sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Os que vencem sozinhos

"Nas modalidades colectivas, com especial destaque no futebol, ninguém ganha sozinho. Claro que existem elementos preponderantes para que a equipa tenha uma prestação elevada. São as mais-valias, aqueles que tiram os coelhos da cartola. Os excepcionais. Eles são fantásticos mas nunca insubstituíveis. Mesmo que sejam únicos. Serão lembrados, alguns imortalizados, mas as equipas não acabam. Por vezes até melhoram o seu espírito colectivo, em virtude de serem obrigadas a reagir a uma situação de adversidade.
Quanto mais se torna mediática a actividade maior é o número de pessoas que pretendem tirar proveito da acção colectiva. Sejam dirigentes, treinadores ou jogadores. O discurso é na primeira pessoa do singular. Sem a sua prestação nada seria possível. Julgam-se insubstituíveis. Sem eles é o caos, com eles o paraíso. Terão sempre os 15 minutos de fama, mas para serem lembrados precisam da equipa. Seja qual for a sua função na estrutura.
As equipas precisam de todo um staff de apoio, muitas vezes esquecido, e poucas vezes lembrado, que faz um trabalho decisivo para o sucesso de todos. Quando alguém fala na primeira pessoa do singular, esquecendo-se tantos que trabalham para que esse momento aconteça, está a colocar em causa toda a estabilidade que uma equipa necessita para reagir nos momentos de adversidade. Os egos destroem muitas vezes equipas com enorme potencial.
O mercado fechou em Portugal, embora continue aberto noutros países, e a partir de agora o foco terá de ser unicamente a equipa. As transferências propostas por dirigentes e empresários só voltam a partir de Maio e até lá temos um clima diferente dos dois últimos meses. Vale a pena analisar esta janela de mercado, com o objectivo de encontrar soluções para criar clima mais estável, também em defesa da verdade desportiva e da competição profissional."

José Couceiro, in A Bola

O estranho caso de Mário Centeno

"Portugal sempre foi um país dado à cunha, onde dava muito jeito conhecer alguém capaz de encontrar uma solução expedita. Sou do tempo em que as multas de trânsito desapareciam por artes mágicas, muitos empregos eram arranjados por influência do tio da prima da afilhada e ter um conhecido na repartição de finanças ou na urgência do hospital não fazia mal a ninguém.
Passaram-se anos a fio sem que houvesse condenações por corrupção ou tráfico de influências, como se o Estado estivesse prisioneiro da sua própria inércia, impotente perante uma teia de interesses, grandes e pequenos.
Hoje em dia, felizmente, tudo mudou, há uma transparência muitíssimo maior e sente-se que o poder judicial não é subserviente perante ninguém, por mais pintado que aparente ser. Esse é o sinal mais evidente de uma sociedade evoluída, que quer progredir baseada na meritocracia e disposta a erradicar as práticas de antanho.
Aqui chegados, há que evitar as derivas justicialistas, por vezes voluntaristas, por outras vingativas, às vezes motivadas por agendas obscuras, mas sempre desajustadas da realidade, por demonstrarem ausência absoluta de bom senso, a tal regra não escrita a que todos devem obedecer.
A sociedade portuguesa, que precisa de se defender assegurando o primado da transparência e os meios para implementá-la, necessita igualmente de fugir das práticas fundamentalistas e dos tiques prepotentes e ditatoriais, que acabam por ser perniciosos para a imagem das instituições.
Ah, é verdade, o Ministério Público arquivou o inquérito a Mário Centeno por causa dos bilhetes para a Luz..."

José Manuel Delgado, in A Bola

Declaração

"No decurso desta semana, o meu nome tem sido associado a um processo judicial que tem alimentado as mais diversas especulações, algumas já desmentidas, sobre factos respeitantes à minha vida pessoal e enquanto Presidente do Sport Lisboa e Benfica.
Afirmo, de forma perentória, que estou de consciência totalmente tranquila. Não pratiquei qualquer ilícito que me possa ser imputado. É, aliás, com enorme estupefacção, que vejo o meu nome associado a este processo.
Nunca, ao longo dos meus sucessivos mandatos como dirigente e Presidente do SLB, confundi ou misturei a minha vida pessoal e profissional com a instituição Sport Lisboa e Benfica.
Confio na Justiça. Espero e exijo dela a pronta reposição e esclarecimento da verdade.
Por último, quero transmitir a todos os meus amigos, a todos os benfiquistas e aos portugueses em geral que nada temo e que estou tranquilo porque estou seguro da minha conduta em todos os domínios da minha vida"

‘Big Brother is watching you’

"Da era da informação passámos à era da maledicência, da vingança anónima, da efabulação, da perseguição e do medo.

