segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Corredores

"1. Os jogos passam e o público teima em não encher o Estádio da Luz. Por que não acredita? Por que ainda vive o medo de desilusões recentes? Por que não está disposto a fazer uma aposta emocional como a que fez na época passada? Por que não vê um futuro para lá das redes da baliza? Perguntas a mais para uma só resposta. Talvez cada um dos ausentes tenha a sua. Ou cada um deles saiba para quando guardou o momento de regressar ao lugar que tem sido seu. Por cada cadeira vazia há um vento frio que percorre o Estádio. Talvez o mesmo vento frio que percorre os corredores da alma de uma equipa outrora feliz...

2. Abriram-se corredores para que energúmenos baratos atingissem os jogadores e treinadores do FC Porto com tochas acesas à medida que estes iam saindo do autocarro que desembarcava nas Antas. A polícia que é sempre tão violenta com uns, limitou-se a ser passiva. E a ver voar as tochas; e até ser por elas atingida, sem queixas nem lamúrias. O Madaleno não estava lá. Devia estar no conforto do lar a abrir garrafas de champanhe sonhando com derrotas da Selecção Nacional. No autocarro é que nunca! Que dobre a espinha aquele a quem ele paga. Que sofra enxovalhos e insultos. No outro dia, pela manhã, estará fresco e bem dormido a dar o apoio de sempre àqueles que ofereceram o corpo à pouca vergonha da véspera. Há quem considere apenas uma deprimente exibição de decrepitude. Há em todo o episódio um cheiro a mofo de processos velhos. Dar um passo atrás, para que a vítima suba sozinha ao cadafalso. Cobardia? Alguns chamaram-lhe qualquer coisa que tem que ver com o seu contrário. O filme está partido e nunca acaba..."

Afonso de Melo, in O Benfica

Prioridades

"O sorteio europeu de segunda-feira conduz-nos, desde já, a algumas conclusões.
É lugar comum afirmar-se que todos os adversários são iguais, e todos os jogos são para vencer. Porém, a realidade mostra que há adversários... mais iguais que outros. É o caso, por exemplo, do Tottenham, conjunto de orçamento superior ao nosso, recheado de estrelas, e revitalizado por novo comendo técnico. Se pensarmos chegar longe na Liga Europa, e mesmo partindo do pressuposto (não totalmente líquido) que conseguimos vencer o PAOK, teremos provavelmente de ser capazes de ultrapassar, também, a forte equipa londrina. E ainda sobram Juventus, Valência, Fiorentina, Sevilha, Shakhtar, Lyon, Ajax ou Napolés. Há, entre os adeptos do Benfica, quem defenda que apenas e só o Campeonato - onde se discutem as rivalidades domésticas - permite acender a nossa chama. Frequentemente, atletas e técnicos, tendem a privilegiar a frente externa, onde a visibilidade, enquanto profissionais, é maior.
Devo dizer que nem sempre consigo escolher: se por um lado percebo que, estrategicamente, as provas nacionais conferem um maior peso relativo, por outro, são os feitos internacionais que ilustram a história. Cada época é um época, e cada contexto tem as suas especificidades.
O que me parece óbvio é que o sucesso, interno ou externo, apenas poderá ser atingido com alguma dose de pragmatismo. E a cada ocasião, deverá corresponder uma clara definição de prioridades - as quais, por sua vez, devem ser escolhidas em função da importância de cada objectivo, e das reais hipóteses de o alcançar.
Esta Liga Europa não parece fácil de vencer. Por outro lado, após três temporadas consecutivas sem título nacional, este não pode deixar de figurar à cabeça da nossa lista de desejos.
No cruzamento entre uma e outra ideia, deve pois prevalecer - neste caso, e por enquanto - uma aposta inequívoca no Campeonato. Eventualmente chegados a umas meias-finais, então se verá. Até lá, que não haja lugar a hesitações, nem a Aroucas."

Luís Fialho, in O Benfica

Positivo e negativo

"1. Gostei da exibição (e da vitória) frente ao PSG, numa Liga dos Campeões em que ficámos aquém do que valíamos, em parte por falhanço próprio, noutra pelo azar que nos perseguiu no excelente jogo em Atenas. Não gostei da exibição (valeu o resultado) em Olhão, onde a defesa voltou a falhar (são demasiados os golos sofridos esta época) e a equipa 'adormeceu' na 2.ª parte, depois do golo da vitória. Positiva, apenas, a reacção às desvantagens.. que poderiam ter sido fatais.

2. Os No Name resolveram não apoiar a equipa ao longo do jogo com o Paris SG, limitando-se a duas curtas intervenções, uma em cada parte. Até admito que, zangados pelo empate frente ao Arouca, estivessem cinco ou dez minutos em silêncio, para dar esse sinal à equipa. Mas estarem todo o jogo calados é, no mínimo, lamentável, pois o grande prejudicado poderia ser o Benfica, que tem de estar sempre acima dos protestos ou das 'birras' de cada um. Felizmente, a equipa não precisou da claque para jogar bem e ganhar. O que não deixou de ser uma boa resposta.

3. Pinto da Costa escreveu outro livro, com 31 decisões nos 31 anos de mandato à frente do FC Porto. Presumo, por aquilo que li nos jornais, que não falou nem dos contactos (e não só...) com os árbitros nem da decisão (que não terá sido fácil) de ir passar uns dias a Espanha, antes de se 'entregar' à polícia, aquando do 'Apito Dourado'. O que até é compreensível: só falou de 31 das milhares de decisões que teve que tomar e as conversas (e não só...) com árbitros ocupariam demasiadas páginas, tantas elas foram...
Curiosamente, e através de Octávio Machado, que ao Record e ao Correio da Manhã desmentiu algumas versões do seu antigo presidente, soubemos que Pinto da Costa fez pressão junto de Scolari no sentido de afastar Vítor Baía e meter Nuno Espírito Santo na selecção. E o antigo treinador disse mais, agora a propósito de superstições: 'Pinto da Costa é que parava os serviços de Delane Vieira. Ele tanto vai a Fátima como vai à bruxa'. E a propósito de mentiras: 'Pinto da Costa mentia a falar e agora mente a escrever.' Ele conheceu-o bem de perto..."

