"Chamaram-lhe ilha da Madeira. Por afinidade e pelos paus que se ergueram em bancadas. Dentro de uma semana, cumprem-se exatamente 60 anos do jogo inaugural.
Nesses primeiros tempos, viu brilhar o bicampeão do mundo Djalma Santos, mais tarde, nos seus bancos sentava-se o ex-selecionador Otto Glória e só não jogou lá Paulo Futre porque na hora de assinar contrato com a Portuguesa de Desportos «fez muita lambança» – contou-me um dia Manuel da Lupa, pombalense de nascimento e antigo presidente.
Quando 16 anos depois de edificado teve direito finalmente à devida inauguração, em janeiro de 1972, já tinha bancadas em betão e o nome de Independência. O Benfica, sem Eusébio, mas com Toni, Simões, Vítor Baptista, Nené e Jordão estragou a festa com uma vitória por 1-3.
Ali, junto à marginal do Tietê, não muito longe do Museu da Língua Portuguesa, que lhe ganha em beleza mais do que em simbologia, está a segunda «embaixada» lusa, bem no centro da maior metrópole do Hemisfério Sul: o Canindé – oficialmente, Estádio Doutor Oswaldo Teixeira Duarte: 21 mil lugares sentados.
São Paulo são dois Portugais de gente. Faz sentido ter dois digníssimos representantes – um cultural e outro sócio-desportivo – bem no coração da cidade.
Não é exagero elevar a Portuguesa e a sua casa a esse estatuto. Tal como a camisola listada da equipa, as cadeiras do Canindé têm o vermelho e verde da bandeira nacional. Ali joga um clube tão português que em 1920 escolheu para data de fundação o 14 de agosto em que se comemora a Batalha de Aljubarrota. Ali é o último reduto da «Lusa». Tão portuguesa que tem como escudo a cruz da ordem de Avis. Tão da Mouraria que na década de 1930 adotou como mascote a fadista Severa. Tão do Minho que ainda hoje tem um extenso grupo folclórico, que mais parece saído de uma qualquer freguesia vianense. Tão de Trás-os-Montes cujo hino é cantado por Roberto Leal, nascido em Vale da Porca, Macedo de Cavaleiros, mas «portuga-brasileiro» como a esmagadora maioria da massa adepta, lusodescendentes quem mantém uma ligação umbilical ao clube.
A Portuguesa não vive, porém, tempos fáceis, sobretudo desde que em 2013 foi administrativamente despromovida da Série A – por o Fluminense jogar demasiado bem na secretaria. Caiu a pique. Três descidas de divisão em quatro anos. E há cerca de um mês e meio baixou para a Série D (quarto escalão do futebol brasileiro).
Ainda mais graves são problemas financeiros, que agora põem em risco o futuro do Canindé.
Na edição de domingo do «Estadão», entre lotes de terreno, apartamentos e carros, saltava à vista o anúncio da Fidalgo Leilões a um imóvel gigantesco, com o preço de saída a rondar os 21 milhões de euros, cuja licitação ocorre dentro de duas semanas.
Ofertas em destaque:
Área do Canindé: 42 350 metros quadrados.
Base de licitação: 74,1 milhões de reais.
Se a Portuguesa não conseguir travar o processo, perderá a sua casa e o Canindé irá mesmo ser leiloado. Independentemente do destino de um estádio onde nunca estive, a constatação não deixa de causar-me sobressalto: há um pedaço de Portugal à venda numa página de classificados."
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