Cena 1:
Um homem toma o pequeno-almoço à mesa de uma pastelaria enquanto lê o jornal. Termina e pede a conta. “Está pago por aquele senhor”, responde o empregado apontando para a porta. Em pânico o homem corre, carteira na mão, chamando o outro: “Você não me desgrace!!”
Cena 2:
Gabinete sóbrio. Dois homens conversam animadamente sobre os tempos da escola que partilharam. Na despedida, um estende um envelope: “Toma lá dois bilhetes para o teatro”. O outro olha desconfiado. “Não te preocupes. São dos mais baratinhos…”.

Longe vai 1984, mas nunca como agora estivemos tão perto de viver a realidade de George Orwell e do seu Big Brother, com a agravante deste ser obra e criação de cada um de nós, que passou a assumir os papéis de polícia, juiz e jornalista. Os tribunais são as redes sociais onde o contraditório não existe e onde a condenação é feita sem apelo nem agravo. Criámos a justiça popular, o linchamento público e assistimos impávidos à destruição do carácter, das carreiras e das vidas das pessoas. Da era da informação passámos à era da maledicência, da vingança anónima, da efabulação, da perseguição e do medo.
Quem tem hoje coragem para falar livremente ao telemóvel, comentar algo, agir em plena liberdade sem pensar que talvez possa ser mal-entendido, descontextualizado ou mesmo punido? Dizer coisas como: “um dia destes dou cabo de ti” ou “tu matas-me”, pode ser entendido como a confissão de uma qualquer culpa. Estar ou ser visto com, pode ser colocado na comunicação social como indício de cumplicidade ou até mesmo de corrupção.
Num mundo em que a informação transformou o tempo e o espaço no “aqui e agora” quem controla a informação que circula? Quem pode travar este Grande Irmão que teimamos em deixar que nos vigie dia após dia? Que é feito da presunção de inocência e da liberdade numa sociedade onde todos espiam todos?"

Pequeno catálogo do “treinador de bancada”

"A luta darwinista das espécies no palco mediático da justiça tende a favorecer os mais aptos para o espectáculo e a superfície. Quanto mais forte e mais alta a onda, mais sobressai quem melhor a surfa, numa espécie de síndrome do canhão da Nazaré

