quinta-feira, 1 de agosto de 2024

Erros olímpicos


"Insistir em fazer a natação do triatlo e as águas abertas no Sena e aceitar que as provas podem ser adiadas quatro vezes parece uma falta de respeito

Organizar uns Jogos Olímpicos, com a dimensão e impacto social e financeiro que têm nos dias de hoje, com exigências muito diferentes de outros tempos face ao profissionalismo dos intervenientes, é uma tarefa hercúlea e falhas irão sempre acontecer, mesmo que da atribuição no evento tenha acontecido sete anos antes. Mas, ainda nem uma semana de Paris-2024 decorreu e há alguns que poderiam ter sido evitados.
Nem me refiro à cerimónia de abertura que meteu água porque alguém, como nos casamentos no verão, não colocou a hipótese que chovesse a cântaros naquele dia. Todos ficaram encharcados, público e atletas. Pior, enquanto num estádio os segundos até poderiam ir embora mais cedo, ali não tiveram hipótese. Sem coletes salva vidas para se atirarem ao Sena e irem para casa, aguentaram a carga de água e, apesar da maioria não competir nos dias seguintes, houve quem depois não tivesse treinado por constipação.
Lindo! Uma vida a treinar para chegar aos Jogos e, na véspera, ficam doentes porque decidiram fazer tudo no rio. Bom espetáculo, mas quebrando um momento mágico que quem já viveu nunca mais se esquece: desfilar num estádio olímpico lotado e naqueles momentos ter um convívio único com estrelas de outras modalidades e países que não terão outra hipótese quando começarem as competições. Em Tóquio-2020 não aconteceu devido à pandemia. Em Paris-2024 por diluvio.
Enquanto decorria o desfile e o acender da pira olímpica, portanto, a cerca de 12 horas de início das competições, no Grand Palais Éphémère, onde está o judo, havia ainda obras para reforçar, de forma a ser seguro, o pódio onde estão montados os tatamis e reparavam-se os tetos que metiam água da chuva há dois dias. As balanças das pesagens oficiais, na véspera de cada categoria e no dia de prova, tiveram de ser arrancadas do chão porque este estava… desnivelado. E conto o resto.
Entretanto, na Paris La Défense Arena, recinto onde está a natação, já se sabia que a profundidade da piscina é de 2,15 m em vez dos 3 m que são exigidos pelo COI e em que foram disputados os quatro Jogos anteriores. O tanque até é de montar, será levado para outro lado, por isso tudo poderia ter sido tratado quando começaram a construção. Antes a piscina era utilizada igualmente para a natação artística, mas agora, com tal profundidade, servirá apenas para o polo aquático.
Ao longo do anos os engenheiros de piscinas analisam tudo e, por exemplo, foi-se descobrindo que por onde entra e sai a água afetava a competição, passou a existir as pistas 0 e 9, sem ninguém, para que quem vai na ponta não seja prejudicado no retorto da água na parede lateral e sabe-se que a profundidade, com a impulsão das braçadas no fundo, também influi na velocidade, assim como o material.
Ora, até ao momento em Paris -2024 não caíram recordes do mundo e não há sucessivos máximos nacionais. Pensa-se que a estrutura e profundidade estão a ter influência e para piorar o fundo, entre outros objetos técnicos, está cheio de câmaras, para transmissão e controlo, e também isto prejudica.
Por fim, o impensável. Nadar no rio Sena no triatlo, já adiado uma vez, e na maratona de águas abertas. O que interessa políticos irem lá chapinhar meia dúzia de metros, onde só falta levarem a bóia do patinho à cintura. Fazem eles ideia da velocidade a que os nadadores vão? Do que são as cotoveladas e pontapés que acontecem nos 10 km de águas abertas e a quantidade de água que os atletas engolem? Como é, se adoecerem por causa da bactéria E-coli é considerado doping ou suplemento?
Sou a favor que se tente despoluir o Sena e se tenha investido milhões no sistema de esgotos num projeto de futuro, agora, depois de já ter sido adiado no ano passado o test event, continuar a existir poluição insistir que as provas têm de ser ali e manter atletas, que se prepararam ao pormenor para aquela data, em dúvida até meia dúzia de horas da competição, se vão ou não competir e dizer que só ao quarto adiamento é que a prova será transferida para outro local já parece desrespeito.
E as federações internacionais que tanto visitaram Paris ao longo os últimos anos, o que é que andaram a fazer? A ver a Torre Eiffel? São demasiados erros olímpicos e ainda nem fez uma semana e já se sabe de tudo."

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