"Pediu 700 escudos, dirigente do FC Porto tratou-o como «malandro»; do «jogo das metralhadoras» ao Benfica
1. Nasceu em Guimarães, em Agosto de 1919. O pai era guarda do campo do FC Porto - e morreu quando ele tinha cinco anos. A mãe tendo de ficar por Infesta na labuta da vida, entregou-o aos avós para o criarem - e, em Guimarães, num campo que se improvisava na Feira do Gado se lhe descobriu um dom no pé esquerdo.
2. Aos 11 anos foi ao reencontro da mãe e logo se lançou à aventura até à Constituição: para lá foi a é de Infesta - pediu para fazer um teste, meia hora depois estavam a tratar de lhe dar a papelada para ser jogador do FC Porto.
3. No desastroso Campeonato da Liga de 1936/37, fez um jogo apenas na primeira equipa, a substituir Nova que adoecera. Encantado com ele, François Gutskas não o tirou mais, no Campeonato de Portugal que ganhou ao Sporting a grande figura foi ele.
4. Já na época de 1937/38, contra o Benfica, saiu das Amoreiras, de pé partido: «O Rogério de Sousa sempre jurou que não tinha feito de propósito, mas nunca acreditei. Que não quisesse partir-me o pé, vá que não vá, mas que me pretendeu segurar à má fila, embora a coisa tenha saído pior do que pensara, nunca me restaram dúvidas».
5. Voltou à liça quando descalabro atingiu o FC Porto - e perdeu 6-1 com o Sporting. 15 dias depois foi o jogo das metralhadoras, assim chamado porque «para acalmar as hostes a polícia andou pelo Lima a mostrar armas, ameaçadora». Para ser campeão, o FC Porto tinha de ganhar, ao Benfica bastava empatar. Ficou 2-2 - «com os jogadores em violências também, como se estivessem numa guerra, mas sem as metralhadoras na mão».
6. FC Porto protestou o jogo, o Benfica reagiu com azedume num ofício em que o jogador mais visado foi ele - por causa dos despiques em que andou metido, ele próprio haveria de o revelar: «A certa altura disse-me, o Rogério: 'Tu és feito de cimento das Devesas, pá' Não sei porquê, aferrou-se-me no espírito a ideia de que me estava a dizer com ironia, que eu era um «anjinho» e não resisti: não lhe parti o pé, não lhe parti coisa nenhuma, mas dei-lhe e, claro, a partir daí foi tudo fogo - e não só entre nós os dois...»
7. Nessa época de 37/38, o Benfica ainda foi ao Porto para o Campeonato de Portugal - e perdeu por 4-2. Após «meia hora de jogo limpo», o cenário incendiou-se de novo - com quatro jogadores expulsos: Rogério de Sousa por pontapé a Pinga, Costuras por agredir Albino e António Santos e o Gaspar Pinto por se «embrenharem ambos em mais uma escaramuça». Dessa não se pôs em confusão, nem depois na segunda mão que o Benfica ganhou 7-0 com «violências em campo e polícia a rodos» - outra vez.
8. Como no FC Porto havia quem recebesse 1500 escudos por mês, foi à sede solicitar «ordenadinho como os demais» - que nada recebia, a não ser os prémios por vitória e empate, nunca mais de 80 escudos no melhor caso. Hesitante, murmurou: «700 escudos já me chegava». Quem o ouviu, deu-lhe, ríspido, a alternativa: «O senhor ou assina a ficha já ou põe-se na rua, não queremos malandros cá dentro a pedirem-nos dinheiro». Por isso, nem sequer lhe juntou a outra parte do pedido que levara congeminado: «10 mil escudos pela assinatura e, logo que se pudesse, um emprego melhor do que o que tenho, de cortador».
9. Descobrindo o que se passara com ele, Ilídio Nogueira foi desafiã-lo para as Amoreiras, largando-lhe, firme, a promessa: «Tudo o que pediste, terás no Benfica». Acordou a mudança, Nogueira mandou-o de «férias» para uma quinta de Valadares. Quatro dias depois, levaram-no de lá para Lisboa...
10. Em Lisboa apareceu-lhe sorrateiro Sebastião Ferreira Mendes a garantir-lhe: «Se voltares comigo para o Porto receberás imediatamente 25 contos, terá emprego nas minhas fábricas, enquanto jogares não precisarás de trabalhar, garantidos terás 1000 escudos todos os meses ou mais até» - e a sua reposta foi: «Apesar de não ter ainda compromisso assinado com o Benfica, dei-lhes a minha palavra de honra, seria capaz de abandoná-la».
11. No Benfica ganhou 6 Taças e 4 campeonatos - e era o seu capitão quando o Torino veio a Lisboa à sua festa de despedida. E, no regresso, o avião que levava a equipa desfez-se contra a catedral de Superga."
António Simões, in A Bola
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