Nada percebo de futebol, mas julgo que a expressão “treinador de bancada” terá sido cunhada nesse universo e acho-a uma bela expressão, referindo-se ao adepto ou ao observador que fala, fala e parece que sabe muito, mas muitas vezes sabe pouco ou nada e, sobretudo, está de fora e não treina.
Há outras áreas onde também abunda a figura; uma delas é a do sistema de justiça, em geral, e dos processos mediatizados, em particular. Tem-me calhado, como advogado, um número significativo destes últimos, e ao longo dos anos tenho observado – ora com o deleite intelectual do biólogo, ora com o desgosto de quem ouve e lê alguns disparates – várias espécies de “treinadores”. Vejamos algumas delas, que se misturam com os que, num esforço sério de compreensão e/ou de esclarecimento, procuram informar e opinar – que também os há, embora tendam a notar--se menos, como se a luta darwinista das espécies no palco mediático da justiça, nos tempos que correm, tendesse a favorecer os mais aptos para o espectáculo e a superfície. Quanto mais forte e mais alta a onda, mais sobressai quem melhor a surfa na sua crista, numa espécie de síndrome do canhão da Nazaré.
Há o “treinador-carteiro”, figura conhecida desde que o mundo é mundo, aquele que traz os recados e as mensagens que lhe pedem, mandam ou assopram que transmita. E há o “treinador Margot”, aquele que não perde uma oportunidade para – com a mesma destreza com que a célebre bailarina inglesa exibia em pontas a beleza do ballet clássico – se colocar em bicos dos pés, à espera que o vejam ou escutem e, assim, se lembrem de que pode ser útil. Há, também, o “treinador Salcede”, designação que homenageia o génio de Eça, que criou dois Dâmasos imorredouros; prefiro o d’“Os Maias”, o Salcede balofo e vazio que segue a maioria, que mimetiza, que vai atrás do último chique, da mais recente tendência, do brilho que julga emanar dos salões que inveja e onde apenas é tolerado.
E há o “treinador-sinaleiro”, o que não perde uma oportunidade para, a respeito de tudo e de nada, exibir a sua clarividente noção dos valores, ensinando ao vulgo, de cátedra (a que inventou para si mesmo), o que é o bem e o que é o mal. Há ainda o “treinador Edviges”, todo aquele que me faz lembrar uma senhora que vivia na vila onde passei a infância e a adolescência, e cuja ocupação era observar e comentar a vida que ela julgava ser a dos outros para preencher o entediante vazio da sua. 
E, ocorre-me também, há o “treinador visionário”, que é aquele que sabe como é que a coisa se resolve e que, com a desinteressada generosidade dos justos, mostra qual a chave do problema. Mas, por favor, não o confundam com o “treinador-pitonisa”, que é de todos o mais bem-sucedido, porque julga que conhece o devir.
Este, que é o mais interessante, faz do anúncio de coisas que hão de acontecer, e que mais ninguém sabe ainda, o seu magistério e a sua fama. E triunfa, mesmo quando se espeta de caras no momento em que a onda se enrola violentamente na areia da Praia do Norte."

No reino do pecado todos são corruptos

"No reino do pecado todos são corruptos Vítor Norinha 00:06 Sem triagem, os suspeitos ficam com o título de corruptos, são reputacionalmente destruídos, vão a tribunal e correm o risco de encontrar operadores judiciais potencialmente contaminados pelo efeito comunicacional.

Os cidadãos foram surpreendidos por uma semana de notícias de processos judiciais, de suspeitas e de constituição de arguidos envolvendo figuras públicas.
Para o cidadão comum, sentado no sofá à noite, enquanto vê ou revê os telejornais, ou ainda para o cidadão urbano que no escritório vai estando atento às notícias que chegam ao seu smartphone, a conclusão imediata é fácil e lapidar: isto é um país de corruptos. Depois ouve nomes de instituições que desconhece, ou então desconhece as relações entre elas: PGR, MP, DCIAP, Sindicato dos Juízes ou Ministério da Justiça.
Para quem está fora do sistema judicial, qualquer destas figuras tem o mesmo objectivo e persegue o mesmo intuito. Para o cidadão comum, que vê uma instituição, um líder dessa instituição ou uma figura com quem simpatiza, envolvido(s) neste “reino do pecado”, o normal é “conjeturar” uma motivação lateral. Uns ficam contentes com a história do ministro Centeno que pediu dois bilhetes para ir ao Benfica e com os secretários de Estado de Sócrates, que compraram livros e revistas e que não as deixaram nos Ministérios. Outros ficam contentes quando o Benfica é atacado porque se envolve o seu presidente num processo ou um juiz que já foi candidato aos órgãos sociais do clube. Outros ainda manifestam o seu gáudio perante o facto de um governante de outro país ser julgado em Portugal, porque o sistema judicial não confia nos congéneres desse outro país. Ninguém se importa com as motivações, umas verdadeiras, outras ridículas.
Mas o que está por detrás destes “tiros nos porta-aviões? São temas de fundo, que ligam o modelo judicial atual do Ministério Público e que, essencialmente, pretende acusar e prepara o caminho de uma forma bem estruturada, colocando os social media do seu lado. Mas sem triagem, os suspeitos ficam com o título de corruptos, são reputacionalmente destruídos, vão a tribunal e correm o risco de encontrar operadores judiciais potencialmente contaminados pelo efeito comunicacional.
Claro que neste ambiente judicialista o mensageiro aproveita e faz o seu trabalho, que é noticiar aquilo que é do interesse público, e as audiências confirmam que são estes casos que dão notoriedade. Mas este é também um ambiente politicamente comprometido, onde o poder judicial é aproveitado para abater um oponente. A delação premiada, alguma sem suficiente qualidade, envenena ainda mais o ambiente. E, claro, nesta escola não é entendível o princípio da razão do Estado. Os tiros nos vários “porta-aviões” até podem ser motivo de celebração, mas nem sempre o país ganha.
Falta ainda responder a outra questão: o que explica este avolumar de notícias judiciais que “nasceram” como cogumelos? Diz-se no inner circle dos assuntos político-judiciais que personalidades importantes deixaram de “segurar” as pontas porque eles próprios estão a ser alvo de suspeitas e se encontram sob investigação."

