terça-feira, 27 de outubro de 2015

Um calor de ananases nos Coqueiros

"Pioneiro como sempre, o Benfica foi a primeira equipa a disputar uma eliminatória da Taça de Portugal em território ultramarino. Em 1969, deslocou-se a Luanda para defrontar o ASA, campeão angolano, efectuando os dois jogos na então colónia portuguesa.

«É verdadeiramente extraordinária o ambiente que rodeia a equipa do Benfica que se encontra em Luanda para defrontar o ASA no jogo da primeira mão da eliminatória da Taça de Portugal em futebol!», gritavam os jornais naquilo que Nelson Rodrigues chamou o Berro Impresso das Manchetes.
Talvez não fosse para menos. Mais uma vez, o Clube da águia era pioneiro: jogava um encontro oficial num dos territórios ultramarinos, primeira equipa a fazê-lo, ficaria para a história.
Chegava gente de toda a província. Gente e mais gente. Tanta gente que o estádio dos Coqueiros, com capacidade para pouco mais de 14 mil espectadores, se preparava para receber um assalto de 30 ou 40 mil.
Toda a Angola queria ver jogar o campeão nacional!
E até de São Tomé vinha um avião fretado de propósito.
Adversário do Benfica nos oitavos-de-final da Taça, o ASA de Luanda.
ASA - Atlético Sport Aviação. Era treinador por Humberto Frade e tinha jogadores como Garrido, Inguila, Juvenal ou Dinis, o «Brinca n'Areia».
Dinis afirmava com denodo: «Vou começar a habituar-me à defesa do Benfica. Sei que será difícil, mas só deixarei de tentar quando o árbitro der o jogo por terminado. Seria para mim uma grande alegria marcar um golo ao José Henrique».
Não era o ASA a única equipa das colónias a jogar nessa eliminatória: a Académica defrontava o Ferroviário e o Sporting a UDIB, da Guiné.
Havia um desejo forte: «Aguarda-se que as representações ultramarinas dêem melhor conta de si do que das outras vezes em que tomaram parte na Taça de Portugal. Valores individuais não lhes escasseiam. O que lhes tem faltado é um contacto insistente com adversários mais evoluídos tacticamente, de preparação mais serena e cuidada, mais rápidos e resistentes».
O estádio era dos Coqueiros mas fazia um calor de ananases.
Dinis não marcou o golo que desejava. Esteve quase, quase... Isolou-se frente a José Henrique, mas atirou ao poste.
A vitória Benfiquista foi fácil.
Eusébio jogou enormidades e encantou a multidão que se apertava nas bancadas como sardinhas em lata. Marcou três golos. O outro foi de Praia. Eliminatória resolvida logo ali, mas ainda havia uma segunda mão para disputar. Outra vez em Luanda, outra vez nos Coqueiros que as viagens eram longas de mais para o luxo de uma lá e uma cá, como mandam as regras das competições, sejam elas quais foram.

