiss jogar ao acidentado campo no sopé do monte de Jena, perdeu por 3-1. Após o jogo, Helmut Muller, o seu treinador, correu à procura do pai do avançado que lhe marcara os três golos, para lhe dizer que o filho deveria ir imediatamente para o FC Carl Zeiss. Era ele - e foi.
4. Nos infantis do FC Carl Zeiss continuou a marcar golos a fio. A dado momento a marcar golos a fio. A dado momento, o pai do guarda-redes foi colocado pelo partido em Moscovo, levou a família para lá - e teve de se lhe arranjar substituto. Para o fazer, Muller pôs todos os seus jogadores à baliza, a defenderem-lhe remates: «Bastou defender, como defendeu, duas bolas, para o decidir: o guarda-redes passava a ser ele, o nosso avançado».
5. O muro de Berlim caiu, a RDA e a RFA passaram a ser uma só Alemanha. Aos 17 anos, já ele era guarda-redes da equipa principal do Carl-Zeiss Jena - e tinha em sonho: ser como Bodo Iller, que saíra campeão do Mundial de 1990. Numa partida abriu-se sinal que não se percebeu lhe marcava o destino: por causa dum falhanço que deu em golo e em derrota - trancou-se no quarto e não foi à escola durante uma semana.
6. Toni nunca se esqueceu da primeira vez que o viu debaixo de uma baliza - e contou-o: «Foi o resumo de um jogo que o Borussia perdeu por 7-0 e ele foi o melhor em campo, com defesas doutro mundo. Fez-me logo lembrar o Damas, naquela vez em que o Benfica ganhou 5-0 ao Sporting e o melhor em campo foi o Damas...»
7. Era meados de 1999, Heynckes foi buscá-lo ao Monchengladbach para sucessor de Preud'Homme. Tinha 21 anos - e ao aterrar em Lisboa soltou-se-lhe outro sinal do que ele era e ninguém percebeu: teve uma ataque de pânico, cinco minutos após assinar o contrato quis livrar-se dele, num acre murmúrio: que já não queria Lisboa, por medo do desafio que era o Benfica.
8. Acabou por vir - e brilhar na sua baliza. Monumental foi naquele jogo em que o Sporting preparava para fazer a festa de campeão à custa do Benfica, não a fez por causa dele - e do golo de Sabry a Schmeichel.
9. Mourinho tentou levá-lo para o FC Porto, o Barcelona contrato-o. Van Gaal deu a balzia ao guarda-redes que viera dos juniores, ele passou a remoer a ideia: «Falhei! Deveria ser o número um. Escolheram o Valdés, a culpa é minha». Pior ficou quando, para a Taça do Rey, Van Gaal o pôs a jogar contra o Novelda da 3.ª divisão - e sofreu três golos. Começou a ser tratado por um psiquiatra, meses depois, revelou: «Já me sentia morto no Barça, de lá fugi».
10. Foi para o Fenerbahce, a vida ficou-lhe mais negra na sua cabeça, a Ronald Reng, seu biógrafo contou-o: «Ao olhar para as minhas fotografias no Benfica, só me apetecia dar estalos a mim mesmo, por que raio me fui embora se era tão feliz?» Da Turquia saiu após 13 dias de empréstimo - e uma derrota com o Istambulspor, em que os adeptos o atingiram com objectos e impropérios. Do Tenerife passou em 2004 para o Hannover 96. Foi eleito o melhor guarda-redes do campeonato, à frente de Oliver Kahn. Voltara-lhe a felicidade, pensava-se...
11. Lara, a filha, nasceu com problema cardíaco, aos 2 anos morreu - e a escuridão voltou-lhe à cabeça, à vida. Esteve no Euro 2008, não jogou - mas Low não o escondeu: o guarda-redes da Alemanha no Mundial 2010 seria ele. Não foi. A 10 de Novembro de 2009, atirou-se para debaixo de um comboio que passava perto do cemitério onde fora sepultada a Lara."
António Simões, in A Bola
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