Lex and drugs and rock and roll

"Se, por um lado, podemos pensar que a justiça está a funcionar e até fazem juízes desembargadores arguidos, assusta saber que a justiça chegou a um ponto em que há, alegadamente, juízes desembargadores a vender decisões judiciais.

O tema da semana é a Operação Lex. O juiz Rui Rangel, alegadamente, andou a vender decisões judiciais. Estou convencido de que a febre do empreendedorismo deu cabo deste país. Se a Judiciária não tem chegado a tempo, o Rui Rangel, alegadamente, ainda abria uma loja no Chiado.
Rangel é suspeito de quatro crimes de tráfico de influência por, alegadamente, ter prometido influenciar o resultado de processos. O processo tem 15 arguidos, entre os quais Rui Rangel, Fátima Galante e Luís Filipe Vieira. Há uma luta renhida entre o número de casos de legionela na CUF e o de arguidos no processo Lex: 14-15, neste momento.
Segundo foi noticiado, Luís Filipe Vieira terá prometido ao juiz um futuro cargo na universidade do Benfica. Custa-me a acreditar. Um cargo na futura universidade do Benfica?! Mas quem é que se vende por isto?! Se ainda fossem dois bilhetes para a bancada principal do estádio para assistir a um clássico... E quem é que quer ir para a universidade do Benfica se, provavelmente, vai ter aulas de Filosofia com o Rui Vitória? Isto é o equivalente a meter uma cunha para ir à Universidade de Verão do PSD quando todas as pessoas sabem que quem frequenta aquela universidade são betos que estão de castigo nas férias grandes porque chumbaram o ano.
Confesso que não sabia que um juiz desembargador não podia ser detido sem ser em flagrante delito. Teria sido decisivo quando optei por esta carreira e a vida que levo. De certa maneira, percebo que seja difícil algemar um indivíduo de toga. Com aquelas mangas, é complicado encontrar os pulsos. Um juiz só pode ser detido em flagrante delito. Ou seja, se for apanhado a roubar uma lata de sardinhas no híper pode ir preso, se estiver envolvido em processos que lhe renderam milhões, não vai de cana. Nisto, há que reconhecer que a justiça é igual para todos.
Segundo vários especialistas, a investigação a Rui Rangel, e cito, "não será prejudicada por o juiz não ser detido". A dele talvez mas, pelo que já vimos, o problema são as outras em que ele é juiz.
Este processo Lex é um pau de dois bicos. Se, por um lado, podemos pensar que a justiça está a funcionar e até fazem juízes desembargadores arguidos, assusta saber que a justiça chegou a um ponto em que há (lá terei de usar a palavra mais usada no país), alegadamente, juízes desembargadores a vender decisões judiciais. - "Ó shor juiz, a quanto é que está o quilo da decisão judicial?" - Acho que a balança no símbolo da justiça não está lá para isso. Portanto, há uma espécie de sentimento de segurança dúbio. É como se eu, alegadamente, confiasse na justiça."

Onde se arquiva a vergonha?

