quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Focados na vizinhança como sempre

"João Tomás é um senhor. Ao contrário de Elias, para quem foi Artur sozinho que ganhou ao Sporting, Tomás nem se lembrou de dizer que foi Boeck sozinho que empatou com o Rio Ave


FOSSE eu do Vitória de Guimarães, e amor pela cidade não me falta, e também seria bem capaz de defender veementemente a causa da expulsão do benfiquista Javi Garcia, neste último jogo entre os dois emblemas, a contar para a Taça da Liga, mesmo tendo de admitir que a queda de N'Diaye demorou um bocadinho de tempo a mais do que devia em função do momento da reclamada agressão.

A expulsão de Javi Garcia, à partida, seria uma boa coisa para o Vitória de Guimarães, a perder por 0-1 e com muito, muito tempo ainda para jogar. Se eu fosse do Vitória de Guimarães teria pensado assim, com certeza, e com toda a legitimidade própria de um adepto que se preze.

Há sempre exageros no raciocinar dos adeptos. E não só dos adeptos. Os comentadores da SIC que transmitiram o jogo não tiveram a menor dúvida de que Javi deveria ter sido expulso e não são do Vitória de Guimarães, presumivelmente. Os comentadores da SIC também não tiveram dúvida nenhuma que Maxi Pereira tinha carregado Toscano dentro da área do Benfica e só mudaram de opinião ao intervalo.

Na verdade, houve falta, sim senhores, mas foi fora da área, o que é uma coisa completamente diferente. E corrigiram a sua opinião os comentadores da SIC, estação que abriu o ano com uma grande entrevista a Pinto da Costa. E a entrevista foi ontem mesmo para o ar, 24 horas depois do Vitória de Guimarães-Benfica, 24 horas depois dos comentadores da SIC, à 16.ª repetição, terem finalmente concordado que não era lance para grande penalidade visto que a falta, que existiu, foi cometida fora da área.

Depois houve aquela grande penalidade que ficou por assinalar contra o Vitória, aos 58 minutos, quando N'Diaye derrubou Nolito dentro da área dos donos da casa. Se eu fosse do Vitória de Guimarães teria reagido como os comentadores da SIC.

Pronto, foi penalty, mas não se fala mais nisso.


DOMINGOS PACIÊNCIA é um treinador com provas dadas no futebol português. Num passado recente, a Académica e sobretudo, o Sporting de Braga cresceram com Domingos até níveis competitivos muito acima do suposto.

Presentemente é o Sporting quem beneficia das qualidades do treinador Paciência no seu trabalho de diligente construtor de uma equipa de futebol. Ninguém duvida que o problema do Sporting é falta de paciência e, assim sendo, está encontrado o treinador ideal com o nome a condizer e tudo.

A trabalhar, Domingos é inquestionável. Já a falar, o treinador peca nas metáforas e expõe-se a riscos desnecessários. Com esta última, a das papas Cerelac, deu o mote para todas as análises e comentários ao que vier a ser a produção da sua equipa até ao final da temporada.

Como ficou provado depois do empate de segunda-feira, em Vila do Conde, com os incontáveis títulos dos jornais versando o tema das papas, a liquidez das mesmas, a imaturidade do infante e por aí fora, sempre no campo da puericultura.

Querendo definir o estado da construção da sua equipa através de uma imagem que fosse facilmente apreendida por todos, desde a mais tenra idade, Domingos Paciência pôs-se a jeito para jocosidades sem fim.

E agora, resta-lhe compenetrar-se de que, ganhando ou perdendo o Sporting, este campeonato ficará para sempre marcado em Alvalade e arredores como o campeonato do Cerelac.

Também é verdade que podia ser pior.


É incrível o João Tomás. E continua a marcar golos ao Sporting. E a falar também não é tolo nenhum.

No fim do jogo da Taça da Liga, João Tomás não caiu em lamentos pelo empate sofrido nos derradeiros instantes, não apresentou queixas contra nenhuma entidade, não contestou o trabalho do árbitro por ter poupado o cartão vermelho a Polga ou por não ter poupado o cartão amarelo a 8 jogadores do Rio Ave.

Com humildade, João Tomás só se queixou de si próprio. «Foi pena não ter conseguido concretizar a outra oportunidade de golo de que dispus», limitou-se a dizer. Referia-se a um lance, ainda na primeira parte mas com o resultado já em 1-0 favorável aos donos da casa, em que lhe saiu torto um chapéu que poderia ter sido fatal para as aspirações dos visitantes na Taça da Liga.

