"Há meia dúzia de anos, chegava Jorge Jesus a Braga, após duas excelentes épocas no Belenenses, um atual dirigente do Benfica confidenciou a um amigo comum que só não defendeu a sua contratação porque, dizia, “o Benfica não pode ter um treinador que não sabe falar”. Não tardou muito a que a necessidade derrotasse a “sensibilidade auditiva” e o técnico fosse chamado aos serviços de urgência.
Se é verdade que Jesus, com o traquejo que ganhou, se expressa hoje melhor, é também certo que o domínio da palavra continua a não ser o seu forte, tanto mais que enfrenta duas inimigas ferozes: a espontaneidade, que faz com que por vezes responda primeiro e pense depois, e a dificuldade do improviso, que o força a nem sempre utilizar os termos adequados. E como não consegue fugir ao destino, volta que não volta sai asneira.
Não creio que no caso do “têm de nascer dez vezes”, que irritou os jovens da formação, se tenha tratado propriamente de asneira. Por um lado, jogadores como Matic não nascem aos pontapés, pelo que Jesus podia até ter optado por “têm de nascer 50 vezes” em vez de dez porque era a raridade do aparecimento desse tipo de futebolista que pretendia sublinhar. Por outro, a qualidade alcançada pelo sérvio não se encontra simplesmente porque se quer, nos “dentes de leite” da academia. William Carvalho, por exemplo, teve de fazer 50 jogos na Bélgica e trabalhar muito para alcançar a maturidade que lhe faltava e ser o que é. E o próprio Matic “enganou” o Chelsea, que o dispensou e com isso perdeu 20 milhões de euros.
Infelizmente para ele, Jesus não pode ter a filosofia de Leonardo Jardim, que lapida os diamantes da academia com tranquilidade porque o nível a que o Sporting tinha descido lhe dá agora tempo para construir uma equipa. No Benfica não é assim, os investimentos obrigam a retorno urgente, a pressão sobre o técnico é tremenda e o “Manel” que ele tem de arranjar já, para o lugar de Matic, deve também corresponder de imediato porque LF Vieira e os adeptos não dão margem de erro ao treinador. Jesus não terá oportunidade de “nascer dez vezes”. Se calhar, nem só mais uma."
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