"Muito se fala hoje em dia sobre a necessidade de cada um de nós criar a sua própria marca pessoal. No recrutamento diz-se que um bom currículo já não é suficiente. Nos negócios, as portas só se abrem quando há legitimidade reconhecida. No dia-a-dia, a galinha do lado tem sempre algo de referência que nos faz pensar sobre a nossa “galinha”. Foquemo-nos no desporto.
Embora seja um exercício por amostragem e com maior enfoque numa faixa de utilizadores de particular relevo junto dos millennials, olhemos para o que o instagram nos diz. No futebol, Cristiano Ronaldo tem 116 milhões de seguidores que comparam com quase 54 milhões e 18 milhões respectivamente do Real Madrid e da UEFA Champions League. No Boxe, Maywether tem mais de 19 milhões de seguidores que confrontam com um pouco mais de 50.000 (!) da World Boxing Association. No ténis, Rafael Nadal e Roger Federer andam ambos na fasquia dos 4 milhões de seguidores, muito acima do milhão que a ATP não atinge. As diferenças são de facto gritantes! O atleta, por si só, apresenta um alcance muito superior ao clube, competição ou entidade máxima do seu desporto.
Analisando o que se passa nas ondas, a história não é diferente mas apresenta as suas dinâmicas específicas. Primeiro, porque o surf é um desporto que se proliferou pela via da internet, onde as plataformas media tradicionais (TV em especial) surgem num plano importante mas secundário. Segundo, o desenvolvimento de carreiras no surf é um assunto completamente global, e, quem procura chegar ao topo tem de dar nas vistas nos quatro cantos do mundo. Terceiro, isto tudo obrigou cada surfista a criar o seu próprio plano de marketing. Numa lógica de conteúdos e entretenimento, o surfista profissional tem um mix de agenda que comporta competições, viagens e lançamento de vídeo clips que por sua vez procuram uma maximização de alcance através das plataformas web domésticas, sites internacionais, redes sociais ou mesmo em TV. Isto obrigou a terem uma equipa que integra profissionais de comunicação e audiovisual que se juntaram às vertentes tradicionais de treino na procura permanente do sucesso desportivo. É um trabalho a favor do ser mas também com garantia do parecer.
Tiago Pires fez este percurso quando provavelmente poucos o souberam vislumbrar. Tendo presente a sua origem numa nação, na altura, com baixa relevância no mundo do surf então dominado por anglo-saxónicos, Pires trabalhou conteúdos para potenciar e legitimar-se como um dos melhores do mundo. Voltando aos números, observe-se que Mick Fanning, ex-campeão mundial por três vezes, é seguido por um milhão de pessoas e que Kelly Slater, o “GOAT” do Surf (Greatest Of All Time), supera os 2 milhões, sendo que ambos veem nos seus patrocinadores principais números significativamente inferiores.
Repare-se em mais um facto. A hoje denominada World Surf League (WSL) fez o takeover à extinta Association of Surfing Professionals em 2015. No processo de centralização da liderança privada do surf, nem a internet nem as marcas dos atletas foram esquecidas na estratégia seguida. No caso da primeira, contrastando com o futebol, boxe e ténis, a competição/entidade tem mais seguidores (designadamente 2.6 milhões) que a estrela principal (Kelly Slater). No segundo ponto, essa marca individual foi deixada a favor da “next big thing”, referindo-me aqui ao facto da piscina de ondas da Califórnia ter mantido no nome de Kelly Slater (KS) mesmo depois da sua aquisição pela WSL. Embora exista a realidade futura no domínio olímpico que assim o exige, releve-se que a associação da piscina à marca KS foi um claro indutor para que ali já esteja calendarizada uma etapa do circuito mundial de elite em Setembro de 2018.
Vivemos então no mundo desportivo onde a tutela ou empregador são claramente menos top of mind que as estrelas da companhia. O colectivo pode mesmo estar nas mãos do individual. Já diziam os altos executivos que o sucesso começa sempre nas pessoas. Ou que parte supera o todo!"
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