O João Tomás é um senhor. Ao contrário das desculpas de Elias, para quem foi Artur sozinho que ganhou ao Sporting na Luz, João Tomás nem se lembrou de dizer que foi o Marcelo Boeck sozinho que empatou com o Rio Ave em Vila do Conde. E não estaria a dizer mentira nenhuma.


O jogo com o FC Porto «não é nenhum drama» para o Sporting. Quem o garante é Carlos Freitas, director do clube de Alvalade, para quem o clássico de sábado «não é mais importante do que a Académica ou o Feirense», diz Freitas sabendo do que fala.

Folga-se em saber que o Sporting arrepiou caminho nos dramas em redor dos clássicos. Fez bem. Aquele drama da gaiola a carburar antes, durante e depois do último clássico da Luz terá servido de lição.

E pronto, está visto. Com o Benfica houve drama, mas com o FC Porto não vai haver drama nenhum. Assim é que é bonito.


FOCADOS na vizinhança como sempre, não nos preocupámos em saber que impacto causou em Inglaterra a declaração de amor de José Mourinho ao futebol inglês. Também é verdade que o impacto causado em Madrid foi de tal monta que dificilmente haveria condições para olhar com a mesma atenção para lá do Canal da Mancha.

A possibilidade de deserção de Mourinho preocupou os adeptos do Real Madrid, como não poderia deixar de acontecer. Mas alguém se deu ao trabalho de saber se a possibilidade de Mourinho regressar a Inglaterra preocupou de alguma forma os grandes treinadores da Premier League?

Para Mourinho entrar, um deles tem de sair, não é verdade?

E há motivos para acreditar que o impacto da declaração de amor de José Mourinho ao futebol inglês foi bem mais forte em Inglaterra do que nas imediações do Estádio Santiago Bernabéu.

A coberto da velha e impecável fleuma britânica que a todos obriga, não se ouviram dislates nem remoques contra Mourinho de treinadores consagrados com posições apetecíveis como Sir Alex Fergunson, Arsene Wenger ou Roberto Mancini.

Nenhum deles abriu a boca. Mas, curiosamente, todos perderam os seus últimos jogos desde que Mourinho os ameaçou com o regresso.

São os nervos.


O Manchester United perdeu o seu jogo com o Blackburn por causa de um deslize fatal do seu guarda-redes, o espanhol De Gea. Também no jogo com o Benfica, em Old Trafford, o mesmo De Gea prestou grande colaboração no lance do golo de Aimar que haveria de empatar a partida.

É um facto que os adeptos do Manchester United não têm grande confiança nas capacidades do guarda-redes contratado ao Atlético de Madrid e que não foi barato. Um dia destes o Atlético de Madrid começa a ter má fama no mercado dos guarda-redes.

Roberto vendido ao Benfica, De Gea vendido ao Manchester United... onde é que uma coisa destas pode ir parar?


DEPOIS de uma época triunfal, o presidente do FC Porto recebeu uma consagração internacional. Rima e é verdade.

Numa cerimónia realizada no Dubai, rodeado de sheiks das Arábias, Pinto da Costa venceu na categoria de melhor dirigente do ano um Globe Soccer Award, troféu de prestígio que, no entanto, não lhe mitigará o desgosto de nunca ter visto os seus méritos devidamente homenageados em Portugal.

E mesmo este Globe Soccer Award, vindo do Dubai, não teve o impacto devido na sociedade portuguesa. O que se compreende porque tratando-se de um prémio dado por mouros, é sempre de desconfiar."


Leonor Pinhão, in A Bola

Objectivamente (Guiné)

"Numa época em que se tanto se fala de solidariedade, hoje não poderei deixar de salientar a digressão da equipa de Futebol Júnior do Benfica à Guiné Bissau, entre 18 e 23 de Dezembro.

Foi uma jornada magnífica, onde pouco se relevaram os resultados desportivos - uma derrota e uma vitória - mas, fundamentalmente, o estrondoso êxito social! Foi um convívio inesquecível com a presença de milhares de pessoas nas ruas e nas deslocações aos lugares previamente programados - Primeiro-ministro e diversos órgãos de soberania.