Arons de Carvalho, in O Benfica 

O regresso de Jesus

"Jorge Jesus regressa hoje ao posto de comando avançado da equipa do Benfica. Uma coisa é ser um general estratego, à distância, manobrando peças num tabuleiro, transmitindo ordens por mensageiros, outra bem diversa é vestir o colete antibala e descer ao campo de batalha, dirigindo as falanges homem a homem, tiro a tiro.
Nestes tempos de guerras virtuais e bombardeamentos por aviões não tripulados, o futebol que alguns pretendem entregar ao escrutínio electrónico continua a resistir como velha escola e métodos conservadores. 
Jesus é um expoente desta velha escola, através de uma intervenção permanente sobre os jogadores, actuando como um 12.º jogador com uma intensidade rara e de enorme contraste relativamente ao estilo da nova vaga de treinadores saídos das universidades e cada vez mais formais e formalistas. Apesar da “boutade” a propósito da sua cátedra, das lições casuais em fóruns universitários e do reconhecimento filosófico de académicos eméritos, Jorge Jesus nunca conseguiu desfazer a faceta popular nem reprimir uma peculiar expressividade emocional que lhe tem custado alguns castigos e uma crescente perda de tolerância por parte dos adeptos do próprio clube.
Quando o Benfica ganha, o estilo de Jorge Jesus é apreciado e justificado como a melhor forma de tirar o máximo rendimento dos jogadores, mantendo-os à rédea curta. Quando o Benfica perde, para lá dos defeitos técnico-tácticos, acresce o cansaço relativamente ao estilo do treinador, acusado até de baralhar os jogadores com tanta linguagem gestual e gritaria para dentro do campo: uns não o percebem, outros não lhe ligam.
A sair de uma suspensão que terá penalizado a equipa, com alguns pontos desperdiçados e um retrocesso evidente na qualidade de jogo, Jesus promete não se deixar voltar a perder pelas emoções. Afinal, não terá sido das lições mais complicadas da sua longa aprendizagem, mas foi certamente das que mais lhe custaram: Jesus é um operacional sem paciência para joguinhos de estratégia nos bastidores do combate. 
regresso ao banco é acompanhado de comentários críticos do presidente benfiquista, mal restabelecido da eliminação prematura da Liga dos Campeões que tanto significava para o clube, este ano. Depois de todos os altos e baixos de uma relação de invulgar resistência, Jesus ter-se-á colocado sobre o fio da navalha, desiludindo o presidente. Já não lhe basta ter de mudar o comportamento, parece que tem igualmente de alcançar resultados."

Federação rica mas pobre

"Depois das jornadas, o Conselho de Disciplina da FPF tem à sua frente os relatórios das equipas de arbitragem, dos delegados da Liga e das forças policiais (porventura, os “autos em flagrante delito” da Liga) e decide os “castigos” dos jogos profissionais de futebol. A função corresponde a um processo sumário, mas implica uma condenação extraordinariamente sensível: afectam-se direitos e interesses relacionados com a competição sem exercício do direito de defesa. O que é uma entorse significativa de uma garantia básica, justificada em nome de princípios considerados superiores, em especial a normalidade do desenvolvimento das provas sem perturbação das decisões disciplinares e a execução célere dessas decisões.
Os regulamentos estão atentos a essa sensibilidade. Essas deliberações do CD devem descrever as circunstâncias relativas ao facto sancionado, proceder à identificação do ilícito disciplinar e motivar os critérios (agravantes e atenuantes) que levaram à escolha da pena concreta. O mínimo, portanto, para que o agente saiba como, porquê e em que medida foi condenado. E o mínimo deve ser exarado em acta do CD e notificado pessoalmente a cada um dos agentes (com excepção das penas “automáticas”, como na expulsão por “duplo amarelo”). Por fim, comunicam-se publicamente as condenações através do “mapa de castigos” relativo a todos os jogos. Que não pode substituir a notificação a que cada um dos agentes tem direito, para saber em que termos se alicerçou a acção do julgador.
Sobre o livro de actas, não sabemos. Sobre o “mapa”, sai cá para fora e é remetido aos clubes. Quanto à notificação das decisões a cada um dos agentes – isto é, o que importa para remediar a falta de contraditório e a ponderação de recurso ulterior –, entrou em desuso, numa violação gritante (mais uma) da lei e dos regulamentos. E, assim, lá temos ao fim da tarde das terças-feiras os agentes de uma prova profissional de futebol a não saberem, em múltiplos casos, por que foram condenados ou qual o critério por que foram condenados e a procurar, por portas travessas, descodificar o “mapa de castigos”. Em suma, o “velho futebol” da opacidade, do amadorismo e da preguiça, no seio de uma federação rica e esbanjadora, orgulhosa da “sua” final da Champions, instaladora de uma “cidade do futebol”, mas sem a mais simples das estruturas para defender os mais elementares direitos dos clubes e dos seus agentes. Agora se compreende melhor um dos “objectivos” de Fernando Gomes, quando, em Julho de 2010, declarava à Lusa ambicionar uma justiça “competente” e “recatada”…"