"E campeões fomos nós. Todos nós. Mesmo os que não acreditavam. Mas que não deixaram de natural e legitimamente comemorar.
1. No domingo passado vivi uma alegria imensa e intensa em Paris. Vivi momentos de glória! Abracei e chorei. Sim no momento do golo do Éder não consegui limpar as lágrimas que me correram pela face. E no instante do apito final do árbitro rejubilei como nunca. Dei um abraço apertado aos meus amigos de jornada parisiense - da Ana à Isabel, do Tomaz ao Joaquim, do Francisco ao Bruno - e partilhei cumprimentos efusivos com os portugueses e as portuguesas que estavam nas filas mais próximas. E olhei para o Fernando Gomes, para o Humberto Coelho, para o Tiago Craveiro, para o José Luís Arnaut e para o Hermínio Loureiro e acompanhei os seus olhares de intensa satisfação no momento imediatamente subsequente à entrega da Taça de Campeões da Europa a Cristiano Ronaldo, coma cumplicidade sentida de Fernando Santos. Tive, assim, o privilégio de participar, no Estádio, na festa portuguesa. E à saída um grande empresário português radicado em Paris, reconhecendo-me, disse-me com a voz embargada: «Senhor Doutor, estava à espera deste momento há cerca de cinquenta anos. Cheguei aqui sem nada e no espaço de um mês participei aqui no Dia de Portugal e tive o privilégio de viver este jogo único. Não avalia a importância deste momento. Para nós que quase nos sentíamos abandonados!» Percebi bem estas palavras. Em Marselha, no final do jogo contra a Polónia, senti a imensa vontade da equipa - de toda a estrutura da Selecção! - em chegar a Paris. E na capital francesa ao longo do dia de domingo senti uma emoção única. Um sentimento fraterno. Uma vontade de vencer aquele que se considerava, mesmo com um autocarro festivo preparado, como um vencedor antecipado. As capas dos jornais franceses antecipavam a festa à noite. A Torre emblemática iluminada com as cores da bandeira francesa. E as avenidas de todas as cidades inundadas de caravanas que exaltavam a França, a conquista de uma selecção que dominaria Portugal e quase que humilharia os liderados, e bem, por Fernando Santos e capitaneados, com orgulho, por Cristiano Ronaldo. E no dia imediato, na segunda feira, fui eu que fui à nossa Alameda saudar uma Selecção que recebeu, ao longo de quase cinco horas, um abraço único de milhares de portugueses e lisboetas.
E nesse instante foi um abraço que juntou os milhares de emigrantes que os acompanharam a tempo permanente em França e os milhões - os quinze milhões! - que, em diferentes partes deste mundo cada vez mais caótico, vibraram, como nunca, com este feito único do futebol português. E repito: feito único.
Mesmo que alguns, agora queiram comparar competições como se a expressão «europa» - e escrevo, de propósito, em letra pequena! - fosse similar ou equivalente em... todas as situações. Políticas ou sociais, financeiras ou mesmo desportivas!
2. Na madrugada do regresso de Paris e numa das poucas lojas abertas do aeroporto da capital francesa vi, e de imediato comprei, um livro com um título que me chamou a atenção: Arrogante como um francês em África. Tinha sentido a arrogância francesa ao longo do dia. À chegada ao principal aeroporto de França só um autocarro para transportar os passageiros portugueses do seu avião. E alguns ficaram, naturalmente, largos minutos à espera de vez dentro do avião. Nas entradas do Estádio uma superioridade assumida e inequívoca. Mas o livro, quase que devorado na viagem de regresso, ajudou-me a perceber a imensa «dor» que percorreu a França na noite do passado domingo. Já que uma imensa dor - esta sim sem aspas! - foi sentida, por todos nós, na noite do trágico e cobarde ataque terrorista em Nice. O livro ensina-nos que a última sala que se visita no Museu da Françafrique é a sala das «ocasiões perdidas». Foi o que aconteceu à França. E, em contraponto com aquele momento inspirador do Éder, foi, para nós, o instante da «ocasião conquistada». Conquistada por um grupo único e unido. Em que todos, na sua dimensão e na sua responsabilidade, foram responsáveis pelo momento mais grandioso do futebol português. E por uma das páginas de ouro do desporto português-
Mesmo que alguns, da literatura à política envergonhada, da sociologia estruturalista à psicologia evolutiva, não queiram compreender a dimensão da conquista e a importância desta vitória. Que é uma vitória de uma estrutura. De Fernando Santos e de Cristiano Ronaldo. De Fernando Gomes e de Pepe. De Tiago Craveiro e de Rui Patrício. De Humberto Gomes e de Renato Sanches. De João Vieira Pinto e de Raphael Guerreiro. De José Carlos Noronha e de Ricardo Quaresma. Das mãos milagrosas. Dos paladares singulares. Da segurança exemplar. Da comunicação responsável. Do marketing envolvente. Do protocolo eficaz. É uma vitória de todos. Mas também da fé do seleccionador, da força do capitão e da vontade dos jogadores. E daquela motivação e daquela inspiração - com muita transpiração - do Éder!
3. Permitam-me duas notas estatísticas. Cristiano Ronaldo foi o jogador mais rematador deste Europeu. Rematou 46 vezes. Mais remates do que metade - 12 - das selecções que participaram neste Europeu do nosso contentamento. E Portugal foi a Selecção que mais faltas sofreu. Foram noventa e quatro. Notas que também são dados. Que ajudam a perceber o que se fez e o que se sofreu. Mesmo que alguns gostem muito de falar da falta de nota artística. Mas esta, em regra, só conquista certa opinião. Escrita e falada. Não gera, a maior parte das vezes, campeões. E campeões fomos nós. Todos nós. Mesmo aqueles que não acreditavam. Mas que não deixaram de natural e legitimamente comemorar. E de se associar a este momento de glória.
4. Portugal, a partir de Oliveira de Azeméis, conquistou o Europeu de hóquei em patins. Aqui, dezoito anos depois. Outro momento de glória. Também com sofrimento frente a uma forte Itália. Em que as alegres bancadas, bem repletas, foram um verdadeiro suplemento de alma!
Aqui combinou-se uma vitória merecida com exibições de elevada nota artística. E todos, também todos, estão de parabéns. De Luís Sénica a João Rodrigues. De Reinaldo Ventura a Diogo Rafael. De Ângelo Girão a Hélder Nunes. De Ricardo Barreiros e Gonçalo Alves. De Nélson Filipe mais José Rafa Costa. E Henrique Magalhães. Onde há vontade de vencer há espírito de conquista. De paris a Oliveira de Azeméis são momentos de glória. Vividos e partilhados. Sentidos e merecidos. Bem merecidos."
Fernando Seara, in A Bola
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