"O Ministério Público (MP) descobriu que o ministro das Finanças pediu dois convites ao Benfica para ver um jogo de futebol. Por coincidência, descobriu igualmente que o filho do presidente do Benfica tinha pedido ajuda ao pai para acelerar a concretização de uma isenção de um imposto municipal, a que por lei tinha direito. O processo avançou e o filho agradeceu ao pai. Como se tratava de um imposto e os impostos têm que ver com as Finanças, alguém no MP chegou à rápida conclusão de que aqui havia marosca. A conclusão foi demasiado rápida e o mal estava feito.
Na velha lógica de que onde há fumo há fogo foi aberto um inquérito criminal e ordenada uma busca às instalações do Ministério das Finanças. Rápida correu a sentença a condenar Mário Centeno, porque se o crime parecia pequeno, a vergonha apresentava-se grande. Nas redes sociais, mas também na pena de muitos comentadores e jornalistas, Centeno estava metido num grave sarilho. Se fosse constituído arguido tinha de se demitir. Logo em Bruxelas descobriram que em Portugal se discutia a conduta pouco ética, quem sabe criminosa, do presidente do Eurogrupo. A conclusão voltava a ser demasiado rápida e o mal continuava a ser feito.
Como todo este caso era demasiado estúpido, era inevitável que tivesse o destino que acabou por ter: o "arquivamento por inexistência de crime". E como é que o MP chegou a esta conclusão? Recolhendo "a prova documental e pessoal necessária ao apuramento dos factos". O MP explicou-nos ainda que a instauração de um processo-crime foi determinada por notícias na comunicação social. São muito ciosos da sua autonomia em relação ao poder eleito, mas andam a toque de caixa no circo mediático, à boleia de suposições de alguém que escreve na comunicação social. Colocaram o Parlamento Europeu a admitir uma discussão sobre o assunto apenas porque, segundo o MP, o jogo da bola e a isenção do imposto ocorreram, "segundo tais notícias, no mesmo período temporal". Só falta saber onde se arquiva a vergonha que nos fizeram passar!"