O reencontro com Marcolino Bragança
O Benfica permanece em Luanda. Jogará dentro de quatro dias.
Na Metrópole, a peregrinação a Fátima é centro das atenções. A peregrinação dos angolanos continua a ser ao estádio dos Coqueiros que prevê nova enchente.
Uma das grandes figuras da história do clube, Marcolino Bragança, atleta e jogador de méritos e atributos, é homenageado pela direcção do Benfica que não se esquece dos seus.
Borges Coutinho, Vieira de Brito e o técnico Otto Glória visitam-no em sua casa, comandando todo o grupo de jogadores que quis encontrar-se com um velhinho de 78 anos a quem haviam amputado uma perna.
O momento foi solene e emocionante.
O «capitão» Coluna pregou na lapela de Marcolino Bragança o emblema de outro e diamante. E titubeou, comovido: «Se não fosse o senhor eu nunca teria sido o Coluna...»
Em seguida para o campo, que se fazia tarde e era preciso regressar a Lisboa.
Desta vez há uma meia surpresa: os «aviadores» batem-se com um entusiasmo maior e com uma concentração mais apurada. O seu futebol era solto, atrevido e causava embaraços sérios às «águias encarnadas». Há neles uma alegria que contagia o público. Coluna e Toni viam-se em apuros no meio-campo. José Augusto recuou no seu auxílio. Sabu, Gaspar, Juvenal e Dinis provocam dissabores. Mas Eusébio é Eusébio: face ao arreganho dos adversários, responde com o seu Futebol felino e assassino. É dele o primeiro golo, aos 23 minutos. Será dele também o segundo aos 75.
Parecia que a sentença, estava dada. Engano! Aos 78 minutos, Garrido faz o 1-2 e, seis minutos mais tarde, um desentendimento entre Adolfo e Humberto Coelho, permite o empate a Cruz.
O povo delira! Um empate frente ao Benfica é algo de histórico. Servirá para alimentar contos e lendas por anos a fio no coração das terras africanas.
Ainda há quem não acredite no que os seus olhos vêem, mas é uma realidade indesmentível. A dois minutos do fim do encontro, o campeão angolano está empatado com o campeão português. Bate-se pela vitória contra uma equipa que domina a Europa e que faz tremer de medo os grandes nomes do mundo.
Esfregam-se os olhos... O relógio faz mover enexoravelmente os seus ponteiros.
Mas o Benfica é enorme: tem Eusébio e Torres, e Coluna e Simões e José Augusto.
É precisamente José Augusto que, no minuto 89 faz o 3-2. O Benfica salva a honra, o ASA pode gabar-se de ter feito sofrer as estrelas vermelhas da Luz.
Os gigantes regressam a casa. Mais uma vez foram pioneiros. Riscam a cores vivas o seu destino.

Taça de Portugal
1957/58 - 1/2 Final - Benfica 6 - 2 Ferrovia Nova Lisboa(Angola) - Alvalade(Lisboa)
1957/58 - 1/2 Final - Benfica 11 -1 Ferrovia Nova Lisboa(Angola) - Tapadinha(Lisboa)
1961/62 - 1/4 Final - Benfica 7 - 1 Ferroviário da Beira(Moçambique) - Luz(Lisboa)
1961/62 - 1/4 Final - Benfica 7 - 1 Ferroviário da Beira(Moçambique) - Tapadinha(Lisboa)
1968/69 - 1/8 Final - Benfica 4 - 0 ASA(Angola) - Coqueiros(Angola)
1968/69 - 1/8 Final - Benfica 3 - 2 ASA(Angola) - Coqueiros(Angola)
1970/71 - 1/4 Final - Benfica 6 - 0 Ind. Porto Alexandre(Angola) - Luz(Lisboa)
1970/71 - 1/4 Final - Benfica 2 - 0 Ind. Porto Alexandre(Angola) - Salema(Lisboa)"

Afonso de Melo, in O Benfica

4 comentários:

  1. O Benfica nunca andará em guerra directa com nenhum clube Português, pelo simples facto do Benfica ser maior que Portugal e não ser sequer comparável ao Sporting e Porto, mesmo quando se juntam, não têm dimensão para ombrear, como clubes, com o Glorioso Benfica.

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  2. Sr Afonso de Melo gostaria de o ver num destes canais subjugados aos azuis e verdes para que com a sua sabedoria, calma e perspicácia enfrentar os comentadores que tudo fazem para denegrir a grande instituição SLB. Por aquilo q conheço da sua personalidade, era a pessoa indicada para defender com unhas e dentes e com todos os conhecimentos q tem, aniquilar todos os que com mentiras rebaixam o nosso clube... em alguns canais ate doi ver a forma como tratam o Benfica e o seu representante no respectivo programa se ri... sem saber o q dizer... tristes...cumprimentos

    27 de outubro de 2015 às 21:29

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A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
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