A viagem ao norte do Pais, cidade de Gabu, ficou na memória de todos, e os veteranos, Chalana e José Henrique, que já passaram por grandes momentos de exaltação benfiquista, disseram nunca ter visto coisa semelhante com mais de 19 mil pessoas(!) em duas longas filas, correndo a par do autocarro, só para tocarem nos ilustres convidados benfiquistas.

Outro ponto alto foi a visita a uma creche, com meninos carenciados, em Bissau, onde os nossos jovens futebolistas se perderam de paixão. Deram prendas, brincaram com as crianças e sentiram um carinho especial que quiseram repetir depois do seu ultimo compromisso desportivo na capital guineense.

Juntaram-se ainda à comitiva benfiquista os antigos ídolos, Reinaldo e Samuel. Como devem imaginar eles foram o centro das atenções muitas vezes durante esta visita. Que orgulho eles sentiram ao ver toda esta festa num país tão carente mas com tanto amor para dar!

O Benfica está no caminho certo e, no início do ano, irá passar por Cabo Verde e Angola, levando o emblema do Clube bem alto!

Em momentos como este é importante sabermos como deveremos viver com muita paixão certos momentos da nossa vida."

João Diogo, in O Benfica

Alarme

"O futebol italiano está a ser varrido por um novo tsunami. Depois do vendaval que o fustigou no Verão passado e que teve consequências funestas para oito jogadores, quatro treinadores, três dirigentes e 15 clubes, agora o que aí vem é um autêntico terramoto. Não só porque desta vez atinge em cheio o escalão principal e vários dos seus protagonistas mas também e, sobretudo, pelas proporções assustadoras que irá ter. O motivo é sempre o mesmo: resultados combinados e apostas clandestinas. Das 20 equipas da Série A só três (Juventus, Milan e Inter) não estão envolvidas no escândalo, enquanto os jogos sob suspeita são nada menos do que 20, alguns do campeonato ainda em curso. Tudo isto veio à tona porque Carlo Gervasoni, ex-defensor do Piacenza (já punido com cinco anos de suspensão na sentença do primeiro processo), apertado pelo juíz de investigação do tribunal de Cremona, despejou o saco. Do que não há dúvida, a fazer fé na opinião dos entendidos em direito do desporto, é de que ocorrerão irradiações e despromoções. Os próprios Buffon (que aposta, no mínimo, 200 mil euros/mês!), Cannavaro e Gattuso, viciados no jogo, não ficaram imunes a alguns salpicos da lama.

Para já, o caso está ainda no âmbito da justiça ordinária, que promete facultar à sua congénere desportiva o dossier com o resultado de todas as diligências efectuadas. Lá para o início da Primavera, o mais tardar, conheceremos as primeiras sanções e o alvoroço que irão provocar. O mais curioso é que o epicentro do ciclone está em Singapura e, pelos cálculos mais optimistas, haverá pelo menos 200 jogos sob suspeita, incluindo da Liga dos Campeões, disputados em países como Alemanha, França, Suíça, Hungria, Bósnia, Eslovénia, Croácia e, obviamente, Itália, que nestas coisas está sempre na primeira linha. Até na busca dos delinquentes."


Manuel Martins de Sá, in A Bola

Real politik

"Ficou célebre o comentário do professor universitário sobre a tese do aluno. Esclareceu o docente que a tese continha ideias boas e ideias originais – pena que as boas não fossem originais e que as originais não fossem boas… É deste episódio lapidar que me recordo sempre que assisto ao triste espectáculo das fúrias legislativas, de febres que atacam homens de bem que se transformam rapidamente em pistoleiros normativos, capazes de disparar em todas as direções. Estudam pouco e sabem menos, conseguindo aquele extraordinário tempero português que é colocar académicos e teóricos de um lado e agentes e técnicos do outro, como se não fossem todos indispensáveis. Depois, quando é preciso um álibi final, nomeia-se um grupo de trabalho que se limita a repetir os desejos do poder ou que tem o seu trabalho condenado ao lixo.

Infelizmente, esta epidemia ameaça chegar ao mundo do futebol. Soubemo-lo através de Jorge Jesus, que veio trazer a público um estudo ou uma proposta ou uma ideia ou lá o que é, com o objetivo de valorizar o jogador português. Tenho como bom o conceito de que o campeonato nacional só é competitivo, respeitado e suscetível de atenção externa, por causa das mais-valias internacionais que por aí andam e às quais se juntam os talentos portugueses, muitas vezes ávidos de emigrar, não para clubes de primeira linha mas para ordenados com que dificilmente podem sonhar (em média) por cá.