Octávio Ribeiro, o verdadeiro Procurador-Geral da República

"Quando soube que o DIAP estava a fazer uma busca ao Ministério das Finanças pensei que alguma coisa de grave tinha acontecido. Quando percebi que a busca se devia à ida do ministro ao futebol percebi que tinha, de facto, acontecido alguma coisa: o Ministério Público decidiu dedicar_se à comédia. Das duas uma: ou o Ministério Público sabe de alguma coisa que nós ignoramos, ou está apostado em transformar este país num circo, destruindo a credibilidade do Estado e das instituições. Bem sei que na cabeça de muitos procuradores que têm o "Correio da Manhã" como leitura de referência, o estado natural de um político é o de arguido. Mas há limites para o ridículo.
A verdade é simples e ficou-se a saber logo no primeiro dia após a manchete do "Correio da Manhã", que assinalava, sempre com aquela má - fé perversa que afasta o pasquim do jornalismo, que dois dias depois de Mário Centeno ter ido à bola um prédio da empresa do filho de Luís Filipe Vieira teve direito a um "perdão fiscal". Não era perdão fiscal nenhum, como sabia o pasquim. Era uma isenção de IMI para imóveis reabilitados claramente definida na lei. Esta isenção fiscal é legislada pela Assembleia da República, determinada e aplicada pela autarquia onde se situa o imóvel (no caso, a Câmara municipal de Lisboa) e depois de verificar se cumprem os critérios. As Finanças limitam-se a dar seguimento. Assim sendo, ou o Ministério Público anda a investigar outra coisa qualquer ou bastaria não se ficar pela leitura do "Correio da Manhã" para ter poupado a viagem ao Ministério das Finanças.
Quanto à ida de Mário Centeno para o camarote presidencial, o que estranho é a estranheza. Por ali já passaram grande parte das figuras políticas nacionais, de Marcelo Rebelo de Sousa a Francisco Louçã. Eu próprio, que não sou ninguém, já fui inúmeras vezes convidado para estar no camarote presidencial do Sporting e, apesar de preferir ver os jogos no meu lugar de sempre, já lá estive várias vezes. Assim como já fui convidado para ir a estreias de teatro e cinema. A diferença é ser convidado ou pedir um convite? Adorava ver em que norma penal se enquadra essa distinção.
É absolutamente natural que o Ministro das Finanças não vá para a bancada num jogo de risco como um Benfica - Porto. Nem sequer é para o defender a ele. As forças de segurança dispensam, para além de tudo o que um jogo desta natureza implica, preocuparem-se em saber por onde anda o ministro. Até para a cultura do taxista (sem desprimor para os taxistas, que não tem culpa nenhuma dos disparates da nossa justiça) que se instalou entre os procuradores há limites para a demagogia. 
Mas está mesmo a acontecer e todos somos obrigados a comentar esta palhaçada judicial. Há até alguns juristas que, por uns minutos de palco, se oferecem à triste figura de comentar a dificuldade em provar o benefício fiscal (que não lhe diz respeito, mas adiante) seja uma contrapartida da ida à bola sem pagar. E fazem-no sem se rirem. Acreditará esta gente que é assim que as coisas se passam? Que os ministros com o poder de Centeno se compram com dois convites para o camarote presidencial? Se os governos e autarquias favorecem os clubes de futebol - e muitas vezes favorecem - não é por vantagens patrimoniais, é por vantagens políticas. É pelo enorme poder de influência que Benfica, Sporting e Porto têm junto de milhões de portugueses. É preciso viver totalmente alienado da realidade nacional para se pensar que é os clubes precisam de oferecer lugares no camarote para os seus presidentes exercerem a sua influência.
Mas os procuradores não estão alienados da realidade. Nem sequer acham que o tráfico de influências se faça assim. O que se passa na cabeça dos magistrados é mais simples do que isso. É um vício que se instalou: o da visibilidade. O Ministério Público trabalha mais para a notícia do que para a justiça. Porque acha que é a notícia, sobretudo a que faz manchetes nos tabloides, que lhe reforça o poder político e institucional. Pouco interessa se estes inúmeros fogachos, a reboque de notícias de jornais,, acabam em alguma coisa. Fica a aparência. Uma dinâmica que faz de Octávio Ribeiro o verdadeiro Procurador - Geral da República.
Só que, neste caso, o número mediático teve alguma repercussão externa. Não que a "nossa imagem lá fora", me tire o sono, mas há alguma respeitabilidade institucional de que o país depende. Uma busca judicial ao ministério do presidente do Eurogrupo não é coisa que se veja todos os dias. E não será fácil explicar aos líderes europeus a idiosincrassias da nossa justiça. Se um acto tão inusitado como uma busca judicial ao Ministério das Finanças não tiver outra razão para além daquela que conhecemos, o Ministério Público não fez mal a Mário Centeno, fez mal ao país. E fá-lo sempre que transforma a justiça portuguesa num prolongamento da cultura tabloide. O que é que vão investigar a seguir? Em casa de quem jantou o ministro esta semana? Se pagou os ingredientes? Qual era a situação fiscal dos anfitriões? Não há criminalidade em Portugal, incluindo criminalidade de colarinho branco? Não têm nada de importante para fazer? Sobra assim tanto tempo e meios para serem as manchetes do "Correio da Manhã" a decidirem a agenda dos procuradores?"

