"Rui Vitória granjeou a consideração dos adeptos por ser uma pessoa que discute as questões nos locais próprios em vez de alijar responsabilidades na praça pública
Na sexta-feira passada, o Benfica perdeu com o Marítimo, na Madeira, em jogo cujo história já foi contada, recontada, analisada, esmiuçada, porque a situação parece grave, adivinham-se ali a emersão de nova frente de crise, pela derrota encarnada, pela aproximação pontual do leão,de cinco para dois, e de eventual novo desaire no dérbi do próximo domingo, o qual, a verificar-se, implicará mudança de líder.
Raciocínio correcto e justificado em função das circunstâncias, sendo certo, porém, que o contrário é de igual modo verdadeiro: ser o Benfica a triunfar no dérbi e repor a distância de cinco pontos.
No ano transacto, o Benfica, por esta altura da corrida, perdera com Arouca (2.ª jornada), FC Porto (5.ª) e Sporting (8.º) e empatara com União (7.ª), embora este jogo se tivesse realizado mais tarde. Onze pontos a voar nas primeiras dez jornadas e, mesmo assim, chegou ao fim em primeiro.
Esta época, em idêntico período competitivo, a melhoria é sensível, embora de ténue significado na contagem final.
Contrariamente ao que se pretende anunciar,a crise, se existe, é de outra natureza e nada tem a ver com resultados, os quais, em face dos constrangimentos que se deparam a Rui Vitória, têm-se revelado, regra geral, interessantes e prometedoras. Mas só boas intenções não chegam para se conquistar títulos e fazer campeões, de aí que da derrota no Funchal se deva extrair a lição necessária, travando euforias e encarando a realidade olhos nos olhos. Se há crise, insisto, ela prende-se com a invulgar onda de lesões que ainda não permitiu ao treinador dispor da totalidade do plantel. Não se trata de casos isolados e normais, mas sim de uma praga de impedimentos, sem a devida explicação e, pior do que isso, sem fim à vista.
Rui Vitória granjeou a consideração dos adeptos por ser uma pessoa que discute as questões nos locais próprios, com recato, em vez de agitar medos e alijar responsabilidades na praça pública, do tipo eu bem queria, mas não é possível. Não, ele mostra enorme força de carácter, mas deve aceitar que há limites para a condescendência, mesmo que na abordagem que faz dos jogos tenha o cuidado de destacar as presenças e desvalorizar as ausências.
Para ele todos os jogadores contam. É excelente que assim seja, mas um plantel não é ilimitado e se lhe faltam dois laterais, ele também resolve, se lhe falta mais alguém continua a resolver, mas o lençol não estica a algum lugar há de ficar destapado ou... mal tapado. Milagres não faz.
Do Benfica campeão em 2016 fizeram parte Nico Gaitán e Renato Sanches, duas peças de incontestável influência, a que se junta Jonas, o melhor marcador. Os dois primeiros saíram e o terceiro, embora tenha ficado, é como se não estivesse, por culpa de uma lesão e de uma bactéria maldita, segundo consta.
Diz o boletim clínico que o jogador continua indisponível e aponta «drenagem de volumoso hematoma pós traumatismo de pé direito» depois de o ter dado como recuperado de «fractura (osteófito do astrágalo no tornozelo direito). Ciclo estranho: indisponível-recuperado-indisponível. Finalmente, os ventos sopram de feição e já se vislumbra o fim do pesadelo.
Mas não é só a situação clínica do avançado brasileiro que intriga, Jardel? Grimaldo? Eliseu? André Horta? Além de outros casos, entretanto ultrapassados, que fizeram o centro de treinos do Seixal parecer uma enfermaria, e, no entanto, o Benfica só depende de si para seguir em frente na Champions (se o consegue ou não é outra conversa) e lidera a classificação na Liga portuguesa.
Abençoada crise, esta, mas convém não brincar com o fogo. Por muito menos já rolaram cabeças...
Pecados só em Espírito Santo...
Ainda no defeso foi decretada crise no FC Porto quando a administração portista proclamava exactamente o contrário, sair dela, depois de três anos de seca em matéria de campeonatos.
Não senhor, nada a fazer, estava, e está, em crise, por ter contratado um treinador que não agradou à franja mais severa de críticos da casa, por ter sido eliminado da Taça de Portugal, por marcar poucos golos e por se ter excedido a festejar a vitória sobre o SC Braga...
Muito bem, mas continua na Champions, estando a um pulo dos oitavos de final, e na Liga portuguesa é terceiro, com menos dois pontos do segundo, o Sporting, o qual vai decidir amahã, em Varsóvia, se confirma presença na Liga Europa ou... volta a casa. Apesar da apregoada quebra de eficácia na concretização, o dragão regista apenas três golos menos do que leão. Isto quanto a golos marcados, porque nos sofridos a equipa de Jorge Jesus contabiliza o dobro (10 contra 5).
Na diferença entre golos marcados e sofridos o saldo portista é superior ao sportinguista, mas é Nuno Espírito Santo quem carrega todos os pecados. Por outro lado, o FC Porto já jogou em Alvalade e perdeu, prova que desde então (3.ª jornada), à lus dos números, recuperou um ponto ao Sporting. Crise, onde?"
Fernando Guerra, in A Bola
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