Haverá certamente formas de regulamentar a utilização dos homens da casa. Mas querer restringir a contratação de estrangeiros aos atletas internacionais parece apenas um assomo de arrogância, demonstrativo de que as palavras austeridade e contenção ainda nos não são familiares e capaz de confundir a nossa capacidade de contratação com a dos ingleses, o que é um desvario.

Jorge Jesus teve o cuidado de dizer que, por cá, somos também formadores de jogadores estrangeiros. Os exemplos a favor deste argumento são muitos. Mas basta pensar em Hulk, que só chega a internacional brasileiro graças ao crescimento e à exposição no FC Porto. Luisão e David Luiz são contabilidade positiva para o Benfica. Van Wolfswinkel precisou do Sporting para aparecer nas cogitações dos responsáveis holandeses para o Euro que aí vem. Mais: alguém duvida que gente como Belluschi, Javi Garcia, Nolito, Ínsua, Rinaudo traz mais perfume e mais combatividade ao futebol nacional?

Acredito muito mais no bom senso – e, já agora, na negativa ao alarmismo que faz do jogador português uma espécie em extinção, algo que é desmentido pelo bom comportamento das selecções – do que na regulamentação por iluminados. Espero que o tempo do “orgulhosamente sós” tenha passado de vez. E desejo que outras vozes se juntem à de Jorge Jesus, antes que se mate a galinha dos ovos de ouro."


Os protetores

"Uma manobra clássica dos ciclos políticos é a incursão legislativa nos meandros do futebol profissional, confundido com desporto apesar de há um século a canibalizar recursos e paixões dos portugueses pela coisa desportiva. Desde meados dos anos 80, embora sem nunca justificar um ministério, o frenesi partidário produziu contraditórias Leis de Base, interferiu no livre associativismo e, certamente pelas piores razões, nunca atinou com um rumo estável que permitisse o crescimento concertado da atividade, nem um paradigma de educação pelo desporto, ao contrário dos parceiros europeus.

Ainda agora terminou, com as sofridas eleições da FPF, o enquadramento à última lei orientadora, com impacto negativo em praticamente todas as outras federações que a ela só se sujeitaram pela dependência extrema das migalhas do OE, e já os novos governantes saem a terreiro com, não um, não dois, mas três estudos de mudanças estruturais, escorados na ambição partidária de realizar “obra”.

Pela mediatização e pelo interesse público as recomendações dos “grupos de trabalho” assestaram pontaria a temas fervilhantes e tão conclusivos como o sexo dos anjos. A profissionalização dos árbitros (de futebol, mas por que não dos outros?) é a senha de entrada no clube restrito dos que sempre dão mais um nó nos emaranhados regulamentares para assegurarem que tudo fica como acham que deve estar, sob controlo deles.

Regimes fiscais e de segurança social de exceção, totonegócio, sociedades anónimas para disfarçar as falências, por um lado, condicionamento dos arquétipos competitivos e do estatuto dos atletas, por outro, praticamente todos os modelos foram alvo de investidas de políticos espertos, incluindo no domínio da segurança e da indústria do espetáculo. Não raro, o rótulo de legislação “mais avançada” da Europa surgia no rodapé propagandístico das inovações, o que torna tudo mais difícil de entender quando, nos balanços, acabam por chegar sempre à conclusão de que as coisas ficam piores do que estavam.

É neste ponto que nos encontramos, no dealbar de mais uma transição rápida, agora pelo flanco da direita: liberal através da alienação das sociedades desportivas, populista pela profissionalização dos árbitros e com laivos de nacionalismo contra o “excesso de estrangeiros”. Para o quadro ser completo só faltaram um grupo de trabalho pela introdução das “novas” tecnologias da bola e outro pelo reconhecimento e legalização das apostas online.
Assustador é que, desta vez, surgem associados ao poder político os novos dirigentes do futebol, entusiasmados com a vontade de aumentar os campeonatos com mais emblemas falidos, porque acham que há muitos fins-de-semana sem futebol, e gulosos pela visão quimérica de inesgotáveis dinheiros da televisão. Sempre com um protecionismo benigno em pano de fundo, que teria, como derradeiro objetivo, a felicidade coletiva em torno de uma atividade transparente, equilibrada e justa, mas também promessa de uma seleção nacional melhor do que a melhor da história. Política sem vergonha."