Alto risco para o Benfica

"Como se já não bastasse toda a polémica com os mails, os vouchers e a suspeita na viciação de resultados, o céu parece estar a cair agora em cima do Benfica com as revelações que envolvem Luís Filipe Vieira e o juíz Rui Rangel. Usar a instituição numa troca de favores é um tema grave e, estranho mundo, não havendo nada que prove que é verdade o clima de suspeição instalou se.
Como já escrevi nestas páginas em diferentes ocasiões a presunção de inocência não é apenas um direito dos 'suspeitos' e/ou arguidos. Da parte de cada um de nós tê-la em conta é um dever e tal implica não fazer ou participar em julgamentos sumários. Sei do que falo, e talvez até por isso, nunca o fiz e jamais o farei.
A minha reflexão segue noutro plano. O ruído que existe neste momento ainda não é ensurdecedor mas é já muito significativo. E vai aumentar muito nos próximos dias. Não é possível, no caso de uma figura como Luís Filipe Vieira, fazer a distinção entre as suas actividades privadas e o seu papel como presidente do Benfica. Que aliás não aparecem desligados, no que foi revelado. É a mesma pessoa, é assim que é vista e percepcionada por todos.
Numa sociedade hiper mediatizada, em que a Justiça faz – em excesso, como se voltou a ver, parte dessa engrenagem os media não vão deixar cair este tema. Nem podem. Porque é efectivamente relevante. Está em causa um eventual ato ou actos de corrupção de um juíz, envolve, numa das componentes, de forma directa ou indirecta o Benfica e é esse dado que lhe confere grande impacto e, como é óbvio enorme atracção junto dos cidadãos. Mas, sejamos claros, existe real interesse público, não é nenhum exercício de voyeurismo. O Jornalismo será excessivo, não tenho dúvidas, mas fará o seu trabalho e a culpa não é do mensageiro.
É até interessante estabelecermos um paralelo com o que sucedeu, mesmo que em casos muitos diversos, durante anos com Jorge Nuno Pinto da Costa. O presidente do FC Porto esteve envolvido em inúmeras controvérsias com a Justiça, algumas até do foro privado, mas noutro tempo, sem o impacto e a pressão que existem hoje. Não é um detalhe.
Luís Filipe Vieira e a suas equipas jurídica e de comunicação tentarão neste primeiro momento minimizar os danos. Esperam que nos próximos días haja uma descompressão e o volume informativo caia. A menos que exista um grande (e inesperado) acontecimento não é suposto que isso suceda no horizonte de uma a duas semanas. Serão muitos dias. Novas revelações, mesmo que nalguns casos seja baralhar e dar de novo.
Pelo meio é fundamental que a equipa de futebol ganhe e se mantenha na corrida para o título. Rui Vitória dirá que é outro ataque "ao coração do Benfica"?
Mas, mesmo que o ambiente desanuvie, mesmo que haja como defende o advogado João Correia "uma perseguição ao Benfica", o presidente do clube tem que ter em conta os superiores interesses da instituição. A pergunta que Luís Filipe Vieira deve fazer é: se para o Benfica, não para ele, mas – repito - para o Benfica é melhor continuar ou apresentar a demissão.

A lição de Carvalhal
uma extraordinária declaração de Carlos Carvalhal no final da (talvez) inesperada vitória do Swansea sobre o Arsenal. Ouvido para a BBC Sport na flash interview, o treinador português explica a sua estratégia e quando é confrontado pelo repórter sobre o facto de o clube ter mudado tanto desde a sua chegada – só perdeu um jogo em oito – e sobre se essa mudança é uma questão de crença, responde que há um Padre no Swansea e que se "acreditar fosse suficiente" a questão seria mais simples. O Padre resolvia. A seguir enumera o trabalho da equipa, não o seu, mas o de todos. Também não se esconde – está no centro das decisões e tem a responsabilidade. Carlos Carvalhal é um muito bom treinador, minimizado em Portugal, com resultados e cartaz em várias geografias e que em Inglaterra está a deixar a sua marca. Por muito pouco falhou a subida com o Sheffield Wednesday e está agora a mudar a face do Swansea que era um doente em coma na exigente Premier League. A equipa continua em sérios riscos e não tem muitas armas, mas joga muito melhor, tem um líder e uma estratégia. É o principio das coisas.

Rúben Semedo
Custa saber o que se passa com Rúben Semedo, um talento do futebol português com potencial para ser um futuro defesa central da Selecção Nacional e que, por falta de cabeça ou de acompanhamento, ou das duas coisas, se envolveu em rixas sérias em Espanha. A venda de Rúben Semedo foi um bom negócio para o Sporting e, apesar do percurso na formação, o clube não tem nenhuma obrigação com jogadores – para mais maiores e vacinados. Mas se ele tinha problemas, e parece que alguns tinha, um pouco de senso, do Sporting ou de pessoas da estrutura, teria ajudado.

Mathieu
Aos 34 anos e com muitas vidas, Jérémy Mathieu encontrou em Lisboa a felicidade perdida. O seu rosto, de sorriso aberto, após a conquista da Taça da Liga falava por ele. Quando Jorge Jesus diz que é difícil marcar golos ao Sporting isso resulta de um trabalho colectivo, mas no eixo desse esquadrão tantas vezes inviolável, está este francês alto (como o treinador gosta) com grande sentido posicional e capaz ainda de sair a jogar iniciando a construção do processo ofensivo da equipa. Um ás."