"Apesar de miserável, à terreola onde se lhe descobriu o destino chama-se Boa Sorte; Como avó o punha a correr
1. Nasceu, por Março de 1987, na Barra do Pirái, localidade no interior do estado a mais de 100 quilómetros do Rio de Janeiro - e cresceu na Boa Sorte, vilarejo assim chamado por ter sido criado (no alto de um morro) em finais do século XIX por escravos fugidos das fazendas de café em seu redor (e sim é deles que descende).
2. Descalço começou a jogar à bola no «campinho de pouca grama na Boa Sorte». O pai abandonara-o pouco depois dele nascer (por isso não lhe deram sequer o seu apelido na hora do registo). Aos três anos a mão arranjou emprego longe da Boa Sorte (pelo que tinha de passar temporadas sem o poder ver), deixando-o ao cuidado da avó (ele e os seus três irmãos).
3. Na casa da avó havia dois quartos apenas - e eram 12 pessoas que a habitavam (entre primos e tios). Numa cama dormia ele com os três irmãos (e com a mãe nas vezes em que ela lá dava saltinho). Com o irmão Maicon, mais dividia: «Ele era mais forte que eu mas só comprava coisas que ficavam apertadas nele para servir em mim. Se comprasse do tamanho dele, eu não conseguiria usar».
4. Nos jogos por Boa Sorte, num fósforo se lhe perceberam os pés em fogo: «Corria muito jogando bola, mas às vezes tinha de correr por outras coisas: quando a gente é moleque travesso, como eu era, faz umas artes e tem que correr. Corria de cachorro, corria da minha avó - para fugir dela quando me apanhava jogando e não era o que eu devia estar fazendo».
5. A caminho dos 15 anos, dois tiros, que eram pedreiros, puseram-no seu servente: «Não tinha como escapar de trabalho pesado para ajudar a família a não passar fome: debaixo de sol quente, carregava pedra, tijolo, areia. Não, não me importava com o serviço duro que tinha de fazer, só não queria perder meu sonho, o sonho de ser jogador de futebol...»
6. A ponta do sonho de ser jogador de futebol apanhou-a no América da Barra de Piraí: «Trabalhava das 8 às 4 horas. O treino era às 4 e meia. Descia de casa de bicicleta para o trabalho, pegava na bicicleta e ia treinar. Chegava no treino e não tinha cansaço, não tinha nada, quando eu colocava a chuteira e ia para o campo não tinha coisa melhor».
7. Ainda não tinha 17 anos quando o Joinville foi a desafio a Barra do Piaí. Nessa altura jogava a lateral direito - e encantou o treinador catarinense pela velocidade, o modo como «aparecia bem na frente a ameaçar a gol». Após desencantar o telefone do tio, ligou-lhe, em segredo de uma cabina telefónica, pedindo-lhe que passasse pelo hotel onde o Joinville se alojara - e logo se acertou que cinco meses depois iria para Santa Catarina, iria para o Joinville. Assim foi.
8. No Joinville, Wagner Oliveira achando que era «desperdício» jogar a lateral - tendo «tanta técnica e tanta velocidade, tanta ginga e tanta versatilidade» passou-o a ala. Dois anos depois, em Julho de 2007, já campeão catarinense - o Cruzeiro contratou-o por 350 mil reais (e não demorou a perceber-se que fora uma pechincha). Por Pernalonga («como o personagem da BD da passada larga») o tratavam, mas, de um momento para o outro, passou a ser o Queniano Azul («por parecer que eu corria maratona durante os 90 minutos e no fim ainda continuava dando pique, correndo»).
9. Dos Jogos Olímpicos de Pequim levava de bronze - e após a conquista do campeonato mineiro 2009 (o de 2008 ganhara-o também), o Benfica deu 7,5 milhões de euros pelo seu passe. Arma nuclear na conquista do título de 2009/2010 (o primeiro de Jorge Jesus), para o Chelsea foi por 19 milhões (sendo-lhe dada a camisola 7 que fora de Shevcehnko). Golo bandeira ao Barcelona abriu ao Chelsea a final da Champions 2011/2012 - e ele não a jogou (nem a ganhou ao Bayern nos penáltis) por ter visto um Camp Nou segundo amarelo.
10. Dunga chamou-o à selecção do Brasil, venceu a Copa das Confederações 2009 - e esteve no Mundial 2010 e no Mundial 2014. Depois de, no Chelsea, também ter ganho a Liga Europa 2012-2013 ao Benfica (e a Premier League 2014-2015 também a tem), no início de 2016 o Jiangsu Suning foi buscá-lo a Inglaterra por 28 milhões de euros - e, nos últimos tempos, soltou-se, a galope, a notícia de que o Benfica o quer de novo na Luz..."
António Simões, in A Bola
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